RESUMO: O presente artigo busca investigar se o método do diálogo das fontes – frequentemente constante da jurisprudência das Cortes Superiores - é adequado à interpretação e solução da dicotomia consumidor-usuário de serviço público. Busca-se responder se seria possível proteger o usuário aplicando-se a disciplina do consumidor sempre que o direito público for omisso em fazê-lo, buscando-se a realização do interesse público.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. A (superável) dicotomia entre direito público e privado A. Caracterização dos serviços públicos – entre o direito público e o direito privado B. Diferenciação entre consumidor e usuário de serviços de energia elétrica 2. O diálogo do CDC com as leis aplicáveis aos serviços públicos de fornecimento de energia elétrica A. A pós modernidade e a necessidade de diálogo com vistas à proteção do consumidor/usuário B. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos usuários finais de energia elétrica por meio do diálogo das fontes. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O presente estudo tem a pretensão de abordar a dicotomia consumidor–usuário, mormente em vistas aos serviços de energia elétrica, iniciando com a visão pós-moderna da separação entre direito público e direito privado, que será defendida já estar superada em muitos aspectos. Inicia-se uma apresentação desta dicotomia e com ilações sobre a noção de serviços públicos[1], ressalvando desde já que não é o propósito do presente trabalho esgotar o tema, que refugiria ao âmbito deste estudo. Na sequencia, apresentar-se-á sumariamente a disciplina aplicada a cada uma destas figuras, consumidor de serviços privados e usuário de serviços públicos, comparando-se a conceituação de consumidor fornecida pelo Código de Defesa do Consumidor com aquela contida nas legislações relativas aos serviços de energia elétrica.
Por fim, e este é o objetivo a que se propõe o presente estudo, será defendida a enorme contribuição que se extrai do diálogo das fontes, na forma como desenhado pelo mestre de Heidelberg, Prof. Erik Jayme, e a nós alcançado pela Prof. Claudia Lima Marques, como método de solução das problemáticas surgidas na aplicação do Código de Defesa do Consumidor a usuários de serviços públicos. O presente estudo segue o plano francês, dividindo-se em duas grandes partes, e tem como marco teórico a obra do Prof. Erik Jayme Identité Culturelle et Integration: Le Droit International Privé Postmoderne. [2]
Conforme já identificou Larenz,[3] as normas jurídicas não se colocam lado a lado sem qualquer ligação entre si, mas em um contexto de interrelações múltiplas umas com as outras.[4] Assim, a ordem jurídica como um todo coerente é regida pelos mesmos pensamentos jurídicos, princípios ou valores, a maioria já expressos na nossa Constituição, que devem justificar a escolha do intérprete na aplicação das leis.[5]
Em consonância com essa necessidade de o jurista atentar para o cânone da totalidade do ordenamento jurídico[6], a Teoria do Diálogo das Fontes permite a conjugação de leis infraconstitucionais para sua aplicação no caso concreto ou a prevalência de uma, atentando-se para os valores consagrados na Constituição, de humanidade, dignidade e proteção dos hipossuficientes, através dos três tipos de diálogos nomeados pelo Prof. Erik Jayme, que serão expostos mais adiante.
Veja-se que ao tratarmos da figura do usuário, estamos adentrando um dos pilares do direito público, referente aos serviços públicos. O direito público tem toda a sua base no princípio da legalidade, imposto seu respeito pela Administração no artigo 37 da Constituição Federal, pelo que poderia ser questionada a “relativização” de suas normas imperativas pelo método do diálogo das fontes. Justamente por esta razão, a jurisprudência ainda é bastante tímida na aplicação irrestrita do Código do Consumidor aos usuários de serviços públicos de energia elétrica, embora uma gradativa mudança pode ser percebida nos anos recentes.
Defende-se, no presente estudo, justamente a validade do método do diálogo das fontes para o direito administrativo também, o que possibilita uma maior aproximação da figura do usuário de serviços de energia elétrica aos direitos conferidos aos consumidores em geral, mormente em razão de sua hipossuficiência frente ao prestador de serviço, tendo sempre como Leitmotiv a concreção dos preceitos constitucionais.
1. A SUPERÁVEL DICOTOMIA ENTRE DIREITO PÚBLICO E PRIVADO
A. Caracterização dos serviços públicos – entre o direito público e o direito privado
O sistema jurídico romano-germânico desde sempre reconheceu uma divisão nos ordenamentos jurídicos, separando os regimes de direito público e de direito privado, cada qual com características, princípios, sujeitos, funções e objetivos diversos. Já nas Institutas de Justiniano (I., 1.4.) se declarava que o direito público dizia respeito ao modo de ser do Estado Romano, e o direito privado aos interesses dos particulares.[7]
Segundo o jurista Hely Lopes Meirelles, o direito público interno regula precipuamente os interesses estatais e sociais, e só reflexamente se ocupa da conduta individual, enquanto que o direito privado tutelaria predominantemente os interesses individuais, assegurando, assim, a coexistência das pessoas em sociedade e a fruição de seus bens.[8] Ou seja, se explica uma diferenciação entre as normas de direito público e as de direito privado, pois aquelas buscam o bem comum dos indivíduos em sua coletividade, enquanto que o direito privado é oferecido aos particulares para que estes possam alcançar o seu bem individual, nas suas relações recíprocas.[9]
Justamente por esta razão é que afirma Cirne e Lima que a relação jurídica de direito público se estrutura ao influxo de uma finalidade cogente, portanto, não pode ser afastada em prevalência de interesses particulares.[10] A distinção entre direito público e privado não quebra, contudo, a unidade da ordem jurídica, pois se trata de dois aspectos fundamentais de uma mesma ciência.[11]
O advento, então, do Estado de Direito, após a queda da maior parte das ditaduras e o restabelecimento da democracia, garantiu uma aproximação acelerada desses dois campos do direito, sob a iluminação das Constituições Sociais. Neste ponto, direito público e direito privado passaram a se mostrar como duas faces de uma mesma moeda, devendo ambos promover os direitos fundamentais e tutelar a dignidade humana. Desta forma, a autonomia da vontade nas relações privadas cede um pouco do seu espaço para a intervenção estatal, consolidando-se o reconhecimento da necessidade de intervenção ativa do Estado em setores específicos, buscando justamente os fins aludidos: promover os direitos fundamentais e tutelar a dignidade.[12]
A partir de então, tanto o direito público quanto o direito privado se desenvolvem como instrumentos de realização dos fins consagrados na Constituição, não sendo atribuído a nenhum sujeito direito ou poder para a satisfação de seus interesses exclusivos e egoístas. Ambos ramos do direito passam a ter natureza instrumental, de realização dos direitos fundamentais, e não de locupletamento individual do seu titular.[13] O interesse público, em um Estado Democrático, consiste, assim, na vontade da maioria eventual e também na garantia aos interesses da minoria, segundo parâmetros constitucionalmente fixados.[14]
Entretanto, as diferenças entre os dois regimes são indiscutíveis, justamente em vista da referida finalidade cogente das relações de direito público.[15] O regime de direito público disciplinaria poderes, deveres e direitos vinculados diretamente à supremacia e à indisponibilidade dos direitos fundamentais, os quais deve promover.[16] A manifestação da vontade do Estado se faz, portanto, de regra, de forma unilateral, tendo em vista o interesse estatal, do coletivo. Mesmo quando as situações jurídicas se formam acaso por acordo, o regime jurídico a que se sujeitam é, em consequência, o estatutário, e as partes são hierarquicamente diferentes, situadas em uma relação vertical.[17] Por outro lado, o regime de direito privado seria norteado pela autonomia da vontade, traduzida principalmente nos institutos da propriedade e do contrato, autonomia na escolha de valores a realizar e na disponibilidade dos interesses em conflito.[18]
Esta dicotomia está presente quando se compara o usuário de um serviço público a um consumidor de um serviço privado. Aquela relação é tipicamente vertical, enquanto esta tenta ser horizontal, independente da vulnerabilidade de uma das partes. Entretanto, em muitos pontos já se faz possível uma aproximação dessas figuras, justamente quando se busca a promoção de direitos fundamentais e da dignidade. Por esta razão, conforme se argumentará, o método adequado para o entrosamento dessas legislações específicas é justamente o diálogo das fontes, sob a égide dos princípios constitucionais.
