RESUMO: As mudanças trazidas pela reforma do Estado, por meio da delegação para o setor privado de algumas atividades que eram prestadas exclusivamente pelo Poder Público, fizeram surgir a figura das Agências Reguladoras, passando o Estado de interventor para regulador. Inobstante essas agências serem autarquias em regime especial, o que possibilita uma maior autonomia nas suas ações, a atuação desses entes deve ser passível de controle, seja pelos três Poderes, pelo controle externo do Tribunal de Contas, pelo Ministério Público, ou pelos próprios consumidores. O objetivo do presente trabalho é expor alguns dos mecanismos de participação da sociedade na atividade regulatória para uma melhor prestação dos serviços regulados por tais agências. Serão detalhadas as audiências públicas, as consultas públicas, a atuação do Conselho Consultivo, as ouvidorias. Dessa forma, pretende-se entender um pouco sobre esses meios, sua importância para proteção dos usuários e sua efetividade.
Palavras-chave: Agências Reguladoras, serviços públicos, usuários, controle social.
INTRODUÇÃO
A partir da década de 90, o Brasil passou por inúmeras transformações no seu modo de administrar. Por meio do Estado Social, era exacerbada a interferência do país na economia, impedindo a livre concorrência tão necessária à iniciativa privada. O dispêndio de recursos foi enorme e isso resultou no esgotamento da capacidade de investimento do setor público. À população só restara a baixa qualidade dos serviços prestados.
Era a hora de dar início a uma completa reforma estrutural, deixando a Administração Pública de ser a responsável direta pelo desenvolvimento econômico e social por meio da produção de bens e serviços, para atuar com função de promotora e reguladora de tal desenvolvimento. Com o Estado Regulador, buscou-se o desenvolvimento da sociedade e a manutenção da prestação de serviços essenciais para a coletividade, atuando na fiscalização das atividades exercidas por particulares.
Nesse contexto, as Agências Reguladoras se desenvolvem como autarquias em regime especial, com o intuito principal de regular os serviços públicos que passaram a ser oferecidos por prestadores privados, preservando não só os interesses destes e do próprio Estado, mas principalmente os direitos dos usuários dos serviços por aqueles ofertados.
O presente trabalho exporá brevemente a atuação das agências reguladoras, entendendo sua motivação, estruturação, características. Ademais, será demonstrado que, a despeito de a autonomia ser imprescindível para os entes reguladores exercerem sua atividade, a atuação das agências deve ser passível de controle, seja pelos três Poderes, pelo controle externo do Tribunal de Contas ou, pelo Ministério Público.
Todavia, sabendo que esses entes reguladores têm o objetivo de garantir uma prestação eficiente e satisfatória dos serviços públicos à população, os próprios consumidores desses serviços também merecem exercer controle sobre a forma de agir das agências, por meio do controle social, através das ouvidorias, das audiências públicas, das consultas públicas, do Conselho Consultivo.
Será certificado que essa estruturação democrática é parcela essencial para o sucesso desse modelo de agências, havendo necessidade de um acompanhamento constante da atuação das mesmas por parte da sociedade.
O presente Trabalho de Conclusão justifica-se na análise dos mecanismos de controle social e sua efetividade, a fim de possibilitar uma compreensão das possíveis alternativas para fazer valer o direito que têm os consumidores a um serviço público de qualidade.
Dessa forma, o objetivo pretendido com o estudo é expor os instrumentos de permanente transparência utilizados pelas Agências Reguladoras, de modo a entender a efetividade desse controle social.
1. A REFORMA DO ESTADO BRASILEIRO E AS AGÊNCIAS REGULADORAS
As agências reguladoras foram inseridas no ordenamento jurídico brasileiro, devido a mudanças no modelo de organização do Estado, por meio do processo de reforma deste, iniciado especialmente a partir da década de 90, no intuito de reconstruir e fortalecer o país que se encontrava em crise.
Logo nas primeiras décadas do século XX as limitações do sistema liberal foram se evidenciando, pois ele não foi capaz de proporcionar melhores condições de vida para a sociedade. As mudanças decorrentes da Revolução Industrial e do próprio Liberalismo tornaram as pessoas mais reivindicadoras de seus direitos e também mais questionadoras.
