RESUMO: O tema do presente trabalho é sobre as características de o crédito alimentar no meio civil, realizando um exame e reflexão no âmbito doutrinário e jurisprudencial. O objetivo é expor as lacunas existentes e que ainda não foram sanadas, apresentando-se um posicionamento diante destas características, principalmente quando esta verba é tutelada em meio diverso do familiar. Justifica-se este trabalho pela constante necessidade deste instituto e em razão das diversas demandas judiciais buscadas para regulamentar determinadas situações em que os seus atributos, muitas vezes, se encontrem vagos ou contraditórios.
Palavras Chaves: Alimentos. Características. Reflexões.
ABSTRACT : The theme of this work is an analysis of aliment credit characteristics of the civil means , making an analysis and reflection within doctrinal and jurisprudential . The goal is to demonstrate gaps and that have not been resolved, demonstrating a position on these characteristics, especially when this money is safeguarded in several middle of the family . Justified this work by the constant need of this institute and because of several lawsuits sought to regulate certain situations where their attributes often they are vague or contradictory.
Keywords: Aliment. Features. Reflections.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa proporcionar uma abordagem sobre as características dos alimentos no âmbito civil, buscando sua relação com o meio familiar, além de analisar as várias lacunas existentes nessas duas esferas jurídicas, atravessando vários questionamentos.
A motivação de reflexões fáticas relativa à como seria ou será a aplicação no meio civil é de suma importância, principalmente em razão do grande número de demandas judiciais que visam tutelar direitos básicos e mínimos dos particulares, porém sem vínculo familiar.
Além disto, a Constituição Federal possui suas finalidades (artigo 3º) que devem ser buscadas, inclusive para tutelar tanto situações individuais, entre particulares, quanto situações na qual existe um reflexo social.
Também são diversas as lacunas e faltas de posicionamentos, da doutrina e jurisprudência, de como é a abrangência, restrições, exceções das características dos alimentos no âmbito civil. As próprias manifestações quanto a este instituto, no direito de família, não dispõem sobre todas situações fáticas e cotidianas que o crédito alimentar possui e é necessário.
Claramente que a legislação fica restrita e impossibilitada de abarcar todas as situações de fato e requeridas através do Poder Judiciário, todavia, este trabalho tem como finalidade levantar questionamentos e trazer posicionamentos destas omissões legais e decisões judiciais que carecem de fundamentos jurídicos.
2 DAS CARACTERÍSTICAS DOS ALIMENTOS
O direito ao crédito alimentar é constantemente debatido e com um amplo leque de interpretações. A constante demanda judicial na qual há o requerimento deste instituto e a solicitação de sua regulamentação acaba por ficar vago em determinados fatos, principalmente quando se dá no meio estritamente civil.
Trata-se de uma medida de matéria de ordem pública que a sua reflexão confirma internamente suas características. O Estado, conforme estipula na Constituição Federal, deve garantir a eficiência dos alimentos e tutelá-los.
Muito embora a conceituação deste instituto seja amplo, há uma pacificação de que os alimentos não abranjam apenas o necessário e os “alimentos” propriamente ditos, mas englobam também serviços básicos, de fatos ou abstratos, bens duráveis ou não duráveis de caráter essencial entre outras abrangências que a sociedade acaba por criar como úteis e básicas para o convívio.
Assim, ainda que exista certa divergência doutrinária quanto à questão da classificação das características peculiares do direito aos alimentos, o questionamento presente é que têm o maior consenso doutrinário.
Evidentemente que, em primeiro plano, a característica base dos alimentos está na sua fundamentalidade, ou seja, é algo fundamental que se encontra positivado nas cláusulas pétreas da Constituição Federal.
Para Dirceu Pereira Siqueira (2015, p. 17) trata-se de um direito fundamental que irá provar, pelos valores supremos, tutelado pelo texto constitucional, que a vida e a dignidade da pessoa humana são justificativas para os alimentos. Esta positivação deu-se a posteriores revoluções de pensamento e sociais, é um crescimento que decorre pelos méritos e tragédias da história.
A universalidade é outro requisito importante para a questão dos alimentos. Independentemente da localidade, o direito aos alimentos é inerente ao sujeito e abrange qualquer Estado.
