Resumo: O presente artigo trata sobre produtos e serviços na ótica do direito consumerista. No que tange ao produto, será abordado, além do conceito, sua aplicação à presentes e doações. Quanto ao serviço, será abordado, também, o seu conceito, a gratuidade, serviços públicos essenciais, finalizando com o tema proteção à segurança e a saúde.
palavras-chave: consumidor, produtos, serviços, públicos e conceito.
Abstract: This article deals on products and services from the viewpoint of consumerist right. Regarding the product, it will be addressed in addition to the concept, its application to gifts and donations. As for the service, it will be addressed also its concept, gratuitousness, essential public services, ending with the theme of protecting the safety and health.
Keywords: consumer, products, services, public and concept.
1 – Conceito
O conceito legal de produto e de serviço se encontra nos §§ 1º e 2º do art. 3º, CDC, como se vê:
“§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.”
Portanto, produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial (§1º do art. 3º). O termo é, pois, amplo, abrangendo os bens móveis (exemplos: carros, motos, sofás etc.), os bens imóveis (exemplos: apartamentos, terrenos etc.), os bens materiais, isto é, corpóreos, de existência física, e os bens imateriais, incorpóreos, isto é, os direitos (exemplo: programas de computador).
Conforme a teoria finalista mitigada, adotada pelo Superior Tribunal de Justiça, consumidor não é somente aquele que compra o produto ou o serviço, mas quem o usufrui, de modo que está abrangido quem recebe um presente ou doação, pois é esse o destinatário final.
Contudo, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor, o direito de troca só é assegurado em caso de defeito na mercadoria. Se o presente não agradou, não serviu ou não era da cor esperada, não há direito de troca do produto recebido. Deve-se ressaltar que, se o fornecedor oferecer um prazo de troca do produto independentemente da existência de um vício, como costumeiramente se faz, a fim de angariar clientes, nascerá a obrigação de troca do produto, já que a oferta/publicidade, vincula o mesmo.
Já serviço, por sua vez, é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista (§2º do art.3º). Exclui-se expressamente: a) os serviços gratuitos; b) as relações trabalhistas (estas são regidas pela CLT).
Quanto aos serviços gratuitos, só são excluídos se forem pura ou inteiramente gratuitos. Se houver uma remuneração indireta (serviços aparentemente gratuitos), impõe-se a incidência do CDC.
São, pois, apenas aparentemente gratuitos, havendo remuneração indireta:
a) Transporte coletivo para maiores de 65 anos. Há uma remuneração por parte da coletividade de usuários, que, de uma certa forma, submetem-se a uma tarifa maior para que a gratuidade seja levada a efeito.
b) Estacionamentos gratuitos em supermercados, shopping centers etc. Há uma intenção de remuneração, pois o objetivo é atrair o consumidor ao estabelecimento. A empresa responde, perante o cliente, pela reparação do dano ou furto de veículo ocorrido em seu estacionamento (súmula 130 do STJ), ainda que o consumidor nada tenha consumido.
c) Associação que presta serviços médicos gratuitos a seus associados. É evidente a remuneração indireta, porquanto esse tipo de associação é mantida pelo dinheiro captado dos próprios associados.
d) Empresa de captação e fornecimento de sangue doado. Com efeito, embora o doador não receba nenhuma remuneração e o sangue não possa ser comercializado, o certo é que há uma remuneração indireta, pois a infraestrutura é mantida pelo preço embutido noutros serviços.
2 – Serviços Públicos
O serviço público só é regido pelo CDC quando for remunerado, de forma direta e voluntária, pelo consumidor. De fato, o CDC cuida apenas dos serviços remunerados (§2º do art.3º). Exemplos: água, luz, telefone, metrô etc. Referidos serviços são chamados de impróprios ou uti singuli e são remunerados por tarifas ou preços públicos. Vale lembrar que a tarifa é uma remuneração facultativa.
Já os serviços públicos próprios ou uti universi, remunerados por impostos ou taxas, cujo pagamento é obrigatório, independente, portanto, da vontade do contribuinte, submete-se aos ditames do direito administrativo e do direito tributário. Assim, o serviço de iluminação pública ou saúde pública não são regidos pelo CDC.
O art. 22 do CDC consagra o princípio da continuidade dos serviços públicos essenciais. Uma primeira corrente, invocando esse dispositivo legal e a ele juntando o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, sustenta que, mesmo diante do inadimplemento do consumidor, o serviço público essencial não pode ser cortado ou suspenso, sobretudo quando o indivíduo for miserável. Prevalece, no entanto, o entendimento que permite o corte do serviço público, após o aviso prévio ao consumidor inadimplente, diante da expressa previsão do art.6º, §3º, II, da Lei nº 8.987/95, que regula a concessão e permissão dos serviços públicos.