Algumas definições mais amplas de serviço público consideram como tal toda atividade exercida pelo Estado para a satisfação de necessidades públicas.[19] Outros autores restringem este conceito àquelas atividades prestadas pela administração, não Estado, excluindo, consequentemente, as atividades jurisdicional e administrativa.[20] Nesta linha, o jurista Marçal Justen Filho, seguindo essa linha mais restritiva, nos provê com uma definição bastante minuciosa de serviços públicos, aduzindo ser uma “atividade pública administrativa de satisfação concreta de necessidades individuais ou transindividuais, vinculadas diretamente a um direito fundamental, insuscetíveis de satisfação adequada mediante os mecanismos da livre iniciativa privada, destinada a pessoas indeterminadas, qualificada legislativamente e executada sob regime de direito público."[21]
De qualquer maneira, é o próprio Estado quem escolhe quais atividades serão consideradas como serviços públicos[22] - rol que se ampliou consideravelmente com a introdução do Estado Social, como se viu -, estando eles para nós elencados no Art. 21, incisos X, XI, XII, XV e XXIII, e 25 §2º. As atividades não definidas como públicas constitucionalmente seguem pertencentes ao setor privado, pelo que a distinção efetiva entre serviços públicos e privados é constitucional. Os serviços de energia elétrica, cujo regime definido pela ordem constitucional brasileira será mais adiante trazido, estão incluídos neste rol, nomeadamente no Art. 21, inciso XII, letra “b”.
A qualificação de uma atividade como serviço público pressupõe, como se vê do rol referido, o vínculo com os direitos fundamentais, mas é também indispensável a inadequação dos mecanismos da livre iniciativa privada para a satisfação das necessidades correspondentes,[23] juízo este realizado, novamente, pelo constituinte. A Constituição Federal dispõe que incumbe ao Poder Público a prestação dos serviços públicos, devendo lei dispor sobre o regime de concessão e permissão, bem como sobre a fiscalização destes, os direitos dos usuários, a política tarifária e a obrigação de manter serviço adequado, conforme se lê expressamente do Artigo 175 da Constituição Federal.
Ao longo do tempo, o instituto do serviço público tem experimentado diversas crises, tendo alguns autores inclusive proclamado sua morte.[24] Uma das maiores causas dessa crise é sem dúvida a evolução tecnológica, responsável pela alteração da configuração dos serviços públicos, mormente no tocante aos monopólios naturais, como é o caso da energia elétrica. Uma característica marcante do novo serviço público reside na dissociação entre as atividades de regulação e de prestação do serviço público, sendo a competência para a regulação retirada dos prestadores do serviço. Para tanto são criadas entidades administrativas autônomas, as agências reguladoras, que disciplinam o desempenho dos serviços, a fim de assegurar a imparcialidade, democratização e transparência em sua gestão[25], com vistas, principalmente, a preservar a concorrência, beneficiando usuários.
Com a introdução da concorrência na prestação de serviços públicos antes considerados como monopólios naturais do Estado[26], cresce o número de concessionários e permissionários atuando na prestação destes serviços, e aumenta a dificuldade de controle da relação destes com os usuários, gerando uma necessidade de se conferir a estes últimos direitos e prerrogativas mais efetivas e exequíveis. Em face ao usuário, o concessionário se posiciona como se fosse o próprio Estado. As relações jurídicas com os usuários não apresentam natureza contratual. Não obstante, os concessionários estão obrigados a respeitar os direitos dos usuários e prestar-lhes o serviço adequado, assim como todas as informações necessárias a sua boa fruição.[27]
A maioria derradeira da doutrina não vislumbra o abandono do instituto dos serviços públicos, justamente em razão da tarefa do Estado de promover os direitos fundamentais. Justamente em razão do caráter de essencialidade ligado aos serviços públicos, regem-se estes por uma série de princípios específicos, alguns legalmente colocados e outros doutrinária e jurisprudencialmente encontrados, sendo principalmente os princípios da continuidade, igualdade, universalidade, neutralidade, isonomia, mutabilidade. Alguns outros são considerados como "novos princípios", como o da adequação da prestação do serviço, transparência, ausência da gratuidade (subsidiado), modicidade tarifária, estes presentes em normas narratórias da Lei 8.897/95 a qual regula a concessão e permissão de serviços públicos.[28]
Entretanto, a onda de privatizações iniciada globalmente na década de 90, trouxe consigo uma consciência da possibilidade de prestação de determinados serviços públicos pelos particulares, entendendo-se benéfica a introdução da concorrência em setores que antes eram considerados monopólios naturais.[29] Consequência inevitável deste movimento uma adequação do conceito de serviço público e da sua regulação; somado ao valor pós-moderno de proteção do consumidor hipossuficiente, surge um cenário no qual os usuários dos serviços públicos – prestados por particulares com um certo nível de discricionariedade -, vêm a merecer proteção em um mesmo nível à dos consumidores de serviços particulares.
No ponto, merece destaque a lição do jurista Juarez Freitas, que delimita ser serviço público todo aquele essencial para a realização dos objetivos fundamentais do Estado Democrático, não podendo o Estado prescindir de sua adequada prestação, justamente porque considerado, num dado contexto histórico, como essencial à consecução de seus fins. Assim, tudo o que transbordasse da essencialidade não deveria ser reputado como serviço público, ainda que o seja nominalmente, nos dias que correm, por força normativa.[30]
Relativamente à mudança na visão e estrutura dos serviços públicos, pode se trazer, exemplificativamente, a experiência europeia que deixou o conceito de “serviços públicos”, fortemente influenciado pelo direito francês, passando a englobá-los no conceito de “serviços de interesse econômico geral”. Traço relevante desta noção é que não é o regime jurídico aplicado, nem o vínculo com o Estados que os definem, mas a configuração de um interesse econômico geral.[31] A Comunicação da Comissão Europeia sobre os Serviços de Interesse Geral na Europa, de 1996,[32] já deixava claro que, a despeito da adoção do modelo de economia aberta, a União está também fundamentada na solidariedade e igualdade de tratamento, concretizadas também pelos serviços de interesse econômico geral.
No novo contexto comunitário, de privatizações, liberalização, abertura á concorrência e internacionalização dos contratos públicos, o Estado vai abrindo mão da sua responsabilidade de execução (Erfüllungsverantwortung), a qual tende a ser substituída por uma responsabilidade de garantia de prestação (Gewährleistungsverantwortung), e por fim por mera responsabilidade de controle e fiscalização (Beobachtungsverantwortung).[33] Isto demonstra que a vinculação dos serviços de interesse geral (para nós inseridos no conceito de serviços públicos) não necessariamente devem estar vinculados somente ao regime de direito público, sendo possível o diálogo também com normas de direito privado, como é o caso do Código de Defesa do Consumidor.
Atendendo à orientação Constitucional, contida no Art. 175, inciso III, de se garantir o direito dos usuários, o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), no seu artigo 6º, dispõe ser direito básico do consumidor a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral, e obriga ao fornecimento de serviços adequados, eficientes, seguros e contínuos, dispondo inclusive sobre a reparação de danos, no artigo 22 do diploma. Entretanto, as figuras do usuário e do consumidor não são coincidentes, e nem a figura do “consumidor” de energia elétrica contida na legislação setorial é idêntica àquela provida pelo CDC, pelo que cabe analisar a sua distinção mais aproximadamente.
B. Diferenciação entre consumidor e usuário de serviços de energia elétrica
Conforme visto, a dicotomia rígida entre o Direito Público e o Direito Privado já não faz o mesmo sentido de outrora, sobretudo em virtude do recente fenômeno da constitucionalização do Direito em geral. A dignidade da pessoa humana passa a ser o princípio fundamental, de que todos os demais princípios derivam e que norteia todas as regras jurídicas, conduzindo a uma “personalização do direito administrativo”[34], voltado primordialmente à proteção da dignidade individual dos cidadãos.
