Orientador: Thalita Toffoli Páez[1].
RESUMO: A sucessão envolve a ideia de substituição de um titular por outro, mantendo-se a continuidade das relações jurídicas, ocorre a modificação de sujeitos, mas subsiste o conteúdo; não há alteração na substância do direito, que já se acha integralmente constituído, mas encerrando-se com a morte o ciclo da atividade pessoal e patrimonial do seu titular, é preciso que este seja substituído no posto vago. No presente trabalho é analisada a sucessão hereditária do cônjuge no âmbito do Código Civil vigente. Realizado o estudo com base nas publicações mais relevantes para a pesquisa, concluiu-se que o cônjuge elevado à categoria de herdeiro necessário pode perfeitamente ser privado do direito sucessório, caso tenha praticado as causas taxativas que acarretam a exclusão pela indignidade, atingindo, assim, sua cota hereditária que vier a receber em concorrência com descendentes ou ascendentes; também sustentou-se pela alteração do dispositivo com a inclusão do cônjuge entre os sancionados pela deserdação, por inúmeras injustiças que a lacuna existente pode provocar, muito embora se tenha defendido que a separação judicial seja um caminho direto para exclusão do cônjuge da sucessão. Verificou-se ainda que, com o advento do atual Código Civil brasileiro, a tutela sucessória do cônjuge encontrou melhor estrutura normativa, privilegiando sua posição sucessória, elevando-o à categoria de herdeiro necessário.
PALAVRAS-CHAVE: Direitos de Sucessão. Novo Código Civil. Direitos do Cônjuge.
ABSTRACT: The sequence involves the replacement idea of the holder on the other, keeping the continuity of legal relationships, is subject to modification but remains content; there is no change in the substance of the law, which already finds himself fully built up, but ending with the death cycle of personal and property activity of its owner, it is necessary that this be replaced in the vacant post. In this paper we analyzed the hereditary succession of a spouse under the current Civil Code. Conducted the study based on the most relevant publications for research, it was concluded that the high spouse to the necessary heir category may well be deprived of inheritance law, if you practiced the exhaustive causes that lead to exclusion by the indignity, reaching thus his hereditary quota that may receive in competition with descendants or ascendants; also supported by the device change to include the spouse of the sanctioned disinheritance, for numerous injustices that the gap can cause, even though it has been argued that the legal separation is a direct path to exclusion of the spouse of succession. It was also found that, with the advent of the current Brazilian Civil Code, succession tutelage of spouse found better regulatory framework, favoring his succession position, elevating it to the necessary heir category.
KEY-WORDS: Rights of Succession. New Civil Code. Rights of Spouse.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 O DIREITO DAS SUCESSÕES. 2.1 Da Sucessão em Geral. 2.2 Das modalidades de sucessão. 3 DIREITOS DO CÔNJUGE. 3.1 O sujeito do casamento. 3.2 O cônjuge no direito sucessório. 3.2.1 Igualdade entre casados e conviventes. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
A sucessão hereditária do cônjuge no âmbito do Código Civil vigente foi levada a efeito pela promulgação da Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
O referido Código Civil, fruto de longo processo legislativo que, pode-se dizer, iniciou há mais de cento e cinquenta anos. Isto porque não se trata de uma criação, mas de uma revisão ao Código Civil de 1916.
Nesse sentido, há profundas inovações quanto a matéria relativa à sucessão do cônjuge e do companheiro. Foi esta, certamente, a maior alteração feita pelo novo Código em matéria de Direito das Sucessões. Melhorou muito o novo Código.
O direito das sucessões é tratado há muito tempo, tanto que no direito romano, fazia parte do “jus civile”, ao lado do direito das coisas e do direito de família. Assim, no princípio dos tempos, a sucessão dava-se no âmbito religioso, ou seja, o “de cujus” era sucedido, no comando do culto familiar. Ao varão mais velho, descendente do falecido, competia a direção da vida religiosa, doméstica e também do acervo dos bens da família.
Conforme destaca Delben, após, esta época, onde o patrimônio era familiar e não do morto, passou-se à propriedade individual, e assim, a preocupação passou em se deixar o patrimônio do falecido dentro das posses da sua família, para evitar a repartição daquele.
Já no período medieval, a sucessão não acontecia, vez que os bens eram do Estado, e só estavam sob a posse ilegítima do falecido, e com sua morte os bens voltavam para aquele.
E, por fim, no direito das sucessões dá-se o alinhamento do direito de família ao direito de propriedade, e aqui, a família não se preocupa apenas com a continuidade patrimonial, conquistados com a economia e com o trabalho, mas, sim, com a perpetuidade da família, agregando-se assim, a ordem sucessória entre os colaterais, cônjuges e recentemente, os companheiros.
Desse modo, no curso da história, viu-se que ora o patrimônio era relevante ora não, ora o que era sucedido era a direção da família e do culto religioso, ora os bens de família, isto quando esses não eram do Estado.
Viu-se com Pieri que o direito das sucessões sofreu inúmeras alterações no decorrer dos tempos, notadamente na classificação dos herdeiros conforme a ordem de vocação hereditária, determinada por lei e segundo uma hierarquia que coloca os sucessores em graus de preferência em relação ao sucessível e conforme a classe a que pertencem.
