RESUMO: Análise da situação atual do sistema penitenciário brasileiro, afirmando que as rebeliões e fugas de presos a que assistimos diariamente, são uma resposta e ao mesmo tempo um alerta às autoridades para as condições sub-humanas, a que são submetidos os que se encontram sob a égide do Estado, apesar da legislação protetiva existente. Além da violação de direitos dentro do cárcere, chama-se à atenção para a ineficácia do atual sistema de ressocialização do egresso, já que, em média, 90% dos ex-detentos voltam a delinquir e acabam retornando à prisão. Advertindo que a principal solução para o problema da reincidência está no efetivo apoio ao egresso, assim como instalações carcerárias dignas de ressocializar o indivíduo que está sob a tutela do Estado Maior. Instalações estas, não disponibilizadas pelo poder público, porém, tal deficiência estrutural poderá ser superada com o apoio da iniciativa privada. Porquanto, permanecendo a atual conjuntura, o egresso desassistido de hoje, assim como o preso sem os bons olhos do Estado, continuarão sendo os criminosos reincidentes de amanhã.
ABSTRACT: The author assesses the current situation of the Brazilian prison system, stating that prisoner’ rebellions and escapes which we hear about everyday serve both as an answer and a warning to authorities about the inhuman conditions under which inmates are kept, despite the ruling protective legislation. Besides the rights violation within prisons, the author points out the ineffectiveness of the ex-convict resocialization, since about 90 per cent of them relapse into crime and end up returning to jail. Concludes that the main solution to the problem of recidivism is the effective support to graduate as well as detention facilities worthy of re-socialize the individual who is under the tutelage of the state’s largest. For, while staying current situation, the egress unassisted today as the prisoner without the good eyes of the state will continue to reincidentes criminals of tomorrow.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Processual Penal; Sistema penitenciário Brasileiro; Violação de direitos – preso; egresso; ex-detento. Reincidência; Lei de Execução Penal – Lei n. 7.210/84; Parceria Público Privada; Reforma do Sistema Prisional.
SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Escorço histórico – 3.Teorias da Pena – 4. Princípio da individualização da pena. – 5. Organização do sistema penitenciário - 5.1. Lei de Execução Penal (LEP) 5.2. Espécies de pena e Regimes prisionais 5.3. Estabelecimentos Prisionais - 5.4. Princípios relativos à execução da pena privativa de liberdade – 6. O problema - 6.1 Superlotação - 6.2 Higiene - 6.3 Saúde - 6.4 As rebeliões e as fugas - 6.4.1 Estação Carandiru – 7. Da recuperação do preso (ressocialização) - 7.1. Sistema Progressivo (progressão de regime) - 7.2 Das Assistências – 8. Da reincidência do egresso como consequência da ineficácia da ressocialização do sistema penitenciário - 8.1 A falência das estruturas de apoio - 8.2 O drama dos servidores públicos - 8.3 A carência dos estabelecimentos penais - 9. A Reforma - 9.1. Possível solução – 10. As parcerias Público-Privadas e o sistema prisional - 10.1 Atividades possíveis de delegação e as indelegáveis - 10.2 A composição do objetivo da PPP prisional e a remuneração do parceiro privado - 10.3 O trabalho do preso – 11. Considerações finais – 12. Bibliografia.
1. INTRODUÇÃO
Como é sabido por muitos, o sistema penitenciário brasileiro apresenta vários e graves problemas, e ao longo dos anos, tais problemas vêm sendo assunto de inúmeras discussões. O presente estudo tem por escopo apresentar como é organizado o sistema penitenciário brasileiro, bem como mostrar a situação em que vivem os presos, os problemas de saúde, higiene, entre outros. Assim como, conjecturar formas de solucionar tal problemática.
Convém ressaltar que não se está analisando a justiça ou injustiça da prisão, e menos ainda defendendo o preso do crime cometido. O presente artigo tem o escopo de analisar matérias que aludem ao sistema penitenciário. Destarte, inicialmente, apresentaremos uma breve análise histórica de como surgiu a privação da liberdade como pena e os estabelecimentos prisionais, e ainda, quando se deu o advento destes no Brasil.
2. ESCORÇO HISTÓRICO
Em tempos remotos era inexistente a privação da liberdade como pena. A punição baseava-se na vingança privada, tida como uma forma de defesa. Mas como a vingança era sempre desproporcional ao mal causado, surge a lei de talião, na qual o criminoso sofria uma punição semelhante ao delito cometido.[1]
Tomando Portugal como base, encontra-se em sua legislação resquícios da vingança privada até o ano de 1340. Essa legislação sofreu mudanças no reinado de D. Afonso IV, que baniu a vingança privada do ordenamento jurídico português. Todavia, são nas Ordenações Filipinas (sua parte criminal vigorou no Brasil até 1830) que se vê claramente a luta contra a vingança privada; mesmo assim, em algumas hipóteses tal pena era admitida.
Essa forma de punir só se modificou com o advento do sistema carcerário. A privação da liberdade como pena, teve seu exórdio na Holanda, em 1595, com o modelo de Rasphuis de Amsterdã. Mas outros estabelecimentos eram mais centrados na ideia de reeducar, como a Casa de Trabalho na Inglaterra (1697), e Auburn, em Nova York(1817).
A prisão no Brasil com o intuito de punir iniciou-se tarde. O primeiro estabelecimento prisional se deu em 1850, denominado Casa de Correição da Corte (hoje conhecida como Complexo Frei Caneca, no Rio de Janeiro). Contudo, foi com o advento do Código Penal de 1890 que surge a ideia de punir reeducando, criando-se o regime penitenciário de Caráter Correcional. Hodiernamente, a pena privativa de liberdade é a mais comum de todas as penas, contando com vários estabelecimentos prisionais em todo o território brasileiro.[2]
3. TEORIAS DA PENA
Antes de adentrarmos na organização do sistema penitenciário, devemos saber qual a finalidade da pena. Para isso, existem as teorias da pena, que visam mostrar qual o objetivo da pena. São as teorias Absolutas ou Retributivas, relativas ou preventivas e mistas ou unificadoras.
As Teorias Absolutas ou Retributivas concentram-se na ideia de que a pena tem o fim de retribuir o mal causado pelo autor do delito, sendo a pena um mal retribuído pelo Estado.
Já as Teorias Relativas ou Preventivas ensinam que a pena tem como objetivo a prevenção, ou seja, impedir que o preso cometa novos delitos. Subdividem em teoria preventiva geral e especial. A primeira é centrada no cidadão, na sociedade, visando intimidar que os delinquentes potenciais cometam delitos. A segunda é direcionada aos delinquentes concretos, visando que estes não cometam novas infrações.
