Resumo: O presente artigo aborda o tema Tipicidade Penal, trazendo seus elementos (tipicidade formal e material), além de tratar da tipicidade conglobante e dos casos em que a doutrina e a jurisprudência dominante aplicam o princípio da insignificância, a qual, presente, exclue a tipicidade material.
palavras-chave: tipicidade, material, formal, conglobante e insignificância.
Abstract: This article discusses the topic Criminal typicality, bringing its elements (formal and materials typicality), in addition to treating the conglobante typicality and where the doctrine and prevailing jurisprudence apply the principle of insignificance, which present, excludes the typicality material.
Keywords: typicality, material, formal, conglobante and insignificance.
1. TIPICIDADE
São elementos do fato típico a conduta, o resultado, o nexo causal e a tipicidade.
Inicialmente, deve-se fazer a seguinte distinção:
Tipo penal: é um instrumento legal, logicamente necessário e de natureza predominantemente descritiva, que tem por função a individualização de condutas humanas penalmente relevantes (Zaffaroni). Se alguém adotar determinada conduta que se amolde perfeitamente àquele tipo, estaremos diante da tipicidade.
Tipicidade: corresponde à subsunção perfeita da conduta praticada pelo agente ao modelo abstrato previsto na lei penal, isto é, a um tipo penal incriminador.
Segundo a doutrina e jurisprudência majoritária, a tipicidade penal se divide em dois elementos:
TIPICIDADE FORMAL => Mera adequação da conduta ao tipo penal. Essa adequação deve ser perfeita, sob pena de o fato ser considerado formalmente atípico. “Confluência dos tipos concreto (fato do mundo real) e abstrato (fato do mundo normativo)” – Nucci.
TIPICIDADE MATERIAL => Consiste em critério que afere a importância do bem no caso concreto, a fim de que possamos concluir se aquele bem específico merece ou não ser protegido pelo Direito Penal. Relaciona-se diretamente ao princípio da intervenção mínima. Este preceitua que a finalidade do Direito Penal é a proteção dos bens mais importantes existentes na sociedade, como a vida, a integridade física, o patrimônio, etc. (princípio da lesividade – adequação social – intervenção mínima – fragmentariedade – insgnificância).
ATENÇÃO! A tipicidade MATERIAL mantém íntima relação com o princípio da insignificância ou bagatela.
Contudo, para Zaffaroni, os elementos da tipicidade penal são divididos em:
TIPICIDADE FORMAL + TIPICIDADE CONGLOBANTE
TIPICIDADE CONGLOBANTE => É formada pela TIPICIDADE MATERIAL e conduta ANTINORMATIVA (contrário ao direito, e não imposta ou fomentada pela norma).
Ex: O art. 121 do CP diz ser proibido matar. No entanto, a proibição nele prevista não se dirige a todos, devendo ser excetuada com relação àqueles que têm o dever de matar. No confronto entre a proibição e uma imposição (norma que determina que o carrasco execute a sentença de morte), deve-se concluir que a proibição de matar, nos casos em que a lei prevê, não se dirige ao carrasco. Portanto, sua conduta não seria antinormativa, contrária à norma, mas de acordo, imposta por ela.
O conceito de antinormatividade – e, por conseguinte, de tipicidade conglobante - esvazia um pouco as causas de exclusão de ilicitude relacionadas ao estrito cumprimento de dever legal e ao exercício regular de direito. Pela tipicidade conglobante, tais causas seriam trazidas para a tipicidade, onde as mesmas seriam excluídas. Não é razoável se falar que o Oficial de Justiça comete fato típico quando realiza o sequestro de bens do devedor por odem judicial. Para a doutrina da tipicidade conglobante, a atitude do Oficial de Justiça é ATÍPICA, pois não houve o cometimento de qualquer conduta antinormativa.
