O presente artigo aborda a responsabilidade penal da pessoa jurídica em crimes ambientais, expressamente prevista na Constituição Federal de 1988, mas que ainda gera controvérsias doutrinárias, apesar da recente pacificação da jurisprudência dos Tribunais Superiores que afastaram a aplicação da Teoria da Dupla Imputação, aceitando a responsabilização criminal dos entes personalizados.
A metodologia utilizada leva em conta estudos eminentemente doutrinários, assim é feita uma exposição e análise acerca do pensamento daqueles não aceitam, e daqueles que admitem a criação da responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes ambientais, conforme previsão do texto constitucional.
Primeiramente, é analisada, em linhas gerais, a abordagem constitucional da matéria meio ambiente. Serão expostas, ainda, as interpretações dadas ao texto do artigo 225, §3º, da Constituição Federal de 1988, em vista das teorias civilistas que conceituam a pessoa jurídica e as possibilidades penais para a responsabilização.
A responsabilidade da pessoa jurídica por danos em geral pode ser penal e civil. A primeira é prevista, como inovação no ordenamento jurídico brasileiro, na Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, a qual trata dos crimes ambientais.
O Código Penal brasileiro mostrava-se desatualizado para reprimir os abusos contra o meio ambiente, visto que, ao tempo de sua elaboração, não havia, ainda, preocupação com o problema ecológico.
Sobre o tema, antes de tratar da responsabilidade penal da pessoa jurídica por infrações penais ambientais, é importante entender o conceito de meio ambiente, definido por José Afonso da Silva como:
(...) a interação do conjunto de elementos naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida e todas as suas formas. A integração busca assumir uma concepção unitária do ambiente compreensiva dos recursos naturais e culturais. (SILVA, 1995, p.2)
Ressalta-se, ademais, que o direito ao meio ambiente é classificado como direito humano de terceira geração ou direito de solidariedade
Assim, antes da Magna Carta vigente, muitos pugnavam por uma reformulação da legislação existente - Código de Águas, Código de Pesca, Código Florestal, Código de Mineração - para que medidas de caráter preventivo e repressivo fossem estabelecidas no âmbito penal, para assim, efetivamente, serem capazes de proteger o meio ambiente, não só dos atos nocivos individuais, mas, também, dos atos criminosos praticados pelos entes morais.
Pensando nisso, o legislador elaborou a Lei 9605/98, responsabilizando civil, administrativa e penalmente as pessoas jurídicas. Contundo, devido à ânsia de responder ao povo e ao mundo, foi feito no Brasil, uma cópia do sistema de imputação francês, esquecendo-se de adaptar o direito penal brasileiro, como fora feito naquele país, afinal, aqui, o Direito Penal foi construído para punir o indivíduo certo, único.
Desse modo, a imputação criminal à pessoa jurídica, no atual sistema criminal, rompe com postulados básicos do direito penal, a exemplo do instituto da culpabilidade e do princípio da individualização das penas
O homem é um ser eminentemente social. Não vive isolado, mas em grupos. A associação é inerente à sua natureza. Nem sempre as necessidades e os interesses do indivíduo podem ser atendidos sem a participação e cooperação de outras pessoas. Desde a unidade tribal em tempos primitivos até os tempos modernos, essa necessidade de se agrupar para atingir uma finalidade tem sido observada (GONÇALVES, 2003, p. 1).
Nessa perspectiva, a convivência impõe certa ordem, determinada por regras de conduta. Essa ordenação, por sua vez, pressupõe a existência de restrições que limitam a atividade dos indivíduos componentes dos diversos grupos sociais. E o fim do Direito é precisamente determinar regras que permitam aos homens a vida em sociedade.
Segundo o doutrinador Mirabete, o Direito Penal consiste na reunião de normas jurídicas pelas quais o Estado proíbe determinadas condutas, sob ameaça de sanção penal, para que essa convivência se dê de forma harmônica, de modo a tutelar em última razão determinados bens, quando outros ramos do direito já não são mais suficientes (MIRABETE, 2007. p. 1).