Por fim, temos as Teorias Mistas ou Unificadoras, que procuram unir os objetivos das teorias absolutas e relativas em uma só finalidade. Assim, para as teorias mistas, a pena tem o intuito de retribuir o mal causado pelo infrator da lei penal, bem como o de evitar que novos crimes sejam cometidos. Esta é a adotada pelo Direito brasileiro.[3]
4. PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA
Este princípio está previsto na Constituição Federal, no art. 5º, XLVI, 1ª parte, e prescreve que a “lei regulará a individualização da pena. Quem fará a normatização da individualização da pena é o legislador ordinário”, porém o constituinte não apenas faculta à lei uma possível individualização, mas determina que assim o faça.
A individualização da pena é o mais importante preceito no que se alude à cominação, aplicação e à execução da pena. A cominação da pena in abstracto deve variar, possuindo um mínimo e um máximo. A aplicação deve observar o caso concreto, analisando-se alguns fatores, bem como considerar o art. 59 do Código Penal. Na execução penal deverá ser observado o disposto no art. 5º da LEP, que determina que o condenado seja classificado segundo seus antecedentes e personalidade.
Em suma, fazer a individualização da pena é observar as condições pessoais de cada infrator da lei, seja na cominação, na aplicação ou na execução do preceito secundário do tipo penal.[4]
5. ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
Para dar conhecimento de como é organizado o sistema penitenciário, falaremos sinteticamente das penas cominadas, regimes e estabelecimentos prisionais, princípios constitucionais, teorias da pena, bem como sobre a Lei de Execução Penal.
5.1. Lei de Execução Penal (LEP)
A Lei nº 7210, de 11 de julho de 1984 é um estatuto específico que regulamenta a execução penal. Em seu 1º artigo está prescrito o objetivo da execução penal, qual seja o cumprimento da pena nos exatos termos da sentença, proporcionando ao preso uma nova inclusão social.[5]
Por esta razão, em seus dispositivos são previstos alguns instrumentos, visando o cumprimento do objetivo da execução penal. Preveem assistências de variadas categorias, trabalhos, direitos e deveres dos presos, entre outros.
5.2. Espécies de pena e Regimes prisionais
Assim dispõe o Código Penal brasileiro. “Art.32. As penas são:
I – privativas de liberdade;
II – restritivas de direitos;
III – de multa.”.
Todavia, a que interessa ao nosso estudo é a pena privativa de liberdade, pois é ela que leva o condenado ao estabelecimento prisional. A privação da liberdade pode ser de Reclusão ou Detenção (art.33 CP). A pena de reclusão deverá ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto e a pena de detenção deverá ser cumprida no regime semiaberto ou aberto.
Os regimes, como já mencionado, são fechados, semiaberto e aberto. Tais regimes são estabelecido na sentença condenatória, de acordo com a pena. O regime fechado será fixado ao sentenciado a pena superior a 8 anos e ao reincidente condenado à pena de reclusão.
O regime semiaberto será fixado ao condenado, não reincidente, em que a pena não exceda 8 anos e não seja inferior a 4 anos. Ao condenado não reincidente à pena igual ou menor a 4 anos, poder-se-á fixar o regime aberto.[6]
5.3. Estabelecimentos Prisionais
Os estabelecimentos prisionais são os locais em que os condenados cumprirão suas respectivas penas. Para cada regime foi instituído um estabelecimento diverso. São eles: a Penitenciária, a Colônia agrícola, industrial ou similar e casa de albergado ou estabelecimento similar.
As Penitenciárias são as casas que abrigam os condenados apenados por reclusão em regime fechado (art. 87 da LEP e art. 33, § 1º, a). As colônias agrícolas, industriais ou similares são destinadas ao cumprimento da pena em regime semiaberto (art. 91 da LEP e art. 33, § 1º, b).
As casas de albergado são destinadas ao condenado que cumpre pena em regime semiaberto. (Art. 93 da LEP e art. 33, § 1º, c).
5.4. Princípios relativos à execução da pena privativa de liberdade
Para garantir o absoluto respeito aos direitos do preso, a CF possui dispositivos acerca da execução da pena privativa de liberdade. Todos estão no artigo 5º. a) cumprimento da pena da pena em estabelecimentos distintos (XLVIII) – De acordo com a natureza do delito, sexo e idade, o apenado terá o estabelecimento específico.
A LEP, em seu art. 82, § 1º, prescreve que “a mulher e o maior de sessenta anos, separadamente, serão recolhidos a estabelecimento próprio e adequado à sua condição pessoal”.
b) respeito à integridade física e moral (XLIX) – Ao que cumpre pena privativa de liberdade garante-se a integridade física e moral. Esse é um dos direitos do preso. A LEP prevê no art. 45, § 1º que as sanções disciplinares não poderão colocar em risco a integridade física e moral do condenado. Também o art. 40 impõe a todas as autoridades o respeito à integridade dos condenados e dos presos provisórios. c) direito das presas de permanecerem com seus filhos durante o período de amamentação (L) – Para assegurar o cumprimento desse preceito, a LEP institui em seu art. 89 que a penitenciária de mulheres poderá ter uma seção para gestante e parturiente, além de creche para assistência à criança cuja mãe esteja presa.[7]
6. OS PROBLEMAS E A FALÊNCIA DO SISTEMA PRISIONAL.
O sistema punitivo prisional brasileiro apresenta uma ineficiência clara e evidente em uma de suas principais finalidades. A ressocialização do indivíduo pode ser declarada como algo utópico na conjectura atual dos presídios nacionais.
A nossa realidade carcerária é preocupante. Os nossos presídios e as nossas penitenciárias, abarrotados, recebem a cada dia um sem número de indiciados, processados ou condenados, sem que se tenha a mínima estrutura para recebê-los e há, ainda, milhares de mandados de prisão a serem cumpridos. Ao invés de lugares de ressocialização do homem, tornam-se, ao contrário, fábricas de criminosos, de revoltados, desiludidos e desesperados. Por outro lado, à volta para a sociedade (através da liberdade), ao invés de solução, muita das vezes torna-se mais uma 'via crucis', pois são homens fisicamente libertos, porém, de tal forma estigmatizados que se tornam reféns do seu próprio passado.
A reintegração do egresso à sociedade liberta é o verdadeiro fim da pretensão punitiva estatal. O grande contrassenso desta finalidade está nos meios empregados para atingir tal propósito.
Não se pode almejar reeducar um indivíduo que comete um delito com condições desumanas de sobrevivência. É público e notório a condição calamitosa e insalubre na grande maioria dos presídios nacionais. A mídia quase que semanalmente torna público tal fato, divulgando em todos meios possíveis os absurdos humanitários e jurídicos ocorridos em instituições prisionais.
