Palavras-chaves: termo de referência, atuação mais efetiva da população, realização de audiências públicas.
O presente artigo busca expor considerações sobre a importância da participação popular no desenvolvimento da atividade ambiental, especialmente no que tange à elaboração do termo de referência.
O primeiro capítulo tratará sobre a gênese da expressão termo de referência, bem como sobre o seu conceito, considerando-o como um documento sintetizador de ideias aptas a subsidiar o estudo ambiental e, seguidamente, o procedimento administrativo de licenciamento.
No segundo capítulo, explicitará sobre a participação da sociedade na seara ambiental, especialmente por intermédio das audiências públicas prévias, de natureza consultiva, com vistas à obtenção de informações da comunidade a ser afetada pela atividade empresarial ou de interessados.
É de fundamental importância a busca por uma crescente participação dos populares em meio aos estudos ambientais, tendo em vista a noção lógica de que necessitam de informações sobre o real impacto a ser acometidos pela atividade, bem como ao se considerar a percepção de que podem contribuir de modo positivo e benéfico com os interesses difusos e coletivos.
O termo de referência surgiu em meio à seara administrativista, mais especificamente no procedimento licitatório, com o advento da Lei 10.520/02, passando a ser exigido para fins de instrução da modalidade pregão. Incumbia ao termo de referência a atividade de documentar de forma pormenorizada a especificação do que se pretende contratar.
Segundo a gênese das palavras, ‘termo’ significaria o ponto final; ao passo que ‘referência’ expressa fonte na qual se faz possível a colheita de informações. Deste modo, sintetizando-se tais termos em uma só palavra, ter-se-ia a expressão termo de referência como sendo um documento que circunscreve de forma limitada um objeto, servindo de fonte para o fornecimento das informações existentes sobre ele.[1]
O termo de referência refere-se a uma condensação de ideias que levará a formação de um documento apto a subsidiar na qualidade de fonte uma determinada atividade. Na seara ambiental, entende-se o termo de referência como um documento que informa as diretrizes para elaboração de Estudos de Impacto/Relatórios de Impacto Ambiental (EIA/RIMA).
Deverá o termo orientar a equipe técnica, definir o conteúdo, a abrangência e os métodos a serem manejados para cada tipo de empreendimento a ser avaliado. Na maioria das vezes, o empreendedor terá a incumbência de ele próprio apresentar um termo de referência ao órgão ambiental competente, o qual deverá julgá-lo e avaliá-lo.
Esse documento deverá ser estruturado a partir da observância de requisitos formais, os quais, passa-se a considerar:
(a) contexto/descrição do empreendimento: são apresentadas sinteticamente a descrição, histórico ou problemas relacionados ao projeto a ser avaliado; (b) objetivo: apresenta os resultados esperados com a avaliação do projeto, ou seja, quais são os benefícios que o empreendedor esperar alcançar com a avaliação de seu projeto; (c) escopo: apresenta os temas e/ou aspectos que devem ser abordados ou considerados para alcançar o objetivo; (d) metodologia: apresenta métodos, instrumentos, etapas e atividades que serão realizadas durante a avaliação do projeto; (e) cronograma: cronograma das atividades e o período de execução da avaliação; (f) produtos esperados: apresenta a quantidade, qualidade, características e prazos de todos os produtos que se espera da equipe técnica; (g) perfil; e (h) orçamento: indica os gastos que o empreendedor terá com o serviço de consultoria.
O EIA/RIMA foi criado pelo National Envionmental Policy Act (NEPA), e, atualmente, é adotado por mais de oitenta países, assim como por diversos organismos internacionais.[2]. Possui status constitucional (artigo 225, §1º, IV), caracterizando-se por se fazer obrigatório quando envolvidas atividades empresariais que potencialmente possam vir a causar degradação ambiental significativa, devendo ser desenvolvido de forma prévia ao procedimento administrativo de licenciamento.