Esta ordem de vocação hereditária corresponde ao deferimento sucessório aos herdeiros legítimos, nos termos do artigo 1.786 do atual Código Civil, onde se dispõe que a sucessão se dá por lei ou disposição de última vontade. Assim, falecendo a pessoa sem testamento, o artigo 1.788 normatiza que se transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento, subsistindo a sucessão legítima se o testamento caducar ou for julgado nulo.
Dessa forma, não havendo testamento, a sucessão legítima é aplicada por inteiro ou na parte em que o testamento for omisso, fazendo-se o chamamento dos sucessores segundo a ordem de vocação hereditária.
Ainda segundo Pieri, foi justamente na alteração da ordem de vocação hereditária, por intermédio do artigo 1.829 do Código Civil vigente, que o legislador inovou o direito sucessório do cônjuge sobrevivo, incluindo-o como herdeiro necessário e concorrendo, em certas situações, com descendentes ou ascendentes. Para que seja reconhecido o direito sucessório ao cônjuge sobrevivo, o legislador impõe restrições, envolvendo o regime de bens do casamento, bem como, a distribuição da quota hereditária entre descendentes comuns, com a reserva da quarta parte ao cônjuge sobrevivo.
A nova posição sucessória é benéfica ao cônjuge sobrevivo; porém, as restrições impostas pelo legislador geram controvérsias doutrinárias, bem como pelo fato de que, ao inseri-lo como herdeiro necessário, esqueceu-se de harmonizar os demais dispositivos que tratam da matéria, notadamente os que cuidam da colação e deserdação, deixando lacunas na forma de aplicação ao cônjuge.
Sendo assim, com a inovação legislativa e as omissões existentes, imprime relevância a temática, motivo pelo qual no decorrer da presente pesquisa é demonstrado, com enfoque na sucessão legítima e utilizando-se de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, a forma de aplicação do direito sucessório ao cônjuge, ressaltando sua nova posição sucessória e a concorrência com descendentes, ascendentes e seus respectivos quinhões.
2 O DIREITO DAS SUCESSÕES
O Direito das Sucessões está previsto no inciso XXX do artigo 5º da Constituição Federal de 1988 no rol dos direitos e garantias fundamentais da pessoa humana. Conforme descrito por Cahale (2007, p. 23);
No Código Civil, a matéria é tratada no Livro V, em quatro títulos a saber:
Título I – Da sucessão em geral – (artigos 1.784 ao 1.828): disciplina as normas gerais pertinentes à sucessão legítima, à sucessão testamentária e à sucessão do companheiro; da herança e sua administração e à vocação hereditária. Estabelecendo regras que abrangem a abertura, transmissão, posse, titularidade, aceitação e renúncia da herança, dos excluídos da sucessão, da herança jacente e petição de herança;
Título II – Da sucessão legítima – (artigos 1.829 ao 1.856): regula a sucessão que se opera por força de lei, as regras atinentes à transmissão do patrimônio seguido de normas expressas descritas na ordem de vocação hereditária;
Título III – Da sucessão testamentária – (artigos 1.857 ao 1.990): contém disposições relativas à transmissão de bens para após a morte, por ato de última vontade;
Título IV – Do inventário e da partilha – (artigos 1.991 ao 2.027): trata das normas procedimentais pelas quais se efetua a partilha dos bens entre os herdeiros e normas pertinentes à colação e aos sonegados;
Livro Complementar - Das Disposições Finais e Transitórias do Código Civil - artigos 2.028 ao 2.046.
O referido autor também indica que, no Código de Processo Civil, a matéria é tratada sob o aspecto processual, nos artigos 982 ao 1.045, do Capítulo IX do Livro IV dos Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa.
A introdução da Lei n. 11.441, de 04 de janeiro de 2007, que alterou os artigos 1º e 2º, ambos da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973, facultando a realização de inventário e partilha consensual por via administrativa.
2.1 Da Sucessão em Geral
Com a morte da pessoa natural, abre-se a sucessão nos precisos termos da legislação civil, transmitindo-se aos herdeiros legítimos e testamentários o seu lugar nas relações jurídicas.
Conforme explanado por Cahale (2007), o patrimônio é objeto de direito que não se extingue com a morte, os sucessores sub-rogam-se nos direitos e obrigações sobre os bens do morto, excetuando-se tão somente aquelas relações jurídicas não patrimoniais, e as de caráter personalíssimo, que com o morto se extinguem.
Os herdeiros respondem pelos encargos deixados pelo morto no limite da quota herdada, conforme dispõe o art. 1.792 CC, com a seguinte redação: “o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança; incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a excuse, demonstrando o valor dos bens herdados”.
No entanto, é oportuno observar que mesmo os não patrimoniais comportam as suas exceções, conforme disserta Gama (2003), é imperioso ressaltar que a sucessão causa mortis não se restringe a referir-se às situações jurídicas patrimoniais, abrangendo inúmeros aspectos relacionados às situações jurídicas existenciais, como na eventualidade de reconhecimento de filhos em testamento, nomeação de tutores e testamenteiros, disposições testamentárias em favor de pessoas pobres de certas localidades, a transmissão mortis causa de alguns direitos morais do autor de obra científica, artística ou literária, entre outras.