Então, adotou-se o modelo de Estado Social, de modo que a não interferência do Estado na economia transformou-se numa participação marcante deste, atuando diretamente junto aos diversos segmentos econômicos. Segundo Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2006, p. 27), foi atribuída ao Estado a missão de buscar a igualdade e, para atingir essa finalidade, ele deveria intervir na ordem econômica e social, a fim de ajudar os menos favorecidos. Tinha-se a preocupação com o bem comum, com o interesse público, em substituição ao individualismo imperante no Estado Liberal.
O Estado fundou empresas estatais para atuarem nos mais variados setores. Em 1942, foi criada a Companhia Vale do Rio Doce, empresa estatal que se converteria na maior exportadora de minério do Brasil. Surgiram também a Companhia Siderúrgica Nacional (1941), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico - BNDE, para financiar o programa de crescimento e modernização da infraestrutura nacional da indústria pesada e de certos setores agrícolas, a PETROBRAS em 1953, dentre outros.(NÓBREGA, 2000, p. 74/75)
No entanto, essa extrema intervenção começou a se esgotar no final dos anos 70 com o reconhecimento do pouco desenvolvimento das atividades econômicas e da ineficiente prestação de serviços públicos. A dívida pública se expandia para financiar inúmeras operações, como concessões de subsídios à agricultura e às exportações, sem autorização legislativa alguma. Assim, o Brasil ingressou em longo período de desequilíbrio macroeconômico, que associado a um processo generalizado de indexação de preços e salários conduziu à crise inflacionária dos anos 80 e início dos anos 90.
Dessa forma, a solução encontrada foi a de modificar as funções do Estado, passando à iniciativa privada certas atividades, principalmente econômicas, e que não eram executadas de forma eficiente pelo Poder Público.
Em abril de 1990 foi promulgada a Lei nº 8.031 que instituiu o Programa Nacional de Desestatização, cujos objetivos, dentre outros, eram de reordenar a posição estratégica do Estado na economia, transferindo à iniciativa privada atividades indevidamente exploradas pelo setor público e permitir que a administração pública concentrasse seus esforços nas atividades em que a presença do Estado fosse fundamental para a consecução das prioridades nacionais. Ressalta-se que, em 1997 a Lei nº 9.491 alterou procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização e revogou a Lei nº 8.031/90. (ROCHAEL, 2005)
Muitas reformas setorizadas foram sendo iniciadas no país, como a administrativa de 1998, cujos objetivos foram traçados no Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, elaborado pelo então Ministério da Administração Federal e da Reforma do Estado (MARE), aprovado em 1995.
Nesse Plano de Reforma foi estabelecida uma diretriz específica para cada tipo de atividade desenvolvida pelo governo. Dentre elas, havia o setor de atividades exclusivas, que é o ramo que interessa aqui analisar, voltado para fiscalização, regulação, arrecadação, polícia. Para tornar mais eficientes essas tarefas, houve a previsão de transformar autarquias em “agências autônomas, ou seja, em agências voltadas para resultados, dotadas de flexibilidade administrativa e ampla autonomia de gestão”. (CÂMARA DA REFORMA DO ESTADO, 1995, p. 55)
Sendo assim, a partir do segmento das atividades exclusivas, foram inseridas no ordenamento jurídico as agências autônomas, subdivididas em agências executivas e agências reguladoras. A partir de 1995, portanto, tais agências começam a adentrar no cenário brasileiro. A redução da atuação do Estado e a melhoria dos serviços desenvolvidos por particulares exigem uma separação entre a autoridade reguladora e a Administração Pública, devendo ser um ente técnico e independente, voltado especificamente ao serviço público que deve regular.
2. AS AGÊNCIAS NO DIREITO BRASILEIRO
Além da eficiência da Administração Pública, o Plano Diretor de Reforma buscava também dar segurança jurídica ao mercado e à sociedade, através da regulação. A prestação de serviços por meio da iniciativa privada requer o estabelecimento de regras bem definidas, de modo a afastar a discricionariedade política influenciada pelas mudanças contínuas dos agentes no governo, incentivando os agentes econômicos a realizarem investimentos de longo prazo.