Adequação típica: ocorre quando a conduta do agente se amolda perfeitamente ao tipo penal. Há 2 espécies:
- Adequação típica de subordinação imediata ou direta: ocorre quando tal adequação se dá de maneira perfeita à descrição do tipo. Ex: homicídio (art. 121 do CP).
- Adequação típica de subordinação mediata ou indireta: ocorre quando o agente, embora atue com vontade de praticar a conduta proibida por determinado tipo incriminador, pratica conduta que não se subsume perfeitamente ao tipo penal. Ex: tentativa de homicídio – se João atirar várias vezes e não matar, embora o desejasse, não haverá perfeita adequação ao art. 121.
Para que se possa obter a tipicidade em casos de adequação típica de subordinação mediata ou indireta, deve-se utilizar as chamadas normas de extensão, que são capazes de ampliar o tipo penal, abrangendo hipóteses não expressamente previstas pelo legislador. Ex: art. 14 (tentativa), art. 29 (concurso de pessoas).
2. CAUSAS DE EXCLUSÃO DA TIPICIDADE
Nucci menciona que as excludentes de tipicidade dividem-se em legais e supralegais (implicitamente previstas em lei).
Excludentes legais: são aquelas situações expressamente previstas em lei. Menciona-se como exemplos: a) crime impossível (art. 17); b) intervenção médico-cirúrgica e impedimento de suicídio (art. 146, §3º); c) retratação no crime de falso testemunho (art. 342,§2º); d) anulação do primeiro casamento no crime de bigamia (art. 235, §2º).
a) Crime impossível: embora a redação do art. 17 cause confusão acerca da natureza jurídica do crime impossível, levando à falsa impressão de ser uma causa de isenção de pena do crime tentado, na verdade, estamos a tratar de causa excludente de tipicidade, eis que o fato praticado pelo agente não se enquadra em nenhum tipo penal.
b) Intervenção médico-cirúrgica e impedimento de suicídio: o art. 146, §3º, do CP, menciona que não se compreendem nas disposições deste artigo. Ao assim dispor, afasta as situações a intervenção médico-cirúrgica e do impedimento ao suicídio do âmbito de adequação típica do constrangimento ilegal. Ora, se os fatos não se encontram compreendidos na norma penal incriminadora, despontam como condutas atípicas.
ATENÇÃO: alguns autores entendem essas situações como causas especiais de exclusão da ilicitude, por se constituírem em manifestações inequívocas do estado de necessidade de terceiro (Nucci entende que é causa de exclusão da tipicidade).
c) Retratação no crime de falso testemunho: a lei menciona ser causa extintiva da punibilidade (art. 107, VI, CP), mas, na essência, é causa de extinção da tipicidade, pois diz o art. 342, §2º, que o FATO deixa de ser punível – e não o agente. Ora, se é o fato a ser excluído, logo, não mais se fala em tipicidade.
d) Anulação do primeiro casamento no crime de bigamia: a declaração de nulidade do primeiro casamento tem efeito ex tunc, retroagindo à data da celebração do matrimônio,
revelando que o agente não era casado quando veio a contrair o “segundo” casamento, afastando o crime de bigamia. e) Desistência voluntária e arrependimento eficaz: importante destacar a querela que existe na doutrina acerca da natureza jurídica da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, é que ao lado das concepções que as entendem como causa pessoal de extinção da punibilidade, ou causa de exclusão da culpabilidade, há forte corrente doutrinária que defende se tratarem de causas de exclusão da tipicidade, uma vez que afasta-se a tipicidade do crime inicialmente desejado pelo agente, subsistindo apenas a tipicidade dos atos já praticados.
Causas supralegais: são situações que, malgrado não estejam expressas no Código penal, afastam a tipicidade. A doutrina, nesse ponto, é uníssona em apontar a insignificância. Mais uma vez, seguindo Nucci, aponta-se também como causa de exclusão da tipicidade, a adequação social.
a) Adequação social (Nucci): sustenta, o penalista do tribunal bandeirante, que uma conduta aceita e aprovada consensualmente pela sociedade, ainda que não seja sua causa de justificação, pode ser considerada não lesiva ao bem jurídico tutelado. Se uma determinada conduta é acolhida como socialmente adequada deixa de ser considerada lesiva a qualquer bem jurídico, tornando-se um indiferente penal. Exemplifica-se com o caso da colocação do brinco, algo tradicionalmente aceito, com meta de embelezamento, embora se possa cuidar de lesão à integridade física.