Descabe, pois, aos entes governamentais exercer a sua discricionariedade para decidir acerca da elaboração ou não de um EIA. Em caso de ser constada a presença de um projeto sintetizador de uma atividade potencialmente causadora de algum impacto ambiental significativo, o estudo de impacto ambiental há de ser realizado.
O EIA e, consequentemente, o RIMA, deverão ser apresentados de acordo com o termo de referência, o qual constituirá em um documento de orientação quanto aos procedimentos a serem seguidos na elaboração do mesmo. Em regra, o termo de referência objetivará determinar a abrangência, os procedimentos e os critérios para a elaboração do Estudo Ambiental.
O artigo 225 da Constituição Federal disciplina ser o meio ambiente um bem de uso comum do povo. Nesse diapasão, faz-se necessária a garantia de acesso da população a um instrumento de política de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente.
Segundo Paulo Affonso Leme, “não se concebe EPIA sem a possibilidade de serem emitidas opiniões por pessoas e entidades que não sejam o proponente do projeto, a equipe multidisciplinar e a administração”[3]
A participação pública efetiva no EIA deriva do próprio princípio da publicidade, decorrente do Direito Administrativo (artigo 37, caput, da CF/88), e pressupõe o direito de todos a ter acesso às informações existentes na Administração Pública.
A lei 10.650, de 16 de abril de 2003, dispõe sobre o acesso público aos dados e informações existentes nos órgãos e entidades integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama). Enuncia, em seu artigo 1º, ser obrigatório aos órgãos e entidades da Administração Pública, direta, indireta e fundacional, integrantes do Sisnama, permitir o acesso público aos documentos, expedientes e processos administrativos que versem sobre a temática ambiental.
Há ainda que destacar que o acesso às informações pode se dar por intermédio de requerimento formulado por qualquer indivíduo, independentemente de comprovação de interesse específico (artigo 2º), desde que não sejam tais informações utilizadas para fins comerciais.
Com vistas a garantir o acesso do púbico ao procedimento de EIA, previu-se na Resolução do Conama nº. 09, de 03 de dezembro de 1987, a possibilidade de se realizarem audiências públicas, as quais se destinam à disponibilização de informações sobre o EIA/RIMA e à colheita de críticas e sugestões do público presente.
Deve ser afixada edital, que anunciará a abertura de prazo para a efetivação da audiência no prazo legal de, no mínimo, quarenta e cinco dias, podendo ser esta requerida por qualquer pessoa. Nesse sentido, entende-se ser obrigatória a realização das audiências quando o requerimento advier de, no mínimo, cinquenta cidadãos, ou partir de entidade civil ou do Ministério Público.
Portanto, não se concebe a existência do EPIA sem a participação do povo, brasileiros e estrangeiros, e de entidades não integrantes da Administração, do projeto tampouco da equipe multidisciplinar. Para a participação no direito ambiental, na qualidade de povo, não se exige qualquer comprovação de ser cidadão, ou seja, de determinado indivíduo estar quite com suas obrigações eleitorais.
A participação popular se dá não apenas de forma ativa como também passiva, no sentido de constituir seu direito também o de tomar conhecimento sobre uma atividade a ser empreendida ou de uma obra a ser projetada, bem como sobre a realização ou não do EPIA.
Nesse sentido, enuncia Paulo Affonso Leme no sentido de que o povo poderá acompanhar a realização do estudo, impugnar – desde a contratação – a equipe multidisciplinar e, também, tentar preparar-se para a fase de comentários e de audiência pública.
O artigo 1º da Resolução nº. 09/1987, que regulamenta os procedimentos da audiência pública, dispõe como uma das finalidades a que se destina a audiência a de expor aos interessados o conteúdo em análise, ou seja, trazer a lume o objetivo a que se pretendem os empreendedores.
O Direito Ambiental deve ser enxergado como uma conquista popular, razão pela descabe afastá-lo do povo, tendo este participação indispensável. Hodiernamente, é de fundamental importância a participação ativa da sociedade civil nos debates dos grandes temas de interesse coletivo.