O advento do Estado de Direito Democrático significou que supremacia do interesse público não pode significar a supressão de interesses privados. Um dos mais graves atentados ao interesse público consiste no sacrifício prepotente, desnecessário ou desarrazoado de interesse privado.[35] Nesse ponto, a distância entre direito público e privado é reduzida, porquanto ambos devem respeitar e buscar concretizados os preceitos fundamentais e a dignidade, devendo aqueles receber maior proteção por parte do Estado, cuja dignidade não pode ser protegida ou realizada por seus próprios esforços e com recursos individuais isolados.[36]
Em uma visão de serviços públicos mais adequados à realidade pós-moderna, é atribuído ao usuário um papel central, sendo os serviços voltados para a concretização da dignidade destes. É necessário reconhecer-se que o serviço é prestado em favor de um usuário, o qual detém direitos subjetivos e pode reclamar sua satisfação.[37] A supremacia do interesse público sobre o privado, que poderia opor-se à extensão dos direitos dos consumidores aos usuários, defendida por grande parte da doutrina, não parece ser suficiente para afastar o diálogo, uma vez que, no contexto constitucional atual, a tutela da dignidade de cada um dos cidadãos jamais poderá ser olvidada, nem mesmo em atenção ao interesse coletivo.[38]
A doutrina usualmente utiliza-se da expressão usuário para indicar todos os sujeitos que, em tese, possam a vir a utilizar-se do serviço público.[39] Distingue-se do consumidor por vários motivos que se irá expor, este definido no CDC, Art. 2º, como "toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final."[40]
Há duas principais correntes de definição do conceito de consumidor, sendo uma restritiva,[41] segundo a qual consumidor será somente aquele que de fato e sob o ponto de vista econômico retira do mercado de consumo determinado bem ou serviço, enquanto que uma corrente “maximalista” pretende estender a aplicação do CDC a todos os agentes do mercado de consumo, bastando, para tanto, que o bem ou serviço seja retirado de fato do mercado.[42] Esta última conceituação se aproxima do que a legislação do setor de energia elétrica engloba em consumidor. O perigo de uma ampliação do conceito é que, como consequência, a proteção conferida pela jurisprudência é reduzida quando também aplicável a agentes de mercado menos vulneráveis.
A noção de consumidor acompanha as relações comerciais privadas, atuando como um controle à suas práticas, ao lado do direito concorrencial.[43] Tradicionalmente, são diferenciados ambos os conceitos, pois a noção de consumidor pressupõe a hipossuficiência, econômica e jurídica, que é dita inexistente nas relações de serviço público, não podendo a posição do usuário ser caracterizada como de fragilidade frente ao prestador de serviços, uma vez que é ele o destinatário desta prestação.[44] Entretanto, conforme será argumentado, tomando-se por exemplo o serviço de fornecimento de energia elétrica a usuários finais, esta compreensão já em muito se distancia da realidade observada e paulatinamente compreendida por nossos tribunais. Nas palavras de Juarez de Freitas, “a luta pela eficácia social do princípio da proteção do consumidor de serviços públicos implica, antes de mais, o reconhecimento técnico e fático da vulnerabilidade dos usuários”.[45]
Neste ponto, importa destacar que a posição jurídica de um usuário de serviço público monopolizado, marcado por liberdade bastante restrita do prestador, é distinta daquela ocupada por um usuário de serviço prestado em regime que assegure ao concessionário liberdade mais ampla na definição dos termos, pois nesses reduz-se a intensidade das garantias públicas ao usuário e amplia-se o regime próprio das relações de consumo. Nos serviços monopolizados, o controle público é, em regra, muito maior, diante da ausência de concorrência, dificultando a aplicação do direito do consumidor à relação.
Já nos serviços prestados em caráter de concorrência, atualmente a maioria, o regime a que será submetido esta relação não deixará de ser de direito público, mas abre-se mais espaço para o diálogo com as normas aplicáveis aos consumidores de direito privado, e mesmo com o direito da concorrência, cujo objetivo primordial é também a proteção dos consumidores.[46] Nestes casos, o Direito do Consumidor atua como uma espécie de segunda face do Direito antitruste, buscando-se em todos os casos evitar as distorções produzidas pelos mecanismos de mercado, assim como ocorre nos serviços privados.[47]
Indiscutível o caráter de verticalidade na relação entre usuário e prestador do serviço público, devendo-se sempre conciliar, por conseguinte, as prerrogativas administrativas e a proteção do consumidor, sob a égide da Constituição. Entretanto, em uma compreensão pós-moderna da necessidade de proteção dos hipossuficientes, é necessário estabelecer-se uma ponte entre a situação estatutária e a relação de consumo.[48] Este já tem sido o reconhecimento do STJ, da existência de uma relação de consumo na prestação de serviços públicos por delegação[49]. A questão da proteção do usuário deve, inclusive, ser considerada entre os fatores determinantes da magnitude do risco que assume o prestador, da mesma forma o custo da proteção do CDC é computada nos cálculos de um prestador de serviço aos consumidores.[50]
No caso dos serviços de energia elétrica, deve-se atentar para a utilização, na legislação setorial, do vocábulo “consumidor”, pelo qual são designados os grandes consumidores, os quais têm a possibilidade de escolher o fornecedor de energia. Neste sentido os artigos 15 e 16 da Lei 9074/95 (Lei geral das concessões). A Resolução Normativa 414/2010 da ANEEL, que estabelece as condições gerais de fornecimento de energia elétrica, no seu artigo 2º, XVII, traz definições específicas dos diversos tipos considerados de consumidores, quais sejam:
XVII – consumidor: pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, legalmente representada, que solicite o fornecimento de energia ou o uso do sistema elétrico à distribuidora, assumindo as obrigações decorrentes deste atendimento à(s) sua(s) unidade(s) consumidora(s), segundo disposto nas normas e nos contratos (...)[51]
Portanto, deve-se ter em conta que, ao falar-se aqui em extensão da proteção do CDC aos usuários do serviço de energia elétrica está-se referindo tão somente àqueles usuários que também se poderiam enquadrar na definição restritiva do Art. 2º do CDC, ou seja, aqueles que sejam destinatários final do serviço, e não intermediários da comercialização.
Veja-se que o STJ já restringiu a aplicação do CDC somente aos usuários finais dos serviços de energia elétrica, explicitando que, “não sendo a empresa destinatária final dos bens adquiridos ou serviços prestados, não está caracterizada a relação de consumo”.[52] Em que pese o artigo 22 do Código de Defesa do Consumidor não faça esta distinção, a jurisprudência têm, acertadamente, pautado-se pelo espírito deste Código, e sua intenção de proteção aos hipossuficientes, que seriam os usuários finais, podendo-lhes, assim, garantir uma proteção mais ampla. Portanto, no presente estudo, ao falar-se em “consumidor de energia elétrica”, toma-se o conceito à luz da interpretação que lhe deu o STJ, significando aquele usuário final do serviço, em um verdadeiro exercício de diálogo com o Código de Defesa do Consumidor.
Ambos os conceitos, de consumidor e usuário, partem de matrizes constitucionais diversas: a defesa do consumidor é referida como princípio da ordem econômica no artigo 170, V, e como um dos direitos e deveres individuais e coletivos no artigo 5, XXXII. Já os direitos dos usuários vêm garantidos constitucionalmente nos artigos 150, §3º e 175, II. Já a previsão de um código de defesa dos direitos dos consumidores veio presente no Art. 48 ADCT. Por outro lado, na EC. 19/1998, no art. 27, fez-se alusão a uma lei de defesa dos direitos do usuário de serviços públicos, o que claramente indicaria a inaplicabilidade, na íntegra, do código destinado aos consumidores, em razão das divergências entre as duas figuras.
Há, ainda, ainda uma distinção econômica entre as duas figuras: consumidor é aquele que vai ao mercado procurar, segundo uma relação de oferta e preço. Esta escolha não se estende ao usuário, que faz uso de uma mercadoria essencial à sua existência, independentemente de preço, oferta ou escassez.[53] De uma leitura dos dispositivos constitucionais, portanto, vê-se que, enquanto que o consumidor é um agente da economia de mercado, o usuário é tão somente destinatário de um serviço público.[54] Justamente esta fragilização do usuário, em não poder prescindir do serviço prestado, por exemplo, o de fornecimento de energia elétrica, é que torna a dicotomia entre direito público e direito privado superável, para fins de lhe garantir uma proteção conforme o princípio constitucional da dignidade humana.
Na lição de Konrad Hesse, a Constituição transforma-se em força ativa se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se fizerem-se presentes, na consciência geral, a vontade de Constituição.[55] Conforme reconhece o renomado jurista, entre a norma fundamentalmente estática e racional e a realidade fluida e irracional, existe uma tensão necessária e imanente que não se deixa eliminar.[56] No presente caso, então, a inexistência de uma lei específica que garanta proteção dos usuários pelo menos equivalente ao Código do Consumidor, impõe-se, em atenção à vontade da Constituição de proteção da dignidade humana,[57] a superação da dicotomia entre o direito público e o privado, neste ponto, para alcançar-se aos usuários de serviços públicos a proteção já garantida aos consumidores na legislação ordinária.