As decisões judiciais que têm reflexos em outros países já possuem respaldo dos tribunais superiores do Brasil[1]. Ademais, sobre tal característica, afirma Walter Claudius Rothenburg (1999, p.56):
Tal característica, no entanto precisa ser ser humano por mera condição existencial, a indicação do conteúdo desses direitos fica a cargo da consciência desenvolvida por determinada comunidade em cada momento histórico. A universalidade não deve ocultar o diferente significado que um mesmo direito fundamental (uma mesma expressão normativa) assim em contextos diversos - o que implica uma consideração constitucional das distintas realidades, como a dos países periféricos (subdesenvolvidos).
Diversos são os acordos internacionais firmados para que compreendam e garantam a devida tutela dos alimentos, exemplo deles é a Declaração dos Direitos Humanos (1948), Convenção de Nova York, Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (1966) entre várias outras normativas.
Deste modo, os alimentos, em decorrência de sua universalidade, podem vincular obrigações existentes em qualquer campo do globo, afinal trata-se de medida fundamental e necessária para a subsistência do sujeito que a recebe.
A irrenunciabilidade é outra característica do princípio fundamental dos alimentos. Não pode ser renunciado, especialmente quanto aqueles derivados do parentesco, estando estipulado de forma clara no art. 1.707 do Código Civil[2].
Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 390) trabalha com esta questão ao afirmar que o encargo alimentar é matéria de ordem pública, razão que não se pode ocorrer a irrenunciabilidade, o máximo que a jurisprudência tem aceitado é a renúncia aos valores dos alimentos vencidos e não pagos[3].
Mesmo pensamento possui Yussef Said Cahali (2013, p. 51), o qual traz que o direito dos alimentos é irrenunciável, tendo ele vigência para o alimentado até determinação judicial, todavia o que pode existir é a renúncia de exercer o direito do crédito dos alimentos.
Divergência doutrinária faz Dirceu Pereira Siqueira (2015, p. 19), uma vez que entende que os direitos fundamentais constituem um mínimo de proteção ao ser humano e em hipótese alguma pode ser renunciado sob a condição de condenar e prejudicar a condição humana inerente do sujeito no que diz respeito aos alimentos.
Interessante elencar que há divergência jurisprudencial que em determinados casos mostra-se possível a renúncia de bens de família, que abrangeria alimentos indiretos, na qual reconhece a oportunidade de desistência quando existir expressa cláusula em contratos de obrigações e de direitos[4].
Assim, tal instituto não é absoluto, trazendo grandes margens para questionamentos, afinal a renúncia poderá partir de várias circunstâncias da vida do alimentado, seja sua estabilidade financeira, seja a inviabilidade da prestação. Porém, obviamente, que é uma medida que necessita de uma análise do caso concreto em si, observando a preferência hermenêutica e fática para aquele que é detentor deste direito.
Existe também a característica da inalienabilidade e/ou intransmissibilidade, ou seja, os alimentos são um direito personalíssimo que visa preservar a vida, não podendo ocorrer a transferência desse direito por ser algo fundamental[5].
Contudo, há ressalvas doutrinárias quanto a esta característica, embora alguns doutrinadores entendam não existir tal transmissão de direitos, por ser algo fundamental e pessoal, devendo ser levada em consideração a questão no que diz respeito ao divórcio e a transmissão dos bens adquiridos através dos alimentos decorrentes de bens inventariáveis, para servir ao pagamento de dívidas.
Em um primeiro ponto, a Lei do Divórcio[6] trouxe algo que se pode caracterizar exceção à regra, haja vista que no art. 23[7] traz a possibilidade de transmissão do direito dos alimentos aos herdeiros do devedor, observado o art. 1.716 do Código Civil de 1916[8], repetida hoje pelo dispositivo do art. 1.700 do Código Civil de 2012[9].
Ou seja, apesar de possuir uma característica tanto quanto genérica, há ressalvas na própria legislação, trazendo o direito do cônjuge em prestar os alimentos, dependendo dos regimes de bens acordado. Todavia, a restrição de tal instituto destinada somente ao mesmo foi ultrapassada com a vinda do Código Civil de 2002.
O companheiro não somente assumiria o ônus dos alimentos do falecido, como também seria detentor de tal direito, o qual já foi elencado no art. 1.694[10] do CC/2002, onde o art. 1.700 faz menção.
Assim, ocorreu uma extensão legislativa para o grau de parentesco, que trouxe grande divergência doutrinária sobre o caso, onde alguns doutrinadores tentam diminuir o ângulo de interpretação da questão da transmissibilidade enquanto outros buscam estendê-la.