A participação popular, na seara ambiental, deve ser vista como um instrumento colocado à disposição do cidadão, a fim de que possa evitar dano ao interesse coletivo, servindo como veículo apto a demonstrar a indignação do cidadão, que não é obrigado a conformar com um ato lesivo de uma autoridade.[4]
A participação social em etapas do processo de EIA tem inúmeras finalidades, dentre as quais a que se destacar: coordenar, difundir e educar, identificar os recursos ambientais mais importantes para a sociedade, identificar problemas e necessidades ambientais, conceber ideais e solucionar casos problemáticos, obter opiniões do público, valorizar as alternativas apresentadas por comunidades afetadas, bem como resolver conflitos a partir do consenso entre os pares.
Conforme exposto alhures, o termo de referência é considerado um documento que se destina a orientar os gestores na elaboração do EIA e, consequentemente, no RIMA, razão pela qual a participação popular deve assumir fundamental destaque, podendo ser efetivada através de uma audiência prévia à elaboração do respectivo termo.
A referida audiência pode se dar na presença da coordenação do órgão ambiental, de qual integra a equipe que propõe o empreendimento e aquela que elaborou os estudos ambientais, bem como deve contar com a presença de membros das comunidades afetadas ou interessados.
Nada mais lógico do que ouvir aqueles que de fato sofrerão o impacto da implantação do projeto ou atividade, os quais poderão sanar eventuais dúvidas existentes, bem como se informar sobre a magnitude da ação. Poderá ainda a sociedade ser informada sobre os impactos que serão provocados durante a instalação e funcionamento.
Todavia, a que se ter em mente o fato de que a realização das audiências públicas e participação popular não contribuirão de modo absoluto para a eliminação de todos os problemas ambientais que acometem a área, na medida em que a natureza jurídica desse instituto é apenas consultiva, de modo que as manifestações emanadas em tais reuniões não são de observância obrigatória, mas servirão como mais um instrumento a serviço do gestor para o estudo das atividades ambientais desenvolvidas e posteriormente subsidiarão o procedimento de licenciamento, que culminará na instalação e início da atividade.
A necessidade de se contar com a participação da sociedade decorre da própria conjuntura do Estado Democrático de Direito, marcada pela ampla publicidade dos seus atos, que se espraiam por todos os ramos do direito, e se mostra de imperativa observância.
Da participação popular, no Direito Ambiental, decorrem vantagens quais sejam: repasse de informações para as comunidades afetadas pelo projeto ou atividade, redução de conflitos, abertura de espaços para que comunidades deem sugestões ou exponham seus pontos de vista com relação à proposta, incremento da legitimidade das decisões individuais e do sistema político em geral, tornando o processo justo e inclusivo, e melhores decisões e com maior consistência.[5]
Apesar de pontual, considera-se a audiência pública um avanço e um conquista da sociedade, pois esta se constitui em um espaço onde o indivíduo tem liberdade para manifestar-se livremente. Talvez por isso um número crescente de indivíduos tem procurado participar ativamente das audiências públicas, como forma de assegurar seus direitos de ouvir e ser ouvido, de exercer sua cidadania, e de negociar diretamente com empreendedores, sem uma intermediação judicial.
O termo de referência caracteriza-se por ser uma condensação de ideais as quais levarão a formação de um documento capaz de servir de subsidiar na qualidade de fonte de uma determinada atividade.
Tem como função a de informar as diretrizes para a elaboração do EIA, e consequentemente, do RIMA, razão pela qual se deve propiciar a participação popular na elaboração do referido documento ainda que forma prévia por intermédio de audiência.
A participação popular, na seara ambiental, deve ser enxergada como instrumento garantidor de cidadania, dentro do paradigma atual de Estado Democrático de Direito, devendo ser privilegiada na medida em que, conforme previsão constitucional, o meio ambiental é bem de uso comum do povo, ou seja, o seu destinatário é a sociedade.