É perceptível que o ócio toma conta da população carcerária Brasileira, não só ele como inúmeros outros problemas. Como exemplo tem-se a contaminação infecto contagiosa de doenças de todas as espécies e tipos. A curta expectativa de sobrevivência do preso devida a violência provocada pela falta de supervisão nos presídios e a existência de gangues ou facções criminosas atuando livremente onde deveria reinar a vigilância.
Com o mesmo grau danoso não se pode deixar de citar a superlotação. Todo esse contexto torna cada vez mais o sistema deletério, tornando claro e evidente o despreparo e a incompetência estatal na gestão dos presídios e colônias agrícolas, tal falta de aptidão não é só visível nas instituições reparadoras, mas principalmente para com o cidadão de direitos que se encontra custodiado.
A falta de recursos e o emprego equivocado dos existentes para a boa qualidade na reforma ética, moral e social do indivíduo, põem em risco não somente a expectativa de uma vida social para aquele que se encontra preso, mas expõe ao risco a população livre. Esta grande parcela da sociedade não sabe e nem terá como saber se aquele egresso terá condições de viver em paz e em harmonia com o todo. Agindo então de forma puramente instintiva, a sociedade evitará o convívio com tal indivíduo.
O produto de tal dúvida ou incerteza fará com que ocorra à descriminação e o preconceito. O sujeito que novamente busca o seu papel na sociedade terá ainda esta barreira a enfrentar. Tal ausência de credibilidade pode levar o egresso a cometer novos delitos, por ser a única forma de obter vantagem e condições de sobrevivência. Sendo desta forma reintegrado ao sistema carcerário por infringir novamente a norma. Ocorrendo assim um círculo vicioso prejudicial a toda estrutura social.
Outro ponto imprescindível a ser debatido nesta problemática, se deve ao alto custo na manutenção do preso. O estado incube-se de arcar com tal custeio, e mesmo assim não disponibiliza a estrutura de vida necessária e correta para punir e reintegrar o indivíduo ao todo social. Desta forma, desperdiça-se o dinheiro público e a vida de cidadãos capazes.
6.1 Superlotação como o primeiro problema
Esse é o problema que mais aflige o sistema penitenciário. A população carcerária no Brasil não é exígua. Atualmente, no Brasil, segundo dados do DEPEN (Departamento Penitenciário Nacional), os presos em regime fechado chegam ao número de 174.372 (penitenciárias masculinas e femininas). Estendendo-se do regime fechado ao aberto, os números indicam 261.718 presos. Já em sua totalidade, abarcando também os presos que cumprem medida de segurança e os provisórios, os números quase dobram, apontando 417.112 presos como total populacional no sistema penitenciário.
O número de presos é muito alto e o sistema não tem idoneidade para tal. O DEPEN indica que o sistema prisional brasileiro possui capacidade para 278.716 presos, e tem um déficit de 139.266 vagas. Será por falta de leis que os presídios brasileiros estão sobrelotados? A resposta é negativa, pois a LEP estipula que para cada preso deve ter um espaço de seis metros quadrados reservado. Mas tal lei não é observada, pois há presídios em que o preso só tem livre um espaço de 30 cm quadrados.[8]
Os números mostram que o sistema penitenciário brasileiro está falido, não passando de um espaço onde se amontoam corpos. Em alguns presídios, os presos fazem revezamento para dormir, sendo que alguns dormem em pé. Outros presos ainda chegam a amarrar seus corpos às grades, pelo motivo de que nem o chão da cela tem espaço suficiente para o repouso noturno. Esse problema não existe por si só, trazendo consigo outros problemas, que serão vistos logo abaixo.
6.2. A Higiene, ou a falta dela.
Como vimos, temos em nosso país, presídios que não possuem condições de proporcionar um cumprimento da pena nos termos da lei, pois a população carcerária é imensa. Como se não bastasse, os prédios não são higiênicos: veem-se restos de alimentos jogados no chão, ratos trafegando livremente pelos corredores, vasos sanitários emporcalhados etc., fazendo com que o cenário dos presídios seja lôbrego e de um fedor nauseabundo.
6.3. A Saúde dos presos.
As condições de saúde dos presídios brasileiros não são boas. Os prédios malconservados, a insalubridade, a falta de higiene citados acima, entre outros, aliados ao excessivo número de presos, transformam as penitenciárias brasileiras num foco de doenças.
No ambiente carcerário encontram-se as mais variadas doenças, como tuberculose, pneumonia, etc. Em virtude do homossexualismo, da violência sexual ocorrente nas cadeias e da injeção de drogas, a AIDS é a doença mais encontrada nos corpos dos presos (em média, 20% dos presos estão contaminados pela AIDS).[9]
6.4. A resposta do cárcere: Rebeliões e fugas.
A conjugação de todos esses fatores negativos acima mencionados, aliada à falta de segurança das prisões e ao ócio dos detentos, leva à deflagração de outro grave problema do sistema carcerário brasileiro: as rebeliões e as fugas de presos.
As rebeliões, embora se constituam em levantes organizados pelos presos de forma violenta, nada mais são do que um grito de reivindicação de seus direitos e uma forma de chamar a atenção das autoridades para a situação subumana à qual eles são submetidos dentro das prisões.
Com relação às fugas, sua ocorrência basicamente pode ser associada à falta de segurança dos estabelecimentos prisionais, bem como à atuação das organizações criminosas e, infelizmente, também à corrupção praticada por policiais e agentes da administração prisional.
De acordo com números dos últimos censos penitenciários, cerca de 40% dos presos, sejam eles provisórios ou já sentenciados definitivamente, estão sob a guarda da polícia civil, ou seja, cumprindo pena nos distritos policiais. Porém estes não são locais adequados para o cumprimento da pena de reclusão. No entanto, isso tem ocorrido em virtude da ausência ou da insuficiência de cadeias públicas e presídios em nosso sistema carcerário.
O problema maior é, nesses estabelecimentos, não haver possibilidade de trabalho ou de estudo para o preso, e a superlotação das celas é ainda mais acentuada, chegando a ser em média de cinco presos para cada vaga, quando nas penitenciárias a média é de 3,3 presos/vaga. As instalações nesses estabelecimentos são precárias, inseguras, e os agentes responsáveis por sua administração não têm muito preparo para a função. O que se tem visto, muitas vezes, é a facilitação, por parte desses funcionários, para a fuga de detentos ou para que estes possam ser arrebatados por membros de sua organização criminosa.
Ressalte-se ainda que a Lei dos Crimes Hediondos veio a agravar ainda mais essa situação, em razão de que os vários crimes por ela elencados, como sequestro, homicídio e assalto à mão armada, passaram a não ter mais o benefício legal da progressão de regime, fazendo com que o sentenciado cumpra a pena relativa a esses crimes integralmente em regime fechado. Assim, o desespero e a falta de perspectivas desses condenados ocasionam um sentimento de revolta ainda maior, vindo a constituir-se em mais uma causa de deflagração das insurreições nas penitenciárias.
