Professor orientador:
RODRIGO GUENA.
RESUMO: Este trabalho tem como tema central o estudo do desenvolvimento da Lei Falimentar, no tocante a recuperação judicial e extrajudicial das empresas falidas no Brasil. Desta forma, foi feito um levantamento histórico, com início na Antiguidade, até alcançar o Direito Falimentar Brasileiro, na atualidade, possibilitando compreender a evolução da lei de falências, a influência de outros ordenamentos jurídicos, sobretudo a necessidade de alterações que acompanhassem o crescimento da sociedade. Desta maneira, a pesquisa desenvolvida permitiu o entendimento da experiência vivida pela sociedade e pelos juristas, durante as modificações aplicadas na lei falimentar. Destaca-se as principais diferenças entre o instituto da concordata, presente no decreto-lei de 1945, e a recuperação judicial e extrajudicial, da lei de falências nº. 11.101 de 2005, além dos motivos que levaram a necessidade da criação desta última. Na pesquisa, são levantadas as características, requisitos, legitimados, meios, conteúdo do pedido, fases e todo o procedimento da recuperação judicial e extrajudicial, a fim de demonstrar a eficácia deste processo. Esperamos contribuir para que a cada dia haja mais segurança na busca de um futuro com a maior segurança jurídica possível para empresários e credores que estejam submetidos ao plano de Recuperação Judicial e Extrajudicial ou até mesmo a falência.
Palavras-chave: lei falimentar; concordata; processo de recuperação empresarial.
Abstract : This work has as its central theme the study of the development of Insolvency Law, with regard to judicial and extra-judicial recovery of bankrupt companies in Brazil. This way, was made a historical survey, beginning in ancient times, until you reach the insolvency law, in actuality, enabling to understand the evolution of the law of bankruptcies, the influence of other jurisdictions, particularly the need for changes that accompany the growth of society. The research developed allowed the understanding of the experience by society and by lawyers during the modifications applied in insolvency law. We highlight the main differences between the bankruptcy protection, present in the law of 1945, and the judicial and extra-judicial recovery, bankruptcy law number 11,101 of 2005, in addition to the reasons that led to the necessity of creation of the latter. In the search, are raised the characteristics, requirements, legitimized, media, content of application stages and the entire procedure of judicial and extra-judicial recovery in order to demonstrate the effectiveness of this process. We hope to contribute to that every day there is more security in search of a future with the greatest possible legal certainty to businessmen and lenders who are subjected to Judicial and extrajudicial recovery or even bankruptcy.
Key-words: insolvency law; bankruptcy protection; judicial and extra-judicial recovery.
1 - INTRODUÇÃO
Este projeto de pesquisa tem como tema central um estudo acerca do desenvolvimento histórico do processo de recuperação judicial e extrajudicial das empresas falidas no Brasil. Desta forma, será efetivado um levantamento cronológico e analítico sobre o contexto histórico em que fora criada a lei de falências, bem como sobre a maneira em que fora incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro, ao longo dos anos, pautando-se em duas hipóteses: lenta, com inúmeras controvérsias, ou rápida, de decisão unânime. Este estudo manterá foco especial no tocante à recuperação judicial e extrajudicial, e os meios com que viabiliza a superação de crises econômico-financeiras dos devedores.
A pesquisa analisará aspectos históricos nos âmbitos sociais, econômicos, político da eficácia da lei de falência, também levantará as novas necessidades que surgiram ao longo do tempo, para que fosse criada no século XXI, a “Nova Lei Falimentar”, e as alterações quanto à recuperação judicial e extrajudicial. Com essa pesquisa, investigaremos a existência ou não de lacunas no processo de recuperação judicial. Assim, caso haja, serão viabilizadas possíveis soluções em prol de preenchê-las.
Através desse processo de investigação do desenvolvimento da recuperação judicial e extrajudicial no território nacional, buscaremos analisar historicamente a eficácia do Direito Falimentar, e descobrir se as leis realmente cumpriram a função de fazer com que o empresário se restabeleça e que consiga produzir seu papel de acordo com o ordenamento jurídico, com os princípios constitucionais e também, com os princípios que regem a atividade empresarial: livre iniciativa, dignidade da pessoa humana, boa-fé, soberania nacional, propriedade privada, função social da empresa, livre concorrência, defesa do consumidor, entre outros.