Se o consumidor for pessoa jurídica de direito público, ainda assim prevalece a tese do corte da energia elétrica, ou de outro serviço público essencial, em razão do inadimplemento, mas de forma temperada, porquanto deve ser mantida a prestação do serviço nas unidades públicas provedoras das necessidades inadiáveis da comunidade, entendidas essas por analogia à Lei de Greve, como aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população, como é o caso das Delegacias de Polícia, hospitais, prontos-socorros etc. Outro tempero imposto pela jurisprudência é a necessidade de inadimplemento atual, não se justificando o corte por débitos passados.
Por outro lado, o STJ tem permitido, com relação ao serviço de consumo de água, a cobrança mensal de tarifa mínima, malgrado a proibição do art. 39, I do CDC, que proíbe o fornecedor de condicionar o fornecimento de produtos ou serviços a limites quantitativos. A propósito, dispõe a súmula 356 do STJ: “É legítima a cobrança da tarifa básica pelo uso dos serviços de telefonia fixa”.
O argumento é que o art. 39, I, do CDC admite, mediante justa causa, a imposição de limites quantitativos, e, no caso, a justa causa consiste no gasto com a infraestrutura para a disponibilização do serviço. Igualmente, tem sido admitida a cobrança de tarifa progressiva ou escalonada de água, fixada de acordo com as categorias de usuários e as faixas de consumo (súmula 407 do STJ).
3 - Proteção à saúde e segurança
A proteção da vida, saúde e segurança são direitos básicos do consumidor, conforme prevê o art. 6º, I, CDC:
“Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;”
Caso o fornecedor haja em desacordo com as normas de proteção da saúde e da segurança do produto ou serviço, ocorrerá um FATO do produto ou serviço, art. 12 e 14, CDC, respectivamente, sendo responsabilizado de maneira OBJETIVA pelos danos causados.
O respeito a saúde e segurança está presente na Política Nacional das Relações de Consumo, tendo por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores (art. 4º, caput, CDC).
O Código de Defesa do Consumidor dedica dos art. 8º ao 10 uma seção para tratar deste tema.
“Art. 8° Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito.
Parágrafo único. Em se tratando de produto industrial, ao fabricante cabe prestar as informações a que se refere este artigo, através de impressos apropriados que devam acompanhar o produto.”
“Art. 9° O fornecedor de produtos e serviços potencialmente nocivos ou perigosos à saúde ou segurança deverá informar, de maneira ostensiva e adequada, a respeito da sua nocividade ou periculosidade, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concreto.”
“Art. 10. O fornecedor não poderá colocar no mercado de consumo produto ou serviço que sabe ou deveria saber apresentar alto grau de nocividade ou periculosidade à saúde ou segurança.
§ 1° O fornecedor de produtos e serviços que, posteriormente à sua introdução no mercado de consumo, tiver conhecimento da periculosidade que apresentem, deverá comunicar o fato imediatamente às autoridades competentes e aos consumidores, mediante anúncios publicitários.
§ 2° Os anúncios publicitários a que se refere o parágrafo anterior serão veiculados na imprensa, rádio e televisão, às expensas do fornecedor do produto ou serviço.
§ 3° Sempre que tiverem conhecimento de periculosidade de produtos ou serviços à saúde ou segurança dos consumidores, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão informá-los a respeito.”
Observa-se, inicialmente, que não é vedado ao fornecedor colocar no mercado produtos que possam causar riscos a saúde e segurança do consumidor, desde que esse risco seja normal ou previsível. Como exemplo podemos citar os refrigerantes de laranja que possuem em sua fórmula alta quantidade de corante que podem causar prejuízo a saúde do consumidor. Como se trata de risco normal e previsível, não é vedada a colocação do produto no mercado, mas deve haver a informação necessária e suficiente da existência desse componete em sua fórmula, já que é direito do consumidor ter acesso a essa informação.
Quanto mais nocivo ou perigo o produto fornecido, mais ostensiva e adequada deve ser a informação sobre os perigos a saúde ou a segurança deles decorrentes. Assim, produtos, como por exemplo os agrotóxicos, devem ter informações sobre sua periculosidade de maneira mais ostensiva. Vejamos a previsão da Lei 7.802/89:
“Art. 7º Para serem vendidos ou expostos à venda em todo o território nacional, os agrotóxicos e afins são obrigados a exibir rótulos próprios e bulas, redigidos em português, que contenham, entre outros, os seguintes dados: (Redação dada pela Lei nº 9.974, de 2000)
III - informações relativas aos perigos potenciais, compreendidos:
a) os possíveis efeitos prejudiciais sobre a saúde do homem, dos animais e sobre o meio ambiente;
b) precauções para evitar danos a pessoas que os aplicam ou manipulam e a terceiros, aos animais domésticos, fauna, flora e meio ambiente;
c) símbolos de perigo e frases de advertência padronizados, de acordo com a classificação toxicológica do produto;
d) instruções para o caso de acidente, incluindo sintomas de alarme, primeiros socorros, antídotos e recomendações para os médicos.”