Em razão desses fatores, não passa um dia, em nosso país, sem que tenhamos notícia da ocorrência de uma rebelião de presos, mesmo que seja ela de pequenas proporções. No que se refere às fugas, levando-se em consideração todas as falhas existentes em nosso sistema carcerário e ainda o martírio a que os presos são submetidos dentro das prisões, não se há de exigir conduta diversa por parte dos reclusos, senão a de diuturnamente planejar uma forma de fugir desse inferno.
Não se pode olvidar também que a liberdade é um anseio irreprimível do ser humano, não sendo razoável esperar que, por si só, o preso venha a conformar-se com o estado de confinamento, mormente na forma pela qual a privação de sua liberdade é executada em nosso sistema carcerário.
6.4.1. Estação Carandirú
Um deplorável Raio X da situação extremamente grave dos campos minados dos presídios, nos é fornecido pelo médico Varella, em sua obra Estação Carandirú. Conforme o autor, o seu objetivo não foi o de denunciar um sistema penal antiquado, apontar soluções para a criminalidade ou defender os direitos humanos.
Como nos velhos filmes, ele “procura abrir uma trilha entre os personagens da cadeia: ladrões, estelionatários, traficantes, estupradores, assassinos e o pequeno grupo de funcionários desarmados que toma conta deles”. Mas é inegável que a narrativa desnuda os dramas e as tragédias produzidos pela violência institucionalizada (pelo Estado e pelos internos) nessas sucursais do inferno em que se transformaram os presídios, independentemente de sua classificação. Um dos pacientes-personagens do livro disse muito bem: “Cadeia é lugar onde o filho sofre e a mãe não vê. ”[10]
7. DA RECUPERAÇÃO DO PRESO (RESSOCIALIZAÇÃO)
Como já visto, o precípuo objetivo da pena, assim como da execução penal, é a recuperação do preso, inserindo-os a novos atos de sociabilidade. Embora recuperar e reinserir o preso na sociedade seja uma tarefa difícil, são previstos alguns instrumentos para que isso aconteça.
7.1. Sistema Progressivo (progressão de regime)
A legislação pátria adotou o sistema progressivo, previsto nos artigos 112 da LEP e 33, § 2º do Código Penal. Desse modo, a pena privativa de liberdade deverá ser executada de forma progressiva, isto é, o preso vai passar de um regime mais rigoroso para um regime menos severo. Todavia, para que ocorra a progressão de regime é necessário que o preso atenda a certos requisitos:[11]
1) Cumprimento de 1/6 da pena no regime anterior. (Requisito Objetivo) Ex: Se a pena for de 12 anos, iniciará seu cumprimento no regime fechado. Passados dois anos (1/6 da pena) ele terá o benefício, transferindo-se para o regime semiaberto. Para conseguir novamente o benefício, desta vez para o regime aberto, terá que cumprir novamente 1/6 da pena. Porém, conta-se a pena restante após a primeira progressão, e não a pena total.
Destarte, no exemplo acima, não se cumprirá 1/6 a partir de 12 anos, mas a partir de 10. Assim, para passar do regime semiaberto para o aberto terá que cumprir aproximadamente 1 anos e 6 meses no regime semiaberto.[12]
Obs.: se for crime hediondo a progressão se dará somente quando do cumprimente de 2/5 da pena se não reincidente. Se reincidente somente será beneficiado com o cumprimento de 3/5.
2) Mérito (Requisito Subjetivo) nada adianta ao preso somente preencher o requisito objetivo. Deve preencher também o requisito subjetivo, qual seja o mérito. Observa-se se o condenado apresenta bom comportamento carcerário, mas analisa-se minuciosamente se o condenado tem possibilidade de adaptação no regime menos severo. Apesar de o preso conseguir o benefício, poderá perdê-lo também. A progressão é um benefício que se dá ao condenado. Não aproveitado o benefício de estar em um regime menos severo, cometendo alguma falta, o preso será responsabilizado pelos seus atos, sofrendo sanções disciplinares. Poderá sofrer até uma regressão de regime prisional.
7.2 Das Assistências
Para que tenha um resultado satisfatório quanto à reinclusão social do preso, este tem o direito de receber a devida assistência no decurso da execução da pena. O Estado tem o dever de prestar assistência ao preso e ao internado, como sendo um instrumento para que o preso não reincida e ao mesmo tempo se ressocialize. Esse dever estatal está previsto no artigo 10 da LEP. O artigo 11 da LEP elenca quais as espécies de assistências que o Estado deve prestar: material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa.
A) Assistência Material (arts. 12 e 13 LEP) A Assistência material consiste no fornecimento de subsídios ao preso, tais como alimentação, vestuário e instalações higiênicas, atendendo às suas necessidades pessoais. A alimentação deve ser distribuída em 3 etapas, sendo o desjejum, o almoço e o jantar. Quanto ao vestuário, o preso que não puder usar roupas pessoais deverá receber um conjunto. Em regra, o estabelecimento penal prevê a utilização de uniformes para os presos. Acerca da higienização, é um dever do preso manter a cela ou alojamento em condições de sobrevivência, cabendo à administração apenas dispor de elementos indispensáveis para que cumpram o dever.
B) Assistência à Saúde (art. 14 LEP) A Assistência Médica compreende atendimento médico, farmacêutico e odontológico. A assistência médica é de 2 aspectos, sendo preventivo e curativo. Será da primeira ordem quando se relacionar a medidas tomadas para evitar doenças, fazendo exames médicos àquele que ingressa no estabelecimento, inspecionando a higiene dos locais, etc. A assistência farmacêutica é aquela que diz respeito aos materiais, aparelhagem e produtos farmacêuticos para que sejam prestados os serviços médicos da melhor maneira possível. Também é imprescindível uma assistência odontológica de exímia qualidade, podendo o preso valer-se de um dentista habilitado. Se ocorrer de o estabelecimento não possuir o aparelhamento necessário para prestar tal assistência, permite a lei que seja prestada em outro local, mediante autorização da direção do estabelecimento.
C) Assistência Jurídica (arts. 15 e 16 LEP) Como se sabe, a maioria da população carcerária não possui subsídios para constituir advogado. Por isso existe a assistência jurídica aos presos, que para alguns juristas é a mais importante, pois para muitos presos ainda há ação penal em curso.
D) Assistência Educacional (art. 17 ao 21 LEP) A Assistência Educacional compreende a instrução escolar e a formação do preso. Ela é uma das prestações básicas para todos os homens, inclusive o que está preso, e deve ser trabalhada como um meio para a reinserção social. O Estado deverá proporcionar o ensino de 1º grau, profissional, além de poder firmar convênios com entidades públicas ou privadas, que instalem escolas ou ofereçam cursos especializados. Todo estabelecimento deverá possuir uma biblioteca para auxiliar nos estudos dos reclusos.