2 - DESENVOLVIMENTOS (REFERENCIAL TEÓRICO)
Ao longo da história da humanidade, a ação de cobrar um devedor, quer fosse ele pessoa física ou uma sociedade passou por diversas transformações, ganhando formas diversas de acordo com a época e com a sociedade pesquisada, sendo assim, em umas breves notas trataremos das condições históricas do adimplemento das obrigações.
Na antiguidade, o adimplemento obrigacional sempre foi motivo de grandes preocupações, quer no âmbito comercial, como no âmbito social. Nas civilizações antigas, o credor tinha poder de coagir fisicamente o devedor, a fim de que este viesse a cumprir sua dívida. O devedor poderia ser preso, escravizado e até morto, caso não adimplisse sua obrigação. Na Índia, segundo o Código de Manu, o credor tinha a faculdade de submeter o devedor ao trabalho escravo, mas sem excessos brutais. Seu débito era acrescido de mais cinco por cento em caso de confissão e de dez por cento se o negas. Vale lembrar que, há divisão da sociedade em castas, portanto, as castas superiores obtinham vantagens na forma do pagamento, podendo realizá-las em prestações, de acordo com as suas possibilidades. No Egito, admitia-se escravidão por dívidas, felizmente, não perdurou por muito tempo.
A execução era feita sobre as dívidas do devedor, mas como muitas vezes insuficientes, possibilitou ao credor, após a morte do devedor, tomar o cadáver deste, a fim de privá-lo das honras fúnebres. Logo, coagiam-se moralmente os parentes e amigos a resgatar o cadáver e adimplir com a obrigação. Entre os judeus, de acordo com o dever da caridade, o rico devia atenção ao pobre. Não havia, portanto, o sistema de coação física sobre o devedor. Na Grécia, a execução das dívidas importava servidão pessoal do devedor ao credor e, se não viesse a cumprir a condenação judicial, o credor poderia alienar o devedor e até mata- lo. Na Idade Média, a partir do século XIII, forma-se, com base no Direito Romano e Canônico, um Direito Comum. Através dos usos e costumes, constitui-se o Direito Comercial, de sentido informal e cosmopolita. Os princípios do instituto da falência e o processo de execução surgem no Direito Romano. O Direito Romano é dividido em duas fases: a antiga e a clássica. Durante a fase antiga, surgiu a Lei das XII Tábuas.
Cujo processo de execução era corpóreo, pessoal e não patrimonial. Verifica-se o princípio da manus injectio, a qual o credor tinha a faculdade de atingir corporalmente o devedor. Inicialmente, o devedor deveria confessar sua dívida diante do magistrado, sendo-lhe concedido o prazo de trinta dias para reparar o dano. Acaso não satisfizesse a dívida no período estipulado, o mesmo seria apreendido e conduzido novamente à presença do magistrado. Seria possível que um terceiro, em prol de evitar a apreensão do devedor, assumisse a responsabilidade da dívida, todavia, se ninguém se apresentasse como vindex, o credor poderia levá-lo consigo, amarrando-o com uma corda, ou algemando lhe os pés. Assim, o devedor era adjudicado ao credor, que podia tê-lo em casa por sessenta dias. Durante esse tempo, o devedor poderia manter seu patrimônio e se sustentar, entretanto, se não o possuísse, cabia ao credor sustentá-lo, obrigatoriamente.
Haveria também, a possibilidade da formação de uma espécie de contrato denominado nexum, pelo qual o devedor obrigava-se voluntariamente a prestar serviços ao credor como escravo, com o intuito de satisfazer sua dívida.
VII Jornada de Iniciação Científica - 2011
Decorridos os sessenta dias, na ausência de pacto entre as partes a respeito da dívida, o devedor era conduzido à feira, e após a terceira feira, se ninguém o solvesse, era condenado à morte ou vendido ao estrangeiro. Ocorrendo a pluralidade de credores, dividia-se o corpo do devedor, cujo cadáver servia de gozo aos credores, por pensarem assim perseguirem-no na outra vida. Portanto, a partir da Lei das XII Tábuas, se delinearam a execução singular e a execução coletiva, grande contribuição do direito romano às instituições brasileiras. Surgem, posteriormente, dois procedimentos de execução patrimonial: pignoris capio e missio in possessionem. Pela primeira, o credor tinha possibilidade de aparar o que lhe era devido, através da apreensão de bens do devedor. A missio in possessionem foi precedida pela Lex poetelia papiria, no ano de 428 ou 441 a.C., pela qual foi abolida a manus injectio. Nela, os bens do devedor passam a constituir a garantia dos credores, ao invés do corpo. A missio era um meio hábil para concretizar-se a bonorum venditio, instituto atribuído a Rutilio Rugo, em meados do ano 636. Através desse sistema, os bens do executado eram alienados a terceiro: o pretor convocava os credores para escolher o magistrado, que ficava encarregado do bonorum venditio, isto é, como vendedor dos bens do insolvente. A concessão a mission in bona dependia da confissão da dívida, da fuga ou ausência do devedor. Se o devedor não adimplisse com a obrigação devido à fuga ou ocultação, considerava-o morto, escolhendo um sucessor universal no ativo e no passivo, devendo pagar aos credores. Através desse mecanismo que se delineia o instituto da falência. Na segunda fase do direito romano, denominada clássica, surgem alguns institutos que revelam traços do procedimento concursal.
