RESUMO: Este estudo tem como objetivo a análise e sistematização da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho acerca da indicação do trecho do prequestionamento no recurso de revista. Como metodologia, adotou-se a revisão da literatura e a pesquisa jurisprudencial acerca do tema. Os resultados do estudo possibilitam a correta elaboração do recurso por advogados e membros do Ministério Público que atuam perante a Corte.
Palavras-chave: Processo do Trabalho. Tribunal Superior do Trabalho - TST. Recurso de revista. Prequestionamento. Artigo 896 da Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. Lei 13.015/2014.
INTRODUÇÃO
O Tribunal Superior do Trabalho - TST tem como missão precípua a uniformização da interpretação do Direito no âmbito de competência da Justiça do Trabalho. A sua atuação garante segurança jurídica na interpretação e aplicação do Direito do Trabalho, evitando a propositura de demandas infrutíferas, orientando a atuação das instâncias de primeiro e segundo graus e concorrendo para a razoável duração do processo. Assegura, também, que para demandas iguais sejam conferidas soluções iguais, atendendo, assim, a reclamos de isonomia e de justiça.
Essa missão do TST é desempenhada por meio do julgamento do recurso de revista, recurso de fundamentação vinculada que, ao lado do recurso especial e do extraordinário, forma a categoria dos recursos ditos excepcionais por parte da doutrina. Apresenta requisitos rígidos de admissibilidade, requerendo conhecimento técnico especializado, para a sua correta interposição.
Segundo Barbosa Moreira (2009, p. 261)[1], requisitos de admissibilidade de um recurso são as condições impostas pela lei para que o órgão possa apreciar o conteúdo da postulação.
Será objeto do presente estudo apenas um requisito específico para o recurso de revista: a indicação do trecho do acórdão recorrido que consubstancia o prequestionamento da questão.
O objetivo da pesquisa é analisar e sistematizar a jurisprudência do TST acerca do tema.
O resultado da pesquisa poderá beneficiar advogados e membros do Ministério Público do Trabalho que atuam perante o TST, auxiliando na correta elaboração de seus recursos. Indiretamente, o resultado da pesquisa poderá beneficiar todos os operadores do Direito na área trabalhista, porquanto o incremento da eficiência na utilização do recurso de revista acarretará mais rápida uniformização da interpretação do Direito do Trabalho.
PREVISÃO LEGAL
A Lei 13.015, de 21 de julho de 2014, gestada no âmbito do próprio TST, promoveu alterações no processamento de recursos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, especialmente quanto ao recurso de revista.
Dentre as alterações promovidas, está a inclusão do § 1º-A no art. 896 da CLT, com a seguinte redação:
“Art. 896 - Cabe Recurso de Revista para Turma do Tribunal Superior do Trabalho das decisões proferidas em grau de recurso ordinário, em dissídio individual, pelos Tribunais Regionais do Trabalho, quando:
(...)
§ 1o-A. Sob pena de não conhecimento, é ônus da parte:
I - indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista;
II - indicar, de forma explícita e fundamentada, contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que conflite com a decisão regional;
III - expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte.
A partir da vigência da Lei 13.015/2014, foi criado o novo pressuposto de admissibilidade do recurso de revista, consistente na indicação do trecho do acórdão recorrido que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso (art. 896, § 1º-A, I, da CLT).
Trata-se de verdadeira inovação, pois não havia anterior previsão legal do mencionado requisito, nem era o mesmo exigido pela jurisprudência da Corte, e a sua interpretação tem gerado dúvidas por parte dos operadores do Direito que atuam perante o TST.
PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA
O prequestionamento consiste no debate, no enfrentamento, de determinada questão na decisão impugnada.
Como já dito anteriormente, o recurso de revista apresenta uma outra função, a par do julgamento da causa: a uniformização da interpretação do Direito do Trabalho e Processual do Trabalho pelo TST.
Trata-se de recurso de fundamentação vinculada, cujo cabimento está adstrito às hipóteses previstas no art. 896 da CLT: divergência jurisprudencial (alíneas “a” e “b”) e violação de lei federal ou da Constituição Federal (alínea “c”).
Assim, o prequestionamento é decorrência lógica das próprias hipóteses de cabimento do recurso de revista.
Não é possível vislumbrar violação à lei ou à Constituição Federal se o conteúdo do dispositivo legal ou constitucional não foi objeto de análise na decisão recorrida.