É possível, dessa forma, concluir pela necessidade da tutela, não só a bens jurídicos individuais, como a vida, o patrimônio, e a liberdade sexual, mas, também, de bens jurídicos coletivos, como a família, as relações de consumo e o meio ambiente, sendo este último bem jurídico pertence à coletividade, conforme se aduz do artigo 225, caput, da Constituição Federal:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
É fácil perceber, então, que o meio ambiente é passível de lesão não por apenas um individuo isolado, ou seja, uma pessoa física, mas também pela coletividade de pessoas, unidas em entes morais, com personalidade jurídica própria, destacada da personalidade jurídica de seus entes físicos e individuais.
A responsabilização penal dos entes coletivos foi esquecida no Brasil até o advento da Constituição Federal de 1988, que em seu artigo 225, §3
º, parece indicar que pessoas jurídicas estão sujeitas as sanções penais e administrativas, pela prática de condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente. Senão, vejamos:
§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
No mesmo sentido, regulamentando o dispositivo constitucional, prescreve a Lei nº. 9.605/98:
Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Apesar das previsões constitucional e legal supratranscritas, uma parte da doutrina não admite que a Constituição Federal de 1988 tenha criado a responsabilidade penal da pessoa jurídica, simplesmente porque o ente moral não possui vontade e existência própria.
Por outro lado, respeitável parcela doutrinária que aceita a criação da responsabilidade penal da pessoa jurídica divide-se entre aqueles que defendem que esta, na atual conjuntura do Direito Penal, não pode cometer crimes – societas delinquere non potest -, tendo em vista a estrutura de punição individual mantida pelo direito sancionador, e aqueles que admitem que a pessoa jurídica comete crimes e está sujeito as penas previstas na Lei 9.605/98 – societas delinquere potest.
Antes de adentrar diretamente ao tema acerca da responsabilidade penal da pessoa jurídica nos crimes ambientais e expor as razões que fundamentam cada uma das referidas correntes, entende-se por bem a necessidade de conceituar pessoa jurídica com amparo na doutrina civilista. Essa abordagem se dará de forma breve e simples, tendo em vista não ser este o objetivo desta obra.
A razão de ser da pessoa jurídica está na necessidade de os indivíduos unirem esforços e utilizarem recursos coletivos para a realização dos objetivos comuns, que transcendem as possibilidades individuais. Essa constatação motivou a organização de pessoas e bens, com o reconhecimento do direito, que atribui personalidade ao grupo, distinta da de cada um de seus membros, passando este a atuar na vida jurídica com personalidade própria.
A necessária individualização só se efetiva se a ordem jurídica atribui personalidade ao grupo, permitindo que atue em nome próprio, com capacidade jurídica igual à das pessoas naturais. Surge, assim, “a necessidade de personalizar o grupo para que possa proceder como uma unidade, participando do comércio jurídico com individualidade”, conforme ensina Orlando Gomes. (GOMES, p. 162-163).
Segundo Caio Mário da Silva Pereira, personificação “do ente abstrato destaca a vontade coletiva do grupo, das vontades individuais dos participantes, de tal forma que o seu querer é uma resultante e não uma mera justaposição das manifestações volitivas isoladas” (PEREIRA, p.186).
Os doutrinadores que aceitam a existência da personalidade jurídica própria da pessoa jurídica, destacada da de seus entes físicos, dividem-se em dois grupos: teoria da ficção e teoria da realidade. Expor essas correntes se faz necessário para entender porque penalistas se dividem ao tratar da responsabilidade penal da pessoa jurídica.
A teoria da ficção divide-se em: “ficção doutrinária” e “ficção legal”. Para os adeptos da teoria ficção legal, desenvolvida por SAVIGNY, a pessoa jurídica constitui uma criação artificial da lei, um ente fictício, pois somente a pessoa natural pode ser sujeito de relação jurídica e titular de direitos subjetivos. Desse modo, a capacidade jurídica só pode ser estendida às pessoas jurídicas em relação a direitos patrimoniais.