E) Assistência Social (arts. 22 e 23 LEP) O Serviço Social é a aplicação de conhecimentos, teorias e doutrinas para solucionar problemas humanos que acarretam infelicidade. Assim, no estabelecimento penitenciário, esse serviço tem por finalidade amparar os presos, preparando-os para o retorno à liberdade. Para isso, o assistente social deve criar um liame entre o preso e a sociedade da qual se encontra afastado.
F) Assistência Religiosa (art. 24 LEP) A religião, ao longo de todos os anos, sempre influiu no comportamento humano e no sistema penitenciário, não poderia ser diferente, por isso, a LEP, em seu art. 24 instituiu a assistência religiosa, que permite aos presos a participação em serviços religiosos organizados no estabelecimento. Prevê também, em seu § 1º, a existência de local apropriado para a realização dos cultos. Em seu § 2º estabelece que nenhum preso será obrigado a participar de atividade religiosa.
A religião nos estabelecimentos prisionais brasileiros vem crescendo a cada dia, e é o que mais tem ajudado na reeducação do preso. Isso ocorre devido à moral religiosa, que surte efeito sobre o comportamento dos indivíduos. Destarte, o obstáculo ao comportamento violento por parte do preso seria justamente a religião.
8. O PROBLEMA DA REINCIDÊNCIA DO EGRESSO COMO CONSEQÜÊNCIA DA INEFICÁCIA DA RESSOCIALIZAÇÃO DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
Um contrassenso ao tópico anterior se dá na comprovação de que a pena privativa de liberdade não se revelou como remédio eficaz para ressocializar o homem preso, e está no elevado índice de reincidência dos criminosos oriundos do sistema carcerário. Embora não haja números oficiais, calcula-se que, no Brasil, em média, 90% dos ex-detentos que retornam à sociedade voltam a delinquir, e, consequentemente, acabam retornando à prisão.[13]
Essa realidade é um reflexo direto do tratamento e das condições a que o condenado foi submetido no ambiente prisional, durante o seu encarceramento, além do sentimento de rejeição e de indiferença sob o qual ele é tratado pela sociedade e pelo próprio Estado ao readquirir sua liberdade. O estigma de ex-detento e seu total desamparo pelas autoridades faz com que o egresso do sistema carcerário se torne marginalizado no meio social, o que acaba levando-o de volta ao mundo do crime, por falta de melhores opções.
A acepção legal da palavra “egresso” é dada pela própria Lei de Execução Penal, que, em seu art. 26, considera egresso o condenado libertado definitivamente, pelo prazo de um ano após sua saída do estabelecimento prisional. Também é equiparado ao egresso o sentenciado que adquire a liberdade condicional durante o seu período de prova. Após o decurso do prazo de um ano, ou a cessação do período de prova, esse homem perde então a qualificação jurídica de egresso, bem como a assistência legal dela advinda.
Legalmente, o egresso tem um amplo amparo, tendo seus direitos previstos nos arts. 25, 26 e 27 da Lei de Execução Penal. Esses dispositivos preveem orientação para sua reintegração à sociedade, assistência social para auxiliar lhe na obtenção de emprego, bem como alojamento e alimentação em estabelecimento adequado nos primeiros dois meses de sua liberdade. A responsabilidade pela efetivação desses direitos do egresso é do Patronato Penitenciário, órgão do poder executivo estadual e integrante dos órgãos da execução penal.
O Patronato, além de deter outras atribuições relativas à execução penal, no que se refere ao egresso tem como finalidade principal promover a sua recolocação no mercado de trabalho, a prestação de assistência jurídica, pedagógica e psicológica. É um órgão que tem papel fundamental na reinserção social do ex-detento.
O cumprimento do importante papel do Patronato encontra obstáculo na falta de interesse político dos governos estaduais, os quais não têm dado a ele a importância merecida, porquanto não lhe destinam os recursos necessários, impossibilitando assim que o órgão efetive suas atribuições previstas em lei.
A assistência pró-egresso não deve ser entendida como uma solução ao problema da reincidência dos ex-detentos, pois os fatores que ocasionam esse problema são em grande parte devidos ao ambiente criminógeno da prisão, o que exige a adoção de uma série de medidas durante o período de encarceramento. No entanto, o trabalho sistemático com o egresso minimizaria os efeitos degradantes por ele sofridos durante o encarceramento e facilitaria sua readaptação após o retorno ao convívio social.
A sociedade e as autoridades devem conscientizar-se de que a principal solução para o problema da reincidência passa pela adoção de uma política de apoio ao egresso, fazendo com que seja efetivado o previsto na Lei de Execução Penal, pois, a permanecer da forma atual, o egresso desassistido de hoje continuará sendo o criminoso reincidente de amanhã.
8.1 A falência das estruturas de apoio
Como estruturas de apoio do sistema penal e penitenciário compreendem-se os recursos e serviços para administrar os problemas relativos ao delito, ao delinquente e às reações penais. A improbidade administrativa, a insensibilidade gerencial, a indiferença humana e a hostilidade burocrática são as coordenadas do abandono a que foram reduzidas as estruturas das Delegacias de Polícia, dos Juízos e Tribunais criminais, dos estabelecimentos e das instituições penais.
E a responsabilidade por tais vícios é exclusivamente do poder político que domina a Administração Pública, diuturnamente omissa quanto à gravidade e a proliferação dos problemas e incapaz de estimular o espírito missionário de uma grande legião de operadores do Direito e da Justiça, obstinados em cumprir os seus deveres com dedicação e honestidade.[14]
8.2 O drama dos servidores públicos
Os servidores públicos, independentemente da hierarquia funcional, são mal remunerados; não há equipamentos adequados às necessidades do trabalho; não há verbas para pesquisa; não há programas e muito menos apoio para introduzir estagiários que estejam cursando Direito, Medicina, Sociologia, Administração e outras disciplinas relacionadas com as questões do sistema.
Esse quadro de carências e de anomia é muito bem ilustrado pelo médico Dráuzio Varella, em seu depoimento sobre a vida prisional: “Dificuldades não faltavam. A medicação prescrita percorria complicadas vias burocráticas, e, nas frequentes transferências dos detentos de um pavilhão para outro, perdia-se no caminho. A burocracia era tanta que as internações e altas da enfermaria eram batidas em seis cópias, trazidas para assinar sem papel-carbono. Muitas vezes, como é característico no serviço público, existia fartura de antibióticos e antivirais caríssimos, enquanto faltava aspirina e remédio para sarna”.[15]
8.3 A carência dos estabelecimentos penais
Procurando vencer a desobediência secular do administrador público em matéria de provisão de estabelecimentos e serviços penitenciários, a Lei n.º 7.210, de 11.7.1984, estabeleceu que, no prazo de 6 (seis) meses após a sua publicação, deveriam as unidades federativas, em convênio como Ministério da Justiça, “projetar a adaptação, construção e equipamento de estabelecimentos e serviços penais previstos nesta Lei” (art. 203, § 1.º). Também, no mesmo prazo, deveria “ser providenciada a aquisição ou desapropriação de prédios para instalação de casas de albergados” (art. 203, § 2º).