Da mesma forma, para divergir de um entendimento adotado por outro Tribunal, o órgão julgador deve necessariamente emitir posicionamento a respeito do tema.
A Súmula 297 resume o entendimento da Corte acerca do prequestionamento:
Súmula nº 297 do TST
PREQUESTIONAMENTO. OPORTUNIDADE. CONFIGURAÇÃO (nova redação) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
I. Diz-se prequestionada a matéria ou questão quando na decisão impugnada haja sido adotada, explicitamente, tese a respeito.
II. Incumbe à parte interessada, desde que a matéria haja sido invocada no recurso principal, opor embargos declaratórios objetivando o pronunciamento sobre o tema, sob pena de preclusão.
III. Considera-se prequestionada a questão jurídica invocada no recurso principal sobre a qual se omite o Tribunal de pronunciar tese, não obstante opostos embargos de declaração.
INDICAR
O inciso I do § 1º-A do art. 896 da CLT fala em indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento.
O verbo utilizado pela lei é “indicar”.
A menção é importante porque alguns precedentes do TST, ao interpretar as alterações promovidas pela Lei 13.015/2014, vêm imprimindo ao termo “indicar” o significado de “transcrever”.
Os precedentes abaixo ilustram o entendimento adotado:
RECURSO DE REVISTA APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. RECLAMADA. BASE DE CÁLCULO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS DO ART. 896, §1º-A DA CLT. Nas razões do recurso de revista a recorrente não transcreve o trecho da decisão que consubstancia o prequestionamento, o que não se admite nos termos do art. 896, § 1º-A, I, da CLT, que assim dispõe: "Art. 896. (...)§ 1o-A. Sob pena de não conhecimento, é ônus da parte: I - indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista;". Recurso de revista de que não se conhece.
(RR - 96-78.2014.5.08.0130 , Relatora Ministra: Kátia Magalhães Arruda, Data de Julgamento: 25/03/2015, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 31/03/2015) (grifei)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. SUMARÍSSIMO. RECURSO DE REVISTA CALCADO EM CONTRARIEDADE À SÚMULA 331 DO TST, MAS QUE NÃO APRESENTA A TRANSCRIÇÃO DO TRECHO DO ACÓRDÃO REGIONAL QUE IDENTIFICA O PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA OBJETO DO APELO. LEI 13.015/2014. No caso concreto, por meio do recurso de revista a empresa reclamada busca o reconhecimento da validade do contrato de facção, sustentando a existência de contrariedade à Súmula 331 do TST (excetuadas as demais alegações incabíveis em procedimento sumaríssimo: violação de lei e divergência jurisprudencial). Entretanto, o recurso de revista foi interposto na vigência da referida lei e não apresenta a transcrição do trecho da decisão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto da contrariedade indicada e, por isso, não alcança conhecimento a tornar inviável o agravo de instrumento que visa ao seu destrancamento. Com o advento da Lei 13.015/2014 a redação do novel § lº-A do artigo 896 da CLT, para efeito de demonstração da contrariedade à Súmula do TST, exige em seu inciso I que: "sob pena de não conhecimento, é ônus da parte: I - indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista", grifamos. A alteração legislativa nesse aspecto constitui pressuposto extrínseco de admissibilidade do recurso de revista e se orienta no sentido de propiciar a identificação precisa da contrariedade a Súmula, afastando-se os recursos de revista que impugnam de forma genérica a decisão regional e conduzem sua admissibilidade para um exercício exclusivamente subjetivo pelo julgador de verificação e adequação formal do apelo. Assim, a necessidade da transcrição do trecho que consubstancia a contrariedade indicada visa a permitir a identificação precisa e objetiva da tese supostamente contrária a Súmula, à segurança das relações jurídicas e à isonomia das decisões judiciais, de modo que contribua para a celeridade da prestação jurisdicional, possibilite a formação de precedentes como elemento de estabilidade e a decisão do TST contribua para a formação da jurisprudência nacionalmente unificada. A ausência desse requisito formal torna inexequível o recurso de revista e insuscetível de provimento o agravo de instrumento. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.
