Resumo: O neoconstitucionalismo é um fenômeno teórico do direito constitucional que pretende ligar o constitucionalismo à força normativa da constituição, bem como à supremacia da carta constitucional, em relação a todo o ordenamento jurídico, para que confira substratos necessários à concretização dos direitos fundamentais. É nesse sentido que o neoconstitucionalismo promoveu influxos no Direito Civil, área jurídica que passou da fase de codificação para a da descodificação, além de ter atravessado a fase da patrimonialização para a da despatriomialização, como será analisado no presente trabalho.
Palavras-Chave: Neoconstitucinoalismo; Direito Civil; despatriomialização e repersonalização do Direito Civil; direito de família.
O Direito Civil estave no centro do ordenamento jurídico, com a onda da codificação a qual prevalecia, antes do novo constitucionalismo, contudo atualmente a Constituição da República brasileira passou a atuar, como núcleo do sistema jurídico, servindo como filtro axiológico para a interpretação daquela área do direito e causando o efeito da descodificação do direito civil:
Do centro do sistema jurídico foi deslocado o velho Código Civil. Veja-se que o direito civil desempenhou no Brasil – como alhures – o papel de um direito geral, que precedeu muitas áreas de especialização, e que conferia certa unidade dogmática ao ordenamento. A própria teoria geral do direito era estudada dentro do direito civil, e só mais recentemente adquiriu autonomia didática. No caso brasileiro, deve-se registrar, o Código Civil já vinha perdendo influência no âmbito do próprio direito privado. É que, ao longo do tempo, na medida em que o Código envelhecia, inúmeras leis específicas eram editadas, passando a formar microssistemas autônomos, em relação a ele, em temas como alimentos, filiação, divórcio, locação, consumidor, criança e adolescente, sociedades empresáriais. (BARROSO, 2007).
Surgiu, então, o fenômeno da constitucionalização do direito. A Constituição da República positivou inúmeros institutos de diversas áreas jurídicas, incluindo o direito civil e seus institutos, como a função social da propriedade, a igualdade entre marido e mulher no casamento e entre os filhos. Criou alguns princípios, a saber, a igualdade, a solidariedade social, a razoabilidade, a cooperação (BARROSO, 2007).
A força normativa da constituição, um dos aspectos do neoconstitucionalismo, promoveu, então, um reflexo no Código Civil de 2002 o qual repetiu as positivações constitucionais citadas acima, entre outras.
A técnica da ponderação também influencia sobremaneira o Direito Civil, ao passo que a autonomia privada não pode prevalecer sobre outro direito fundamental, como a igualdade material entre os contraentes, a dignidade da pessoa humana, prevalência de direitos patrimoniais sobre direitos da pessoa humana.
Diante do conflito entre valores, a técnica da ponderação pode ser utilizada para conferir a máxima efetividade aos direitos fundamentais e preservar a força normativa da Constituição Brasil.
1 DESPATRIOMIALIZAÇÃO E REPRESONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL
No Estado Liberal, a propriedade era o principal interesse privado que pairava sobre os demais, em razão de as relações privadas terem forte cunho patrimonializante (LOBO, 1999) e considerando que o patrimônio era meio para atingir a realização de cada indivíduo, como pessoa.
O Código Civil de 1916 foi influenciado pelos princípios, valores e objetivos do Estado Libera:
Até mesmo o mais pessoal dos direitos civis, o direito de família, é marcado pelo predomínio do conteúdo patrimonializante, nos códigos. No Código Civil Brasileiro de 1916, por exemplo, dos 290 artigos do Livro de Família, em 151 o interesse patrimonial passou à frente. Como exemplo, o direito assistencial da tutela, curatela e da ausência constitui estatuto legal de administração de bens, em que pessoas dos supostos destinatários não pesam. Na curatela do pródigo, a prodigalidade é negada e a avareza é premiada. A desigualdade dos filhos não era inspirada na proteção de suas pessoas, mas do patrimônio familiar. A maior parte dos impedimentos matrimoniais não têm as pessoas, mas seus patrimônios, como valor adotado. (LOBO, 1999).
A Constituição Federal Cidadã, contudo, impossibilitou essa predominância do patrimônio nas relações entre os particulares, tornando esse viés incompatível com a reumanização, a qual previu uma “ênfase em valores existenciais e do espírito , bem como no reconhecimento e desenvolvimento dos diritos da personalidade, tanto em sua dimensão física quanto psíquica”. (BARROSO, 2007). A Carta Magna positivou inclusive a dignidade da pessoa, como um dos fundamentos da República, no seu art. 1.°, III.