O modelo de regulação por entes independentes teve efetivo início no Brasil em 1996, após a criação das primeiras Agências Reguladoras nas áreas de energia, petróleo e telecomunicações.
O âmbito de atuação das agências não se restringe aos serviços públicos, mas abrange atividades econômicas de maneira ampla. Assim sendo, os órgãos reguladores brasileiros, em geral, têm por objeto a regulação da prestação de serviços públicos (privatizados ou não)[1], visando, principalmente, promover a eficiência nessa prestação, fixar as tarifas justas e razoáveis, como também regular, normatizar, controlar e fiscalizar as atividades desenvolvidas por particulares, tendo em vista o interesse público e a defesa dos interesses dos consumidores, que almejam a manutenção da qualidade dos serviços e produtos ofertados, os preços justos, o respeito aos menos privilegiados e às minorias. (CUÉLLAR, 2001, p. 79/80)
No Brasil, não há lei que defina agência administrativa ou reguladora. Não existem parâmetros normativos genéricos, prefixados de forma clara e precisa, a conceituar o que é uma agência administrativa. Assim, não há simetria e uniformidade legislativa na definição desses entes.[2]
O regime jurídico, no entanto, é uniforme para todas as agências reguladoras, qual seja, o de autarquia em regime especial, uma vez que se observou a necessidade de ser dado elevado grau de independência a esses órgãos, de maior estabilidade a seus dirigentes, assim como, de especialização funcional e de autonomia financeira.
Marçal Justen Filho (2002, p. 595) ensina que esse regime especial consiste na ausência de submissão da entidade, no exercício de suas competências, à interferência de outros entes administrativos. Dessa forma, a produção dos atos de competência da autarquia não depende da aprovação prévia ou posterior da Administração direta, assim como, não se verifica uma competência de revisão desses atos.
Por outro lado, deve-se ressaltar que a independência dos entes reguladores não é absoluta, verificando-se que eles se submetem a certas intervenções por parte dos três Poderes do Estado, do Ministério Público e, ainda, pela própria sociedade, através do controle social.
3. CONTROLE DA ATUAÇÃO DAS AGÊNCIAS REGULADORAS
Segundo Marçal Justen Filho (2002, p. 584/585), a sistemática de separação de poderes exige a adoção de controles a todos os polos de poder político. Dessa forma, a necessidade de autonomia no desempenho de funções regulatórias não permite a imunização da agência reguladora de submeter-se à sistemática constitucional. Apesar de a fiscalização não eliminar a autonomia, possibilita que os órgãos titulares do poder político não atuem sem limites. Tal controle não deve recair apenas sobre a nomeação e demissão dos administrados das agências, mas também sobre o desempenho de suas atribuições.
É essencial, portanto, uma estrutura fiscalizatória estável perante a atuação das agências reguladoras, para que haja o aperfeiçoamento no desempenho das funções desses entes, evitando a prática de atos indevidos. Sendo assim, a ampla autonomia da atividade regulatória realizada pelas agências não impede a submissão das mesmas à fiscalização pelos mais variados meios, conforme breve resumo a seguir.
3.1 CONTROLE DOS TRÊS PODERES E DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Inicialmente, há o controle parlamentar efetuado pelo Poder Legislativo. A Constituição Federal de 1988, no seu inciso X do art. 49[3], determina ser de competência exclusiva do Congresso Nacional a fiscalização e o controle, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, dos atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta. Tal fiscalização significa a possibilidade de exigir, a qualquer tempo, explicação e justificativa das agências acerca das decisões adotadas, não podendo estas invocarem sua competência própria e exclusiva para disciplinar determinados assuntos como meio de afastar a prestação de contas em face do Congresso Nacional, nem mesmo quanto a questões técnico-científicas.(JUSTEN FILHO, 2002, p. 585)
Ademais, é importante mencionar aqui a capacidade normativa que têm as agências reguladoras e como esta capacidade se compatibiliza e é limitada pelo Poder Legislativo. Apesar da necessidade de as agências exercerem sua competência normativa, como forma de desenvolvimento de sua função reguladora, a atribuição desse poder normativo aos referidos entes suscita inúmeras discussões face ao regime jurídico brasileiro.