Escoaram-se os seis meses, passaram-se quase 30 (trinta) anos e aquelas determinações não foram atendidas. Não há notícia de que qualquer unidade federativa tenha, diante do injustificado descumprimento, sofrido a pena administrativa de “suspensão de qualquer ajuda financeira a elas destinadas pela União, para atender as despesas de execução das penas e das medidas de segurança” (LEP, art. 203, § 4.º).
9. A RESPOSTA PARA O PROBLEMA PRISIONAL BRASILEIRO.
A busca pela reforma prisional parte da pretensão punitiva e reformadora do estado de direito, para aqueles que cometeram ilícitos e contravenções penais. O Art. 5º, XLVII, da CF proíbe penas de caráter perpetuo e cruéis. Assim sendo, como pode o indivíduo “egresso” ser punido perpetuamente com preconceito e descriminação pela sociedade que está inserido? O fato de ter cumprido pena, justifica tal comportamento? Porque o Estado Maior não proporciona a sua reinserção?
A mesma letra de lei proibi a aplicação de penas cruéis. Já em total desconformidade com a norma legal, o estado permite a aplicação cruel da sanção penal. Mesmo que indiretamente, porém devido à ausência de tutela governamental, o indivíduo punido com a perda do seu direito de liberdade sofre com a barbárie do sistema prisional.
Em razão da redação dada pelo caput do art. 59 do CP, podemos concluir pela adoção, em nossa lei penal, de uma teoria mista ou unificadora da pena. Visto que a parte final do caput do referido artigo descreve a necessidade de reprovação com prevenção do crime, fazendo, assim, com que se unifiquem as teorias de Reprovação ou Teoria Absoluta e a teoria de Prevenção ou Relativa, que se pautam, respectivamente, pelos critérios da retribuição e da prevenção.
Tomando como norte, a teoria da prevenção, que busca evitar a pratica de futuras infrações penais e voltada, portanto, para o futuro. O que faz crer que a reforma da estrutura prisional Brasileira se torna, portanto, de suma importância para impedir que o indivíduo volte ao crime.
Como já descrito anteriormente, a inaptidão ou falta de critérios dos gestores públicos para administrar os presídios nacionais, juntamente com as colônias agrícolas faz com que tal calamidade torne-se evidenciada. Infelizmente a redundância se faz necessária, já que o meio empregado está produzindo tal produto. Devemos repensar a estrutura governamental de gestão prisional. Podemos ter como um exemplo de parâmetro a ser seguido o sistema carcerário Norte Americano. Sistema este, onde a iniciativa privada administra e gerencia boa parte do cárcere e daqueles que se encontram a margem da sociedade.
Diminuindo assim o gasto público na manutenção prisional. Mediante imposição contratual de concessão de tal serviço, pode-se impor: A boa qualidade de vida do preso, estrutura para que o mesmo possa exercer atividade laboral ou estudantil, logo, podendo em detrimento de tal exercício fazer jus ao instituto da remição e ser reinserido mais rapidamente na sociedade com a capacidade de adequação social almejada.
Todo este contexto leva a crê que, colocar os presídios nas mãos da iniciativa privada pode ser a melhor saída para um sistema punitivo ineficaz como o brasileiro. Porem a tutela da execução penal não pode ser delegada a particular. As modalidades contratuais existentes hoje dentro da esfera da legislação administrativa não podem ser aproveitadas pelo programa de privatização, principalmente se o mesmo permitir que o particular aufira lucro e ainda se reembolse dos gastos com a construção de presídios através do trabalho dos presos. Essa forma de pagamento à empresa privada nada tem a ver com as que estão previstas na Lei de Licitações e Contratos hoje em vigor.
Nas mãos da iniciativa privada, os presídios estariam melhores administrados. Podemos ter como um parâmetro, a concessão de serviços públicos nas estradas de rodagens, fazendo com que atualmente o motorista tenha melhor qualidade nas vias e arrefecendo os cofres públicos com a diminuição dos gastos com a manutenção da malha rodoviária. Fazendo assim valer o princípio da economia ou economicidade.
Diante te tal embate jurídico, eis que surge uma possibilidade já adotada em duas Situações nos tempos atuais; A terceirização dos presídios. Tal modalidade vem em contraponto à privatização e pode ser aplicada no Brasil sem a necessidade de modificação radical da legislação em vigor. O conceito de terceirização da estrutura carcerária é de origem Francesa. Vejamos o que diz a respeito deste tema o jurista Luiz Flávio Borges, presidente da Academia Brasileira de Direito Criminal (ABDCRIM):” No modelo francês, que preconizo para o Brasil, o Estado permanece junto à iniciativa privada, numa cogestão. O administrador vai gerir os serviços daquela unidade prisional – alimentação, vestimenta, higiene, lazer etc. –, enquanto o Estado administra a pena, cuidando do homem sob o aspecto jurídico, punindo-o em caso de faltas ou premiando-o quando merecer. É o Estado que, detendo a função jurisdicional, continua a determinar quando o homem vai preso e quando será libertado. Trata-se de uma terceirização, em que a remuneração do empreendedor privado deve ser suportada pelo Estado, jamais pelo preso, que deve trabalhar e, com os recursos recebidos, ressarcir prejuízos causados pelo seu crime, assistir a sua família e poupar para quando for libertado. ”[16]
O autor abordado, a seguir narra as duas ocasiões onde a terceirização foi aplicada no Brasil: “na cidade de Guarapuava (PR), onde se instalou, há dois anos, a primeira unidade prisional terceirizada brasileira. Registre-se que, em dois anos, nenhuma rebelião ou fuga ocorreram. Todos os presos trabalham, muitos estudam e todas as condições de higiene e saúde são garantidas pelo Estado e fornecidas pela administradora privada. A comida é servida de forma que o preso abastece seu prato à vontade, terminando com o deplorável expediente, que nutre a corrupção, de se ter que comprar um bife ou duas batatas a mais. A segunda experiência no Brasil ocorre em Juazeiro do Norte (CE), com os mesmos resultados satisfatórios, destacando-se que os presos, que também trabalham, o fazem confeccionando joias, sem que tenha havido qualquer incidente. ”
Diante de tais problemas enfrentados pela administração estatal para custodiar a população carcerária, se faz necessário uma reformulação da legislação em vigor. Para que a possibilidade da concessão de tais serviços seja possível e viável a todo o país. Pois não podemos deixar a sociedade retroagir a barbárie e tornar a natureza da pena aflitiva, ou seja, o corpo e a mente do delinquente pagarem de forma tortuosa como ocorre atualmente.