O Lex Julia
Introduz no ordenamento a bonorum cessio, vindo a possibilitar o abandono do patrimônio dos devedores aos credores, para saldar suas dívidas. O devedor perdia a administração de seus bens, que passavam ao curator, nomeado pelo magistrado. O credor publicava a missio para que outros credores pudessem vir a concorrer, dentro de trinta dias. Acaso passado esse prazo, o devedor não solvesse seus compromissos, o curator alienava ao melhor ofertante o patrimônio do devedor e que o sucedia, respondendo, consequentemente, pelas obrigações assumidas pelo devedor. Se o devedor preferisse, podia usar da bonorum cessio, isto é, fazer cessão de seus bens ao credor que podia vendê-los separadamente por intermédio do curator a fim de pagar, em rateio aos demais credores. Através deste princípio, o devedor evitava a execução pessoal e a infâmia e não poderia rejeitar-se de novo a execução, salvo por aquisição de novos bens.
Segundo Rubens Requião
É possível notar a influência que o direito romano exerceu, através das instituições medievais que o acolheram em grande parte, no direito moderno. O desapossamento dos bens do devedor, a concorrência dos credores disputando preferência ou rateio, a arrecadação dos bens postos sob a administração do magister ou curator (sindico) a venda pública dos bens sob a supervisão do magistrado e tantos outros procedimentos, são técnicas de direito substancial e de direito formal, que perduram nos modernos processos de falência. Na Idade Média, através da invasão bárbara no Império Romano, surgiu um mecanismo baseado na execução individual, efetuado sobre o sujeito ou sobre seus bens móveis, caso fosse solvente ou insolvente, respectivamente. O regime predominante era o corporativo, portanto os imóveis eram excluídos deste sistema. Em casos de fuga do devedor, seus bens eram sequestrados, possibilitando após determinado prazo, a venda dos bens em prol da satisfação dos credores.
No estatuto da cidade de Verona
No início do século XIII, que se esboçaram as primeiras regras que vieram a constituir o instituto da falência, como típica execução patrimonial, semelhantes às aplicadas atualmente.
Carvalho de Mendonça
Afirmou que, “o velho direito italiano constituiu o laboratório da falência moderna”. Embora fossem reprimidos os abusos de caráter privado no processo de execução, ainda assim permaneceram os castigos extremamente cruéis para os devedores falidos, encorajando a fuga destes. Assim, a fuga do devedor acabou por transformá-la em pressuposto do estado de falência.
Já no século XV, surgiu uma espécie de concordata que homologava um acordo amigável feito com a maioria dos credores; estabeleceu-se o salvo-conduto, permitindo ao devedor retornar para a conclusão da concordata. Poderia ocorrer falência em três hipóteses: fuga do devedor (exposto acima); requerimento do credor, devendo provar sua condição de credor e demonstrar insolvência do devedor; ou pedido do próprio devedor (autofalência).
Nelson Abrão
Citou, a falência surgiu dos estatutos medievais das cidades italianas com o escopo de, por meio de um processo expropriatório global dos bens do devedor, comerciante ou artesão, fugitivo, ou que se ocultava, presumindo-se, por isso, sua insolvência, lograr-se um resultado solutivo, isto é, de pagamento dos credores. Os princípios do direito estatuário italiano penetraram na França, principalmente nas cidades de Leão e Champagne, que mantinham intenso comércio com as cidades italianas. Da ordenação de Colbert as normas sobre falência passaram ao Código Comercial Francês de 1808, sendo notável o papel preponderante de Napoleão na elaboração dessa parte do Código Comercial de França. Tal código era dotado de extrema severidade e intolerância, tornando-se conhecidos por toda a parte. Uma lei de 1838 modificou os dispositivos do código, fazendo desaparecer as medidas excessivas, embora conservasse o espírito e a essência da técnica de 1807. Em 1889, outra lei criou um processo paralelo – a liquidação judicial – visando a beneficiar os devedores infelizes e de boa-fé, vítimas do progresso econômico, porque não souberam adaptarem-se as novas mudanças e enfrentar poderosos concorrentes, em consequência, levados a ruína. Posteriormente, em 1955, foi suprimida a liquidação judicial e criado o regulamento judicial.