Para Cahali e Hironaka (2003, p. 31), entretanto,
são excluídas da herança as relações jurídicas não patrimoniais e as personalíssimas, mesmo com conteúdo econômico, tituladas pelo falecido, como por exemplo, o pátrio poder, a tutela, a curatela eventualmente exercidos pelo de cujus, o usufruto, o uso, o direito real de habitação, as rendas vitalícias, a pensão previdenciária, o contrato de trabalho, porque o sucessor não é a continuação da pessoa do de cujus.
Na lição de Oliveira (1987, p. 22), “a ideia de sucessão está toda na permanência de uma relação de direito que perdura e subsiste a despeito da mudança dos respectivos titulares”.
Nesse sentido, Gomes (2012, p. 5) conceitua:
A expressão sucessão hereditária emprega-se nos sentidos objetivo e subjetivo. No sentido objetivo, é sinônimo de herança, massa de bens e encargos, direitos e obrigações que compunham o patrimônio do defunto. No sentido subjetivo, equivale ao direito de sucede, isto é, de recolher os bens da herança.
Completando o conceito, Rodrigues (2002, p. 3) aduz que o direito das sucessões se apresenta como um conjunto de princípios jurídicos que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus sucessores. A definição usa a palavra patrimônio, em vez de referir-se à transmissão de bens ou valores, porque a sucessão hereditária envolve a passagem, para o sucessor, tanto do ativo como do passivo do defunto.
Cumpre salientar, conforme destacado por Reis e Reis (2013), que o precípuo objetivo do direito sucessório é disciplinar a transmissão de bens deixados por uma pessoa após sua morte, demonstrando o seu destino, observando-se a existência de manifestação de última vontade e/ou a determinação legal.
Venosa (2012) acrescenta ainda que, na sucessão, ocorre a substituição do titular de um direito por outra pessoa. Quando o conteúdo e o objeto da relação jurídica permanecem os mesmos, mas mudam os titulares da relação jurídica, com uma substituição, diz-se que houve uma transmissão no direito ou uma sucessão. Destarte, sempre que uma pessoa tomar o lugar de outra em uma relação jurídica, há uma sucessão.
Neste mesmo sentido é a opinião do doutrinador Monteiro (2006, p. 1), dizendo que a palavra sucessão significa o ato pelo qual uma pessoa toma o lugar de outra, investindo-se, a qualquer título, no todo ou em parte, nos direitos que lhe competiam.
Feitas estas breves considerações a respeito do direito sucessório resta determinar o momento da abertura da sucessão, e, nesse desiderato, impõe-se esclarecer, que a lei a qual se deve considerar para efeito de partilha é a que estava em vigência no momento da abertura da sucessão, ou seja, no momento da morte do respectivo titular.
Diante do exposto, Reis e Reis (2013) concebem que seria possível que, hoje, tenhamos a aplicação do Código anterior, mesmo durante a vigência do Código Civil de 2002.
2.2 Das modalidades de sucessão
Segundo Carvalho Neto (2005), sucessão, em sentido comum, implica a ideia de transmissão de bens. Suceder, no dizer de Venosa (2012), substituir, tomar o lugar de outrem, no campo dos fenômenos jurídicos.
Etimologicamente, “sucessão” adveio do termo latino sucessio, que deriva por sua vez do verbo succedere (ir para debaixo de, vir debaixo, vir para o lugar de, tomar o lugar de, vir depois, vir em seguida)7. Sendo assim, teríamos sucessão legal ou voluntária, a título gratuito ou a título oneroso, inter vivos ou causa mortis. No Direito das Sucessões, contudo, só cuidamos da sucessão gratuita causa mortis.
Nesse sentido, Rodrigues (2002) define o Direito das Sucessões como “o conjunto de princípios jurídicos que disciplinam a transmissão do patrimônio de uma pessoa que morreu a seus sucessores”.
Em sentido objetivo, a expressão designa o conjunto de normas relativas à transmissão dos bens; em sentido subjetivo, o direito de uma pessoa a receber a herança de outrem.
Quanto à fonte, a sucessão pode ser testamentária ou legítima. Testamentária, se baseada em testamento; legítima, ao contrário, se fundada na lei, por não haver testamento válido e eficaz, ou não abranger ele todos os bens. Quanto aos efeitos, a sucessão pode ser universal ou singular. Universal é a sucessão em que se transfere toda a herança, ou uma quota ideal dela, sem discriminação de bens; singular, ao contrário, é a sucessão em bens individuados.
Conforme explica Carvalho Neto (2005), à sucessão universal chama-se herança; à sucessão singular, legado. Se se deixa em testamento, metade dos bens a outrem, ter-se-á uma sucessão a título universal; se, ao contrário, deixa-se uma determinada casa, a sucessão se dará a título singular.