Quando a nocividade ou periculosidade do produto for grande e desproporcional ao benefício pretendido, o fornecedor será proibido de colocar o produto no mercado de consumo. Como exemplo, podemos citar produtos que contenham radiação em sua fórmula ou a produz quando da sua utiliação.
Caso tenha colocado o produto no mercado e posteriormente venha a saber da sua grande nocividade e periculosidade para a saúde e segurança do consumidor, o fornecedor deverá comunicar imediatamente tal fato aos consumidores e ao poder público, ficando às suas expensas tal publicidade. Ex: Recall
Um recall (do inglês "chamar de volta", traduzido para português como "chamamento" ou recolha de produto) é uma solicitação de devolução de um lote ou de uma linha inteira de produtos feita pelo fabricante do mesmo. Geralmente, isto ocorre pela descoberta de problemas relativos à segurança do produto. Recalls são comuns na indústria automobilística, onde um defeito pode causar acidentes graves e mortes no trânsito; porém já há alguns anos tem sido estendidos a outros tipos de produtos, como medicamentos e brinquedos.
“RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE PELO FATO DO PRODUTO. AUTOMÓVEL FIESTA. QUEBRA DO BANCO DO MOTORISTA. DEFEITO DE FABRICAÇÃO. PERDA DO CONTROLE DO VEÍCULO. ACIDENTE GRAVE. RECALL POSTERIOR AO EVENTO DANOSO. ÔNUS DA PROVA DO FABRICANTE.
1 - Ação de indenização proposta com base em defeito na fabricação do veículo, objeto de posterior recall, envolvido em grave acidente de trânsito.
2 - Comprovação pelo consumidor lesado do defeito do produto (quebra do banco do motorista com o veículo em movimento na estrada) e da relação de causalidade com o acidente de trânsito (pera do controle do automóvel em estrada e colisão com uma árvore), que lhe causou graves lesões e a perda total do veículo.
3 - A dificuldade probatória ensejada pela impossibilidade de perícia direta no veiculo sinistrado, no curso da instrução do processo, não caracteriza cerceamento de defesa em relação ao fabricante.
4 - Inocorrência de violação às regras dos incisos II e III do § 3ºdo art. 12 do CDC.
5 - Precedente desta Corte. 6 - Recurso especial desprovido. (REsp 1.168.775⁄RS, Relator Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 10⁄4⁄2012, DJe 16⁄4⁄2012)
6 - Conclusão
Assim, verifica-se que o conceito de produto e serviço obtidos no art. 3º do Código de Defesa do Consumidor estabelecem um alcance bem satisfatório e completo para os mesmos. Contudo, deve-se obervar que muitos serviços considerados gratuitos são na verdade serviços pagos indiretamente e que, portanto, se submetem aos ditames do CDC. Podemos incluir nessa categoria, o transporte de ônibus aos maiores de 65 anos e os estacionamentos de supermercados.
Quanto aos serviços públicos, só serão regido pelo CDC quando for remunerado, de forma direta e voluntária, pelo consumidor. O CDC cuida apenas dos serviços remunerados, que são chamados de impróprios ou uti singuli e são remunerados por tarifas ou preços públicos, não abrangendo os serviços públicos próprios ou uti universi, remunerados por impostos ou taxas, que se submetem aos ditames do direito administrativo e do direito tributário.
Por fim, foi abordada a necessária e imperativa observância das normas quanto a proteção à saúde e segurança do consumidor nos produtos e serviços adquiridos. Destaca-se a obrigatoriedade de realização de recall quando o fornecedor colocar no mercado de consumo produto perigoso para a saúde e segurança do consumidor. Assim, deve o fornecedor convocar, às suas expensas, o consumidor que adquiriu um produto viciado para a correção.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 19 de abr. De 2016.
BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8078.htm>. Acesso em 19 de abr. De 2016.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes, O conceito de FATO DO PRODUTO ou do SERVIÇO fica restrito a situações que geram insegurança (riscos) ao consumidor? Disponível em: <http://www.dizerodireito.com.br/2015/04/o-conceito-de-fato-do-produto-ou-do.html>. Acesso em 19 de abr. de 2016.
DINIZ, Maria Helena, Dicionário Jurídico Universitário - 2ª Ed. - São Paulo: Saraiva 2013.
MARQUES, Claudia Lima; Bessa, Leonardo Roscoe; Benjamin, Antonio Herman de Vasconcellos, Manual de Direito do Consumidor - 6ª Ed. - São Paulo: RT 2014.
VENOSA, Sílvio de Salvo, Direito civil: parte geral. - 15. Ed. – São Paulo: Atlas 2015 – (Coleção Direito Civil; v. 1)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Bruno Medrado dos. Produtos e serviços no direito do consumidor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 abr 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46531/produtos-e-servicos-no-direito-do-consumidor. Acesso em: 23 dez 2024.
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