A pessoa jurídica, concebida dessa forma, não passa de um simples conceito, destinado a justificar a atribuição de certos direitos a um grupo de pessoas físicas. Constrói-se, desse modo, uma ficção jurídica, uma abstração, que diversa da realidade, assim é considerada pelo ordenamento jurídico.
A teoria da ficção doutrinária é apenas uma variação da anterior, afirmando seus adeptos que a pessoa jurídica não tem existência real, mas apenas intelectual, ou seja, na inteligência dos juristas, sendo assim uma mera ficção criada pela doutrina.
Concluindo, para teoria da ficção, seja jurídica, seja doutrinária, a pessoa jurídica goza de uma personalidade criada, aceita pelo universo jurídico no âmbito das relações patrimoniais. Porém, essa doutrina não admite que a pessoa jurídica tenha vontade própria, de modo que sua vontade, o seu querer, é sempre decorrente do querer de um conjunto de pessoas físicas.
Para os defensores das teorias da realidade, as pessoas jurídicas são realidades vivas, e não mera abstração, tendo existência própria como os indivíduos. Seu principal expoente OTTON GIERKE proclama que a vontade, pública ou privada, é capaz de dar vida a um organismo, que passa a ter existência própria, distinta da de seus membros, capaz de tornar-se sujeito de direito real e verdadeiro.
Segundo CAPITANT, a personificação é atribuída a grupos aos quais a lei reconhece vontade e objetivos próprios. O Estado, reconhecendo a necessidade e a conveniência de que tais grupos sejam dotados de personalidade própria, para poder participar a vida jurídica nas mesmas condições das pessoas naturais, outorga-lhe esse predicado.
Após tecidos os comentários, acerca do conceito de pessoa jurídica, e analisada quão independente é sua personalidade jurídica, é possível adentrar a discussão acerca de sua responsabilidade criminal, e se essa realmente tem respaldo constitucional e legal. Passemos a expor as três correntes de pensamento instaladas no Brasil.
Para essa corrente, a Constituição Federal de 1988 não criou a responsabilidade penal da pessoa jurídica, o que se pode extrair da correta interpretação do artigo 225, § 3º, da CF/88.
O texto usa a palavra “condutas” como complemento da palavra pessoas físicas, sujeitas às sanções penais. Já a expressão “atividades” refere-se a pessoas jurídicas, sujeitas a sanções administrativas.
Assim, o parágrafo terceiro do art. 225 da CF/88 somente atribui a responsabilidade criminal para pessoas físicas que praticarem condutas lesivas ao meio ambiente, e responsabilidade administrativa para pessoas jurídicas que exercerem atividades ofensivas ao meio ambiente.
Ademais, o art. 5º, XLV, da Carta Magna, que traz o princípio da pessoalidade da pena, impede que a responsabilidade penal recaia sobre a pessoa jurídica, pois que deve recair exclusivamente sobre a pessoa física, autora de conduta criminosa, não sendo admissível que transcenda à pessoa jurídica.
José Antônio Paganella Boschi, diz:
O texto do §3º do art. 225, da CF apenas reafirma o que é do domínio público, ou seja, que as pessoas naturais estão sujeitas a sanções de natureza penal, e que pessoas jurídicas estão sujeitas a sanções de natureza jurídica. O legislador constitucional, ao que tudo indica, em momento algum pretendeu, ao elaborar o texto da Lei Fundamental, quebrar a regra por ele próprio consagrado (art. 5º, XLV) de que a responsabilidade penal é, na sua essência, inerente só aos seres humanos, pois estes, como afirmamos antes, são os únicos dotados de consciência, vontade, e capacidade de compreensão do fato e de ação (ou omissão) conforme ou desconforme ao direito. (BOSCHI, 2006, p. 135)
Luiz Regis Prado, referindo-se ao § 3º, do art. 225, da CF, menciona que:
o dispositivo em tela refere-se claramente, a conduta/atividade, e, em consequência a pessoas físicas ou jurídicas. Dessa forma vislumbra-se que o próprio legislador procurou fazer a devida distinção, através da correlação significativa mencionada.
(...)