Far-se-á uma reflexão sobre a possibilidade da extensão legislativa, afinal, poderiam os parentescos e cônjuge perpetuar o ônus dos alimentados que o falecido ficará incumbido em uma pensão decorrente de ato ilícito? E até quando poderia ir esta responsabilidade de alimentar?
A norma não se contrapõe a estas determinadas questões, no entanto, deve existir uma visão mais humana, afinal o direito pode cessar com a morte, uma vez que é personalíssimo, porém não é razoável deixar sem amparo aqueles que eram dependentes do falecido.
Questões a serem levantas é que se o finado fosse alimentado e, por consequência, utilizasse desse instituto para também alimentar seus familiares, como haveria o estabelecimento da pensão pelo alimentante?
Tratam-se de questionamentos a serem solucionados pela doutrina e pelos tribunais, porém ainda sem nenhum parecer, haja vista que quando o ângulo de conhecimento é limitado aos aspectos familiares, ao âmbito civil, a pertinência dos alimentos não é relevante a ponto de serem reduzidas suas características.
Quando se verificar, juridicamente, que os alimentos prestados anteriormente não forem devidos, ou reconhecer um equívoco fático, que revoga o direito de receber a pensão de créditos futuros, estes não poderão ser restituídos, pois os mesmos têm como princípio básico a irrepetibilidade ou impossibilidade de restituição.
Apesar de não existir a positivação da impossibilidade de restituição de alimentos pagos anteriormente e indevidamente ou provisionais, como é possível visualizar no art. 2007, n.2 do Código Civil Português[11], os Tribunais Superiores já têm entendimento claro e pacificado dessa impossibilidade[12].
Contudo, Arnold Wald citado por Yussef Said Cahali (2013, p. 109) entende que tal característica não é absoluta ao afirmar sobre a possibilidade de restituição em determinados casos, como se verifica:
Admite-se a restituição dos alimentos quando quem os prestou não os devia, mas somente se fizer a prova de que cabia a terceiro a obrigação alimentar, pois o alimentado, utilizando-se dos alimentos, não teve nenhum enriquecimento ilícito. A norma adotada pelo nosso direito é destarte a seguinte: quem forneceu os alimentos pensando erradamente que os devia pode exigir a restituição do valor dos mesmos do terceiro que realmente devia fornecê-los.
De fato, alguns tribunais já têm entendido tal possibilidade, todavia é cláusula restrita dependendo de requisitos, como o enriquecimento sem causa e a solicitação da restituição, não para aquele que alimentou, mas para o terceiro que deveria ter feito, mas não o fez[13].
Afirma claramente Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 392) sobre o tema:
Toda a afirmação peremptória em Direito é perigosa: nos casos patológicos, com pagamentos feitos com evidente erro quanto à pessoa, por exemplo, é evidente que o solvens terá direito à restituição.
Pertinência reflexiva a ser feita é, quando se rescinde uma sentença ou acórdão que concedeu direitos a pensão vitalícia e parte destes valores já foram executados (fundamentado no pagamento em parcela única[14]) a restituição seria devida? Entende-se tal possibilidade posto que, como será visto, outra característica que torna o crédito o caráter alimentar é sua periodicidade, e quando não evidenciado tal requisito creditício, então a restituição é devida.
Nestes termos, quando se tratar de ato ilícito não há parecer jurisprudencial ou até mesmo doutrinário em diversos casos, existindo várias lacunas legais que não abrangem situações no âmbito familiar e principalmente civil.
Assim sendo, em princípio, aplica-se a mesma regra através do entendimento do Superior Tribunal de Justiça ao reconhecer a irrepetibilidade dos alimentos em questão, porém o caso concreto é de suma importância para o convencimento do juízo.
Traço marcante e evidente, mas com uma problemática em questão, é o princípio que não dá o direito a penhora dos alimentos, estando tal instituto bem formulado na própria legislação.
Yussef Said Cahali (2013, p. 87) leciona sobre tal instituto de maneira incisiva:
Tratando-se de direito personalíssimo, destinado o respectivo crédito à subsistência da pessoa alimentada, que não dispõe de recursos para viver, nem pode prover às suas necessidades pelo próprio trabalho, não se compreende possam ser as prestações alimentícias penhoradas, inadmissível, assim, que qualquer credor do alimentando possa privá-lo de que é estritamente necessário à sua subsistência.