ATENÇÃO: O STJ na Súmula 502 não aceitou a tese da adequação social para excluir a tipicidade na prática de “pirataria”. Vejamos: “Presentes a materialidade e a autoria, afigura-se típica, em relação ao crime previsto no art. 184, § 2º, do CP, a conduta de expor à venda CDs e DVDs piratas.”
b) Insignificância: Segundo a doutrina, o juízo de tipicidade, para que tenha efetiva significância e não atinja fatos que devam ser estranhos ao Direito Penal, por sua aceitação pela sociedade ou dano social irrelevante, deve entender o tipo na sua concepção material, como algo dotado de conteúdo valorativo, e não apenas sob o seu aspecto formal, de cunho eminentemente diretivo. Para dar validade sistemática à irrefutável conclusão político-criminal de que o Direito Penal só deve ir até onde seja necessário para a proteção do bem jurídico, não se ocupando de bagatelas, é preciso considerar materialmente atípicas as condutas lesivas de inequívoca insignificância para a vida em sociedade. Expressa, ainda, Carlos Vico Mañas que o “princípio da insignificância é instrumento de interpretação restritiva, baseado na concepção material do tipo penal, através do qual é possível alcançar, pela via judicial e sem macular a segurança jurídica do pensamento sistemático, a proposição político-criminal da necessidade de descriminalização de comportamentos que, apesar de formalmente típicas, não ferem de forma socialmente relevante os bens juridicamente protegidos pelo Direito Penal” [...] “doutrina e jurisprudência têm conseguido fixar critérios razoáveis para a conceituação e o reconhecimento das condutas típicas afetas ao Princípio da Insignificância, com base na natureza fragmentária e subsidiária do Direito Penal”.
Para o Supremo Tribunal Federal (HC 109.363, 11.10.11, Min, Ayres Britto) são requisitos objetivos para a aplicação do princípio da insignificância como causa excludente da tipicidade da conduta do agente:
a) Mínima ofensividade da conduta;
b) Ausência da periculosidade social da ação;
c) Reduzido grau de reprovabilidade do comportamento;
d) Inexpressividade da lesão jurídica.
Os julgados que mencionam esses requisitos não explicam o que seja cada um deles, até porque alguns parecem se confundir. A doutrina critica esses critérios. Paulo Queiroz, por exemplo, afirma que esses requisitos são claramente tautológicos e apenas dizem a mesma coisa com palavras diferentes, argumentando em círculo (Curso de Direito Penal. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 89).
Ao lado dos requisitos objetivos, existe, também, requisito subjetivo: A 5ª Turma do STJ, estabeleceu que para a aplicação do princípio da insignificância, é necessário que o réu não possua HABITUALIDADE CRIMINOSA.
Outros requisitos:
a) Valor sentimental do bem. Ex: furto de uma bijuteria de baixo valor econômico, mas que pertenceu a importante familiar falecido da vítima.
b) Condição econômica da vítima. Ex: furto de bicicleta velha de uma vítima muito pobre que a utilizava como único meio de transporte (STJ. 6ª Turma. HC 217.666/MT, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 26/11/2013).
c) Condições pessoais do agente. Ex: o STF já decidiu que, se a conduta criminosa é praticada por policial militar, ela é revestida de maior reprovabilidade, de modo que isso poderá ser levado em consideração para negar a aplicação do princípio da insignificância (HC 108884/RS, rel. Min. Rosa Weber, 12/6/2012).