O Princípio da personalidade da pena – nenhuma pena passará da pessoa do condenado (art. 5º, XLV, CF) – tradicionalmente enraizado nos textos constitucionais brasileiros, impõe que a sanção penal recaia exclusivamente sobre os autores materiais do delito (...) (PRADO, 1999, p. 174).
Para Cézar Roberto Bitencourt:
(...) no Brasil, a obscura previsão do art. 225, §3º, da Constituição Federal, relativamente ao meio ambiente, tem levado alguns penalistas a sustentarem, equivocadamente, que a Carta Magna consagrou a responsabilidade penal da pessoa jurídica. No entanto, a responsabilidade penal ainda encontra limitada à responsabilidade subjetiva e individual (BITENCOURT, 2007, p. 232).
Sendo assim, é possível concluir que, para esta corrente, o art. 3º da Lei 9.605/98 padece de inconstitucionalidade material, tendo em vista que prevê responsabilidade penal da pessoa jurídica, o que não esta escrito em lugar algum da Constituição Federal, e afronta o art. 5º, inciso LXV, da CF, o qual permite responsabilidade penal apenas para pessoas físicas.
A maior parte da doutrina filia-se a esta corrente, a exemplo de Luiz Flávio Gomes, Roberto Delmanto, Eugenio Raul Zaffaroni, Rogério Greco e Julio Fabrinni Mirabete.
Neste momento, faz-se necessário voltar às correntes que definem pessoa jurídica, pois para essa teoria majoritária do Direito Penal, é acolhida a teoria minoritária entre os civilistas, qual seja, a Teoria da Ficção Jurídica, de SAVIGNY.
Assim, para a maior parte dos penalistas, a pessoa jurídica é totalmente desprovida de consciência, vontade e finalidade, de modo que é impossível falar em dolo ou culpa, e até mesmo anteriormente a esses componentes da conduta, nota-se a própria ausência de conduta.
Ao dizer que a pessoa jurídica não tem consciência afirma-se, por pressuposto, que ela não possui capacidade de ação, ou seja, de conduta, um poder para fazer ou não fazer. Assim, falar em responsabilidade penal da pessoa jurídica é aclamar responsabilidade penal objetiva – com a ausência de dolo ou culpa – o que é repudiado pelo Direito Penal brasileiro.
Ao se falar em dolo e culpa, figuras que durante a teoria causalista fizeram parte da culpabilidade, e com a teoria finalista da ação passaram a ocupar um novo espaço, qual seja, na conduta, ao se analisar fato típico, não se pode dizer totalmente que dolo e culpa saíram por completo da culpabilidade, pois na atualidade do direito penal, o dolo e a culpa são novamente analisados no momento posterior a verificação da existência do crime, ou seja, no instante da responsabilização, dentro ainda da culpabilidade.
Assim, sem conduta, e sem dolo ou culpa, é possível dizer que fica obstado à análise da existência de crime, bem como de culpabilidade, pois ausentes seus elementos, quais sejam: a imputabilidade (o que não gera maiores dúvidas, vez que não existem fatores biopsicológicos a serem analisados), a potencial consciência da ilicitude (entendida como a capacidade de entender o caráter injusto do fato) e a exigibilidade de conduta diversa, pois não há conduta.
Ademais, as finalidades da pena (retributiva, preventiva, e ressocializadora), perante um ente sem consciência, restam esvaziadas.
Zaffaroni coloca que:
(...) não se pode falar de uma vontade, em sentido psicológico, no ato de uma pessoa jurídica, o que exclui qualquer possibilidade de admitir a existência de uma conduta humana. A pessoa jurídica não pode ser autora de delito, porque não tem capacidade de conduta humana no sentido ôntico-ontológico da mesma (ZAFFARONI, 1996, p. 339).
Luiz Vicente Cernicchiaro, Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça, aduz:
(...) não há que se falar em conduta desse ente, no sentido de projeção de vontade, sabido que opera através de pessoas físicas. Estas, sim, têm vontade e fazem a opção entre o atuar lícito e o comportamento ilícito. A culpabilidade – tome-se o vocábulo no sentido de elemento subjetivo, ou significando reprovabilidade – é própria do homem. Não se censura a pessoa jurídica, mas quem atua em seu nome (CERNICCHIARO, 1991, p. 138-139).