Assim sendo, o diálogo entre as leis aplicáveis a um e a outro se faz útil e inclusive necessário à garantia de direitos fundamentais e da dignidade, levando-se para o regime do usuário figuras da proteção consumeirista, sempre que se fizer sentir a omissão do direito público em determinado caso. Importante é que se possibilite a incorporação do modo de pensar trazido com o Código de Defesa do Consumidor para o serviço público. Conforme bem observa a autora Bibiana Graeff Pinto, o status de consumidor não substitui o de usuário, mas este último seria protegido tanto pelo direito dos serviços públicos quanto pelo direito do consumidor.[58] Nas palavras da autora, “os usuários de serviços públicos devem ser considerados como usuário-consumidor”, recebendo uma proteção suplementar do direito do consumidor.[59]
Conforme se viu, nossa Constituição demanda a proteção dos consumidores e dos usuários, sempre buscando-se a afirmação da dignidade humana, mas também garante as prerrogativas da Administração Pública para a concreção do interesse público, o qual difere do interesse particular de cada um dos usuários. A Carta Fundamental, portanto, manda direito público e direito privado dialogarem, para a concreção dos direitos fundamentais.
Quando se desce ao plano das leis infraconstitucionais, contudo, têm-se aquelas que regulam os serviços públicos e direito dos usuários – como exemplo principal a Lei 8.987/95, que regula as concessões e permissões e, pertinente ao presente estudo, a Lei 9.074/95, que regula a concessão dos serviços públicos inclusive o de energia elétrica, bem como as demais legislações setoriais-, e o Código do Consumidor, com alguns dispositivos considerados típicos de direito administrativo, mas a maioria voltada à regulação das relações privadas. A aplicação de uma ou outra lei a um determinado caso não é conflito passível de ser resolvido pelas regras de solução de conflito de leis dadas pela lei civil, necessitando de um método mais adequado a resolução dos casos concretos atentando-se para a dignidade e outros preceitos fundamentais, que, conforme se verá, é o método da teoria das fontes.
O desenvolvimento da força normativa da Constituição não depende, como reconhece Hesse, só do conteúdo da Constituição, mas também de sua práxis. A concepção de vontade de Constituição deve ser partilhada por todos os partícipes da vida constitucional,[60] no que desponta a importância da recente tendência jurisprudencial na questão, mormente no tocante aos serviços de fornecimento de energia elétrica, conforme se verá na sequencia.
2. O diálogo do CDC com as leis aplicáveis aos serviços públicos de fornecimento de energia elétrica
A. A pós modernidade e a necessidade de diálogo com vistas à proteção do consumidor/usuário
O método da teoria das fontes foi detalhadamente apresentado à Comunidade Internacional pelo Prof. Erik Jayme, da Universidade de Heidelberg, em 1995, na Conferência de Direito Internacional de Haia, inserindo-se na tradição da visão sistemática do direito, ao ratar da coerência do direito posto, mas atualizada por uma visão cultural do direito e uma nova perspectiva humanista.[61] Foi com sucesso e gradual aceitação introduzido no direito brasileiro pela jurista Prof. Claudia Lima Marques, aparecendo hoje reiteradamente em decisões importantes das Cortes Superiores.
Os critérios clássicos para a solução de antinomias foram positivados na Lei de Introdução ao Código Civil, de 1942, no Artigo 2º. São eles (i) a anterioridade, que determina a retirada da lei anterior do sistema pela lei mais recente, (ii) a especialidade, critério pelo qual a lei especial derroga a lei geral se regular inteiramente a matéria da anterior geral e (iii) a hierarquia, pelo que a lei hierarquicamente superior, determinada por critérios formais, afastaria a lei inferior. A técnica tradicional de solução de conflitos determina, assim, necessariamente a aplicação de uma única norma, excluindo-se da aplicação a normal conflitante, segundo tais critérios.
Entretanto, referida solução mostra-se insuficiente e ineficaz nos tempos pós-modernos, principalmente por duas razões. Primeiramente, porque identifica-se a necessidade de o direito concretizar os direitos fundamentais e, especialmente, a dignidade humana, tidos como Leitmotive, valores a nortear o caos legislativo atual.[62] O que nos leva à segunda razão da insuficiência das regras clássicas de solução de conflitos de lei, o que o autor Ricardo Luiz Lorenzetti denomina a “Era da desordem”, em razão do fenômeno da decodificação[63], chegando a referir ao fenômeno do “big bang legislativo”.
O fenômeno da Codificação surge historicamente como uma reação justamente como forma de conter-se o ativismo judicial, sinônimo, à época, da tirania dos juízes, apoiando-se, consequentemente, no positivismo Kelseniano. A evolução social e mormente a criação do Estado de Direito trouxeram de volta a necessidade de se interpretar as leis de forma a concretizar os novos preceitos constitucionais, demandando dos juízes serem mais do que a Bouche de la Loi, como defendia Montesquieu.[64]
O Professor Erik Jayme elenca três características do nosso tempo, quais sejam, a velocidade, a ubiquidade e a liberdade.[65] Consequência desta velocidade, principalmente, é o surgimento de novas leis em forma de microssistemas, leis esparsas, produção legislativa intensa. Por consequência, os tempos pós-modernos não mais admitiriam uma monossolução, como a proposta por nossa Lei de Introdução do Código Civil, mas demandariam o que o professor denominou diálogo: a superação de paradigmas substituída pela convivência dos paradigmas.[66] Assim, não mais se faria necessária a supressão de uma das normas na aplicação ao caso concreto, mas o juiz escutaria o diálogo destas, aplicando-as simultaneamente, complementariamente ou subsidiariamente.
Três são os diálogos possíveis entre duas ou mais normas, conforme explicado pelo mestre de Heidelberg. Pode-se observar (i) um diálogo sistemático de coerência, quando uma lei serve de base conceitual para a outra, (ii) um diálogo sistemático de complementariedade e subsidiariedade, quando uma lei complementa e acrecenta à aplicação de outra, e (iii) o diálogo de coordenação e adaptação sistemática, em um diálogo de influências recíprocas ou com a transposição das conquistas do Richterrecht de um campo do direito ao outro.[67] Este dialogo é possibilitado, e justificado, pelos elementos que o Professor Erik Jayme ensina como característicos do direito pós-moderno: o pluralismo, a comunicação, a narração e o retorno aos sentimentos.[68] O pluralismo se refere tanto a uma diversidade de estilos e valores, somados à tolerância crescente entre as pessoas, quanto a uma diversidade de fontes legislativas para regulação do mesmo fato, e traz consigo a exigência que “lês situations différentes soient traitées différemment”[69].
A narração é o elemento base da teoria do diálogo das fontes, referindo-se às normas, cada vez mais presentes nos ordenamentos jurídicos atuais, que em lugar de imporem obrigações, apenas descrevem valores e motivos, aos quais necessariamente deve atentar o intérprete em caso de conflitos de leis. O retorno aos sentimentos delineia a forma como deve ser conduzido esse diálogo. Trata-se do retorno aos valores humanos, a salvaguarda da identidade cultural, da dignidade, dos preceitos fundamentais, que devem ser os motivos condutores do ordenamento jurídico e de sua aplicação.[70] O diálogo das leis deve, assim, alcançar a finalidade narrada em ambas as normas aplicadas, sob a luz da Constituição de seu sistema de valores.[71]
A aplicação do método do diálogo das fontes ao direito administrativo pode inicialmente ser questionada, porquanto este se subordina, como regra, à legalidade estrita. Entretanto, também nesta matéria observa-se a aplicação jurisprudencial, paulatinamente crescente, do referido método.[72],[73] Aqui argumenta-se a necessidade de uso do método do diálogo das fontes para a resolução de antinomias entre os regimes aplicáveis aos usuários de energia elétrica e consumidores, visando garantir àqueles a proteção que lhes é constitucionalmente assegurada, com aplicação subsidiária do código do consumidor, nos pontos em que a legislação de direito público é omissa. Em muitas hipóteses, conforme se verá, esse diálogo entre direito privado e direito público é plenamente possível, conduzindo a soluções aceitáveis dentro do método, como sendo aquelas que garantem maior proteção aos hipossuficientes e promovem a dignidade humana.