d) Circunstâncias do delito. Ex.1: furto mediante ingresso sub-reptício na residência da vítima, com violação da privacidade e tranquilidade pessoal desta. Ex.2: estelionato praticado por meio de saques irregulares de contas do FGTS. A referida conduta é dotada de acentuado grau de desaprovação pelo fato de ter sido praticada mediante fraude contra programa social do governo que beneficia inúmeros trabalhadores (STF. 1ª Turma. HC 110845/GO, julgado em 10/4/2012). Ex.3: o modus operandi da prática delitiva – em que o denunciado quebrou o vidro da janela e a grade do estabelecimento da vítima - demonstra um maior grau de sofisticação da conduta a impedir o princípio (STJ. 6ª Turma. AgRg nos EDcl no REsp 1377345/MG, julgado em 03/12/2013, DJe 13/12/2013).
e) Consequências do delito. Ex.: furto de bicicleta que era o único meio de locomoção da vítima. Ex.2: não se aplica o princípio da insignificância ao delito de receptação qualificada no qual foi encontrado, na farmácia do réu, exposto à venda, medicamento que deveria ser destinado ao fundo municipal de saúde. Isso porque as consequências do delito atingirão inúmeros pacientes que precisavam do medicamento (STF. 2ª Turma. HC 105963/PE, julgado em 24/4/2012).
3. HIPÓTESES JULGADAS PELOS TRIBUNAIS
É possível a aplicação do princípio da insignificância para réus reincidentes ou que respondam a outros inquéritos ou ações penais?
Em regra, NÃO. É a posição que atualmente prevalece, sendo adotada pela 5ª Turma do STJ e pelo STF. “A reiteração delitiva, comprovada pela certidão de antecedentes criminais do paciente, impossibilita a aplicação do princípio da insignificância. (...) STF. 1ª Turma. HC 109705, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 22/04/2014. (...) Sentenciados reincidentes na prática de crimes contra o patrimônio. Precedentes do STF no sentido de afastar a aplicação do princípio da insignificância aos acusados reincidentes ou de habitualidade delitiva comprovada. (...) (STF. 2° Turma. HC 117083, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 25/02/2014). A reincidência específica é prognóstico de risco social, recaindo sobre a conduta do acusado elevado grau de reprovabilidade, o que impede a aplicação do princípio da insignificância. (…) (STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 487.623/ES, julgado em 18/06/2014).”
ATENÇÃO: Existem alguns julgados, muito específicos e excepcionais, em que o STJ já aplicou o princípio da insignificância para réu reincidente. Tratava-se de caso em que o réu furtou 4 barras de chocolate de uma padaria.
Princípio da insignificância e atos infracionais: é possível a aplicação, desde que verificados os requisitos. Além do mais, seria contrassenso aplicar um tratamento punitivo mais gravoso para os adolescentes, àquele previsto para os adultos.
Princípio da insignificância e trânsito em julgado: é possível a aplicação dessa causa de exclusão da tipicidade mesmo após o trânsito em julgado, assim reconheceu o STF, HC 95570.
Princípio da insignificância e aplicação pelo Delegado de Polícia: Não há posição prevalecente.
a) 1ª corrente: SIM. O princípio da insignificância, como vimos, afasta a tipicidade material. Logo, se o fato é atípico, a autoridade policial pode deixar de lavrar o flagrante. Nesse sentido: Cleber Masson (Direito Penal esquematizado. Vol. 1. São Paulo: Método, 2014, p. 37).
b) 2ª corrente: NÃO. A avaliação sobre a presença ou não do princípio da insignificância, no caso concreto, deve ser feita pelo Poder Judiciário (e não pela autoridade policial). É a posição da doutrina tradicional.