(AIRR - 1995-59.2012.5.15.0010 , Relator Ministro: Alexandre de Souza Agra Belmonte, Data de Julgamento: 08/04/2015, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 10/04/2015) (grifei)
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA EM FACE DE DECISÃO PUBLICADA A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO EFETIVO PREQUESTIONAMENTO. REQUISITO PREVISTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, I, DA CLT. Dentre as alterações promovidas à sistemática recursal pela Lei nº 13.015/2014 encontra-se a criação de pressuposto intrínseco do recurso de revista, consistente na indicação (transcrição) do fragmento da decisão recorrida que revele a resposta do tribunal de origem sobre a matéria objeto do apelo. O requisito encontra-se previsto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, cujo teor dispõe que: 1º-A. Sob pena de não conhecimento, é ônus da parte: I - indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista. Logo, inviável o processamento do recurso de revista em que a parte não indica, de modo específico, o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia pontuada em seu apelo, ante o óbice contido no referido dispositivo legal, que lhe atribui tal ônus. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (...)
(AIRR - 2763-24.2012.5.02.0017 , Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 03/02/2016, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/02/2016) (grifei)
Ocorre que, ao contrário do que fazem crer os precedentes acima, “indicar” não significa “transcrever”.
Confira-se significado do verbo “indicar” no Dicionário Houaiss[2]:
indicar
verbo ( 1661)
1 ( t.d. ) med mostrar a conveniência na aplicação de (tratamento, remédio)
2 ( t.d.bit. ) [prep.: a] fazer com que, por meio de gestos, sinais, símbolos, algo ou alguém seja visto; assinalar, designar, mostrar
‹ sem nenhuma discrição, indicou os artistas que passavam › ‹ i. um objeto a alguém ›
3 ( t.d.bit. ) [prep.: a] dar (a alguém) sugestão acerca de; aconselhar, ensinar, recomendar
‹ poderia i.(-nos) um bom médico? ›
4 ( t.d.bit. ) [prep.: a] esclarecer, informar (alguém) sobre (algo); instruir, orientar
‹ coube ao sargento i. as tarefas a serem executadas › ‹ o manual do candidato indica aos concorrentes as datas das provas ›
5 ( t.d.,t.d.pred.bit. ) [prep.: para] apontar (alguém ou algo) como preferencial ou ideal para; designar, escolher, eleger
‹ o juiz indicou os jurados › ‹ indicou o avô paterno como o mais querido › ‹ costumava i. familiares para os cargos de confiança ›
6 ( t.d. ) recomendar com precisão; determinar, estabelecer, firmar
‹ indique você mesmo o lugar e a hora para o encontro ›
7 ( t.d.bit. ) [prep.: a] dar a conhecer, por escrito ou oralmente; enumerar, mencionar, registrar
‹ este livro indica vários roteiros de viagem pelo Nordeste › ‹ o professor indicou(-lhe) uma bibliografia ›
8 ( t.d. ) dar a conhecer, por meio de traços, sinais, sintomas, gestos, o caráter ou a existência de (alguém ou algo); atestar, demonstrar, revelar
‹ nenhuma pista a i. o rumo dos fugitivos › ‹ nuvens escuras indicavam a proximidade da chuva ›
9 ( t.d. ) fazer o esboço de; esboçar, delinear
‹ apenas indicaram o plano, mais tarde fornecerão os detalhes ›
E também no Dicionário MICHAELIS[3]:
indicar
in.di.car
(lat indicare) vtd 1 Mostrar com o dedo ou por meio de algum sinal; apontar: O engenheiro indicava, à direita, o ponto onde se devia fazer a escavação. 2 Designar, sugerir: "Indicara ao senador Afonso Celso o meu nome para o seu ministério" (Rui Barbosa). 3 Dar a conhecer, manifestar, revelar: Essa atitude indica um caráter reto. 4 Significar: "...uma onomatopeia que indicava o ruído das contas" (Jorge Amado). 5 Enunciar, mencionar: Indiquei, de memória, os livros apócrifos. 6 Ensinar: Indicar regras de acentuação. 7 Aconselhar, orientar: Indica-me, ó, Deus, o que devo fazer. 8 Prescrever, receitar: O médico indicou um antibiótico. 9 Determinar, precisar: Indicar as origens de uma campanha. 10 Esboçar ligeiramente: Indicamos somente um esquema resumido.
Nenhum dos significados do verbete “indicar” corresponde a “transcrever”.