A partir de 1965
Nova legislação veio alterar a situação: toda pessoa moral de direito privado, mesmo não comerciante, que cessa seus pagamentos, deve em quinze dias, declarar que deseja a abertura de um processo de regulamento judicial ou de liquidação de bens. Tais processos podem ser também abertos por um credor, qualquer que seja a natureza de seu crédito. Vale dizer que, a legislação francesa constitui-se em modelo para as legislações falimentares de grande parte dos países da Europa continental e dos latino-americanos. Sabemos que o Brasil era colônia de Portugal, portanto sujeitavam-se as regras jurídicas estabelecidas por ele. Em Portugal, vigoravam as Ordenações do Reino, ressaltando-se em todas elas o aspecto punitivo em relação ao devedor denominado quebrado.
Nas Ordenações Afonsinas
Embora predominasse os princípios do direito romano, na parte sobre falências, reproduzia o direito estatuário italiano, considerando tal instituto como parte do direito criminal. As Ordenações Manuelinas mantiveram a parte sobre falências no mesmo estado. Entretanto, em 13 de novembro de 1756, nas Ordenações Filipinas foram criadas um alvará considerado importante marco legislativo, servindo de modelo a terceira parte do nosso Código Comercial. Segundo o autor Amador Paes de Almeida, “este alvará baseava-se em quatro princípios: impontualidade na falta de pagamento em dia (ponto, a parada total de pagamento); quebra (impossibilidade de pagar suas obrigações); bancarrota (quebra fraudulenta)”. O processo de falência tornou-se nítido e acentuadamente mercantil, em juízo comercial, exclusivamente para mercadores, comerciantes ou homens de negócios. Foi também instituído a inducia moratória, que era decretada pelos soberanos, e a inducia creditória ou compromisso, que era a concordata. Proclamada a Independência, continuou o país a reger-se pelas leis portuguesas. O primeiro diploma legal que disciplinou o instituto da falência foi o Código Comercial Brasileiro de 1850, dedicando ao tema sua terceira parte intitulada “Das quebras”.
Nesse período o que caracterizava as falências era a cessação de pagamentos. O sistema do Código Comercial não satisfez as suas finalidades, devido a sua lentidão, complexidade, vinda a prejudicar credores e devedores. A segunda fase histórica do nosso instituto iniciou-se com a Proclamação da República, tendo o Governo Provisório revogado inteiramente as disposições sobre falências do Código Comercial. De acordo com J. C. Sampaio Lacerda, “essa fase caracteriza a falência por atos ou fatos previstos na lei e na impontualidade no pagamento de obrigação mercantil liquida e certa, no seu vencimento, tendo instituído os meios preventivos: a moratória, a cessão de bens, o acordo extrajudicial e a concordata preventiva”. A má aplicação da lei, agravada pela crise econômica do período (O Encilhamento) geraram sua derrogação. Surgiu a Lei nº 859, de 1902, máxime pela nomeação do síndico provisório e de uma comissão fiscal de lista organizada pela Junta Comercial, ou, onde não existissem pelos comerciantes maiores contribuintes de fisco. Tal lei causou tantos escândalos que houve a necessidade do Congresso substituí-la. Em 17 de dezembro de 1908, foi promulgada a Lei n. 2024, a qual dá inicio a terceira fase estendendo até a atualidade. Segundo Nelson Abrão, a lei possuía as seguintes características: impontualidade como caracterizadora da falência; enumeração das obrigações cujo inadimplemento denota a falência; alinhou os chamados atos falimentares, a exemplo do direito inglês; suprimiu a concordata amigável, admitida só a judicial; conceituou os crimes falimentares e estabeleceu que o procedimento penal corresse em autos apartados e, a partir do recebimento da denúncia perante o juiz criminal; determinou a escolher de um até três síndicos, conforme o valor da massa, entre os credores. Em 1939, Trajano Miranda Valverde apresentou um anteprojeto de lei de falência, o qual não teve o andamento esperado. Suas propostas tinham o objetivo de amparar o devedor honesto, punir severamente o devedor desonesto, criar autonomia da concordata em relação à vontade dos credores, além de reduzir a administração da falência ao sindico com os deveres que eram do liquidatário. Em 1943, o Ministro da Justiça Alexandre Marcondes Filho ofereceu um novo anteprojeto que se tornou vigente no decreto-lei n. 7661 de 1945.