Nada impede, contudo, que, instituindo herdeiro, designe bens concretos para preencher a sua quota, o que não desvirtuará a sua condição de herdeiro. Assim, observa-se que a sucessão legítima é sempre universal, ao passo que a sucessão testamentária pode ser universal ou singular. Um outro fator distintivo entre herança e legado: só o herdeiro continua a posse do autor da sucessão, enquanto o legatário tem uma posse nova (CARVALHO NETO, 2005).
Para Carvalho (2015), a sucessão legítima ocorre na ausência de testamento, ou seja, quando o de cujus falece ab intestato, ou se o testamento for nulo, caduco ou não dispôs de todos os bens (art.1.788,CC), observando que a capacidade para suceder é a do tempo da abertura da sucessão, conforme art. 1.787, CC.
Na ausência do testamento o legislador estabelece que a herança será deferida a determinadas pessoas obedecendo certas preferências denominadas ordem de vocação hereditária.
Os herdeiros legítimos herdam na seguinte ordem, conforme estabelece o art. 1.829 do Código Civil: os descendentes em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se este era casado com o autor da herança no regime de comunhão universal de bens, de separação obrigatória ou comunhão parcial se o falecido não deixou bens particulares; os ascendentes, em concorrência com o cônjuge, qualquer que seja o regime de bens; o cônjuge sobrevivente, na hipótese de ausência de ascendente e descendente será herdeiro único, qualquer que seja o regime de bens; os colaterais até o quarto grau.
O art. 1.829 não incluiu na ordem de vocação hereditária o companheiro(a), entretanto, por força do art. 1.790, também do Código Civil, que alterou os direitos do companheiro previstos nas Leis 8.971/94 e 9.278/96, estabelece que também herdará na sucessão legítima em concorrência com os descendentes, ascendentes e colaterais, sendo herdeiro único na ausência destes parentes.
Cada grupo de herdeiros, estabelecido pelo art. 1.829 do Código Civil, é chamado de classe, portanto, se não houver herdeiros na classe dos descendentes, convoca-se a classe dos ascendentes. Inexistindo herdeiros a herança será transferida ao Município, Distrito Federal ou União (art. 1.844, CC).
O Código Civil vigente incluiu o cônjuge entre os herdeiros necessários (art. 1.845), portanto o autor da herança não pode dispor em testamento de mais da metade dos bens se for casado (art. 1.846) e será herdeiro único, qualquer que seja o regime de bens, desde que não esteja separado judicialmente ou de fato há mais de dois anos, salvo se não teve culpa (art. 1830).
A possibilidade de discussão de culpa na separação de fato do casal no direito sucessório vai gerar grande discussão na doutrina e jurisprudência, posto que a cada dia se fortalece a corrente que exclui a discussão de culpa do casal na separação judicial e estendê-la, do direito de família ao sucessório, é no mínimo um retrocesso.
Não há que confundir meação (efeito da comunhão dos bens) com o direito hereditário (que independe do regime, salvo se concorrer com descendentes). A meação pertence ao cônjuge sobrevivente por direito próprio e não por herança, sendo intangível (não pode ser privada por indignidade ou deserdação).
Os herdeiros são os sucessores do falecido, contemplando a legislação brasileira, algumas formas de sucessão, como a legitima, a testamentária e a mista.
Porém, antes de tratar sobre estas é necessário esclarecer que existem duas formas de sucessão no direito, uma delas é aquela que ocorre por ato entre vivos, como uma transação comercial, uma doação, sendo a outra modalidade aquela que ocorre após a morte de alguém. Nesta modalidade, os sucessores receberão os direitos e/ou obrigações do de cujus, sendo esses sucessores os herdeiros ou os legatários.
Verifica-se, pois que no direito sucessório, as pessoas que recebem a herança são chamadas de herdeiros, sendo necessários aqueles que não podem ser afastados da sucessão por mera liberalidade do falecido, são eles: os descendentes, os ascendentes e os cônjuges. Assim, o de cujus, obrigatoriamente deverá deixar metade de seus bens a esses, o que se chama de sucessão legítima, e a outra metade poderá dispor em testamento, que seria a sucessão testamentária.
Por isso, Venosa (2012) esclarece que, a sucessão dependerá da vontade do falecido, quando esse deixa um testamento, sendo uma: a sucessão testamentária, e a outra chamada de sem testamento, a sucessão ab intestado. Porém, para melhor compreensão da disciplina os operadores do direito acabam por classificar a sucessão em três maneiras, ou seja, a legítima, aquela descrita na lei; a testamentária, aquela onde o sucedido deixa um testamento sobre a disposição de seus bens, se não tem herdeiro necessário (descendentes, ascendentes e cônjuge), poderá dispor de 100% de seu patrimônio, do contrário, poderá testar apenas 50% desse acervo; já na sucessão mista, quando a pessoa falecida deixa parte de seus bens, no testamento e parcela sem estar descrita no testamento, e aqui o patrimônio deverá ser partilhado, como na sucessão legítima, que é o chamamento dos herdeiros que sucederão bens, direitos e obrigações do falecido que findou ab intestato.
Esse chamado obedece a uma ordem de vocação hereditária, sendo que os parentes mais próximos ao herdar excluem os demais, os subsequentes. Assim, os ascendentes mais próximos excluirão os mais remotos (nesse sentido, pai e mãe como herdeiros, os avós não herdarão), ao passo que se houver igualdade de grau e diversidade de linha ambos lados receberão proporcionalmente os bens deixados pelo extinto.