9.1. Possíveis soluções: O modelo Norte Americano e o Francês.
A aplicação da pena no sistema carcerário Nacional perdeu o seu propósito de existir. Não se pode abandonar cidadãos em instituições com finalidade inicial de reeducar, e os mesmos encontrarem-se no estado deplorável evidenciado diariamente pela mídia. O princípio da dignidade da pessoa humana está em total desapego para com esta parcela da sociedade.
O real funcionamento do sistema prisional deve ter e tem como seu principal alicerce a ressocialização do custodiado. Como já dito anteriormente a incompetência estatal na administração do sistema e custodia do indivíduo faz urgir uma reformulação de controle de tal setor.
Os recursos dos cofres públicos empregados e desperdiçados vão de encontro aos princípios básicos da administração pública. Tamanho despropósito revolta não somente os custodiados e seus familiares, mas também o contribuinte brasileiro, que vê a sua contribuição fiscal literalmente ir ralo a baixo.
Para a busca do real sentido e o verdadeiro alcance da pena, faz-se necessário a troca do comando e de regime do sistema inúmeras vezes citado. Para tanto e já anteriormente narrado, existem atualmente dois sistemas: A corrente Norte Americana, ou seja, a privatização das instituições carcerárias e a forma do sistema Francês, que terceiriza a administração da instituição sem perder a custodia do indivíduo e todas as suas intercorrências.
Ambas correntes buscam uma espécie de parceria público privada. Parceria esta que não somente melhor a qualidade de vida e possibilitar a recuperação do indivíduo preso, mas, também reduzir o custo da máquina pública e também ampliando a geração de renda com a criação de novos empregos deste novo setor. Portanto, é de suma importância um estudo mais aprofundado do tema em questão, para que assim, essa problemática possa se tornar fundamental no nosso ordenamento jurídico.
10. A TERCEIRIZAÇÃO DOS PRESÍDIOS (PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS).
Como dito, é viável a transferência de serviços administrativos aos privados ainda que inseridos no bojo da manifestação de competências típicas de Estado. O tema ganha relevo com o surgimento das parcerias público-privadas (PPPs). Neste campo, Experiências desta natureza são cada vez mais frequentes. O caso do sistema penitenciário é um exemplo marcante do problema.
Inúmeros países vêm utilizando as (PPPs) para a construção, conservação e operação de presídios por particulares. Os programas são variados, alcançando-se de formatações que vão desde a atribuição de serviços exclusivamente acessórios - como o fornecimento de alimentação e hotelaria – até a gestão propriamente de arranjos tipo DCFM contracts (desing, construção financiamento e administração), assim como a gestão de presídios ditos “industriais” (comportando o trabalho do preso como fator de remuneração).[17]
No Brasil a discussão acerca da “privatização” dos presídios é motivada pela visível ausência de condições dignas de manutenção de presos na grande parte dos estabelecimentos penitenciários (administrados exclusivamente pelo Estado) brasileiros. Vale referir o documento E/CN 4/20001/66/Add-2, produzido pela Organização das Nações Unidas (ONU), em que se relataram visitas a prisões brasileiras nos Estados de Minas Gerais, Pernambuco e Pará e, ainda, no Distrito Federal, considerando-se agora a crise no setor. Problemas relacionados com edificações inadequadas, má higienização, ausências de assistência medica aceitável, carência de recursos humanos adequados, utilização de métodos de tortura, entre outros, retratam o estado da precariedade que marca o sistema penitenciário nacional.
Algumas experiências com a gestão privada na execução de serviços prisionais têm demonstrado a superação do modelo (exclusivamente) estatal. Resultados satisfatórios são colhidos, anunciando-se a introdução de gestão privada de serviços prisionais como instrumentário de aperfeiçoamento do sistema. [18]
10.1. Atividades possíveis de delegação e as indelegáveis na terceirização.
Parece clara, desde logo, a impossibilidade de transferir a entidades privadas atribuições de natureza jurisdicional ou disciplinar, por serem, estas, funções exclusivas do Estado, que importam o manejo de autoridade pública. Assim, e como já referido, o ato que aplica sanções ou concede recompensas não poderá, em qualquer caso, ser delegado ao parceiro privado. Bem assim, as determinações atinentes à manutenção da ordem e da disciplina interna do presídio são privativas de autoridade ou agente público. Essas atividades compreendem-se num conceito de ‘policia’ dedicada a instrumentar a execução da pena criminal. Além de imbuídas de autoridade, podem, em algumas situações, envolver o emprego de força física.
Mas há parcelas de atribuições não envolvidas com o exercício da coação (e com a individualização da pena) que implicam a realização material de algumas tarefas de apoio à custodia do preso.
Partindo dessa evidência, seria possível traçar uma classificação entre categorias de atividades prisionais: (1) a transferência à gestão privada de serviços acessórios apenas mediante relacionados à manipulação de competências estatais típicas; e (2) a transferência de serviços instrumentais imediatamente comprometidos com esta. Os primeiros são serviços reflexamente acessórios, como hotelaria, fornecimento de alimentação, prestação de assistência médica, limpeza, higienização, educação, etc. São atividades que não servem imediatamente ao exercício de atividades comprometidas com funções típicas do Estado, porquanto não se prestam a instrumentá-las.
Prover e gerir a lavanderia ou o restaurante de presídios, por exemplo, sob a fiscalização da administração geral de agentes estatais, não toca imediatamente à manifestação de competências administrativas coativas (nem toca à atividade jurisdicional que caracteriza a execução da pena). Está-se, nesta hipótese, diante de serviços inquestionavelmente transferíveis à gestão privada, como quaisquer outros atos da Administração Pública.
Noutro lado, há serviços imediatamente instrumentais à manifestação de competências dotadas de coação administrativa, como a atividade de suporte à segurança interna e vigilância, monitoramento eletrônico de pontos vulneráveis etc. Estes se traduzem em instrumentos para a realização da disciplina interna do presídio.[19]
Há questão diretamente afetada a permitir o controle de segurança e manutenção da ordem do presídio. Nesta hipótese o risco de interferência dos privados na seara das competências estatais indelegáveis é mais visível. Quanto aos primeiros a constituição federal não impede sua transferência à gestão privada. Inserem-se no âmbito de projeção do princípio geral do recurso ao contrato, que permite à Administração a terceirização de atividades gerais.