Parece prevalecer a doutrina a qual defende que o poder regulatório das agências não deve ser confundido com o poder regulamentar atribuído ao Presidente da República no art. 84, IV, CRFB[4]. Isso porque, os entes reguladores produzem atos normativos gerais e abstratos de observância obrigatória para os particulares que exercem atividades inseridas no seu âmbito de regulação, devendo tais atos versar somente sobre conteúdo técnico e/ou econômico necessário ao fiel desempenho de sua função. Marcos Juruena Villela Souto (2005, p. 251) concorda com a tese de atribuição às agências reguladoras de competência para a normatização técnica da atividade que é de sua responsabilidade.
Quanto ao controle externo do Tribunal de Contas, trata-se de fiscalização que abrange tanto os aspectos contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial da União e das entidades da Administração Direta e Indireta, quanto a legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, conforme preceitua a Carta Magna.
Já o Poder Judiciário controla a atuação dos entes reguladores em razão do que dispõe o inciso XXXV do art. 5° da Constituição Federal[5], possibilitando a apreciação de qualquer lesão ou ameaça a direito por aquele. Essa amplitude dada à tutela jurisdicional diminui a independência das agências reguladoras em face desse Poder.
No que diz respeito ao Poder Executivo, em razão da autonomia administrativa que gozam as agências reguladoras, não há uma subordinação hierárquica em relação ao Executivo, mas tão somente uma supervisão face ao Ministério a que se vincula, de modo que seus dirigentes detêm estabilidade, por meio de nomeação por prazo determinado pelo Chefe do Executivo, com a prévia aprovação das indicações pelo Poder Legislativo, além da proibição de exoneração ad nutum.
Quanto ao controle do Ministério Público, o art. 127 da Constituição da República Federativa do Brasil[6] dispõe que o Parquet é uma instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Sendo assim, também cabe a ele fiscalizar as condutas das agências reguladoras e dos respectivos setores regulados, podendo, inclusive, propor ações judiciais, como a ação civil pública.
3.2 CONTROLE SOCIAL
Há, por fim, o chamado controle social.
Dentre as funções da regulação está a de promover o equilíbrio entre o poder concedente, os prestadores de serviço e os usuários. Todavia, na maioria das vezes, os consumidores dos serviços públicos não têm conhecimento sobre a atuação das agências reguladoras nem o controle da prestação dos serviços públicos. Sendo assim, faz-se necessária a criação de mecanismos eficientes de controle social para garantir a participação dos três grupos, de modo a observar a satisfação dos interesses de todas as partes envolvidas.
Os usuários são uma fonte extremamente útil de informação, pois sendo consumidores dos serviços, monitoram as práticas comerciais, sua qualidade e confiabilidade. Não há dúvidas de que sem a participação dos consumidores, os reguladores, assim como as empresas prestadoras do serviço, não conheceriam as necessidades, preferências e prioridades daqueles quanto aos temas regulatórios. Ademais, a participação dos consumidores é essencial para preservar a neutralidade e a independência do processo regulatório, e reduzir o risco de captura do regulador.
No controle social deve haver a participação de usuários e não-usuários dos serviços no que diz respeito ao acompanhamento e à fiscalização da sua prestação e ao processo de tomada de decisão sobre políticas e programas. Ao se estabelecer que o processo participativo envolve usuários e não-usuários, abrem-se duas vertentes, pois a participação dos usuários situa-se no âmbito dos direitos do consumidor, do cidadão, e a participação dos não-usuários refere-se à dimensão do direito à cidadania, que deveria ser assegurado a todos os indivíduos de uma sociedade (HELLER; REZENDE; HELLER, 2007, p. 39).
Para efetiva participação popular na fiscalização do exercício das competências e dos atos praticadas pelas agências reguladoras, faz-se necessária a criação de mecanismos que possibilitem esse controle. Há vários canais de relacionamento entre os usuários e os entes reguladores, dentre eles, são mais comuns as consultas públicas, as audiências, as ouvidorias e os conselhos consultivos.
Inicialmente, aponta-se a audiência pública como forma de participação da sociedade na atividade das agências reguladoras. Trata-se de um dos instrumentos que garante à sociedade civil a oportunidade de participar diretamente da discussão de assuntos relacionados à coletividade na gestão da administração pública, por meio de reuniões presenciais, em que os usuários dos serviços, órgãos de defesa e proteção dos usuários, entidades de classe participam do processo regulatório, podendo defender suas teses oralmente e apresentar argumentos diante dos reguladores.