A sucessão legítima está prevista no art. 1829 do Código Civil de 2002. Porém, o art. 1836 desse Código, esclarece que a falta de descendentes traz à sucessão os ascendentes, que concorrerá com o cônjuge sobrevivente, sendo que os parágrafos da citada norma estabelecem que não haverá distinção de linhas sucessórias.
Já no tocante à sucessão testamentária, Delben (2010, p. 81) explica que esta acontece quando um sujeito de direitos, maior de dezesseis anos, em gozo de suas faculdades mentais, conforme art. 1.860 do Código Civil resolve por disposição de última vontade contemplar determinadas pessoas em seu testamento.
Compreende-se, a partir das explanações do referido autor, que o cônjuge habilitado a suceder é aquele que é casado sob o regime da comunhão parcial de bens, disciplinado nos arts. 1658 a 1666 do Código Civil de 2002, onde os bens adquiridos posteriormente ao casamento fazem parte da meação, porém, os bens particulares são objetos de partilha da herança para o consorte supérstite, como herdeiro necessário em concorrência com descendentes e ascendentes conforme art. 1845 desse codex, ainda que, uma das partes não tenha bens a inventariar em razão de seu falecimento.
Porém, há que se destacar que o cônjuge perderá a capacidade sucessória, quando da separação judicial ou do divórcio, porque como “[…] a dissolução da sociedade conjugal acarreta a ausência de legitimidade do cônjuge para suceder.”
Mesmo em caso de ausência de culpa, decretada a separação judicial do casal um não poderá mais suceder com a morte do outro. Assim, podem-se concluir, ao analisar o art. 1830 do Código Civil de 2002, que as hipóteses de exclusão do cônjuge da sucessão, seria o caso da separação judicial, posto que ainda que permaneça o vínculo conjugal, que só é rompido no divórcio ou na morte, a sociedade conjugal é desfeita, nos moldes do art. 1571 desse Código. Outro motivo seria a separação de fato há mais de dois anos, desde que o sobrevivente seja culpado pela separação.
Desta constatação acima, Caio Mário da Silva Pereira esclarece que é necessária a homologação da separação judicial do casal em caso de separação consensual e no caso da separação litigiosa, esta deverá contar com sentença transitada em julgado, sob pena de a morte absorver esse estado e ao invés de separado a pessoa passará a ser viúva, pois não houve a chancela judicial.
Para Paulo Nader há, ainda, outra possibilidade de exclusão do cônjuge da sucessão, que seria o caso do falecimento de um deles durante a ação que requeresse a invalidação do casamento. Assim, se, o sobrevivente soubesse do vício do casamento, esse não herdaria, ao passo, que se tivesse de boa-fé, o casamento seria putativo e o supérstite, concorreria à herança e se o de cujus, não tivesse deixado nem descendentes nem ascendentes, o viúvo herdaria a totalidade do acervo patrimonial do extinto. Há que se advertir, porém que, com a reconciliação do casal, antes de decretado o divórcio em conformidade com o art. 1577 do Código Civil de 2002, restabelece os direitos dos pares, até mesmo o sucessório.
O companheiro também poderá ser herdeiro e meeiro do seu par falecido. Quanto à meação, estabelece o art. 1.725: “na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens.” Conforme se verifica no art. 1829 do Código Civil de 2002, já mencionado, a sucessão legítima, não contemplou a possibilidade de participar da sucessão dos bens particulares deixados pelo de cujus, sendo que esses só aproveitarão os bens adquiridos onerosamente, durante o período que vigeu a união estável entre o casal nos moldes do art. 1790 do Código Civil de 2002.
Resguardando-se os bens adquiridos que o falecido, em vida havia conquistado por doação ou por herança, percebe-se com a interpretação do artigo acima, que no tocante aos bens adquiridos onerosamente, os primeiros a herdar serão os descendentes. Se, o falecido, não os tiver deixado os ascendentes serão chamados à sucessão e após os colaterais até o quarto grau. Assim, só ai se não tiver nenhum desses parentes é que o companheiro poderá receber a totalidade do patrimônio que era do extinto.
3 DIREITOS DO CÔNJUGE
3.1 O sujeito do casamento
Assim vos declaro marido e mulher. Com esta celebre frase, o padre ou pastor conjuga os esposos na celebração do matrimônio religioso, passando aqueles de um ser individualizado para um ser uno, esposo e esposa e Deus, o mesmo acontecendo quando o juiz de paz declara que aos olhos da lei, marido e esposa formam um casal.
Na pesquisa de Delben (2010), os personagens são os cônjuges e os companheiros supérstites. O autor destaca, porém, que, no campo do direito, tem-se que exprimir que só é cônjuge aquele que contrai núpcias com outrem, respeitados o grau de afinidade e de vontade, para o ato, e cônjuge seriam “[…] pessoas conjugando suas vidas intimamente, por um afeto que as enlaça especialmente, quanto aos fins e aos meios de vivência, convivência e sobrevivência”.