Não há divergência nem dúvida quanto à impenhorabilidade destes termos. Contudo a legislação deixa realizar a possibilidade de penhora de bens de família se esses forem para crédito alimentício, como é visível em grande parte dos incisos elencados no art. 833, do atual Código de Processo Civil (2015) e pelo art. 3º, inciso III, da Lei 8.009/90[15].
Todavia, é possível uma relativização, afinal, cumpre alimentar alguém e deixar sem amparo outra pessoa que depende daquilo que é penhorado? Resposta para tal questionamento é possível verificar em decisões que se apoiam ao princípio da proporcionalidade ou razoabilidade, haja vista que não é aceitável e digno atentar contra preceitos constitucionais em detrimento de outro objeto de sustento à terceiros.
Interessante apresentar características desse princípio afirmadas por Humbérto Bergmann Ávila (2012, p. 102):
O postulado da proporcionalidade se aplica a situações em que há uma relação de causalidade entre dois elementos empiricamente discerníveis, um meio e um fim, de tal sorte que se possa proceder aos três exames fundamentais: o da adequação (o meio promove o fim?), o da necessidade (dentre os meios disponíveis e igualmente adequados para promover o fim, não há outro meio menos restritivo do(s) direito(s) fundamentais afetados?) e o da proporcionalidade em sentido estrito (as vantagens trazidas pela promoção do fim correspondem às desvantagens provocadas pela adoção do meio?). Nesse sentido, a proporcionalidade como postulado estruturador de aplicação de princípios que concretamente se imbricam em torno de uma relação de causalidade entre um meio e um fim, não possui aplicabilidade irrestrita. Sua aplicação depende de elementos sem os quais não pode ser aplicada. Sem um meio, um fim concreto e um relação de causalidade entre eles não há aplicabilidade do postulado da proporcionalidade em seu caráter trifásico.
Claramente que o instituto da proporcionalidade deve ser coerentemente aplicado se houver necessidade de penhora de alimentos para alguém que deva alimentos, é o caso claro do desconto em conta salário que é permitido legalmente.
Novamente, levando em consideração o caráter personalíssimo do crédito alimentar, esse não pode ser compensado, princípio já positivado nos termos do artigo 1.707[16] e 373, inciso II do Código Civil[17].
Interessante citar o parecer do doutrinador Yussef Said Cahali (2013, p. 90), uma vez que ele entende que é possível, em casos esporádicos, a compensação dos alimentos, para que não ocorra o enriquecimento sem causa do alimentado, caso que deverá ser analisado pelo juiz.
Já para o doutrinador Orlando Gomes, os alimentos não podem opor ao credor a compensação do crédito alimentar, por ser esse intransferível, ainda que as prestações tenham acumulado-se por atraso de seu pagamento, ou seja, há um caráter de incompensabilidade fundamentalista sobre tal princípio.
Contudo, vários tribunais superiores têm entendido a possibilidade de existir uma compensabilidade de créditos, envolvendo os alimentos, uma vez que não pode ocorrer o fundamento do enriquecimento sem causa, relativizando tal instituto[18].
O direito aos alimentos é imune a transação de créditos, ainda que alimentares, afinal, perderia sua essência e significado a transação de alimentos a outros créditos.
De forma direta e conclusiva apresenta Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 393):
Assim como não se admite renúncia ao direito de alimentos, também não se admite transação. O quantum dos alimentos já devidos pode ser transigido, pois se trata de direito disponível. O direito, em si, não o é. O caráter personalíssimo desse direito afasta a transação. O art. 841 somente admite transação para os direitos patrimoniais de caráter privado. O direito a alimentos é direito privado, mas de caráter pessoal e com interesse público.
Claramente também é passível, no entanto, a relativização de tal instituto, podendo acontecer, quando os alimentos são vencidos, ou seja, se cumularam no passado, podem ter a ocorrência de uma transacionabilidade, como se verifica nas palavras do doutrinador Lafayette (2013, p. 92):
Em relação aos alimentos pretéritos, é licita a transação, porque teriam por fim sustentar o necessitado em época que já passou, cessada a razão da lei, a necessidade indeclinável.
Assim, fica evidente que há diversos pareceres sobre a questão dos alimentos, principalmente no âmbito de família, porém quando esse é levado para a área cível, novamente ocorre a carência de fundamento, tendo então que recorrer à questões familiares e mesmo assim não tem pleno assentimento, embora a razão e a essência sejam a mesma.