Fernando da Costa Tourinho Filho menciona que o próprio legislador não admite que a pessoa jurídica possa cometer crimes, pois permite a responsabilização penal apenas por atos praticados pelo representante legal ou contratual ou órgão colegiado da pessoa moral. Diz:
Aí esta a prova maior de que nem o legislador concebe a possibilidade de uma pessoa jurídica ser sujeito passivo de pretensão punitiva. A própria lei reconhece que ela sozinha não pode delinquir. Se não pode, por que falar da sua responsabilidade penal? (...) Melhor andaria o legislador se deixasse de lado tanta engenhosidade e observasse a regra contida no art. 28, do Código de Defesa do Consumidor, que admite a figura do disregard of legal entity, não como sanção penal, mas como índole de providência administrativa ou civil (FILHO, 2006, p. 460).
Mirabete pontua que:
a pessoa jurídica não pode ser sujeito ativo de crime, quer se entenda ser ela ficção legal (SAVIGNY, IHERING), realidade objetiva (GIERKE, ZITELMANN), realidade técnica (PLANIOL, RIPERT) ou se adote a teoria institucionalista (HAURIOU). É impossível uma ficção a prática de fatos criminosos, e aos entes reais compostos de pessoas físicas não se adapta o conceito penal de dolo ou culpa (puramente subjetivo) (MIRABETE, 2007, p. 111).
Assim, para esta corrente que adota a teoria da “societas delinquere non potest”, o art. 225, §3º, da Constituição Federal, é norma constitucional de eficácia limitada, dependente de regulamentação, a qual foi prevista superficialmente, insuficiente e inadequadamente na Lei 9605/98.
Assim, para essa corrente, a imputação à pessoa jurídica é incompatível com a teoria do crime adotada no Direito Penal pátrio atual.
Nossa legislação, que imitou o modelo francês, se esqueceu de que, na França, o Código Penal Gaulês de 1992 introduziu a responsabilidade penal da pessoa jurídica, porém, foi elaborado naquele país uma Lei de Adaptação (12.02.1992), com a criação de normas penais e processuais condizentes com as pessoas jurídicas.
Tentar adaptar a teoria do crime atual é algo descabido, e reformula-la traria inúmeros inconvenientes, de modo que o mais plausível seria criar um sistema penal a parte, com penalistas e juristas voltados ao estudo da imputação à pessoa jurídica, com juízes preparados para enfrentar tal questão, ou seja, um sistema heterogêneo entre o direito penal do indivíduo e o direito penal coletivo, assim como ocorreu com as normas de processo civil.
Ademais, o país não possui um sistema processual adequado. Indaga-se: quem representará a pessoa jurídica por ocasião do interrogatório?
Filiam- se a esta corrente: Ada Pellegrini Grinover, Celso Ribeiro Bastos, Damásio E. de Jesus, dentre outros.
Aqui, a teoria que explica a pessoa jurídica que prevalece é a teoria da realidade, a mesma hoje prevalecente entre os civilistas. O curioso é que autores militantes fora do direito penal são os que defendem tal posição, como por exemplo, a processualista Ada Pellegrini Grinover.
Pois bem. A teoria da realidade atribui à pessoa jurídica capacidade e vontade próprias, diferentes das de seus criadores. Portanto, de plano, é possível aduzir que a pessoa jurídica tem capacidade de ação e, assim, pode praticar uma conduta.
O principal argumento desta corrente é pragmático e normativo: pode haver responsabilidade penal porque a Constituição Federal de 1988 assim determinou.
Para analisar a culpabilidade, os adoradores desse ponto de vista divorciam-se da visão clássica de culpabilidade individual e passam a falar em culpabilidade social, baseada na ideia da empresa como centro de emanação das decisões. Sustentam que o direito penal deve ser mais um aliado no combate às empresas destruidoras do meio ambiente, já que as sanções civis e administrativas não tem se mostrado suficientes ao longo do tempo (princípio da fragmentariedade).