Assim é que há precedentes contrários do TST, que não imprimem ao termo “indicar” o significado de transcrever:
RECURSO DE REVISTA CONTRA DECISÃO PUBLICADA NA VIGÊNCIA DA LEI 13.015/2014. SALÁRIO IN NATURA. INTEGRAÇÃO. Apesar de o autor indicar violação de dispositivos de lei e trazer arestos para fins de demonstração de divergência de teses, nos termos do disposto no art. 896, "a" e "c" da CLT, não transcreve ou mesmo indica o trecho do acórdão recorrido que entende consubstanciar o prequestionamento da controvérsia, objeto do recurso de revista (art. 896, §1º-A, I, da CLT). Não cumprido o disposto no art. 896, §1º-A, I, da CLT, o recurso não alcança conhecimento. Recurso de revista não conhecido. (...) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REQUISITOS. Não obstante a invocação pela parte de dispositivos legais, na forma do art. 896, "c", da CLT, não houve transcrição ou mesmo indicação do trecho do v. acórdão regional que entende a recorrente consubstanciar o prequestionamento da controvérsia, desatendendo, assim, à exigência do art. 896, §1º-A, I, da CLT, o que implica o não conhecimento do recurso.
(RR - 216-02.2013.5.09.0657 , Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, Data de Julgamento: 11/03/2015, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 13/03/2015) (grifei)
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PRIMEIRA RECLAMADA (PREVI). RECURSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. 1. RECURSO DE REVISTA QUANTO AOS TEMAS "MULTA PREVISTA NO ARTIGO 475-J DO CPC" E "JUSTIÇA GRATUITA" DENEGADO SEGUIMENTO COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, I, DA CLT. INDICAÇÃO DO TRECHO DA DECISÃO RECORRIDA QUE CONSUBSTANCIA O PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA OBJETO DO RECURSO DE REVISTA. Nos termos do artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, incluído pela Lei nº 13.015/2014, é ônus da parte, sob pena de não conhecimento, "indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista". Depreende-se, pois, que o dispositivo legal estabelece como pressuposto a imprescindibilidade de indicação do trecho da decisão recorrida, e não necessariamente de sua transcrição. Assim, entende esta Relatora que esse requisito é atendido, inclusive, pela breve síntese da tese adotada pelo Tribunal Regional, na forma articulada pela primeira reclamada nas razões do seu recurso de revista. Desse modo, não há falar em inobservância do requisito previsto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT. Assim, superado o óbice imposto no despacho de admissibilidade, no aspecto, prossegue-se na análise dos pressupostos intrínsecos remanescentes do recurso de revista, nos termos da OJ nº 282 da SDI-1 do TST. (...)
(AIRR - 44-54.2010.5.09.0014 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 18/03/2015, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 20/03/2015) (grifei)
Na verdade, não é admissível que se adote uma interpretação contrária ao texto expresso da lei.
E a lei, linguagem técnica que é, exige do intérprete que considere o real significado, a real definição dos seus termos.
Por isso, errônea a interpretação de que somente atende o requisito legal o recorrente que transcreve nas razões do recurso de revista o trecho do acórdão recorrido que consubstancia o prequestionamento.
TRECHO DA DECISÃO RECORRIDA
Outra questão que tem sido objeto de controvérsia na jurisprudência do TST é sobre o significado da expressão “trecho da decisão recorrida”.
O Dicionário Michaelis[4] apresenta a seguinte definição de “trecho”:
trecho
tre.cho
(ê) sm (cast trecho) 1 Espaço ou intervalo de tempo: Um trecho do dia. 2 Espaço ou extensão de um lugar a outro: Trecho de caminho. 3 Fragmento de uma obra musical, literária ou artística; excerto, extrato. A breve trecho: dentro de pouco tempo. A trecho ou a trechos: a espaços, de quando em quando, de tempo a tempo.
Já o Dicionário Houaiss[5] traz o significado abaixo:
trecho /ê/
substantivo masculino ( 1652)
1 espaço compreendido entre dois pontos no tempo ou no espaço; intervalo
2 passagem selecionada de um livro, de uma composição musical; fragmento, extrato
3 parte de um todo; fração, segmento
Assim, o trecho da decisão recorrida deve ser entendido como um seu excerto, um fragmento, uma parte.
Parcela significativa dos Ministros que compõem a Corte tem entendido que a transcrição do inteiro teor da fundamentação do acórdão recorrido não satisfaz a exigência legal, acarretando o não conhecimento do recurso.
É o que se verifica dos precedentes abaixo:
Na presente situação, a transcrição do acórdão, integralmente, sem a delimitação do ponto de insurgência objeto das razões do recurso de revista - mediante o destaque do trecho em que foram adotados os argumentos do acórdão regional para o deslinde da controvérsia -, não atende ao requisito previsto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, pois tal procedimento impede, por consequência, a observância dos demais requisitos contidos nos incisos II e III do artigo 896, § 1º-A, da CLT, em especial, no que se refere à demonstração analítica (que se faz por meio da argumentação) entre os dispositivos e verbetes apontados como violados e o trecho da decisão destacada no apelo, bem como a comprovação da especificidade dos arestos transcritos para o confronto de teses, conforme preceitua o § 8º do aludido dispositivo e o entendimento contido na Súmula nº 337, I, “b”, do TST.