A lei eliminou a figura do liquidatário
A concordata preventiva não ficou mais na dependência dos credores. Instaurou o processo falimentar com o processo criminal, na hipótese de crime falimentar, fornecendo desde logo índices para o tratamento severo ou tolerante do falido na esfera civil. O decreto-lei de 1945 vigorou no Brasil durante meio século, até que enfim, devido o grande desenvolvimento do país e os progressos da ciência jurídica, fosse decretada a nova lei de falências nº. 11.101 de 2005, a qual extinguiu tanto a concordata preventiva quanto a suspensiva, introduzindo a forma moderna da recuperação da empresa.
ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Concordata. São Paulo: Saraiva 2000.
3 - MÉTODOS
Os documentos utilizados para a pesquisa foram livros de grandes autores, cujas obras possibilitaram uma maior compreensão acerca do desenvolvimento da Lei Falimentar e suas transformações, de forma a atender as necessidades da sociedade. Também foi analisada a lei 11.101/2005, além dos comentários de pesquisadores e doutrinadores acerca dos artigos presentes nesta legislação, especificamente no que concerne a recuperação judicial e extrajudicial.
4 - RESULTADOS E DISCUSSÃO
Seguirá agora a apresentação e análise comparativa das principais características técnicas da velha e nova Lei de Recuperação de Empresas. Objetiva-se com esse estudo, demonstrar as causas que levaram a extinção do antigo regime da concordata e a criação do instituto de recuperação judicial e extrajudicial. Durante décadas, o instituto da concordata representou a maior possibilidade de soerguimento da atividade de um devedor infeliz de boa-fé em uma situação de liquidez. Destinava-se a suspender (concordata suspensiva) ou prevenir (concordata preventiva) a falência do empresário ou sociedade empresária, mediante proposta de pagamento - à vista ou a prazo - dos valores devidos aos credores quirografários. Os efeitos da concordata estendiam somente aos credores quirografários, presentes ou não no processo, residentes no país ou fora dele. Nenhuma outra classe de credores, dentre eles trabalhistas e tributários, estava submetida aos efeitos jurídicos que lhe eram próprios. Aos credores destituídos de qualquer privilégio ou preferência legal, restava simplesmente suportar os ônus decorrentes da concordata. Recebiam o seu crédito (quando recebiam) em 24 meses, sendo que a lei estabelecia que pelo menos 2/5 fossem pagos ao final do primeiro ano. Como qualquer outra solução para a situação de insolvência, a concordata sofria diversos inconvenientes: extremamente formal submissa a prazos intransigentes, não envolvendo todos os credores; deixava de fora os débitos fiscais, os encargos trabalhistas e as dívidas bancárias, a fim de abranger somente o pagamento dos créditos dos fornecedores.
Pressupõe-se que, a concordata não recuperava a empresa, mas prorrogava sua agonia, já que não alcançava os verdadeiros problemas das empresas. Em consequência da sua lentidão, crescente número de falências insolúveis e concordatas fracassadas, inegável desconfiança que substituía o crédito e do amplo descontentamento reinante no mercado, houve a necessidade de uma reforma na lei falimentar, de forma a suprir as lacunas do velho instituto. Assim, com o decreto da nova lei de falências nº. 11.101 de 2005 surgem à recuperação judicial e extrajudicial, cujas regras têm outro direcionamento: preservar as atividades de empresas viáveis, ensejando que a médio e longo prazo fiquem assegurados os direitos dos credores, os empregos e a normalidade das relações que envolvem, de um lado, fornecedores e de outro, consumidores. Portanto, visa atender a manutenção da dinâmica empresarial, em seus três aspectos fundamentais: fonte produtora, emprego dos trabalhadores e interesses dos credores.