Desse modo, aqui, o Direito Penal cumpre sua função social, no sentido de finalidade, ao servir como “ultima ratio”, compatível com o princípio da intervenção mínima, considerando a subsidiariedade. Nesse sentido, segue trecho do voto do Desembargador do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, José Luis Germano da Silva, no julgamento do Mandado de Segurança 2002.04.01.013843-0/PR:
Não é incomum ouvir-se a afirmação de alguns no sentido de que bastariam as sanções administrativas para coibir os atos ilícitos societários. Não parece razoável a tese. Em primeiro lugar, especialmente nos países de terceiro mundo, onde a administração é mais sensível à impropridade e os seus órgãos julgadores são despreparados, não é eficaz como resposta do sistema subtrair do Direito Penal a regulação, submetendo-se a perseguição ao Judiciário, que tem mais autonomia e independência para investigar e punir. Se a carga de negatividade social do crime empresarial justifica a presença do Direito Penal como ultima ratio, não há por que omitir-se na regulação. No Brasil, acresce a esses argumentos o fato de que a investigação criminosa pertence ao Ministério Público, que tem cumprido à risca sua função constitucional. Manter a controvérsia no âmbito regulador estrito da administração seria afastar o parquet da teia armada pelas empresas para realizar seus fins delituosos. (MS, 2002.04.01.013843-0/PR, rel. José Luis Germano da Silva.)
Isso porque um processo criminal tem maior força coercitiva do que sanções administrativas e cíveis. Sérgio Salomão Shecaira (SHECAIRA, 1998) faz ponderações relevantes sobre o tema, ressaltando o caráter histórico desse tipo de punição, a qual é cobrada por uma realidade mundial hodierna.
Esse argumento é confirmado no julgamento do Resp. 628.637/SC (2004-0012312-7), em que o relator do processo Ministro Gilson Dipp aduz que:
No direito comparado, muitos são os países que já adotam a possibilidade de responsabilização penal da pessoa jurídica, dentre eles: Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia, Austrália, França, Venezuela, México, Cuba, Colômbia, Holanda, Dinamarca, Portugal, Áustria, Japão e China, demonstrando uma tendência mundial no sentido de admitir a aplicação de sanções de natureza penal às pessoas jurídicas pela prática de ofensas ao meio-ambiente. (Resp. 628.637/SC. Proc. nº. 2004-0012312-7. Rel. Ministro Gilson Dipp, 2004)
A Lei 9.605/98, que nasceu em um contexto de pressão social para o combate às condutas ambientais ilícitas, foi decorrência do XV Congresso Internacional de Direito Penal, realizado em setembro de 1994, no Rio de Janeiro.
Cumpre esclarecer o que esta corrente entende como sendo a culpa social, a qual dá origem ao sistema dicotômico da dupla imputação, como previsto na Lei 9605/98. A culpa social é definida por Valdir Sznick:
(...) à pessoa jurídica pode-se imputar, exigir e atribuir à responsabilidade penal. Se a culpabilidade é poder agir segundo as exigências do direito (a exigibilidade de outra conduta) a pessoa jurídica é culpável (entendendo a exigibilidade no conceito dos finalistas, reproduzido por Jimenez de Asúa). Tratando-se de pessoas jurídicas, estamos diante de uma culpa social, diferenciada mas que atinge interesses coletivos; em um campo teórico, trata-se de uma culpa diferenciada, diversa da culpa tradicional, dentro do interesse público, fundamento da "strict liability", do direito americano, que prescinde da "mens rea", ou seja, do dolo. (Conf. Celis