RESUMO: O presente artigo tem como tema o instituto do amicus curiae no novo código de processo civil brasileiro. O objetivo é esclarecer o instituto à luz da Lei n° 13.015 de 16 de março de 2015. Esta análise foi elaborada através do método dedutivo e da pesquisa bibliográfica, utilizando-se, primordialmente, de fontes secundárias, tais como: livros, códigos, sites de internet e outras literaturas afetas ao tema. Em um primeiro momento, destacou-se a introdução do amicus curiae dentre as modalidades de intervenção de terceiros. Em um segundo plano, explicou-se o conceito e a natureza jurídica do instituto. Em seguida, foram analisados os requisitos subjetivos e objetivos para a admissão do amicus curiae no processo. Depois, foi feita uma explanação sobre o cabimento, o momento para a intervenção e os poderes processuais atribuídos a essa figura. Por derradeiro, abordou-se a importância do instituto para o processo.
PALAVRAS-CHAVE: Amicus Curiae. Intervenção de Terceiros. Novo Código de Processo Civil.
ABSTRACT: This article focuses on the amicus curiae institute in the new Brazilian Civil Procedure Code. The objective is to clarify the institute in light of Law 13,015 of March 16, 2015. This analysis was elaborated through the deductive method and the bibliographical research, using primarily secondary sources such as books, codes, Internet sites and other literature related to the topic. At first, the introduction of the amicus curiae among the intervention modalities of third parties was highlighted. In the background, the concept and legal nature of the institute was explained. Subsequently, the subjective and objective requirements for admission of the amicus curiae in the process were analyzed. Afterwards, an explanation was given about the fitting, the time for intervention and the procedural powers attributed to that figure. Lastly, the importance of the institute for the process was discussed.
KEYWORDS: Amicus Curiae. Third Party Intervention. New Code of Civil Procedure.
SUMÁRIO: Introdução. 1. Considerações iniciais e conceito; 2. Natureza jurídica. 3. Requisitos subjetivos e objetivos para a admissão do amicus curiae no processo; 4. Cabimento e momento para a intervenção; 5. Procedimento da intervenção. 6. Poderes processuais atribuídos à figura. 7. Importância do instituto para o processo. Conclusão. Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como tema o instituto do amicus curiae. Ele será abordado à luz da Lei n° 13.015 de 16 de março de 2015.
Dentro dessa seara, pretendemos buscar a resposta para o seguinte questionamento: como é tratado o instituto do amicus curiae no novo código de processo civil?
Para uma melhor explanação, várias questões foram levantadas: Qual o conceito e a natureza jurídica dessa figura? Quais os requisitos subjetivos e objetivos para a sua admissão? Onde é cabível e qual o momento para a intervenção? Como ocorre o procedimento? Quais os poderes processuais atribuídos a essa figura? Qual a importância do instituto para o processo?
Baseado nesses questionamentos, temos o objetivo geral de elucidar a figura do amicus curiae sob a ótica do código processual civil vigente.
Objetivando cumprir o papel metodológico, a pesquisa em tela tem como objetivos específicos: explicar o conceito e a natureza jurídica do instituto; explanar sobre os requisitos subjetivos e objetivos necessários para o ingresso do amicus curiae no processo; elucidar acerca do cabimento e momento para a intervenção; expor o procedimento; esclarecer sobre os poderes processuais atribuídos a essa figura e ressaltar a relevância do instituto para o ordenamento jurídico brasileiro.
É justificada a feitura do presente artigo, primeiramente, por se tratar de uma modalidade de intervenção de terceiros que, antes do novo código de processo civil, não havia recebido uma regulamentação adequada (embora houvesse previsão do instituto em leis esparsas, para casos específicos). Assim, é indispensável o esclarecimento de várias questões em torno dessa figura, agora introduzida no capítulo referente à intervenção de terceiros.
Depois, a participação do amicus curiae no processo garante a qualidade e a legitimação das decisões judiciais, concretiza diversos princípios (democrático, da soberania popular, do acesso à jurisdição e da cooperação) e amplifica o contraditório. Sendo, portanto, de suma importância o estudo de um instituto tão relevante para o processo.
Através da realização de diversas pesquisas e da construção de uma análise construtiva e crítica acerca do tema, constatou-se que a inserção e o tratamento genérico atribuído ao instituto pelo novo código de processo civil, foi uma grande conquista para o ordenamento jurídico brasileiro.
Verificou-se, ainda, que várias questões antes controvertidas na doutrina e na jurisprudência foram sanadas com a edição da Lei n° 13.015/2015. Entretanto, alguns pontos continuaram sem enfrentamento, possibilitando o surgimento de novas polêmicas.
Tal quadro, porém, poderá ser modificado através da criação de normas que tratem dos pontos considerados obscuros.
Impende ressaltar que os métodos de abordagem e de pesquisa utilizados no desenvolvimento da pesquisa foram o dedutivo e o bibliográfico, respectivamente.
Quanto ao procedimento, pautou-se nos métodos histórico e comparativo.
Já no que diz respeito a abordagem, foi empregada a pesquisa qualitativa e exploratória.
O presente artigo foi elaborado em sete capítulos, seguidos de uma conclusão.