Segundo Evanna Soares (2002, p. 22), a audiência pública é também um instrumento de conscientização comunitária, pois propicia à sociedade esclarecimentos sobre diversas questões que envolvem o seu cotidiano, e muitas vezes alerta sobre assuntos até então aparentemente menos relevantes.
Ressalta-se que, para as agências reguladoras, as audiências públicas também funcionam como um meio de publicizar seus atos administrativos e, assim, obter maior participação dos cidadãos, diretamente ou por meio de entidades representativas, no processo de tomada de decisão.
Quanto aos limites encontrados para que as audiências possam cumprir seu papel, Patrícia Brant Mourão Teixeira Mendes e outros (2007, p. 119/120) defendem que tais restrições dizem respeito à falta de experiência e de cultura da gestão pública brasileira para gerenciar as audiências públicas como espaços de diálogo e negociação de interesses entre os diferentes atores sociais.
Por outro lado, apesar dos obstáculos encontrados pelos cidadãos que acabam por intimidá-los no momento de ir a uma audiência pública, pode-se dizer também que ainda não há no próprio povo brasileiro a cultura e a valorização de práticas coletivas. Sobre o assunto, Scherer-Warren (2001 apud MENDES; PAGANINI; SILVA; QUEVEDO, 2007, p. 132) se posiciona no sentido de que sociedade ainda não está capacitada para se fazer representar com legitimidade nos espaços políticos de participação. Há dificuldade em transpor a fase de meras denúncias para formulação de propostas efetivas de qualidade para a comunidade.
Quanto às consultas públicas, trata-se de períodos em que um futuro regulamento, lato sensu, do ente regulador fica disponível, principalmente nos sites deste, para ser consultado e receber contribuições, a fim de ser aperfeiçoado. Durante esse período, a agência recebe diversas sugestões, acatando tecnicamente ou não cada uma delas. Portanto, a consulta pública trata do interesse da Administração Pública na opinião pública por meio de manifestações da sociedade, devidamente escritas, a serem juntadas no processo administrativo.
A colocação de normativos e de documentos em consulta pública favorece o processo de discussão da sociedade. Com o crescimento do acesso aos meios eletrônicos, a participação de indivíduos tende a aumentar ainda mais.
Sob o ponto de vista do regulador, a consulta pública oferece um atrativo de economia processual, na medida em que as questões mais relevantes serão discutidas pelas partes envolvidas, que contratarão às suas expensas pareceres e opiniões técnicas que serão oferecidas à agência como subsídio ao processo de tomada de decisão. Isso porque, a filtragem dos argumentos é um processo mais barato que a produção dos pareceres pelo pessoal próprio da agência, invariavelmente limitado (TUROLLA, 2007, p. 110).
No entanto, frisa-se a importância do feedback que deve ser dado àqueles que leem os documentos e enviam sugestões para melhorar o texto, de modo que todas as propostas de mudanças devem ficar registradas no site, assim como, a súmula do relatório final.
Dessa forma, percebe-se que a consulta pública é outra forma de participação social que deve ser utilizada cada vez mais pelas agências reguladoras, em razão do crescente acesso à internet por todas as classes sociais, atrelado ao aumento do interesse dos cidadãos quanto à prestação satisfatória dos serviços públicos. Cabe aos reguladores, então, divulgar amplamente tais consultas.
Outro meio de interação entre a sociedade civil e as agências reguladoras ocorre por meio das Ouvidorias, as quais recebem denúncias e reclamações e elaboram relatórios de avaliação crítica de desempenho.
Através das Ouvidorias o indivíduo tem a oportunidade de exercer sua cidadania, porquanto, quando o cidadão questiona, reclama, sugere, denuncia, ele está contribuindo para a melhoria da qualidade dos serviços públicos. A Ouvidoria funciona, então, como um viabilizador de solução de conflitos entre o usuário e o prestador de serviço público, representando um instrumento de aproximação entre o cidadão e o órgão fiscalizador, com o objetivo de atender aos anseios e expectativas da sociedade (DANTAS, 2007, p. 180).