Pelas mesmas razões, seria viável afirmar, em princípio, que mesmo a transferência de serviços instrumentais imediatamente comprometidos com a coação seria constitucionalmente viável, dentro de certos parâmetros. Para estes hão de ser observados os limites da invasão, pela gestão privada, de parcela finalisticamente envolvidas com a coerção e com a individualização da pena. Ou seja: admite-se a transferência de atribuições que importem a realização apenas material e acessória daquelas atividades.
10.2. A composição do objetivo da PPP prisional e a remuneração do parceiro privado
No que se refere à complexidade estrutural do objeto da concessão administrativa prisional, há três hipóteses mais prováveis para sua configuração. Um ajuste desta natureza poderá abarcar a construção do presídio, envolvendo seu aparelhamento (mobiliário, equipamentos etc.) e o subsequente desempenho de um conjunto de serviços inerentes ao seu funcionamento.
Poderá, em outra configuração abranger apenas a recuperação de uma instalação prisional existente, com o seu aparelhamento e a decorrente prestação de serviços prisionais. Ou, ainda, poderá traduzir apenas a prestação de serviços, precedida ou não da instalação dos bens necessários (hipótese em que haverá a construção do presídio).
Vale lembra que por força do previsto no art.7º da lei 11.079/2004, nas hipóteses em que houver a construção ou a recuperação de presídios (as mais prováveis e interessantes à Administração), a remuneração do parceiro privado só será efetuada após a finalização da infraestrutura necessária, quando os serviços ou parcela destes estiverem em plena condição de fruição pela Administração. [20]
Quanto a configuração da remuneração do parceiro privado, deve-se lembrar que será provida integralmente pala administração (podendo envolver não apenas contraprestação pecuniária, como outras formas jurídicas de contraprestação) – art. 6º da Lei 11.079/2004, com possibilidade da integração de receitas alternativas e acessórias.
Em uma (PPP) prisional, poderia se configurar, por exemplo, pela comercialização do produto do trabalho do preso etc. Além disso a remuneração poderá orientar-se por parâmetros de performance do prestador, como é próprio da concessão administrativa.
O desempenho do parceiro privado serve para fins de controle da remuneração correspondente se pautará em critérios objetivos estipulados no edital e no contrato de (PPP), tal como prescrito pelo inciso VII do art. 5º da Lei 11.079/2004. A avaliação se fará, como regra, por entidade independente e admitida como tal pelas partes.
10.3. O trabalho do preso
Um último aspecto a se considerar na esfera das (PPPs) prisionais trata-se da exploração do trabalho remunerado dos presos. O tema é recorrente no Direito Norte-Americano, onde se conhecem os presídios ditos industriais.
A hipótese apresenta, primariamente, uma dificuldade de operacionalização, sob a evidência de que não é constitucionalmente possível obrigar o preso ao trabalho, visto que a Constituição Federal proíbe a pena de trabalho forçado “inciso XLVII do art. 5º”. Logo apenas os trabalhos voluntários seriam considerados para tanto. Pode decorrer disso certa dificuldade de delimitar e precisar com segurança previa os ajustes remuneratórios (ainda que isso não seja impraticável).
Mas não há propriamente, óbice constitucional ou legal a hipótese. Observe que a própria lei de execução penal prevê, na alínea “d” do § 1º do art. 29, que o produto da remuneração pelo trabalho deverá atender, além de outras destinações, “ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado”. Assim como a própria lei prevê em seu art. 34 que o poder público poderá celebrar convenio com a iniciativa privada, para implantação de oficinas de trabalho referentes a setores de apoio dos presídios. [21]
11. CONSIDERAÇÕES FINAIS
De acordo com todo este contexto, o Estado Maior não poderá se manter inerte a condição nacional dos presídios brasileiros. Tanto no que tange a esfera dos direitos básicos do cidadão e a dignidade da pessoa humana, assim como no gasto que os cofres públicos sofrem com a manutenção de tal máquina ineficaz. O indivíduo encarcerado deve ter o apoio estatal na sua reabilitação, assim como o estado nesta conjuntura necessita do apoio dos entes privados para almejar uma condição ideal de controle, punição, ressocialização do indivíduo sobre a sua tutela. Por fim, visa-se não tornar a letra da lei uma ficção jurídica, e sim, torná-la aplicável e eficaz para o Estado e a sociedade como um todo.
12. BIBLIOGRAFIA
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[1] BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das Penas. Coleção Fundamentos do Direito, editora Ícone, 2010
[2] D’URSO, Luiz Flavio Borges. Coletânea da Legislação Criminal Brasileira. Editora Cultura Jurídica, 2011.
[3] MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução penal. 17ª ed. São Paulo, Atlas, 874p. 2011.
[4] CAPEZ, Fernando. Curso de direito Penal: Parte Geral. Vol. 1. 15º ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010.
[5] Lei de execução Penal 7210/84
[6] Código Penal Brasileiro, art. 33
[7] Lei de execução Penal 7210/84
[8] DEPEN. Departamento Penitenciário Nacional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/depen> Acesso em: 19/06/2015.
[9] DEPEN. Departamento Penitenciário Nacional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/depen> Acesso em: 19/06/2015.
[10] VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru, São Paulo: Companhia das Letras.
[11] Lei de execução Penal 7210/84
[12] Código Penal Brasileiro, art. 33
[13] DEPEN. Departamento Penitenciário Nacional. Disponível em: <http://portal.mj.gov.br/depen> Acesso em: 19/06/2015.
[14] THOMPSON, Augusto. A questão penitenciária. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
[15] VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru, São Paulo: Companhia das Letras.
[16] D’URSO, Luiz Flávio Borges. Privatização de presídios. Revista Consulex, v. 3, n. 31, p. 44-46, jul. 1999.
[17] Fernando Vernalha Guimarães, “PPPs”
[18] D’URSO, Luiz Flávio Borges. Privatização de presídios. Revista Consulex, v. 3, n. 31, p. 44-46, jul. 1999.
[19] D’URSO, Luiz Flavio Borges. Coletânea da Legislação Criminal Brasileira. Editora Cultura Jurídica, 2011.
[20] BOLSANELLO, Elio. Panorama dos processos de reabilitação de presos. Revista Consulex, v. 2, n. 20, p. 19-21, ago. 1998.
[21] BOLSANELLO, Elio. Panorama dos processos de reabilitação de presos. Revista Consulex, v. 2, n. 20, p. 19-21, ago. 1998.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TEIXEIRA, André Luiz Rapozo de Souza. A falência do sistema prisional brasileiro e as parcerias público-privadas como a possível solução Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 mar 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46216/a-falencia-do-sistema-prisional-brasileiro-e-as-parcerias-publico-privadas-como-a-possivel-solucao. Acesso em: 23 dez 2024.
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