De início, é necessário reforçar a diferença entre as figuras do usuário e consumidor, sendo o diploma da lei 8.078/90 (consumidor) aplicável inicialmente aos consumidores de serviços privados. Referida lei dispõe de dois dispositivos aplicáveis diretamente aos usuários de serviços públicos, notadamente os artigos 6º, X, e 22º.[74]
Afora estes dispositivos, a Lei 8.987/1995, que regula as concessões e permissões de serviço público, dedica alguns de seus dispositivos à proteção dos usuários, frente aos concessionários e permissionários, os quais com os usuários se relacionam como se o Estado fossem, mormente o Art. 7º. Essa aplicação do CDC aos usuários deve ser, então, adicional à proteção conferida pelo direito público, e é adequada sempre que houver algum espaço de liberdade aos prestadores (permissionários ou concessionários). Não se pode olvidar, porém, que referida aplicação deve ter sempre atenção ao fato de que os contratos com a Administração Pública jamais perdem seu caráter de verticalidade, reservadas à Administração faculdades que desequilibram o contrato.[75]
O artigo 4º, VII do CDC declara ser um dos princípios da Política Nacional das Relações de Consumo a “racionalização e melhoria dos serviços públicos” e o art. 6º, X, do CDC prevê que é um direito básico do consumidor “a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral”. Estas normas narrativas estabelecem um norte ao diálogo entre as leis aplicáveis, quando em conflito, conforme ensinamentos do mestre Erik Jayme.
Adentrando, no próximo ponto, especificamente a aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos usuários finais de energia elétrica, verificar-se-á a possível superação da dicotomia entre as figuras de usuário e consumidor, devendo garantir-se àqueles a proteção que lhes é constitucionalmente garantida e que, à vista das peculiaridades do serviço, que não permite a escolha do fornecedor pelos pequenos consumidores, deve somar a proteção já legislada do direito público à proteção do consumidor em geral, por meio do diálogo das fontes.
B. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos usuários finais de energia elétrica por meio do diálogo das fontes
A atividade de fornecimento de energia elétrica foi durante muito tempo considerada indivisível e um monopólio natural. A evolução tecnológica assistida permitiu perceber-se, contudo, que em algumas fases dessa cadeia de serviços seria possível introduzir-se o regime de concorrência, como é o caso da atividade de geração da energia e de comercialização da energia, remanescendo como monopólios naturais as atividades de transmissão e distribuição desta, que dependem de uma só rede.
Na década de 90, então, o setor de energia elétrico brasileiro experimentou a desestatização e privatização, mormente nos setores de geração e distribuição de energia. Assim, o Estado deixou paulatinamente de ser o executor dessas atividades de interesse público e passou a ser o regulador, criando-se a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), mediante a Lei 9.427/96, com a função de precipuamente fazer surgir um mercado, garantindo a livre entrada de novos interessados, sua permanência e a troca de bens e serviços entre eles.[76] Mais recentemente, surgiram as licitações para a compra e venda de energia, destacando-se o papel da CCEE – Câmara de Comercialização de Energia Elétrica, onde a compra de energia é negociada em leilões ou mediante contratos bilaterais.
De acordo com a legislação setorial, conforme já explanado, consumidores são aqueles que compram em grande quantidade, negociam energia elétrica, tendo a possibilidade escolher o fornecedor. Esse “consumidor” é aquele que paga um preço pela energia, diferente do usuário final, pequeno consumidor, que paga uma tarifa, integralmente regulada pelo Poder Concedente e acompanhada pela ANEEL.
A Lei nº 9.427/96, que criou a ANEEL, em seu artigo 3º, V, prevê que a esta compete dirimir, em âmbito administrativo, as divergências entre concessionárias e entre elas e os consumidores, o que significa afirmar que ela constitui o único âmbito administrativo de fazê-lo.[77] Há, no âmbito legislativo, uma preocupação com o discurso oficial em garantir a neutralidade das Agências Reguladoras, em razão do alto risco de captura destas pelas pressões políticas e econômicas. Por esta razão, o direito de participação do consumidor é considerado digno de tutela, e é, ao menos formalmente, garantido pela legislação setorial em vigor (Lei 9.427/96 e Decreto 2.335/97).
Existem Conselhos de Consumidores de Energia Elétrica, criados pelas concessionárias e permissionárias, que são constituídos por consumidores voluntários de todas as classes, inclusive residencial, bem como representantes dos órgãos de proteção e defesa do consumidor. Da mesma forma, o Operador Nacional do Sistema elétrico (ONS) conta com a participação de pequenos consumidores, porém sem direito a voto.[78] Entretanto, em razão da complexidade dos serviços, a participação é dificulada, uma vez que os consumidores participantes são em sua maioria leigos nos assuntos eminentemente técnicos, o que requer ainda um avanço na garantia deste direito.[79]
A legislação específica traz já normas que fazem menção à defesa do consumidor, como é o caso da Lei n. 9.478/97, que dispõe sobre a política energética nacional, que estabelece, no art. 1º, III, o objetivo de “proteger os interesses do consumidor quanto ao preço, qualidade e oferta dos produtos”.
Ademais, a Resolução ANEEL n. 414/2010 traz pormenorizadamente algumas garantias aos pequenos consumidores, quais sejam: especificação das informações mínimas que devem constar da fatura, elencando um total de 15 itens (art. 119), garantia aos consumidores residenciais de baixa renda a possibilidade de parcelamento de débito (art. 118), garantia de instalação de medidores gratuitamente às famílias de baixa renda (art. 74).
Especificamente no que tange o corte de energia elétrica, a proteção do consumidor inadimplente não é a mesma verificada no âmbito de outros serviços públicos, como é o caso de fornecimento de água. Ao contrário do que usualmente dispõe a legislação sobre o serviço de fornecimento de água, a obrigatoriedade de fruição não foi imposta pelas normas vigentes para o setor elétrico, tendo cada usuário o direito de optar por ter ou não acesso ao serviço, razão pela qual não se aplica ao setor necessariamente os mesmo fundamentos do corte no fornecimento de água.[80]
A lei prevê uma proteção nesse sentido, um tratamento diferenciado, somente para os "consumidores" que sejam prestadores de serviços públicos (Art. 17 da Lei 9.427/96[81]); ainda assim, determina que apenas seja comunicado o poder público responsável antes de proceder-se o corte. Diverge da posição adotada pelo STF quanto ao serviço de água, que proibiu o corte do fornecimento.[82] Mesmo com relação a estes prestadores de serviços essenciais, portanto, a interrupção do fornecimento de energia elétrica é entendida legal, após a notificação referida no art. 17 da Lei nº 9.427/96.[83] Contudo, a recente jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, já vem reconhecendo a impossibilidade de corte no caso de consumidor de baixa renda que necessite do fornecimento de energia elétrica para sua sobrevivência, mediante aparelhos. Nesse sentido cumpre transcrever:
MANDADO DE SEGURANÇA. SUSPENSÃO DO SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA POR INADIMPLEMENTO. IMPOSSIBILIDADE. ESPECIAL CONDIÇÃO DE SAÚDE DO USUÁRIO. Não se trata de deferimento de fornecimento de energia elétrica de forma gratuita, pois é dever da impetrada fornecer o serviço e do usuário cumprir com a contraprestação, ou seja, adimplir os seus encargos, para que se possa manter o equilíbrio financeiro da atividade econômica. O que se está assegurando na presente ação é a continuidade do serviço, tendo em vista a particularidade relacionada à saúde do cônjuge da impetrante, sem impossibilitar a cobrança de eventual dívida pelas vias legais pertinentes. (TRF4, APELREEX 5002558-84.2010.404.7201, Terceira Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Lúcia Luz Leiria, D.E. 23/09/2011).
Veja-se que permeia tal decisão o reconhecimento de que no conceito de serviço público se busca justamente garantir o princípio da dignidade da pessoa humana, especialmente pelo atendimento às populações de baixa renda.
A despeito do reconhecimento, na própria legislação específica, de alguns direitos aos usuários, em muitos pontos ainda se faz necessário diálogo com o Código de Defesa do Consumidor, conforme inclusive é reconhecido pela Corte Superior de Justiça, como é o caso da inversão do ônus probatório, calcada no art. 42, parágrafo único do CDC, garantida aos usuários de serviço de energia elétrica,[84] da restituição em dobro dos valores cobrados erroneamente,[85] ou a aplicação de penalidade pelo PROCON a distribuidora que tenha efetuado corte no fornecimento indevidamente.[86]
Conforme se vê, mesmo a disciplina processual da defesa do consumidor é integralmente aplicável ao usuário, podendo ser aplicáveis à tutela dos usuários as ações disponíveis no CDC, no art. 83, garantindo-se, assim, a eficaz tutela de sua dignidade. No atinente à defesa do consumidor de serviços públicos em juízo, da mesma forma, esta poderá ser exercida individualmente ou de modo coletivo, conforme possibilita o art. 81 do CDC.