Trata-se de órgão de natureza imparcial, destinado a contribuir para um melhor funcionamento dos serviços públicos, ao criar condições para que a comunidade possa reivindicar seus direitos negados pelas concessionárias. Sendo assim, ela disponibiliza diversos meios de atendimento para a população, a exemplo do atendimento pessoal, das ligações, do registro de solicitações enviadas por carta, e-mail, fax.
Geralmente, a atividade desempenhada atua em segunda instância, pois, para atender aos usuários das concessionárias reguladas, é necessário que estes registrem primeiramente a solicitação nas empresas prestadoras de serviços, aguardando o prazo informado para a solução do problema. No caso de não ser resolvido no tempo determinado, ou o usuário não ficar satisfeito com a solução, deve então procurar a Ouvidoria da agência que regula o determinado serviço.
Sendo assim, nota-se que tal instrumento é o mais conhecido pela sociedade e, provavelmente, o mais utilizado. Isso porque, são frequentes os problemas enfrentados pelos cidadãos no que se refere à prestação de serviços, como a falta de sinal telefônico, cobranças indevidas, etc. O inconformismo diante dos abusos cometidos por empresas concessionárias de serviços públicos estimula ainda mais a utilização das Ouvidorias.
É, portanto, um meio de controle social com grande efetividade e que deve ser sempre difundido pelos entes reguladores e pelos prestadores de serviços.
A quarta forma de participação é a escolha de pessoas da sociedade para compor os órgãos consultivos das agências que atuam de forma não deliberativa, mas apenas opinativa.
Apesar de terem o mesmo objetivo, a definição de tais conselhos varia a depender das leis de criação das agências reguladoras. No art. 33 da Lei da ANATEL (Lei n° 9.472/97), por exemplo, eles são definidos como o “órgão de participação institucionalizada da sociedade na Agência”. Já a Lei n° 11.182/05, que deu origem à ANAC, define o conselho consultivo como “órgão de participação institucional da comunidade de aviação civil na Agência”.
Os membros do Conselho Consultivo, cuja qualificação deve ser compatível com as matérias afetas ao setor regulado, em geral, não são remunerados e têm mandato de três anos, sendo vedada sua recondução. Ademais, em geral, as reuniões dos Conselhos Consultivos são abertas à população, que pode acompanhar sua agenda de trabalho pelo endereço eletrônico das Agências.
É evidente, portanto, a preocupação de que a sociedade, além de poder controlar externamente a atividade das agências reguladoras por meio dos mecanismos citados, possa também atuar internamente, fazendo parte de órgãos desses entes. A partir daí, é possível que os anseios dos cidadãos possam ficar mais visíveis àqueles que têm poder de decisão. Sem dúvidas, é um instrumento de grande efetividade para o desenvolvimento da democracia brasileira.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As mudanças trazidas, a partir da década de 90, pela reforma do Estado com o amplo processo de desregulamentação e por meio da delegação para o setor privado de algumas atividades que eram prestadas exclusivamente pelo Poder Público, fizeram surgir a figura das Agências Reguladoras, passando o Estado de interventor para regulador.
Tais agências, de uma maneira geral, foram criadas com o objetivo de regular os serviços públicos que passaram a ser oferecidos pelo setor privado, assegurando, além do interesse econômico das empresas, os direitos dos usuários dos serviços e os interesses políticos do Estado. São entes vinculados aos Ministérios respectivos, porém desprovidos de subordinação, com autonomia perante as ingerências políticas, com funções técnicas e especializadas, a fim de que a função regulatória possa ser afastada das influências externas.
Por outro lado, como demonstrado ao longo do texto, a despeito de a autonomia ser indispensável ao desempenho das atividades regulatórias, tais entes reguladores não podem ficar isentos de qualquer tipo de limitação, uma vez que deve ficar assegurado à sociedade que as agências atuarão em busca de realizar os interesses dos cidadãos.
Nesse sentido, para a perfeita consecução das atividades a que foram instituídas, as agências reguladoras sofrem certas limitações externas das suas ações, como as sofridas pelos três Poderes do Estado, pelo Tribunal de Contas, pelo Ministério Público e, até mesmo, pelos próprios usuários dos serviços públicos.