Princípio da insignificância e infração bagatelar imprópria: Não se pode confundir o princípio da insignificância com a chamada “infração bagatelar imprópria”. Princípio da insignificância Infração bagatelar imprópria é aquela que nasce relevante para o Direito penal, mas depois se verifica que a aplicação de qualquer pena no caso concreto apresenta-se totalmente desnecessária (GOMES, Luiz Flávio; Antonio Garcia-Pablos de Molina. Direito Penal Vol. 2, São Paulo: RT, 2009, p.305)”
Em outras palavras, o fato é típico, tanto do ponto de vista formal como material. No entanto, em um momento posterior à sua prática, percebe-se que não é necessária a aplicação da pena. Logo, a reprimenda não deve ser imposta, deve ser relevada (assim como ocorre nos casos de perdão judicial). Segundo Luiz Flávio Gomes, a infração bagatelar imprópria possui um fundamento legal no direito brasileiro. Tratase do art. 59 do CP que prevê que o juiz deverá aplicar a pena “conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime”. Dessa forma, se a pena não for mais necessária, ela não deverá ser imposta (princípio da desnecessidade da pena conjugado com o princípio da irrelevância penal do fato). Ainda de acordo com Luiz Flávio Gomes, no direito legislado já contamos com vários exemplos de infração bagatelar imprópria:
a) No crime de peculato culposo, a reparação dos danos antes da sentença irrecorrível extingue a punibilidade. Assim, havendo a reparação, a infração torna-se bagatelar (em sentido impróprio) e a pena desnecessária. No princípio havia desvalor da ação e do resultado. Mas depois, em razão da reparação dos danos (circunstância post-factum), torna-se desnecessária a pena.
b) Pagamento do tributo nos crimes tributários;
c) Colaboradores da justiça (delator etc.) quando o juiz deixa de aplicar a pena.
Princípio da insignificância e crime de furto: atenção – o simples valor do objeto não requisito suficiente para a aferição da insignificância. As circunstâncias do crime e o reflexo da conduta, também deve orientar o aplicador do direito. Assim:
a. Não se aplica ao furto noturno
b. Não se aplica ao furto com invasão de domicílio;
c. Não se aplica à ligação clandestina de água;
d. Não se aplica quando o agente furta a coisa para trocar por droga;
e. Não se aplica mesmo quando o agente restitui a coisa à vítima, quando o valor da res furtiva for relevante;
f. Atenção: em regra, não se aplica ao furto qualificado (mediante escalada; com abuso da confiança; com rompimento de obstáculo). Predomina na jurisprudência.
Furto de pequeno valor e de valor insignificante:
Pequeno valor do bem subtraído (art. 155, §2º, CP) |
Valor insignificante do bem subtraído |
Até um salário mínimo |
Não há um parâmetro objetivo, mas, por óbvio, deve ser menor que um salário mínimo |
Se a coisa furtada é de pequeno valor e o condenado é primário, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de 1/3 a 2/3, ou aplicar somente a pena de multa |
Se o valor da coisa é insignificante, o juiz irá absolver o réu por falta de tipicidade material. |
Ex.: furto de um relógio que custa R$ 500,00. |
Ex.: furto de um relógio que custa R$ 90,00 |
Crimes contra a ordem tributária: STJ e STF aplicam o mencionado princípio aos crimes contra a ordem tributária. Para a aplicação, no entanto, deve-se levar em consideração o valor do tributo que deixa de ser repassado aos cofres públicos. Divergem, no entanto, as cortes superiores sobre o valor a ser considerado como ínfimo, para fins de aplicação do princípio.
Para o STJ o valor é de R$ 10.000,00. Para tanto leva como parâmetro o art. 20, da lei 10.522/2010.
Para o STF o valor paradigma é de R$ 20.000,00. Para tanto, considera o que dispõe o art. 1º, II, da portaria do MF n.º 75/2012, que aumentou o valor paradigma para o arquivamento das execuções fiscais de dividas ativas da união.
Atenção: os parâmetros acima mencionados destinam-se a tributos federais. Portanto, não se aplicam aos delitos estaduais. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, na análise da insignificância de delitos tributários estaduais e municipais, dever-se-á observar se há legislação local semelhante à federal, devendo-se, utilizar essa legislação como parâmetro(STJ. 6ª Turma. HC 165003/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 20/03/2014).