Wells, Corporations asd Criminal Responsability, Claredon Press, N. York, 1993, pág. 56 e seg.). Segundo Celia Wells, a "strict liability" (responsabilidade estrita) se incorporou à responsabilidade da pessoa jurídica, dentro da relação empresa-empregados, adotando a responsabilidade vicariante (da empresa pelos seus empregados), sempre procurando determinar a responsabilidade da pessoa física (dirigentes ou responsáveis), mesmo sendo a pessoa jurídica responsável busca-se o elemento subjetivo do responsável. (SZNICK, 2001, p. 66⁄67)
Para Guilherme de Souza Nucci, que se filia a esta corrente, as penas privativas de liberdade não constituem, atualmente, o objetivo principal do direito penal, devendo ser substituídas, cada vez mais, por penas alternativas, que continuam a obedecer as finalidades da pena, tendo em vista que esta modalidade tem mostrado resultados ao ser aplicada em pessoas físicas, além de serem compatíveis com pessoas jurídicas, nesse sentido:
(...) cremos estar a razão com aqueles que sustentam a viabilidade de a pessoa jurídica responder por crime no Brasil, após a edição da Lei 9605/98, que cuida dos crimes contra o meio ambiente, por todos os argumentos supra citados. Além disso, é preciso considerar que a condenação na esfera penal – pouco importando se a pena é somente restritiva de direito ou multa – é, moralmente, mais efetiva que pronunciamentos judiciais em outras áreas. (NUCCI, p.763)
Por fim, dentre os que defendem a possibilidade de responsabilização criminal da pessoa jurídica há um dissenso: para uma corrente, a pessoa jurídica pode ser punida penalmente por crimes ambientais ainda que não haja responsabilização de pessoas físicas, simplesmente porque o artigo 225, §3º, da CF, não faz essa exigência, para outra, é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica, desde que em conjunto com uma pessoa física. Essa última posição ficou conhecida como Teoria da Dupla Imputação e baseia-se na redação do artigo 3º da Lei 9.605/98. Vejamos:
Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade (grifou-se).
Para os defensores desse pensamento, o Ministério Público, ao oferecer denúncia contra uma pessoa jurídica, deve, obrigatoriamente, identificar as pessoas físicas que, atuando em nome do ente moral, participaram na infração penal, sob pena de inépcia (REsp 610.114/RN).
O Superior Tribunal de Justiça era adepto da Teoria da Dupla Imputação. Nesse sentido, entre outros, o seguinte precedente:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE. ART. 38, DA LEI N.º 9.605/98. DENÚNCIA OFERECIDA SOMENTE CONTRA PESSOA JURÍDICA. ILEGALIDADE. RECURSO PROVIDO. PEDIDOS ALTERNATIVOS PREJUDICADOS. 1. Para a validade da tramitação de feito criminal em que se apura o cometimento de delito ambiental, na peça exordial devem ser denunciados tanto a pessoa jurídica como a pessoa física (sistema ou teoria da dupla imputação). Isso porque a responsabilização penal da pessoa jurídica não pode ser desassociada da pessoa física – quem pratica a conduta com elemento subjetivo próprio. 2. Oferecida denúncia somente contra a pessoa jurídica, falta pressuposto para que o processo-crime desenvolva-se corretamente.3. Recurso ordinário provido, para declarar a inépcia da denúncia e trancar, consequentemente, o processo-crime instaurado contra a Empresa Recorrente, sem prejuízo de que seja oferecida outra exordial, válida. Pedidos alternativos prejudicados. (RMS 37.293/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 2/5/2013, DJe 9/5/2013).