Buscou-se mostrar que controle social é a criação de mecanismos para garantir a inserção das pessoas nas ações e nas tomadas de decisão do ente regulador. Tal participação se faz presente por meio das audiências públicas, das consultas públicas, das Ouvidorias e do Conselho Consultivo, cada um com propósitos específicos e com suas peculiares. As duas primeiras com o intuito de acrescentar ideias, melhorar o funcionamento das agências por meio de reuniões e exposição de documentos a serem aperfeiçoados via internet; as ouvidorias para receber denúncias e reclamações quanto à prestação de serviços e o Conselho Consultivo essencial à participação da sociedade na composição do próprio ente regulador.
A partir da breve análise de tais instrumentos foi possível perceber que os usuários são uma fonte extremamente útil de informação, devendo sempre se fazer representar por qualquer um dos meios. Isso porque, sendo consumidores dos serviços, monitoram as práticas comerciais, sua qualidade e confiabilidade, possibilitando o conhecimento das necessidades, preferências e prioridades daqueles quanto aos temas regulatórios. Ademais, a participação dos consumidores é essencial para preservar a neutralidade e a independência do processo regulatório, e reduzir o risco de captura do regulador.
O controle social, então, é de suma importância para atuação das agências reguladoras e se mostra cada vez mais efetivo, pois está aproximando a sociedade de tais entes e, consequentemente, está possibilitando que a prestação de serviços satisfaça tanto os interesses dos usuários quantos os dos regulados e do próprio Estado.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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HELLER, Léo, REZENDE, Sonaly Cristina e HELLER, Pedro Gasparini Barbosa. Participação e controle social em saneamento básico: aspectos teórico-conceituais. Disponível em: <http://abar.org.br/images/publicacoes/livro_controlesocial.pdf>. Acesso em: 07 mar. 2015.
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NÓBREGA, Mailson da. O Brasil em transformação. São Paulo: Gente, 2000.
ROCHAEL, Carlos Henrique Reis. As agências de regulação brasileiras. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 697, 2 jun. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/6822>. Acesso em: 07 mar. 2015.
SCHERER-WARREN, I. Movimentos sociais e participação. Apud MENDES, Patrícia Brant Mourão Teixeira, PAGANINI, Wanderley da Silva, SILVA, Carlos Celso do Amaral e, QUEVEDO, Claudia Maria Gomes de. Audiências públicas: limites e possibilidades nos processos decisórios. Disponível em: <http://abar.org.br/images/publicacoes/livro_controlesocial.pdf>. Acesso em: 01 de mar. de 2015.
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SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito Administrativo Regulatório. 2ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.
TUROLLA, Frederico Araujo. Participação social na definição de tarifas. Disponível em: <http://abar.org.br/images/publicacoes/livro_controlesocial.pdf>. Acesso em: 08 mar. 2015.
[1] É preciso ressaltar que nem todas as 10 agências reguladoras federais existentes até o momento foram criadas com o objetivo de fiscalizar a prestação de serviços públicos, pois a ANCINE (Agência Nacional do Cinema) tem como objetivo principal o fomento à produção, à distribuição e à exibição de obras cinematográficas e videofonográficas; a ANP (Agência Nacional do Petróleo) fiscaliza as atividades econômicas integrantes da indústria do petróleo; a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) controlam atividades que o Estado também protagoniza, mas que, simultaneamente, podem ser exercidas por particulares e a ANA (Agência Nacional de Águas) regula o uso de bem público.
[2]Idem, p. 75.
[3] CRFB, Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: [...] X - fiscalizar e controlar, diretamente, ou por qualquer de suas Casas, os atos do Poder Executivo, incluídos os da administração indireta;
[4] CRFB, Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: [...] IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução.
[5] CRFB, Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
[6] CRFB, Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
Pós-Graduada em Direito Administrativo - LFG. Graduado em Direito - Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LORENA DE FáTIMA SOUSA ARAúJO, . Controle social das agências reguladoras: a tutela do direito dos usuários Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 mar 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46244/controle-social-das-agencias-reguladoras-a-tutela-do-direito-dos-usuarios. Acesso em: 23 dez 2024.
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