Não há que se conceber a implantação de atividades potencialmente geradoras de impactos significativos de degradação ambiental, sem, contudo, ser a população instada a externar a sua opinião, ainda que de natureza consultiva, ou, até mesmo, poder contribuir de forma efetiva e ativa para o desempenho pleno dos fins mediatos a que se propõe o meio ambiente por meio de seus agentes e órgãos ambientais.
Das vantagens decorrentes da participação popular, cabe destacar duas delas, quais sejam: incremento de legitimidade às decisões individuais e do sistema político em geral, tornando o processo justo e inclusivo e a emanação de decisões melhores e mais consistentes.
Deste modo, a promoção da participação popular serve como instrumento legitimador da ação dos gestores ambientais, o que faz com que se evite conflitos futuros entre as populações afetadas e os agentes empreendedores, na medida em que a população se fará cientificada previamente do impacto a que lhe acometerá a instalação de dada atividade.
Nesse espeque, a participação popular prévia no termo de referência e nos estudos ambientais corrobora para a redução de atitudes arbitrárias e ilícitas por parte dos administradores, o que reforça a garantia de maior lisura no procedimento administrativo de licenciamento ambiental e, tão logo, maior proteção ao meio ambiente.
BELTRÃO, Antonio F. G.. Direito ambiental. 4. ed. São Paulo: Editora Método, 2013. 371 p.
MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 21. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012. 1311 p.
PAULA, Jônatas Luiz Moreira de. Direito ambiental e cidadania. São Paulo: Mizuno, 2007. 243 p.
SANTANA, Jair Eduardo; CAMARÃO, Tatiana; CHRISPIM, Anna Carla Duarte. Termo de Referência: o impacto da especificação do objeto e do termo de referência na eficácia das licitações e contratos. 4. ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2014. 193 p.
ASSUNÇÃO, Francisca Neta Andrade; BURSZTYN, Maria Augusta Almeida e DE ABREU, Teresa Lúcia Muricy. Participação social na avaliação de impacto ambiental: lições da experiência da Bahia, Confins [Online], 10|2010, posto online no dia 28 Novembro 2010, acesso em: 02 Dezembro 2015. Disponível em : http://confins.revues.org/6750; DOI: 10.4000/confins.6750
[1] SANTANA, Jair Eduardo; CAMARÃO, Tatiana; CHRISPIM, Anna Carla Duarte. Termo de Referência: o impacto da especificação do objeto e do termo de referência na eficácia das licitações e contratos. 4. ed. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2014. p. 27
[2] BELTRÃO, Antonio F. G.. Direito ambiental. 4. ed. São Paulo: Editora Método, 2013. P. 102.
[3] MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 21. ed. São Paulo: Editora Malheiros, 2012. 231 p.
[4] PAULA, Jônatas Luiz Moreira de. Direito ambiental e cidadania. São Paulo: Mizuno, 2007. P. 167-168
[5] ASSUNÇÃO, Francisca Neta Andrade; BURSZTYN, Maria Augusta Almeida e DE ABREU, Teresa Lúcia Muricy. Participação social na avaliação de impacto ambiental: lições da experiência da Bahia, Confins [Online], 10 | 2010, posto online no dia 28 Novembro 2010, acesso em: 02 Dezembro 2015. Disponível em : http://confins.revues.org/6750 ; DOI : 10.4000/confins.6750
Ensino Superior Completo - Universidade de Brasília (UnB). Cargo de Técnico Judiciário Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PIAU, Priscila Helena Soares. Qualidade do Termo de Referência, exigência de consulta e participação social para a sua elaboração e discricionariedade do órgão ambiental na definição de seus critérios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jul 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46994/qualidade-do-termo-de-referencia-exigencia-de-consulta-e-participacao-social-para-a-sua-elaboracao-e-discricionariedade-do-orgao-ambiental-na-definicao-de-seus-criterios. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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