O Código Civil de 2002, trata em seu art. 1.521 sobre os impossibilitados de casar, como os ascendentes com os descentes e dos adotantes ou os adotados com os cônjuges um do outro. Também não podem se casar os irmãos (independente se unilaterais ou bilaterais) e os demais colaterais, bem como, as pessoas, ainda casadas também não podem se casar novamente, e, tampouco, podem o cônjuge sobrevivente com aquele que foi condenado por homicídio ou tentativa de homicídio de seu consorte.
Por ser o Brasil um país católico, a Constituição Federal de 1988, embora resguarde todas as formas de entidade familiar, prima pelo casamento, sempre privilegiando a união entre homens e mulheres que se entrelaçam civilmente, tanto que não dificulta a conversão da união estável em casamento. Assim, na busca de conceituar o que seja cônjuge, Barros (2004) defende que: “Cônjuges são, como o próprio nome diz, os que se sentem conjugados por uma origem ou destino de vida em comum. Nessa conjugação de vidas, atua o afeto”.
O casamento se consuma em face da affectio maritalis, que cria entre os esposos uma expectativa de direito consubstanciada no respeito, na convivência, na ajuda mútua, na sinceridade recíproca, no relacionamento duradouro e na observância de princípios e de valores que devem reinar na intimidade da sociedade familiar formada. Sobre o casamento, Dias (2003) se pronuncia esclarecendo que, embora a lei não conceitue casamento, ele é fundamento da sociedade, constituído pela vontade dos pares, que tem a liberdade de unirem-se, tendo forma definida em lei.
Desta maneira, nada mais justo do que encarar o afeto como um direito individual, que não pode ser negado a qualquer pessoa, por ser um direito fundamental135, de primeira dimensão, sendo o “direito ao afeto a liberdade de afeiçoar-se um ao outro”136, direito esse que está “implícito na Constituição, cujo § 2º do art. 5º admite direitos que, mesmo não declarados, decorram do regime e princípios por ela adotados.”
Assim, o casamento é a união mais comum de afeiçoarem-se homens e mulheres, tornando-os esposos, por afeto e vontade própria, com intuito de formarem família e que obedece a procedimentos ditados em lei.
3.2 O cônjuge no direito sucessório
Conforme descrito por Delben (2010), as entidades familiares consagradas no ordenamento jurídico brasileiro são aquelas formadas pelo casamento, pela união estável, pela monoparentalidade, amparando-se também, pela evolução dos tempos, a família socioafetiva, aquela formada pelos padrastos e madrastas com os enteados, filhos exclusivos de seu par, porém, afetivamente considerados com se seus fossem.
Ocorre, porém, que se reconhece como casais, aqueles participes unidos pelo casamento e pela união estável, que poderão partilhar, mear e herdar bens e obrigações quando do falecimento de seu consorte, obedecendo critérios trazidos pelo Código Civil de 2002, que já estavam sendo consagrados pela jurisprudência, quando reconhecia a sociedade de fato havida entre aqueles que viviam como se casados fossem, tanto que a Constituição Federal de 1988, consagrou esta família, que foi regulamentada pelas leis 8971 de 29 de dezembro de 1994 e 9278 de 10 de maio 1996.
Ainda para Carvalho (2015, p. 2), O Código Civil de 2002 introduziu diversas inovações quanto ao cônjuge no direito sucessório, estando atualmente na situação jurídica de herdeiro necessário, herdeiro concorrente com descendentes e ascendentes, herdeiro único, conferindo-lhe ainda direito real de habitação e de ser preferencialmente o inventariante.
A primeira inovação foi incluí-lo entre os descendentes e ascendentes como herdeiro necessário nos bens e não apenas no direito a usufruto, não podendo o autor da herança dispor de mais da metade dos bens se for casado, ainda que não possua descendentes e ascendentes (art. 1.845 e 1.846), sendo necessário, para exclusão do cônjuge, que exista justa causa que autorize deserdação ou atos de indignidade, não se aplicando o disposto no art. 1.850.
Na mesma ordem de vocação hereditária do Código de 1916, o atual Código Civil mantém o cônjuge como herdeiro único. Assim, na ausência de descendentes e ascendentes recebe por inteiro a herança, independentemente do regime de bens (art. 1.838), desde que não estivesse separado judicialmente, posto que dissolvida a sociedade conjugal (art. 1.830, 1ª parte).
O novo Código Civil inovou porém ao estabelecer a exclusão do cônjuge na sucessão se estiver separado de fato há mais de dois anos (art. 1.830, 2ª parte), admitindo-se, entretanto, que o cônjuge herdeiro comprove que não teve culpa no rompimento da convivência, sendo reconhecido, neste caso, o seu direito sucessório.
3.2.1 Igualdade entre casados e conviventes
No intuito de resolver a indagação a respeito de que são ou não tratados com igualdade as entidades familiares formadas pelo casamento e pela união estável, no direito sucessório, faz-se necessário um breve estudo sobre o tratamento igualitário entre os gêneros sexuais, para após, solucionar a questão.
Pinho (2005) esclarece que se entende por gênero o conjunto de conceitos essenciais vocacionado a aportar elementos metodológicos e teóricos centrados nas relações sociais e culturais que são elaboradas e construídas entre os sexos.