Uma das mais marcantes características dos alimentos é a questão da imprescritibilidade, afinal, não teria fundamento jurídico e nem lógico o interrompimento dos alimentos em razão do lapso temporal.
Maria Helena Diniz (2007, p. 548) leciona sobre tal instituto ao afirmar:
Os alimentos são imprescritíveis, mesmo não sendo exercido por algum temo, enquanto estiver vivo, o indivíduo tem direito a demandar recursos materiais visando à percepção de alimentos.
Não se pode confundir o direito aos alimentos, como imprescritível, e o direito as suas parcelas, afinal o Código Civil (2002) traz o prazo de dois anos como direito a tomar as atitudes judiciais para pleitear tal crédito[19].
Ou seja, a qualquer momento na vida do sujeito, pode esse requerer a necessidade de alimentos, regendo então o instituto do direito aos alimentos e fazendo nascer o direito à ação, não sendo então, subordinada a um prazo de propositura de ação, é o entendimento também de Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 393).
Para visualizar através dos anseios civis, é possível uma reflexão de que a imprescritibilidade poderá, além de servir a qualquer tempo, fazer com que exista dúvida em caráter processual naquela ação decorrente de ato ilícito. Afinal, perpetuaria ainda o cumprimento de sentença ou existiria uma ação autônoma como é verificada no âmbito da justiça familiar?
Além disto, é interessante apresentar sobre como ficaria a questão da ação rescisória para os alimentos, quando vir a ocorrer questionamentos de fatos. Quando reconhecido o direito ao crédito alimentar e houver penhora de porcentagens de salários ou verbas também alimentares do credor e posteriormente verificar a possibilidade de rescindir tal sentença transitada em julgado, os alimentos, neste caso poderiam ser revistos em ação rescisória independente do prazo estipulado para esta ação, afinal o direito deste instituto também seria imprescritível por abarcar os alimentos?
Problemas a serem resolvidos em razão da grande complexidade social e sua implicação dos litígios, cabendo aos magistrados e cortes superiores decidirem sobre eventuais lides e a doutrina opinar seus fundamentos sobre estas situações.
Interessante ressaltar que é possível a revisão econômica do devedor para a majoração ou minoração do crédito alimentar, situação essa analisada pelo juiz.
Modificadas as situações econômicas e as necessidades das partes, deve ser alterada a prestação, podendo assim ocorrer uma análise concreta a partir das despesas do alimentado e dos rendimentos do alimentante, as quais influenciarão a sua subsistência social, moral, educacional e alimentícia em sua questão terminológica.
Tal característica já se encontra positiva no artigo 1699 do Código Civil atual como uma visão humanística e flexível do crédito alimentar[20].
E novamente, o arbitramento no meio civil, no que diz respeito a pensão alimentícia, deve ser levada em questionamento. Em liquidação de sentença é determinado um valor especifico para a verba alimentar, em que essa acaba sendo imutável e não há, muitas vezes, reflexão e solicitação pelas partes de alteração da variabilidade desses alimentos.
Ou seja, enquanto no meio familiar o valor estipulado não transita em julgado, não pode no meio civil este trânsito ser absoluto também, razão que essa característica traz para os alimentos e sua tutela de maneira coerente com as necessidades das partes.
A periodicidade é uma característica importante para a relação alimentar, afinal trata-se de um direito a prestação dos alimentos que é adimplido de forma periódica, ou seja, tem previsibilidade temporal.
Não pode então os alimentos serem solicitados em parcela única, pois assim se atende à necessidade de promover a subsistência.
Entendimento possui Silvio de Salvo Venosa (2014, p. 394):
(...) não se admite que um valor único seja o pago, nem que o período seja longo, anual ou semestral, porque isso não se coaduna com a natureza da obrigação. O pagamento único poderia ocasionar novamente a penúria do alimentado, que não tivesse condições de administrar o numerário.
Também, não só é proveitoso para o alimentado receber a prestação de modo periódico como para o próprio alimentante, afinal é menos oneroso para o devedor, ao tempo que assegura de maneira mais certa a subsistência do credor, que assim melhor controla seus gastos, conforme leciona Yussef Said Cahali (2013, p. 115).