Descaminho, é considerado um crime contra a ordem tributária, logo, se submete aos requisitos antes mencionados.
Crimes ambientais: Admite-se o princípio da insignificância no caso de crimes ambientais, devendo, no entanto, ser feita uma análise rigorosa, considerando que o bem jurídico protegido é de natureza difusa e protegido constitucionalmente.
4. CASOS EM QUE A JURISPRUDÊNCIA REJEITA A INSIGNIFICÂNCIA
Lesão corporal: Afirmou-se que a violência física é incompatível com os vetores da insignificância (STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 19.042/DF, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 14/02/2012).
Roubo: Não se aplica ao crime de roubo porque se trata de delito complexo que envolve patrimônio, grave ameaça e a integridade física e psicológica da vítima, havendo, portanto, interesse estatal na sua repressão (STF RHC 111433) (STJ AgRg no AREsp 348.330/SP, julgado em 19/11/2013).
Tráfico de Drogas: Não se aplica ao tráfico de drogas, visto se tratar de crime de perigo abstrato ou presumido, sendo, portanto, irrelevante a quantidade de droga apreendida (STJ. 5ª Turma. HC 240.258/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 06/08/2013).
Porte de drogas: Precedentes do STJ afirmam que é impossível afastar a tipicidade material do porte de substância entorpecente para consumo próprio com base no princípio da insignificância, “ainda que ínfima a quantidade de droga apreendida”.
Moeda falsa: O bem violado é a fé pública, a qual é um bem intangível e que corresponde à confiança que a população deposita em sua moeda, não se tratando, assim, da simples análise do valor material por ela representado.
Contrabando: É inaplicável o princípio da insignificância ao crime de contrabando, uma vez que o bem juridicamente tutelado vai além do mero valor pecuniário do imposto elidido, alcançando também o interesse estatal de impedir a entrada e a comercialização de produtos proibidos em território nacional (STJ. 5ª Turma. AgRg no AREsp 342.598/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 05/11/2013).
Atenção: lembre-se que para o descaminho, é possível a aplicação do instituto. No delito de contrabando, o objeto material sobre o qual recai a conduta criminosa é a mercadoria PROIBIDA (proibição absoluta ou relativa). Em outras palavras, o objetivo precípuo dessa tipificação legal é evitar o fomento de transporte e comercialização de produtos proibidos por lei. No contrabando não se cuida, tão somente, de sopesar o caráter pecuniário do imposto sonegado, mas principalmente, de tutelar, entre outros bens jurídicos, a saúde pública. Em suma, no contrabando, o desvalor da conduta é maior, razão pela qual se deve afastar a aplicação do princípio da insignificância.
A jurisprudência também vem se recusando a aplicar o princípio da insignificância aos crimes de estelionato contra o INSS, bem como ao estelionato envolvendo o FGTS, além do estelionato evolvendo seguro desemprego, pois todos esses casos significam acentuado grau de reprovabilidade da conduta do agente.
Posse de arma sem munição: Não é possível a aplicação do princípio da insignificância à posse ilegal de 48 (quarenta e oito) munições de revólver calibre 38 e um recipiente contendo pólvora, por se tratar de crime de perigo abstrato, que visa a proteger a segurança pública e a paz coletiva (STJ. 5ª Turma. RHC 43.756/AL, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 08/04/2014).
Crime Militar: Prevalece que o princípio da insignificância NÃO é aplicável no âmbito da Justiça Militar, sob pena de afronta à autoridade, hierarquia e disciplina, bens jurídicos cuja preservação é importante para o regular funcionamento das instituições militares.