Obviamente, a exemplo da concordata, consiste em procedimento preventivo, pois tem a intenção de evitar a situação da falência, todavia, persegue um objetivo muito mais amplo. Busca-se não apenas resolver o passivo, mas também permanecer ativa. Na recuperação, os credores não se restringem a concordar ou não com a proposta, podem conhecer a verdadeira situação do devedor, revendo propostas e sugerindo alternativas.
O processo de recuperação, tanto judicial como extrajudicial, é uma intervenção dos credores na empresa do devedor, a pedido deste. As duas espécies têm por escopo não o mero prolongamento de dívidas, mas a remoção das causas da crise econômico-financeira da empresa, para que possa resolver seus débitos, sem que isso implique sua desaparição.
Professor Waldo Fazzio Junior
Destacou a flexibilização dos procedimentos preventivos; ampliação da participação dos credores; maior amplitude nas possibilidades de acordo entre credores e devedor; manutenção do privilégio dos créditos trabalhistas e acidentários; adoção de novos mecanismos para superação das crises empresariais; mitigação da função jurisdicional; simplificação dos procedimentos; e reformulação da função administrativa.
CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte, MG: Del Rey, 2007.
5 - RECUPERAÇÕES JUDICIAIS.
5.1 - A recuperação judicial é uma ação de conhecimento, cujo fim é sanear a situação gerada pela crise econômico-financeira da empresa devedora, levando em conta a concretização da função socioeconômica desta, em todos os seus aspectos. O diploma legal da recuperação judicial, estabelece apenas uma normação essencial: iniciativa do processo reservada ao devedor que exerça atividade a mais de dois anos de forma regular (artigo 48). Desta forma, tudo mais é passível de qualquer espécie de acordo entre credores e devedor.
5.2 - A recuperação judicial é um ato complexo, pois abrange um ato coletivo processual, um favor legal e uma obrigação ex lege. É ato coletivo processual, porque as vontades do devedor e de seus credores formam uma única vontade, sob direção e fiscalização do poder Judiciário. Favor legal, pois garante ao devedor o direito de sanear o estado de crise econômico-financeira em que se encontra com a finalidade de salvar o negócio, manter o emprego dos trabalhadores, respeitar os interesses dos credores e reabilitar-se. Por último, é uma obrigação ex lege porque, concedida pelo juiz, mediante sentença, implica novação dos créditos anteriores ao pedido, além de obrigar devedores e credores a ela sujeitos.
5.3 - Os princípios pautados pela recuperação judicial são: conservação e função social da empresa; dignidade da pessoa humana e valorização do trabalho; segurança jurídica e efetividade do direito, de acordo com o artigo 47. Somente quem está exposto ao risco de ter a falência decretada poderá requerer a recuperação judicial, pois o objetivo de tal medida é preservar o devedor da falência. Cabe ressaltar que, o devedor terá que ter interesse ou vontade em fazê-lo, logo, ocorrerá somente se o titular da empresa em crise quiser. Os legitimados para o pedido de recuperação judicial são as sociedades empresárias e o empresário individual. Todavia, não basta ser exercente de atividade econômica exposta ao risco de falência, devendo atender a mais quatro requisitos: Pelo primeiro, a empresa não pode estar falida, já que apenas os devedores em estado de pré-falência podem ser socorridos pela recuperação judicial. Segundo, terá que atender a um tempo mínimo de exploração da atividade econômica exigido: mais de dois anos. Presume-se que, a importância da empresa para a economia local, regional ou nacional não se consolida em menos de dois anos.
Por tal razão, é exigida a demonstração da inscrição da firma ou do arquivamento dos atos constitutivos no Registro de Empresas, bem como a apresentação dos livros obrigatórios. Pelo terceiro requisito, não se legitima o pedido de recuperação judicial ao devedor que a tenha obtido a menos de cinco anos. Se já foi concedida a sociedade empresária a recuperação judicial nesse período, e novamente necessita ser socorrida, sugere falta de competência suficiente para a exploração da atividade econômica em foco. Em relação às microempresas e empresas de pequeno porte, o prazo é maior (oito anos), para que nova habilitação seja considerada.
5.6 - Por fim, o quarto requisito determina que, o sócio controlador e nenhum dos administradores pode ter sido condenado pela prática de crime falimentar.
Para vencer tais dificuldades, é necessário prever meios ou medidas de reorganização, como o fez a Lei de Recuperação Judicial, apresentando mais de duas dezenas de modos ou meios de recuperação judicial.
Caberá ao empresário individual ou a sociedade empresária, junto com o advogado e outros profissionais, analisar os meios de recuperação eficazes no reerguimento da atividade econômica em determinada empresa.