O direito de propriedade está previsto, entre outros, no Título II, CapítuloI, art. 5.°, XXII e XXIII, art. 170, II todos da Constituição da República que prevê esse instituto civilista, como um direito fundamental e como um elemento integrante da Ordem Econômica, tendo que ser exercido, de acordo com sua função social, a qual é incompatível com direito absoluto.
Nesse sentido, a aplicação do princípio da solidariedade e da cooperação é aplicável. O direito deve ser utilizado para o bem e interesse de todos; não visando apenas a beneficiar o proprietário. A não obediência à função social é causa de intervenção do Estado na propriedade privada:
Para determinadas situações, a Constituição estabelece o conteúdo da função social, como se lê no artigo 182, § 2.°, relativamente à propriedade urbana, e no art. 186, relativamente à propriedade rural. Neles, evidentemente, não se esgota seu alcance. A desapropriação por interesse social arma o Poder Público de poderoso instrumento para alcançá-la, pois não se trata de expropriação tradicional, que transfere o bem particular para o domínio público, mas de tranferência de bem particular, que não realizou a função social, para o domínio ou posse de destinatários particulares, que presumivelmente a realizarão. No caso da propriedade urbana, outros mecanismos de intervenção estatal estão previstos: o parcelamento ou a edificação compulsórios e o imposto progressivo no tempo. O conflito entre a concepção individualista da propriedade e a concepção social emerge na reação que se nota nos tribunais à implementação, pelos municípios, do imposto progressivo sobre terrenos urbanos desocupados, apenas utilizados para fins especulativos. (LOBO, 1999).
2 INFLUXOS NO DIREITO DE FAMÍLIA
O direito de família foi assaz atingido e reformulado pela constitucionalização do Direito Civil. A família patriarcal, com função procracional, a qual era vista sob uma ótica política e instituicional, passou a ser a base da sociedade, consoante previsão do art. 226, “caput” da Constituição da República.
Os laços afetivos importam mais que o biológico. A mulher é tratada com os mesmos direitos e deveres destinados ao homem, salvo algumas exceções permitidas pela própria Constituição:
Hoje, a família recuperou a função que, por certo, esteve nas suas origens mais remotas: a de grupo unido por desejos e laços afetivos, em comunhão de vida. Sendo assim, é exigente de tutela jurídica mínima, que respeite a liberdade de constituição, convivência e dissolução; auto-responsabilidade; a igualdade irrestrita de direitos, embora com reconhecimento das diferenças naturais e culturais entre os gêneros; igualdade entre irmãos biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais, como pessoas em formação; o forte sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo prevalecimento de interesses patrimoniais. (LOBO, 1999).
Essa reformulação na tutela jurídica conferida à família deveu-se à influência dos princípios da dignidade da pessoa humana, igualdade e liberdade.
Ante o exposto, percebe-se que o neoconstitucionalismo é um fenômeno jurídico absorvido pela comunidade jurídica brasileira o qual possui três marcos: histórico, teórico e filosófico.
Seus influxos no Direito Civil foram basicamente a influência das positivações de institutos civilistas na Constituição Brasileira os quais foram repetidos no Código Civil de 2002, como a função social da propriedade, a prevalência do princípio da isonomia na família, pois a distinção entre marido e mulher e entre filhos fora vedada pela Carta Magna.
A constitucionalização do Direito Civil, no Brasil, avançou gradativamente, na medida em que a comunidade jurídica e os tribunais estaduais e superiores aceitvavam e iam absorvendo as mudanças, criando doutrinas contemporâneas e jurisprudência adequada ao novo cenário.
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Bacharel em Direito pelo Centro Universitário de João Pessoa (2012.1), Assessora Jurídica de Promotor de Justiça no Ministério Público da Paraíba desde novembro de 2012, Pós-Graduanda em Direito Civil pela Anhanguera-Uniderp (Convênio Rede LFG), aprovada Defensora Pública no 1.° Concurso Público da Defensoria Pública do Estado da Paraíba - DPE/PB (FCC/2014-2015).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAISSA PACíFICO PALITOT REMíGIO, . Influxos do neoconstitucionalismo no Direito Civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 mar 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46267/influxos-do-neoconstitucionalismo-no-direito-civil. Acesso em: 23 dez 2024.
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