Outro exemplo possível de aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos usuários de energia elétrica, através do diálogo das leis, poder-se-ia elencar o direito do usuário de obter a prevenção – não apenas da reparação – dos danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos, sem que seja necessário haver dano previamente, conforme previsto no CDC, art. 6º, VI. Pode-se pensar, a título de exemplo, em exigir o conserto de uma fiação que ameace cair sobre trausentes. Não há qualquer previsão deste tipo na legislação administrativa, contudo, esta aplicação respeitaria os dispositivos constitucionais, atendendo à concreção da dignidade humana sem, contudo, desrespeitar os imperativos do direito público, pelo que o diálogo se mostra possível e adequado.
Desta exposição de vê que, no âmbito dos serviços públicos de energia elétrica, o diálogo da legislação setorial com o CDC não é somente possível, mas já é reconhecido pelas Cortes Superiores, pensando-se a tutela destes usuários em termos de consumidores, à égide dos princípios constitucionais. Mormente nos espaços de liberdade dos prestadores do serviço, há um afastamento do direito público, e a aplicação das normas do consumidor na tutela dos vulneráveis faz-se imprescindível.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O que se conclui é que o método das fontes é adequado a interpretação e solução da dicotomia consumidor-usuário, mormente o diálogo de complementaridade / subsidiaridade. Isto quer dizer que deve-se proteger o usuário aplicando-se a disciplina do consumidor sempre que o direito público for omisso em fazê-lo, e na medida em que não impeça a concreção do fundamento deste, que é a realização do interesse público. É necessário ter-se em mente que a aplicação das normas do direito do consumidor não pode ser feita aos usuários de serviço público na mesma extensão que das relações privadas, nas quais não existem interesses transcendentes àquele das partes.[87] Os interesses coletivos devem ser, por certo, sopesados, mas a dignidade do usuário deve ser prevalente, como única maneira de concretizar-se o texto constitucional.
Conforme visto, estamos presenciando uma alteração do Estado prestador para um Estado regulador,[88] concentrando-se a Administração Pública na tarefa de regular, fiscalizar e sancionar os prestadores dos serviços públicos, que passam a ser pessoas jurídicas de direito privado. É uma tentativa de tornar a atuação do Estado mais eficiente, reduzindo custos para a sociedade. Entretanto, esta delegação dos serviços públicos, que passam a ser prestados por empresas privadas, com espaço de liberdade relativamente ao modo de prestação, aproxima-os cada vez mais dos serviços privados e, consequentemente, a figura do usuário à do consumidor.
A dicotomia entre direito público e direito privado não se mostra mais inquebrantável; pelo contrário, as duas áreas convergem cada vez mais na concretização dos fins constitucionais maiores, dentre eles a dignidade da pessoa humana. Neste ponto, a força normativa da Constituição, reconhecida por Hessen, impõe que sejam garantidos aos usuários de serviços públicos os mesmo direitos dos consumidores, mormente quando a atuação questionada do concessionário/permissionário se inserir neste espaço de discricionaridade do prestador.
Estas considerações demonstram a importância do diálogo das fontes entre as normas de direito público protetoras dos usuários, e o Código de Defesa do Consumidor, diálogo este que deve ocorrer visando a maior proteção dos direitos humanos e da dignidade, como Leitmotiv de sua aplicação. No presente estudo foram abordados, especificamente, os serviços de energia elétrica, prestados sob a égide da Lei 9.427/96. Conforme visto, esta já traz em seu corpo a previsão de alguns direitos aos usuários; são, porém, ainda mais restritos do que aqueles garantidos aos consumidores, razão pela qual os tribunais já aplicam, em vasta jurisprudência, o Código de Defesa do Consumidor, quando cabível. Veja-se que, nesta aplicação, não há uma subversão do regime de direito público, nem o afastamento de seus princípios basilares, mas justamente a acomodação dos direitos do consumidor-usuário dentro deste, em um verdadeiro exercício de diálogo.
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[1] Eros Robert o Grau defende a utilização do vocábulo “noção” de serviços públicos, em lugar de “conceito”, quando busca-se a significação da expressão serviço público. GRAU, Eros Roberto. Constituição e serviço público. In: GRAU, Eros Robert; GUERRA FILHO, Willis Santiago. Direito Constitucional – estudos em homenagem a Paulo Bonavides. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 264.
[2] JAYME, Erik. Identité Culturelle et Integration: Le Droit International Privé Postmoderne, 251. Recueil des Cours de la Academie de Droit International de la Haye, 33, 1995.
[3] LARENZ, Karl; CANARIS, Claus-Wilhelm. Methodenlehre der Rechtswissenschaft. 3ª ed. Berlin: Springer, 1995, p. 263.
[4] Conforme bem coloca o Prof. Juarez Freitas, “a interpretação jurídica é sistemática, ou não é interpretação”. FREITAS, Juarez. A Interpretação Sistemática do Direito. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 74.
[5] No dizer de Pontes de Miranda, “Essa exigência de sistematicidade do Direito atende à necessidade de coerência e consistência, na conduta humana, máxime no que concerne a vida em relação.” DE MIRANDA, Pontes. Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969. Rio de Janeiro: Forense, 1987. p. 39.
[6] BETTI, Emilio. Interpretação da lei e dos atos jurídicos. São Paulo: Martins Fontes, 2007. p. XLIX.
[7] BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios Gerais de Direito Administrativo. Vol. I. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 42.
[8] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 38.
[9] BANDEIRA DE MELLO, Oswaldo Aranha. Princípios Gerais de Direito Administrativo. Vol. I. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 46.
[10] CIRNE LIMA, Ruy. Sistema de Direito Administrativo Brasileiro. Porto Alegre: Editora Santa Maria, 1953.
[11] BANDEIRA DE MELLO, Op. Cit. p. 44.
[12] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 47.
[13] Ibidem.
[14] JUSTEN FILHO, Marçal. Conceito de interesse público e a “personalização” do direito administrativo. Revista Trimestral de Direito Público. Sao Paulo: Malheiros, 1999. p. 122.
[15] Sobre essa distinção, merece ser mencionada a exposição de Norbert Achterberg, que cataloga as mais significativas teorias sobre a separação entre direito público e direito privado como sendo (i) a Subjektionstheorie (teoria da sujeição), (ii) a Interessentheorie (teoria do interesse), (iii) Subjektstheorie (a teoria do sujeito), e (iv) Schwachwaltertheorie (a teoria do mandato), sendo esta última defendida pelo autor porquanto as relações de direito público necessitariam de pelo menos um dos sujeitos legitimado como mandatário do interesse comum. ACHTERBERG, Norbert. Allgemeines Verwaltungsrecht. Heidelberg: Decker & C. F. Müller, 1985. p. 3.
[16] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 46.
[17] Idem, p. 40.
[18] Idem, p. 45-46.
[19] CRETELLA JUNIOR, José. Administração Indireta Brasileira. Rio de Janeiro: Forense, 1980. p. 55-60.
[20] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 364. Já Celso Antônio Bandeira de Mello define os serviços públicos como "atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administrados, prestado pelo Estado ou quem lhe faça vezes, sob regime de direito público - porquanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais - instituídos pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios no sistema normativo." Para a caracterização de um serviço público, na visão mais moderna do autor (apresentada na edição de 2002 do seu Curso de Direito Administrativo, p. 628), exigir-se-ia a possibilidade de fruição singular deste, excluindo deste conceito mais restrito os chamados serviços uti universi (como o exercício do poder de polícia), os quais teriam regime distinto dos aplicáveis aos serviços públicos stricto sensu, justamente porque nestes estaria presente a figura do usuário, ausente naqueles. BANDEIRA DE MELLO, CELSO ANTÔNIO. Curso de Direito Administrativo. 14ª ed. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 628.
[21] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 596.
[22] No dizer do mestre CIRNE LIMA, “A definição do que seja, ou não, serviço público pode, entre nós, em caráter determinante, formular-se somente na Constituição Federal e, quando não explícita, há de ter-se como suposta no texto daquela. A lei ordinária que definir o que seja, ou não, serviço público, terá de ser contrastada com a definição expressa ou suposta pela Constituição.” CIRNE LIMA, Ruy. Pareceres (Direito Público). Porto Alegre: Sulina, 1963. p. 122.
[23] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 598.