Em outro momento, posteriormente, a Primeira Turma do citado tribunal superior, afastou a tese da dupla imputação e admitiu a possibilidade de responsabilização penal da pessoa jurídica por infrações penais ambientais independentemente da responsabilização de pessoa física. Vejamos a ementa:
EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PENAL. CRIME AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA. CONDICIONAMENTO DA AÇÃO PENAL À IDENTIFICAÇÃO E À PERSECUÇÃO CONCOMITANTE DA PESSOA FÍSICA QUE NÃO ENCONTRA AMPARO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O art. 225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação. 2. As organizações corporativas complexas da atualidade se caracterizam pela descentralização e distribuição de atribuições e responsabilidades, sendo inerentes, a esta realidade, as dificuldades para imputar o fato ilícito a uma pessoa concreta. 3. Condicionar a aplicação do art. 225, § 3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a pessoa física implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção do constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções penais, mas também de evitar a impunidade pelos crimes ambientais frente às imensas dificuldades de individualização dos responsáveis internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico ambiental. 4. A identificação dos setores e agentes internos da empresa determinantes da produção do fato ilícito tem relevância e deve ser buscada no caso concreto como forma de esclarecer se esses indivíduos ou órgãos atuaram ou deliberaram no exercício regular de suas atribuições internas à sociedade, e ainda para verificar se a atuação se deu no interesse ou em benefício da entidade coletiva. Tal esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado delito à pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades, as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal individual. 5. Recurso Extraordinário parcialmente conhecido e, na parte conhecida, provido. (RE 548181, Relatora Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 6/8/2013, acórdão eletrônico DJe-213 divulg 29/10/2014, public 30/10/2014)
Caminhando nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça alinhou-se à jurisprudência a Suprema Corte. Nesse sentido, a título de exemplo, colaciona-se o seguinte precedente:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PLEITO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. EXORDIAL ACUSATÓRIA QUE ATENDE AO DISPOSTO NO ART. 41 DO CPP. AUSÊNCIA DE NECESSIDADE DA DUPLA IMPUTAÇÃO EM CRIMES AMBIENTAIS , QUANDO HÁ DENÚNCIA EM DESFAVOR SOMENTE DA PESSOA FÍSICA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Esta Corte pacificou o entendimento de que o trancamento de ação penal pela via eleita é cabível apenas quando manifesta a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a ausência de provas da existência do crime e de indícios de autoria. 2. Devidamente descrito o fato delituoso, com indicação dos indícios de materialidade e autoria, não há como trancar a ação penal, em sede de habeas corpus, por falta de justa causa ou inépcia da denúncia, pois plenamente assegurado o amplo exercício do direito de defesa, em face do cumprimento dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal. 3. De acordo com o entendimento jurisprudencial sedimentado nesta Corte de Justiça e no Supremo Tribunal Federal, o ato judicial que recebe a denúncia, ou seja, aquele a que se faz referência no art. 396 do Código de Processo Penal, por não possuir conteúdo decisório, prescinde da motivação elencada no art. 93, IX, da Constituição da República (AgRg no HC n. 256.620/SP, Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe 1º/7/2013). 4. A responsabilidade da pessoa física que pratica crime ambiental não está condicionada à concomitante responsabilização penal da pessoa jurídica, sendo possível o oferecimento da denúncia em desfavor daquela, ainda que não haja imputação do delito ambiental a esta. 5. Recurso em habeas corpus improvido. (RHC 53.208/SP, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 21/5/2015, DJe 1/6/2015)
O Brasil, hoje, com seu sistema penal voltado para a sanção de atos praticados por agentes individuais, tem condição de punir um ente coletivo? Os magistrados são preparados para lidar com esse tipo de agente criminoso? As penas estão reguladas de modo correto na Lei 9.605/98?
Em relação ao argumento de que o Direito Penal deve obedecer ao princípio da intervenção mínima, quanto ao seu caráter subsidiário, e só intervir quando comprovada a ineficácia da legislação civil e administrativa em relação às praticas penais desajustadas, esse não merece prosperar. O meio ambiente e assuntos relacionados a ele tomaram, nos últimos tempos, proporções continentais, de modo que definir quais são os crimes ambientais e puni-los faz parte da função social do Direito Penal.
Assim, conclui-se que, apesar de a Constituição Federal prever a punição penal para pessoas jurídicas que cometem crimes ambientais, a matéria ainda não encontra regulamento jurídico próprio, pois o sistema penal individualmente estruturado é aparentemente incompatível a responsabilização da pessoa jurídica.
Contudo, como forma de temperar as incompatibilidades, os tribunais superiores, atualmente, aceitam com tranquilidade a punição das pessoas jurídicas pela prática de crimes ambientais. Hoje, tanto o Superior Tribunal de Justiça quanto o Supremo Tribunal Federal entendem que é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALVES, Brunna Melgaço. A responsabilidade criminal da pessoa jurídica nos crimes ambientais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 maio 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46606/a-responsabilidade-criminal-da-pessoa-juridica-nos-crimes-ambientais. Acesso em: 23 dez 2024.
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