(AIRR - 760-76.2014.5.03.0186 , Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 27/04/2016, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 29/04/2016) (grifei)
Com efeito, no que toca à indicação do trecho de prequestionamento da questão objeto de insurgência recursal, o entendimento nesta Corte Superior é o de que cabe à parte recorrente, de fato, transcrever o trecho em questão, com vistas a revelar de forma clara e inequívoca a parcela da decisão recorrida que contenha o pronunciamento explícito da Corte Regional.
Ressalta-se, que a exigência processual em questão é direcionada às partes litigantes, de forma que o ônus acerca do cumprimento desse requisito recai sobre o recorrente, não cabendo ao julgador proceder ao exercício de averiguação subjetiva ou interpretativa acerca da satisfação desse pressuposto recursal.
Registra-se, também, que, ressalvando-se a hipótese em que a decisão atacada seja lacônica, a transcrição da íntegra do acórdão recorrido, com a manutenção da prática de impugnação genérica e dissociada, que era usual na vigência do regramento anterior, sem que a parte tenha o cuidado de delimitar o respectivo trecho em que tenha sido apreciada a questão objeto do seu inconformismo, não atende à exigência acrescentada pela Lei nº 13.015/2014.
(AIRR - 1522-67.2014.5.10.0002 , Relator Ministro: José Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 16/03/2016, 2ª Turma, Data de Publicação: DEJT 18/03/2016)
Mas há precedentes contrários:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. DENEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO DE REVISTA COM FUNDAMENTO NO ARTIGO 896, § 1º-A, I, DA CLT. INDICAÇÃO DO TRECHO DA DECISÃO RECORRIDA QUE CONSUBSTANCIA O PREQUESTIONAMENTO DA CONTROVÉRSIA OBJETO DO RECURSO DE REVISTA. Nos termos do artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, incluído pela Lei nº 13.015/2014, é ônus da parte, sob pena de não conhecimento, "indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista". No caso, não há falar em observância do requisito previsto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, porque se verifica que a reclamada, nas razões do seu recurso de revista, não indicou precisamente as folhas, tampouco transcreveu a ementa, o inteiro teor ou o trecho pertinente da decisão atacada que consubstancia o prequestionamento da matéria recorrida. Agravo de instrumento conhecido e não provido.
(AIRR - 21442-12.2013.5.04.0331 , Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 30/09/2015, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 02/10/2015)(grifei)
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.015/2014 - PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA - DANOS MORAIS E MATERIAIS - CARACTERIZAÇÃO E QUANTUM INDENIZATÓRIO - OBRIGAÇÃO DE FAZER - FORNECIMENTO DE PLANO DE SAÚDE - CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL O recurso não indica o trecho ou o inteiro teor da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do Recurso de Revista, que desatende ao disposto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT. Agravo de Instrumento a que se nega provimento.
(AIRR - 127-23.2012.5.20.0005 , Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 30/09/2015, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 02/10/2015)(grifei)
Se há precedentes que consideram que a transcrição do inteiro teor não atende à exigência legal, há outros no sentido de que também não o faz a transcrição de um trecho muito curto do acórdão recorrido:
Na presente situação, o fragmento do julgado colacionado pela parte recorrente (fl. 287, primeiro parágrafo) não representa, em específico, o prequestionamento da controvérsia objeto das razões do recurso de revista, uma vez que se trata apenas do parágrafo final do acórdão recorrido, que não contém os fundamentos jurídicos adotados no julgamento da matéria, tampouco os aspectos fáticos correlatos.
(AIRR - 2763-24.2012.5.02.0017 , Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 03/02/2016, 7ª Turma, Data de Publicação: DEJT 12/02/2016)
A expressão “trecho da decisão recorrida” guarda certo grau de subjetivismo, e não tem sido interpretada de modo uniforme dentro do TST, o que gera insegurança na parte quanto ao atendimento do requisito legal nesse aspecto.
Parece haver excesso de rigorismo por parte do TST, característico da jurisprudência de defesa formada quanto à admissibilidade do recurso de revista, uma vez que a redação do § 1º-A do art. 896 da CLT não faz qualquer restrição quanto à indicação de toda a fundamentação da decisão recorrida.