Dentre eles cabe ressaltar:
- Dilação do prazo ou revisão das condições de pagamento, na qual a chance de reorganização é representada com o abatimento no valor de suas dívidas ou o aumento do prazo de vencimento. Este é o meio que mais se aproxima do instituto da concordata preventiva, se diferenciando, pois vincula os credores de maneira geral e não apenas o quirografário como ocorria na concordata; ausência de prazos máximos e percentuais mínimos na recuperação judicial.
- Operações societárias - cisão, incorporação, fusão, transformação. -Cabendo ao devedor contextualizá-las num plano econômico que mostre como sua efetivação poderá acarretar as condições para o reerguimento da atividade.
- Alteração total ou parcial do controle societário. No primeiro caso, opera-se a venda do poder de controle; no segundo, a admissão de novo sócia no bloco controlador. - Reestruturação da administração, já que geralmente, o motivo das dificuldades econômicas é a falta de condições ou competência para os administradores realizarem cortes de pessoal e de despesas, modernizarem o estabelecimento empresarial ou aperfeiçoarem os recursos disponíveis.
- Transferência ou arrendamento do estabelecimento, que significa à venda do estabelecimento para alguém com condições melhores de explorar a mesma atividade econômica de modo mais competente, ou a direção da atividade econômica passa as mãos de arrendador que está em melhores condições de promover sua recuperação.
- Usufruto de empresa, destinada a transferir a direção da atividade econômica em crise para alguém mais preparado e competente. O novo dirigente torna-se usufrutuário do estabelecimento empresarial, revertendo em seu beneficio os frutos da exploração deste. A ação de recuperação judicial é constitutiva, porque cria nova situação jurídica para o devedor e os credores a ela sujeitos. O processo da recuperação judicial se divide em: fase postulatória, fase deliberativa e fase de execução.
Na fase postulatória, o empresário individual ou a sociedade empresária em crise apresenta seu requerimento, por meio da petição inicial, e encerra com o despacho judicial mandando prosseguir o pedido. Por sua vez, na fase deliberativa, discute-se e aprova-se um plano de reorganização. Tem início com o despacho que manda processar a recuperação judicial e se conclui com a decisão concessiva do benefício.
Finalmente, na fase de execução, ocorrerá a fiscalização do cumprimento do plano aprovado. Termina com a sentença de encerramento do processo.
6 - RECUPERAÇÕES EXTRAJUDICIAIS.
O empresário ou sociedade empresária não precisa atender a nenhum dos requisitos da lei para a recuperação extrajudicial. Estando todos os envolvidos de acordo, assinam os instrumentos de novação ou renegociação, e assumem, por livre manifestação da vontade, obrigações cujo cumprimento proporcione o reerguimento do devedor.
Contudo, caso o devedor pretenda levar o acordo à homologação judicial, deverá atender as mesmas condições estabelecidas pela lei para o acesso à recuperação judicial: exercer atividade há mais de dois anos; não ser falido ou, se o foi, terem sido declaradas extintas suas obrigações por sentença transitada em julgado; não ter sido condenado ou não ter como administrador ou controlador pessoa condenada por crime falimentar; não se encontrar nenhum pedido de recuperação judicial dele; não lhe ter sido concedida, há menos de dois anos, recuperação judicial ou extrajudicial.
A respeito da desistência de adesão ao plano de recuperação extrajudicial, é vedada a desistência do credor, após a distribuição do pedido de homologação judicial, ao menos que os demais signatários concordem. Há duas espécies de homologação em juízo do plano de recuperação extrajudicial. A primeira, denominada facultativa, é a homologação do plano que conta com a adesão de todos os credores atingidos pelas medidas neles previstas. Assim, quando todos os credores concordam com o plano, a homologação judicial não é obrigatória para sua implementação.
Comentários à Lei de recuperação de empresas e falência. São Paulo: Saraiva 2005.
7 - FLUXOGRAMA DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
1º A empresa entra em uma situação de crise econômica financeira, não conseguindo honrar seus débitos em dia.
2º Empresa ingressa no judiciário com pedido de recuperação judicial.
3º O juiz pode ou não deferir o pedido, caso o pedido seja deferido (um prazo de respiro), permite a manutenção da fonte de emprego dos trabalhadores, promovendo então a preservação da empresa e sua função social. É nomeado um administrador judicial como gestor como responsável.