[24] Como corajosamente constatou o autor espanhol Gaspar Ariño Ortiz, o serviço público foi um instrumento de progresso e socialização; contudo, após ter cumprido sua função, seu ciclo estaria terminado, sendo impossível embalsamar o instituto, pois hoje mudaram os pressupostos econômicos e sociais, políticos e culturais que permitiram o nascimento e desenvolvimento desse instituto. A consequência disso, segue o autor, seria a necessidade de abrir-se caminho a novas realidades, mais competitivas, mais inovadoras, melhorando os serviços e a prestação. O autor fala em "desideologizar" a política econômica, dentro de um novo modelo de regulação econômica. ARIÑO ORTIZ, Gaspar. Sobre el significado actual de la noción de servicio público y su régimen jurídico. In: ARIÑO ORTIZ, Gaspar; DE LA CUÉTARA MARTÍNEZ, Juan Miguel; y MARTÍNEZ LÓPEZ-MUÑIZ, J. L. Madrid: Marcial Pons, 1997. p. 22-23.
[25] BARCELOS, Betina. O poder normativo das agências reguladoras no direito norte-americano e no direito brasileiro: um estudo comparado. Trabalho apresentado sob a orientação do Prof. Dr. Almiro do Couto e Silva para obtenção do título de mestre pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2008. p.10.
[26] Nesse sentido, o Artigo 16 da Lei 8.897/95 faz referência à ausência de exclusividade nas concessões e permissões, preconizando a concorrência também em setores que antes eram entendidos como monopólios estatais.
[27] JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de Direito Administrativo. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 616.
[28] Ibidem.
[29] IMMENGA, Ulrich et. al. (Orgs.) Die Liberalisierung der Energiemärkte in Europa. Baden-baden: Nomos Verlagsgesellschaft, 2003. p. 33.
[30] FREITAS, Juarez. Estudos de direito administrativo. São Paulo: Malheiros, 1997. p.33 – 34.
[31] CONRADO, Régis da Silva. Serviços públicos à brasileira: fundamentos jurídicos, definição e aplicação dos serviços. Tese apresentada para a obtenção do grau de doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2011. p. 99.
[32] UNIÃO EUROPEIA, Comissão. Os serviços de interesse geral na Europa. Jornal Oficial das Comunidades Europeias, C 281, 26 set. 1996, f. 3-12.
[33] ESTORNINHO, Maria João. Direito Europeu dos Contratos Públicos. Coimbra: Almedina, 2006. p. 88.
[34] FREITAS, Juarez. Regime dos serviços públicos e a proteção dos consumidores. Revista do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Ed. 3, 2001. p. 123.
[35] JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003. p. 35.
[36] JUSTEN FILHO, Marçal. Conceito de interesse público e a “personalização” do direito administrativo. Revista Trimestral de Direito Público. Sao Paulo: Malheiros, 1999. p. 136.
[37] PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Usuários de serviços públicos. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 12.
[38] Humberto Bergmann Ávila refuta a existência de um princípio constitucional de supremacia do interesse público sobre o privado, sustentando que essa inexistente supremacia não pode ser sequer havida como postulado explicativo do direito administrativo brasileiro, e que a relação entre os interesse público e privados seria baseada no postulado da reciprocidade de interesses, poderando-os de acordo com a sistematização das normas constitucionais. ÁVILA, Humberto Bergmann. Repensando o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular. In: SARLET, Ingo Wolfgang. O direito público em tempos de crise. Porto Alegre: Livraria do advogado, 1999. p. 126. Fábio Medina Osório, contrapondo-se à tese avultada por Humberto Ávila, defende ser a administração pautada, finalisticamente, pela perseguição inafastável do interesse público, que é, nesse medida, superior ao interesse privado, notadamente quando se trata de restringir direitos individuais. Tal princípio revelar-se-ia como uma norma instituidora de outras norma, valores e fins legislativos. OSÓRIO, Fábio Medina. Existe uma supremacia do interesse público sobre o privado no direito administativo brasileiro? Revista dos Tribunais, ano 88, vol. 770, dez. 2009. São Paulo: Parma, 1999. p. 88. Ressalva o autor, contudo, que essa supremacia não se traduz na possibilidade de arbítrio dos agentes públicos e tampouco significa que a Administração Pública possa atuar com a mesma liberdade conferida aos particulares, antes, pelo contrário, traduz limitações ainda mais rígidas à atividade administrativa. Idem, p. 75.
[39] JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003. p. 549.
[40] Mais detalhadamente sobre o conceito jurídico de consumidor ver: BENJAMIN, Antonio Herman V. O conceito jurídico de consumidor. In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno (Orgs.) Doutrinas Essenciais do Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 935-954.
[41] MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor : o novo regime das relações contratuais. 6. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 99.
[42] BONATTO, Cláudio. MORAES, Paulo Valério Dal Pai. Questões controvertidas no código de defesa do consumidor : principiologia, conceitos, contratos atuais. 4. ed. Porto Alegre : Livraria do Advogado, 2003. p. 72.
[43] JUSTEN FILHO, Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003. p. 595.
[44] Ibidem.
[45] FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. São Paulo. Malheiros, 2009. p. 148.
[46] PEREIRA, Cesar A. Guimarães. Usuários de serviços públicos. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 40 ss.
[47] JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003. p. 555. Nesse sentido ver também COMPARATO, Fábio Konder. A proteção do Consumidor. Importante capítulo do Direito Econômico. In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno (Orgs.) Doutrinas Essenciais do Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 167-186.
[48] Em uma interpretação do Art. 3º, §2º do CDC, as suas normas somente podem ser aplicadas a consumidores de serviços uti singuli, prestados individualmente mediante remuneração, escluíndo-se, assim, os serviços uti universi, e aqueles prestados gratuitamente. MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 486.
[49] "Entre o usuário da rodovia e a concessionária, há mesmo uma relação de consumo, com o que é de ser aplicado o artigo 101 do Código de Defesa do Consumidor". REsp 467.883/RJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito. 3ªT. DJ 1.9.2003.
[50] SALOMONI, Jorge Luis. Teoría General de los servicios públicos. Buenos Aires: Ad-Hoc, 2004. p. 396.
[51] O dispositivo ainda classifica várias tipos de consumidores, de acordo com a sua capacidade de compra, nas seguintes categorias: a) consumidor especial: agente da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE, da categoria de comercialização, que adquire energia elétrica proveniente de empreendimentos de geração enquadrados no § 5odo art. 26 da Lei no 9.427, de 26 de dezembro de 1996, para unidade consumidora ou unidades consumidoras reunidas por comunhão de interesses de fato ou de direito cuja carga seja maior ou igual a 500 kW e que não satisfaçam, individualmente, os requisitos dispostos nos arts. 15 e 16 da Lei no 9.074, de 7 de julho de 1995; b) consumidor livre: agente da CCEE, da categoria de comercialização, que adquire energia elétrica no ambiente de contratação livre para unidades consumidoras que satisfaçam, individualmente, os requisitos dispostos nos arts. 15 e 16 da Lei no 9.074, de 1995; e c) consumidor potencialmente livre: pessoa jurídica cujas unidades consumidoras satisfazem, individualmente, os requisitos dispostos nos arts. 15 e 16 da Lei no 9.074, de 1995, porém não adquirem energia elétrica no ambiente de contratação livre.
[52] AgRg no REsp 916.939/MG, Rel. Ministra DENISE ARRUDA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/11/2008, DJe 03/12/2008.
[53] DERANI, Cristiane. Privatização e serviços públicos. São Paulo: Max Limonad, 2002. p. 76
[54] No tocante a uma maior proteção do usuário, relativamente ao consumidor, pelo direito público, tem-se como exemplo a responsabilidade dos prestadores: as pessoas jurídicas de direito privado que prestam serviços públicos submetem-se à responsabilidade objetiva. Se agente de concessionária de energia elétrica, em atividade de reparação de cabos elétricos, provoca danos a terceiros, a entidade sujeitar-se-á à responsabilidade objetiva, porquanto agindo em delegação do Estado. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Responsabilidade civil das pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos. In: FREITAS, Juarez. Responsabilidade Civil do Estado. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 147.
[55] HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991. p. 5.
[56] Idem, p. 10. Após o surgimento do Staatsrecht e do Estado Constitucional, nenhuma disposição jurídico-civil pode estar em contradição com a Lei Fundamental, e todas precisam ser interpretadas em seu espírito, sendo que o os direitos fundamentais passam a reger toda a vida jurídica de um estado. HESSE, Konrad. Verfassungsrecht und Privatrecht. Heidelberg: C. F. Müller Juristischer Verlag, 1988. p. 58.