Se a indicação ou transcrição efetuada pelo recorrente é pertinente ao tema objeto do recurso, havendo menção aos dispositivos legais ou constitucionais violados, ou à questão objeto da divergência jurisprudencial, o recurso deve ser conhecido.
A indicação de um trecho demasiadamente longo, por excesso de zelo do recorrente, ou muito curto, por excesso de confiança, não pode acarretar para o recorrente a mesma consequência da falta de indicação de trecho qualquer: o não conhecimento do recurso.
PRESSUPOSTO EXTRÍNSECO DO RECURSO DE REVISTA
Consideramos que o novo requisito de admissibilidade criado pela Lei 13.015/2014 deve ser classificado como pressuposto extrínseco do recurso de revista.
Pressupostos extrínsecos do recurso são aqueles de natureza meramente formal, que podem ser analisados de modo objetivo, como a tempestividade, o preparo, o depósito recursal, a regularidade formal.
Se observarmos atentamente a redação do § 1º-A do art. 896 da CLT, podemos verificar que os três pressupostos ali previstas não estão agrupados ao acaso.
Ao contrário. As três hipóteses mencionadas no § 1º-A do art. 896 da CLT foram inseridos pelo legislador no mesmo dispositivo pois têm a mesma natureza - dizem respeito à regularidade formal do recurso de revista, abrangendo:
a) a indicação o trecho do prequestionamento;
b) a indicação do dispositivo legal violado ou da súmula ou orientação jurisprudencial contrariada;
c) a impugnação da decisão recorrida, em atendimento ao princípio da dialeticidade.
Não há dúvidas de que a regularidade formal, sob quaisquer dos seus aspectos, tem natureza de pressuposto extrínseco.
Assim, nos parece claro que a indicação do trecho do prequestionamento ostenta essa natureza de pressuposto extrínseco, diferenciando-se do prequestionamento em si, este sim caracterizado como pressuposto intrínseco do recurso de revista.
A distinção é relevante, à medida que a revisão dos pressupostos extrínsecos do recurso é possível por meio de embargos de declaração e de embargos de divergência (art. 897-A da CLT e Súmula 353 do TST), o que não se dá quanto aos pressupostos intrínsecos.
CONCLUSÃO
A partir da vigência da Lei 13.015/2014, foi criado o novo pressuposto de admissibilidade do recurso de revista, consistente na indicação do trecho do acórdão recorrido que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso (art. 896, § 1º-A, I, da CLT).
O prequestionamento consiste no debate, no enfrentamento, de determinada questão na decisão impugnada, e é decorrência lógica das próprias hipóteses de cabimento do recurso de revista.
Uma vez que o inciso I do § 1º-A do art. 896 da CLT fala em “indicar” o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento, é errônea a interpretação de que somente atende o requisito legal o recorrente que “transcreve” nas razões do recurso de revista o trecho do acórdão recorrido que consubstancia o prequestionamento.
“Trecho da decisão recorrida” deve ser entendido como um seu excerto, um fragmento, uma parte. A expressão guarda certo grau de subjetivismo, e não tem sido interpretada de modo uniforme dentro do TST. A indicação de um trecho demasiadamente longo, por excesso de zelo do recorrente, ou muito curto, por excesso de confiança, não pode acarretar para o recorrente a mesma consequência da falta de indicação de trecho qualquer: o não conhecimento do recurso.
O novo requisito de admissibilidade criado pela Lei 13.015/2014 deve ser classificado como pressuposto extrínseco do recurso de revista.
[1] Moreira, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V: arts. 476 a 565., 9ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
[2] http://houaiss.uol.com.br/busca?palavra=indicar. Acesso em 13/05/2016.
[3] http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/definicao/indicar%20_982915.html. Acesso em 13/05/2016.
[4] http://michaelis.uol.com.br/moderno/portugues/definicao/trecho%20_1058260.html. Acesso em 13/05/2016.
[5] http://houaiss.uol.com.br/busca?palavra=trecho. Acesso em 13/05/2006.
Advogada da União. Especialista em Direito do Trabalho. Foi Analista Judiciária do STJ.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TORRES, Caroline de Melo e. Indicação do trecho do prequestionamento no Recurso de Revista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 jun 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46768/indicacao-do-trecho-do-prequestionamento-no-recurso-de-revista. Acesso em: 23 dez 2024.
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