José Medina (2011, p. 840) ressalta sobre a descaracterização da verba alimentar, quando vir a existir uma pensão decorrente de ato ilícito:
No caso, deve o juiz distinguir a que título está definido a indenização, porquanto a condenação pode ter por fim apenas a reparação de danos sofridos pelo demandante (p. ex., nos casos de indenização decorrente de morte de filho, em que o quantum é calculado tomando-se por base os rendimentos que o mesmo obteria até quando atingisse determinada idade. Se, em situação como a ora exemplificada, a execução tem por objeto o recebimento do valor integral, fica evidente que tal indenização não tem caráter propriamente alimentar).
Periodicidade esta já compreendida pelo Superior Tribunal de Justiça[21], haja vista que cria uma melhor forma de pagamento para o alimentando e uma recepção mais humana e coerente com os preceitos alimentícios para o alimentado.
O próprio termo em si já traz a possibilidade de análise dos créditos alimentares como preferência nas execuções. Assim estarão protegidos tais credores quando o judiciário aplicar os resultados de forma eficaz, após verificar a dependência deste crédito, medida excepcional que já foi sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça[22].
E sobre tal característica não há limitação sobre sujeitos, seja passivo ou ativo, como já reconhecido pelos próprios julgados do Supremo Tribunal Federal[23], sobre a possibilidade de preferência daquele que possuiu o crédito alimentar até mesmo no pagamento da dívida, através de precatórios.
A mesma medida não se aplica somente a precatórios, mas também quando se diz respeito ao concurso de dívidas, de preferência contra a execução de um mesmo particular, seja executado pelo meio cível, família, ou até mesmo trabalhista, afinal mais vale garantir a subsistência de alguém do que conceder créditos acessórios e perpetuar o estado de miséria.
Como bem apresenta Pedro Albino Vieira Vilande (2010, p.92) “O legislador fez questão de deixar estampado na exposição de motivos do Código de Processo Civil de 1973” colocando a cargo da doutrina e das decisões dos Tribunais a regulamentação sobre a possibilidade de preferência do crédito alimentar e a sua atuação no plano fático.
Com base em Yussef Said Cahali (2013, p. 98) trata-se de medida lógica, afinal a prestação alimentícia é exigível no presente e não no futuro, de modo que o credor tem de aguardar o possível pagamento enquanto enfrenta as diversidades da vida e que, em razão da inadimplência ficar-se-á prejudicado.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desta forma, é possível verificar que há diversas situações em que o crédito alimentar pode ser desenvolvido com maior eficácia e tutelando os direitos daqueles que necessitam deste instituto.
Diversas são as interpretações existentes, porém ainda há certas dúvidas no judiciário atuante e no meio acadêmico sobre determinadas características e regulamentações de como deveriam perpetuar no meio prático, de forma que traga uma maior dignidade ao sujeito que é amparado pelo crédito alimentar.
Até mesmo a própria advocacia encontra-se limitada quanto ao impulsionamento reflexivo deste instituto nas demandas judiciais, havendo uma paralisação do raciocínio e não abrangência dos alimentos.
O Estado é responsável em garantir que este direito venha ser efetivado, de forma eficaz, em seu plano fático, tendo a Constituição Federal pactos e acordos internacionais validando esta responsabilidade estatal. Assim sendo, espera-se deste Estado, uma melhor incisão de seus atos para tutelar os alimentos à quem necessita, ainda mais que isto garantirá as suas teleologias buscadas no artigo 3º da Constituição Federal.
Deste modo, os argumentos elencados devem ser debatidos e levados a uma reflexão, para uma concretização e realização das características dos alimentos de forma mais eficiente, na qual o alimentado não fique desamparado em razão das lacunas legais e omissões das fontes dos direitos referentes a este instituto e sua regulamentação, principalmente quando for solicitada a intervenção do Estado.
REFERÊNCIAS
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VILANDE, Pedro Albino Vieira. A preferência do crédito trabalhista no concurso particular de credores. Revista TRT 9ª Região, Curitiba, v. 1, a. 35, n. 64, p. 81-108, jan/jun, 2010.
Acadêmico de Direito da Universidade Norte do Paraná (UNOPAR)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MAZIERI, Luan Bertin. Análises e reflexões sobre as características dos alimentos no âmbito civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 dez 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47939/analises-e-reflexoes-sobre-as-caracteristicas-dos-alimentos-no-ambito-civil. Acesso em: 23 dez 2024.
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