[57] Esse direito começou a ser desenvolvido no plano internacional (NR: Declaração Universal dos Direito do Homem, art. XXI.2: "Todo homem tem igual direito de acesso ao serviço público de seu país".), o que se coaduna com o diálogo das fontes. Se trata de um reconhecimento de direitos humanos. CASSAGNE, Juan Carlos. El Contrato Administrativo. Buenos Aires: LexisNexis, 2005. p. 275. No Estado pós-moderno, se inicia um movimento jurídico que soleniza o compromisso da gestão pública com resultados que assegurem a concretização dos direitos fundamentais, sem exclusões, nem discriminações, pelo só fato de serem direitos inerentes à dignidade da pessoa humana, e não favores ou liberalidades do Estado. PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres; DOTTI, Marinês Restelatto. Políticas Públicas nas Licitações e Contratações Administrativas. Belo Horizonte: Fórum, 2009. p. 24. Juarez Freitas também propõe a constitucionalização efetiva das relações administrativas, no intuito de promover uma expansão da aplicabilidade direta dos direitos fundamentais. p.24. FREITAS, Juarez. Direito Fundamental à boa administração pública e a constitucionalização das relações administrativas brasileiras. Interesse Público, ano 12, n. 60, mar./abr. 2010. Belo Horizonte: Fórum, 2010. p. 13-24.
[58] PINTO, Bibiana Graeff Chagas. La gestion des services publics de distribution et d'assainissement de l'eau: etude comparée en droit français et brésilien. Dissertação de Doutorado. UFRGS, 2008. p. 289.
[59] Idem, p. 308.
[60] HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991. p. 22.
[61] MARQUES, Claudia Lima. O “diálogo das fontes” como método da nova teoria geral do direito, p.23. In: MARQUES, Claudia Lima (Coord.). Diálogo das fontes – Do conflito à coordenação de normas do direito brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
[62] MARQUES, Claudia Lima. Direito na pós-modernidade e a teoria de Erik Jayme. p. 29. In: Oliveira Júnior, José Alcebíades (Org.). Faces do multiculturalismo: teoria - política - direito. Santo Ângelo: EDIURI, 2007.
[63] LORENZETTI, Ricardo Luiz. A era da desordem e o fenômeno da decodificação. p. 341 - 376. In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno (Orgs.) Doutrinas Essenciais do Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 397.
[64] Afirmou Montesquieu: “[...] os juízes da nação são apenas, como já dissemos, a boca que pronuncia as palavras da lei, são seres inanimados que não podem moderar nem sua força, nem seu rigor”. MONTESQUIEU, Charles de Secondat, Barão de. O espírito das leis. Tradução de Cristina Murachco. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2005. p.175. Uma visão mais adequada da realidade pós-moderna é resumida por François Rigaux, quando aduz que: “O juiz tornou-se o árbitro de todos os conflitos de leis que os legisladores não puderam ou não quiseram resolver.” RIGAUX, François. A lei dos juízes. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 337.
[65] JAYME, Erik. O Direito Internacional Privado do novo milênio: a proteção da pessoa humana face à globalização. p. 5. In: MARQUES, Claudia Lima; ARAUJO, Nadia de (Orgs.). O novo Direito Internacional: Estudos em homenagem a Erik Jayme. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
[66] MARQUES, Claudia Lima. Direito na pós-modernidade e a teoria de Erik Jayme. p. 31. In: Oliveira Júnior, José Alcebíades (Org.). Faces do multiculturalismo : teoria - política - direito. Santo Ângelo: EDIURI, 2007.
[67] MARQUES, Claudia Lima. Superação das antinomias pelo diálogo das fontes. p. 709. In: MARQUES, Claudia Lima; MIRAGEM, Bruno (Orgs.) Doutrinas Essenciais do Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
[68] JAYME, Erik. Identité Culturelle et Integration: Le Droit International Privé Postmoderne, 251. Recueil des Cours de la Academie de Droit International de la Haye, 33, 1995, p. 247.
[69] Idem, p.251.
[70] Idem, p. 261.
[71] MARQUES, Claudia Lima. O “diálogo das fontes” como método da nova teoria geral do direito, p.29. In: MARQUES, Claudia Lima (Coord.). Diálogo das fontes – Do conflito à coordenação de normas do direito brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
[72] MIRAGEM, Bruno. Eppur si muove: Diálogo das Fontes como método de interpretação sistemática. p. 105. In: MARQUES, Claudia Lima (Coord.). Diálogo das fontes – Do conflito à coordenação de normas do direito brasileiro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
[73] A exemplo, os julgados: STJ, RMS 29.183-RS, rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., DJe 31.08.2009, (ii) STJ, REsp 1.139.554-RS, rel. Min. Castro Meira, 2ª T., DJe 09.10.2009, (iii) STJ, REsp 1.094.218-DF, rel. Min. Eliana Calmon, 1ª Seção, DJe 12.04.2011, voto vencido do Min. Castro Meira
[74] “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.”
“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.
Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.”
[75] MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. 6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.p. 485.
[76] SOUTO, Marcos Jurena Villela. Direito Administrativo em debate: 2ª série. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
[77] ARAGÃO, Alexandre Santos. Agências Reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. 2ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 298.
[78] GROTTI, Dinorá Adelaide Musetti. O serviço público e a Constituição brasileira de 1988. São Paulo: Malheiros, 2003. p.359.
[79] Idem, p. 361.
[80] CÂMARA, Jacinto Arruda. Tarifa nas concessões. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 89.
[81] Art. 17. A suspensão, por falta de pagamento, do fornecimento de energia elétrica a consumidor que preste serviço público ou essencial à população e cuja atividade sofra prejuízo será comunicada com antecedência de quinze dias ao Poder Público local ou ao Poder Executivo Estadual. Parágrafo único. O Poder Público que receber a comunicação adotará as providências administrativas para preservar a população dos efeitos da suspensão do fornecimento de energia, sem prejuízo das ações de responsabilização pela falta de pagamento que motivou a medida.
[82] STF, RE 94320, Relator(a): Min. MOREIRA ALVES, Segunda Turma, DJ 03-11-1981
[83] PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. ENERGIA ELÉTRICA. UNIDADES PÚBLICAS ESSENCIAIS, COMO SOEM SER HOSPITAIS; PRONTO-SOCORROS; ESCOLAS; CRECHES; FONTES DE ABASTECIMENTO D'ÁGUA E ILUMINAÇÃO PÚBLICA; E SERVIÇOS DE SEGURANÇA PÚBLICA. INADIMPLÊNCIA. SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. (...) Com efeito, ainda que se trate o consumidor de ente público, é cabível realizar-se o corte no fornecimento de energia elétrica, mesmo no caso de prestação de serviços públicos essenciais, como a educação, desde que antecedido de comunicação prévia por parte da empresa concessionária, a teor do art. 17 da Lei nº 9.427/96. Tal entendimento se justifica em atendimento aos interesses da coletividade, na medida em que outros usuários sofrerão os efeitos da inadimplência do Poder Público, podendo gerar uma mora continuada, assim como um mau funcionamento do sistema de fornecimento de energia (...)".EREsp 845.982/RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2009, DJe 03/08/2009.
[84] AgRg no REsp 1098876/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 08/09/2009, DJe 26/04/2011
[85] AgRg no REsp 1296139/MS, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/02/2012, DJe 05/03/2012
[86] Ementa: “ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INTERRUPÇÃO NO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. APLICAÇÃO DE MULTA PELO PROCON. PROCEDIMENTO LEGAL PARA APLICAÇÃO DA PENALIDADE. PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. OBSERVÂNCIA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS FORMAIS DO ATO ADMINISTRATIVO. ANÁLISE DE REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.” RMS 22.585/RN, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/03/2009, DJe 02/04/2009.
[87] JUSTEN FILHO, Marçal. Teoria geral das concessões de serviço público. São Paulo: Dialética, 2003. p. 558
[88] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações nos serviços públicos. REDAE, n. 1, fev./mar./abr. 2005. Disponível em: <http:direitodoestado.com>.
analista judiciária no TRF4, graduada com láurea acadêmica em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal do RIo Grande do Sul, bolsista CAPES e DAAD para intercâmbio de graduação na Universidade de Giessen, Alemanha, LL.M. (Master of Law) pela Saarland University, Alemanha, Mestre em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: KRUGER, Alessandra. Diálogo das fontes e a proteção dos usuários de serviços públicos pelo Código de Defesa do Consumidor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 ago 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47421/dialogo-das-fontes-e-a-protecao-dos-usuarios-de-servicos-publicos-pelo-codigo-de-defesa-do-consumidor. Acesso em: 23 dez 2024.
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