4º A partir desse momento todas as ações dos credores que estavam cobrando dividas ficam suspensas por 180 dias. Prazo que a empresa tem para aprovar seu plano com os credores.
5º Nos 180 dias, vários atos são realizados, o mais importante é a assembleia geral de credores. Nela os credores e a empresa se reúnem para revisar as propostas, e colocar em votação em plano.
6º com o plano aprovado, a empresa ganha um novo folego e cumprindo todas as etapas previstas, poderá se recuperar e voltar às atividades normalmente.
8 - OS PRAZOS DA RECUPERAÇÃO JUDICAL
-Publicação do deferimento e do edital com relação de credores (art. 52 §1º) – 15 dias.
-Apresentação do plano (art. 53) e publicação do edital com a nova relação de credores (art. 7º §2º) – 45 dias, prazo para impugnação de crédito (art. 8º) 10 dias.
-Prazo para apresentar objeções ao plano (art. 55 caput) – 30 dias.
-Prazo para realização de assembleia geral de credores (art. 56 § 1º) – 60 dias.
-Final do prazo de 180 dias. Suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor (art.6º § 4º e art.52, III).
-Um dos avanços trazidos pela Lei 11.101/2005, que disciplina a recuperação judicial, extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, é dar margem à preservação da empresa como fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores.
Na busca dessa recuperação, vale a criatividade na negociação entre empresário e os credores, com a conversão da dívida em ações, participação no capital, fusão, incorporação. Tudo feito com transparência, num trabalho em equipe para fazer a empresa gerar receita e produzir riqueza. Veja o passo-a-passo de uma recuperação judicial.
8 - CONCLUSÃO
Diante do estudo realizado, é possível notar a grande evolução e progresso do Direito Falimentar nos mais diversos ordenamentos jurídicos, desvinculando-se da punição corpórea causada pelo inadimplemento da obrigação, e se aproximando da execução dos bens patrimoniais.
É perceptível a grande influência oriunda de países europeus em nossa legislação falimentar, principalmente do Direito Romano e Português, cujos resquícios se fazem presentes até os dias atuais. Verificamos que inicialmente, nosso Código Comercial, regido pelas leis portuguesas, não satisfez a necessidade da população, devido à lentidão, complexidade, vinda a prejudicar credores e devedores.
Após a criação das mais variadas leis, que não obtiveram sucesso, surgiu o decreto-lei de 1945, vigorando em nosso país durante meio século. Neste decreto, destacamos o instituto da concordata preventiva e suspensiva, as quais demonstraram extrema formalidade, submissas a prazos intransigentes, não envolvendo todos os credores, não recuperando todas as empresas, caracterizada pela lentidão e crescente números de falências.
O crescimento da população e do mundo globalizado, fez com que houvesse a necessidade de adaptar a lei de falências às transformações da sociedade. Assim, somente em 2005, é criada a lei 11.101, e a denominada recuperação judicial e extrajudicial. Ambas apresentam características da antiga concordata, todavia, buscam um objetivo muito mais amplo: não só resolver o passivo, mas permanecer ativa. Neste instituto, tudo é passível de acordo, entre os credores e devedor. Portanto, é possível concluir que, a lei de falências fora incorporada em nosso ordenamento jurídico lentamente, com inúmeras controvérsias, cujas leis não demonstraram a eficácia esperada, até que, com a recuperação judicial e extrajudicial, cumpriram o papel de fazer com que o empresário, além de adimplir suas obrigações com os credores, se restabelecesse. Cabe ressaltar que, se fazem presentes os princípios constitucionais e também aqueles que regem a atividade empresarial, dentre eles: conservação e função social da empresa; dignidade da pessoa humana e valorização do trabalho; segurança jurídica e efetividade do direito.
REFERÊNCIAS
Direito Falimentar. Editora: Saraiva 2010.
Campos Filho, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte MG: Del Rey, 2007.
Emerenciano & Baggio Advogados e Associados.
Lei de recuperação de empresas e falência. São Paulo: Saraiva 2005.
Bacharelando do Curso de Direito da Universidade Camilo Castelo Branco - UNICASTELO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIBEIRO, Mateus Rocha. Desenvolvimento histórico do processo de recuperação judicial e extrajudicial das empresas falidas no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jun 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46821/desenvolvimento-historico-do-processo-de-recuperacao-judicial-e-extrajudicial-das-empresas-falidas-no-brasil. Acesso em: 23 dez 2024.
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