O homem sempre foi considerado um ser “privilegiado, dotado de alguma coisa a mais, ignorada pelas mulheres: o mais forte, mais inteligente, mais corajoso, mais responsável, mais criativo ou mais racional. Sempre havia um mais para justificar a relação hierárquica com as mulheres, ou pelo menos com a sua”.
Isto porque,
[…] o dualismo masculino-feminino é transposto para o discurso jurídico numa perspectiva hierárquica em que o nível superior é identificado ao homem. O discurso jurídico também esconde uma ideologia sexista que, fazendo constante referência ao princípio da igualdade, recusa-se a reconhecer as reais desigualdades entre os sexos (MONTEIRO, 2003, p. 30-31).
Segundo Hermann (2001, p. 7), os “costumes e práticas sociais ainda continuam a ser obstáculos para a implementação da igualdade e da equidade de gênero”, porém, mesmo que existam diferenças físicas e históricas, estas não podem constituir em fatores determinantes para uma possível dominação desse em relação àquela (PINHO, 2005).
Somando partido aos que pregam a igualdade entre os pares, sejam eles casados ou conviventes e fulminando a idéia de arbitrariedade no tratamento, verifica-se que “o art. 1º do atual Código Civil utiliza o termo pessoa, não mais homem, como fazia o art. 2º do Código Civil de 1916, deixando claro que não será admitida qualquer forma de distinção decorrente do sexo”.
O princípio da igualdade dos cônjuges baseia-se em “uma nova forma de comunidade afetiva, […] em total paridade de deveres, consideradas as funções de ajuda mútua e a conseqüente divisão dos resultados econômicos surgidos desta parceria, isto por que o que se pretende é a preservação da dignidade da pessoa humana. De fato, o desrespeito à dignidade da pessoa humana da mulher e aos seus direitos da personalidade são os elementos essenciais que compõem o seu problema histórico e nuclear: a desigualdade na distribuição de toda a sorte de bens da vida.
Madaleno (2005/2006) interpreta esta determinação dizendo que direitos e deveres de cônjuges e companheiros “recebem a tutela integral do Estado, sem restrições pelo gênero. Os direitos dos seus membros são autônomos, e suas decisões passam a ser sempre tomadas em conjunto, e a benefício da sociedade familiar”.
Assim, analisando os arts. 1.566 e 1.567, do Código Civil de 2002, se verifica que dentre os deveres dos casados estão a fidelidade, coabitação, respeito, mútua assistência, guarda e sustento dos filhos, cabendo a ambos a direção da sociedade conjugal, sob pena de que se existirem conflitos, esses poderão ser solucionados por uma decisão judicial. Desse modo, não existe tratamento diferente entre os pares, eliminando-se assim, a posição de inferioridade com que a mulher era vista.
Após as considerações a respeito de que não mais existem diferenças entre homens e mulheres, posto que ambos tem direitos e deveres dentro de uma sociedade conjugal debruça-se a indagação se são equiparados os cônjuges aos companheiros, devendo ser observados as questões que os equipara e os diferencia, mesmo porque não existindo motivo para tratar as pessoas de maneiras desiguais é porque o tratamento deverá dado de maneira igual (DELBEN, 2010, p. 70).
A comunhão de vida entre os cônjuges tem pilar na igualdade, não só entre esses, mas, também entre os companheiros, baseando-se em preceitos do art. 1.511 do Código Civil de 2002 c.c. art. 226, § 3º, da Constituição Federal, e pelos arts. 1.723 a 1.727 do atual Código Civil.
Em outros dispositivos do Código Civil de 2002, a equiparação entre cônjuges e companheiros também está clara258, posto que tanto um como o outro poderá requerer a ação de separação de corpos (art. 1562). É assegurado a ambos os casais, o parentesco por afinidade com a família de seu par (art. 1595).
Outra equiparação é a trazida pela combinação dos arts. 1631, 1632, 1636, onde aflora o poder familiar, que permanece mesmo em caso de separação dos casados, como na dissolução da união estável, no caso dos companheiros e até em caso de contraírem novas núpcias ou novo companheirismo. A permissão de tanto o cônjuge como o companheiro pleitear ação de alimentos contra seu consorte, conforme disposição do art. 1694, enquanto o par não contrair nova relação, nos moldes do art. 1708, também é uma forma de igualar estas instituições. Querendo, podem os casados ou os que vivem em união estável, destinar até um terço de seus bens, como bens de família, como preceitua o art. 1711.
Outros deveres que tem tanto o cônjuge como o companheiro é a curadoria do outro, nos termos do art. 1775 e a administração da herança enquanto não nomeado o inventariante, a rigor do art. 1795. Tudo isso porque, o art. 1723 do Código Civil de 2002, afirma a união estável como entidade familiar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A morte determina a abertura da sucessão, passando a propriedade e a posse da herança aos herdeiros legítimos e testamentários, nas mesmas condições em que as tinha o finado, o que acontece de forma instantânea. O sistema pátrio adotou a tese da imediata integração dos herdeiros à posição do falecido, tudo se passando como se ele os investisse na herança, sem separação temporal entre a declaração e aquisição da herança, ficando a participação definitiva dos interessados e sua aceitação, que retroage à data do óbito.