5. CASOS EM QUE A JURISPRUDÊNCIA DIVERGE SOBRE A APLICAÇÃO DA INSIGNIFICÂNCIA
Crimes cometidos por prefeitos: STF: possibilidade Ex-prefeito condenado pela prática do crime previsto no art. 1º, II do Decreto-Lei 201/1967, por ter utilizado máquinas e caminhões de propriedade da Prefeitura para efetuar terraplanagem no terreno de sua residência. 3. Aplicação do princípio da insignificância. Possibilidade. (...) (HC 104286, Rel. Min.Gilmar Mendes, 2ª Turma, julgado em 03/05/2011); STJ: não pode ser aplicado Não é possível a aplicação do princípio da insignificância a prefeito, em razão mesmo da própria condição que ostenta, devendo pautar sua conduta, à frente da municipalidade, pela ética e pela moral, não havendo espaço para quaisquer desvios de conduta. (...) (HC 148.765/SP, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, 6ª Turma, julgado em 11/05/2010).
Porte de Droga para Consumo Pessoal: Não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância ao delito de porte de drogas para consumo próprio, uma vez que se trata de crime de perigo abstrato, em que o bem tutelado pela norma é a saúde pública. Irrelevante, portanto, para a tipificação da conduta, a quantidade de entorpecente apreendido em poder do agente. O simples ato de portar substância ilícita presume o potencial ofensivo da conduta. Ademais, a reduzida quantidade de droga é inerente à natureza do delito previsto no art. 28 da Lei 11.343/06. (STJ - RHC 35.920/DF, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz).
Crimes contra a Administração Pública: No STJ prevalece que não se aplica, em regra, o princípio da insignificância aos crimes contra a Administração Pública, ainda que o valor da lesão possa ser considerado ínfimo, uma vez que a norma visa resguardar não apenas o aspecto patrimonial, mas, principalmente, a moral administrativa.
Há, contudo, uma exceção: admite-se o princípio da insignificância ao crime de descaminho (art. 334 do CP), que, topograficamente, está inserido no Título XI do Código Penal, que trata sobre os crimes contra a administração pública.
Segundo o STJ, “a insignificância nos crimes de descaminho tem colorido próprio, diante das disposições trazidas na Lei n. 10.522/2002”, o que não ocorre com outros delitos, como o peculato etc. (AgRg no REsp 1346879/SC, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 26/11/2013).
No STF, há julgados mais antigos da 2ª Turma admitindo a aplicação do princípio, como foi o caso do HC 107370, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 26/04/2011.
6 – CONCLUSÃO
Assim, verifica-se que, segundo a doutrina e jurisprudência majoritárias, a tipicidade penal se divide em dois elementos: tipicidade formal e tipicidade material. Já Zaffaroni afirma que a tipicidade é dividida em tipicidade formal e tipicidade conglobante, onde esta última se subdivide em tipicidade formal e condutas antinormativas.
Além disso, foi abordada de maneira completa e didática as hipóteses em que a jurisprudência aplica ou não o princípio da insignificância. Ressalta-se que o Supremo Tribunal Federal trouxe 4 requisitos objetivos para aplicar o princípio da insignificância, quais sejam, mínima ofensividade da conduta; ausência da periculosidade social da ação; reduzido grau de reprovabilidade do comportamento; e inexpressividade da lesão jurídica.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em 20 de abr. de 2016.
BRASIL. Decreto-lei nº 2.848/1940. Institui o Código Penal. Lex: Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em 20 de abr. De 2016.
GOMES, Luiz Flávio; Antonio Garcia-Pablos de Molina. Direito Penal Vol. 2, São Paulo: RT, 2009.
MAÑAS, Carlos Vico, O princípio da Insignificância como excludente da tipicidade no direito penal – São Paulo: Saraiva 1994.
NUCCI, Guilherme de Souza, Código Penal Comentado - 15ª Ed. - Rio de Janeiro: Forense 2015.
NUCCI, Guilherme de Souza, Manual de Direito Penal - 10ª Ed. - Rio de Janeiro: Forense 2014.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Bruno Medrado dos. Tipicidade penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 abr 2016, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46535/tipicidade-penal. Acesso em: 23 dez 2024.
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