A morte gera efeitos distintos, um no Direito de Família, extinguindo o casamento, o que faz cessar o regime de bens entre os cônjuges, cuja meação do patrimônio comum seguirá as regras do regime adotado; mas também afeta o Direito das Sucessões, pois o patrimônio do falecido, agora herança, será imediatamente transmitida a seus herdeiros e legatários, pelo direito de saisine.
O acervo deixado constitui-se, em regra, da meação e da herança, que são institutos pertencentes a diferentes ramos jurídicos, embora confusão que se costuma estabelecer.
A meação não é direito sucessório, mas direito patrimonial resultante do regime de bens do casamento, e pela morte do parceiro aquela parcela do cabedal comum se integra ao direito do supérstite, extinto o condomínio pelo decesso.
A meação do finado, agora herança, será transmitida a seus sucessores, mas como podia ele dispor da metade de seus bens para testar, o catálogo canônico declara pertencer aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança ou legítima (CC, artigo 1.846), constituída pelo patrimônio existente na abertura da sucessão, abatidas as dívidas e as despesas de funeral, adicionando-se, em seguida, o valor dos bens sujeitos à colação (CC, artigo 1.847); morrendo a pessoa sem testamento, a herança é transmitida aos herdeiros legítimos (CC, artigo 1.788, 1ª parte).
A herança é uma universalidade, compondo-se não só da meação sobre os bens comuns, mas também do patrimônio particular do defunto, o que tem sido causa de discórdia quando se examina sua transmissão ao cônjuge sobrevivo em rivalidade com outros herdeiros.
Com o advento do atual Código Civil brasileiro, levado a efeito pela Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002, a tutela sucessória do cônjuge encontrou melhor estrutura normativa, privilegiando sua posição sucessória, elevando-o à categoria de herdeiro necessário (PIERI, 2008).
É certo que o legislador procurou dar uma equivalência hereditária benéfica ao cônjuge, com a finalidade de amparar o âmbito familiar em consonância com os princípios constitucionais, alterando substancialmente a ordem da vocação hereditária.
No entanto, verificou-se com Pieri (2008) que a aplicação da nova regra contida no artigo 1.829 do atual Código Civil, ao incluir o cônjuge sobrevivo como herdeiro necessário (e concorrente), provoca discussões e controvérsias, quer na doutrina ou na jurisprudência, desenvolvendo uma nova dogmática sucessória em razão de inúmeras situações híbridas que podem ocorrer, principalmente quando da concorrência do cônjuge com descendentes comuns e exclusivos.
Primeiramente, embora tenha sido encontrado entendimento doutrinário divergente conclui-se na presente pesquisa, quanto à existência da concorrência sucessória do cônjuge com herdeiros comuns e exclusivos, pela não prevalência da reserva da quarta parte e, assim, a herança é distribuída em partes iguais. Sobre este posicionamento encontra-se respaldo favorável na doutrina e na jurisprudência.
Dessa forma, o cônjuge nessa situação recebe uma quota igual à dos descendentes que sucederem por cabeça; se forem três os filhos, parte da herança objeto da concorrência é dividida em quatro partes iguais, atribuindo-se uma cota a cada um dos filhos, bem como uma ao cônjuge; se os filhos são comuns do autor da herança e do cônjuge sobrevivente, este tem assegurado um quarto da parte da herança em relação à qual há concorrência.
Apesar de ser essa a lógica imposta pela redação do referido artigo, verificou-se que a questão gera desigualdade de quinhões quando o cônjuge concorrer com quatro filhos comuns (ou mais), haja vista que estes perdem uma parte da herança em favor do cônjuge sobrevivo. A contrario sensu, se os descendentes são exclusivos do de cujus, o cônjuge não tem direito a essa quarta parte; se concorrer cinco filhos, todos exclusivos do falecido, a divisão será realizada em seis partes, uma delas correspondente ao cônjuge.
Por outro lado, muito embora se considere que o reconhecimento da concorrência sucessória ao cônjuge não é absoluta, posto que somente lhe é deferido se, ao tempo da abertura da sucessão, não estava separado judicialmente ou de fato por mais de dois anos do falecido, salvo se provar que a separação não decorreu de sua culpa, encontrou-se a possibilidade de concorrência sucessória entre cônjuge e companheiro.
REFERÊNCIAS
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[1] Graduação em Ciências Jurídicas e Sociais na Pontifícia Universidade Católica de Campinas (2005); Especialização em Direito Empresarial e Tributário pelo Centro Universitário Toledo, Brasil (2013); Especialização em Direito Civil e Direito Constitucional pela Anhanguera/Uniderp (2013/2014) Mestrado Profissional em andamento em Ciências Ambientais; Professora Universitária na Universidade Camilo Castelo Branco.
Bacharelando do Curso de Direito da Universidade Camilo Castelo Branco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEITE, Thiago Nunes. Sistema de meação e herança do cônjuge sobrevivente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 jun 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46936/sistema-de-meacao-e-heranca-do-conjuge-sobrevivente. Acesso em: 23 dez 2024.
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