No primeiro capítulo, após as devidas considerações iniciais, foi apresentado o conceito de amicus curiae. O segundo capítulo, por sua vez, tratou da natureza jurídica do instituto.
No terceiro capítulo, foram analisados os requisitos subjetivos e objetivos para a sua admissão no processo, ao que passo que o cabimento e o momento para a intervenção foram explicados no quarto capítulo.
No quinto e sexto capítulo, houve o estudo do procedimento e dos poderes atribuídos a essa figura, respectivamente.
No sétimo capítulo, destacou-se a importância do instituto para o processo, e finalmente, a conclusão.
1. Considerações iniciais e conceito
A Lei n° 13.015 de 16 de março de 2015 (novo CPC) implementou uma série de modificações no tocante à intervenção de terceiros. Dentre elas, destaca-se o tratamento genérico atribuído ao amicus curiae, antes regulamentado pontualmente por meio de legislações esparsas.
Data vênia, essa modalidade de intervenção de terceiros ainda não havia recebido o tratamento adequado. Não é por outra razão, inclusive, que esta expressão de origem latina já foi denominada por Cassio Scarpinella de “terceiro enigmático” (p. 139 a 141, 2008).
O amicus curiae, também denominado de colaborador da corte: “é um terceiro que, conquanto não tenha interesse jurídico próprio, que possa ser atingido pelo desfecho da demanda em andamento, como tem o assistente simples, representa um interesse institucional, que convém seja manifestado no processo para que, eventualmente, possa ser considerado quando do julgamento” (GONÇALVES, 2016, p. 265).
Constitui uma forma de intervenção peculiar, já que o terceiro não figura como parte, nem como auxiliar desta. Trata-se de verdadeiro auxiliar do juízo, que ingressa no processo para fornecer subsídios relevantes para o julgamento da ação, contribuindo para a qualidade da decisão.
2. Natureza jurídica
A natureza jurídica do instituto suscitava muita controvérsia no meio jurídico. Tanto a doutrina quanto a jurisprudência não entravam em consenso sobre o assunto.
Com o advento da Lei n° 13.015/2015, o amicus curiae foi incluído dentre uma das modalidades de intervenção de terceiros, consolidando o entendimento do Ministro Celso de Mello, proferido no julgamento da ADI 2.130.
3. Requisitos para intervenção
3.1. Requisitos subjetivos
A Lei n° 13.015/2015 ampliou o rol de terceiros que podem intervir no processo na condição de amicus curiae, acolhendo a posição da melhor doutrina e jurisprudência. Além disso, afastou qualquer dúvida quanto à possibilidade da pessoa física intervir no processo nessa condição.
De acordo com o art. 138, caput, do novo diploma, o amicus curiae poderá ser pessoa, física ou jurídica, bem como órgão ou entidade especializada. “Tanto entes públicos como privados; entidades com ou sem fins lucrativos. Mesmos órgãos internos a outros entes públicos podem em tese intervir nessa condição” (WAMBIER; TALAMINI, p. 381, 2016).
Cassio Scarpinella Bueno elogia a ampliação, vejamos: “(...) A regra, ao admitir a pessoa física para atuar na qualidade de amicus curiae, merece aplausos. É providência que encontra eco em diversas “audiências públicas” que o Supremo Tribunal Federal vem realizando em sede de controle concentrado de constitucionalidade e que, rigorosamente, devem ser entendidas como casos de amicus curiae” (BUENO, 2011, 118).
Na mesma linha, preleciona Daniel Amorim Assumpção Neves: “A melhor doutrina entende corretamente que o amicus curiae pode ser tanto uma pessoa jurídica, tal como uma associação civil, um instituto, um órgão etc., como natural, tal como professor de direito, cientista, médico etc” (NEVES, p. 260, 2015).
A lei também exige como pressuposto subjetivo a representatividade adequada. Isto é, “que o terceiro demonstre ter um interesse institucional na causa, não sendo suficientes interesses meramente corporativos, que digam respeito somente ao terceiro que pretende ingressar na ação” (NEVES, p. 263, 2015).
Por interesse institucional entende-se: “a possibilidade concreta do terceiro em contribuir com a qualidade da decisão a ser proferida, considerando-se que o terceiro tem grande experiência na área à qual a matéria discutida pertence. A pessoa jurídica deve ter credibilidade e tradição de atuação concernentes à matéria que se discute, enquanto da pessoa natural se espera conhecimento técnico sobre a matéria” (NEVES, p. 263, 2015).
O amicus curiae, portanto, não defende interesses próprios. A sua participação deve se pautar na necessidade de se defender os interesses gerais da coletividade ou aqueles que expressem valores essenciais de determinado grupo ou classe.
É importante salientar que: “Ter representatividade adequada não significa que o amicus curiae precise levar ao processo a manifestação unânime daqueles que representa. A legitimação democrática que justifica a sua intervenção não é – e nem pode ser nas democracias representativas – sinônimo de unanimidade. O que se quer é debate sobre pontos de vista diversos, sobre valorações diversas em busca de consenso majoritário; não a unanimidade” (BUENO, p.118, 2011).
3.2. Requisitos objetivos
Segundo o art. 138, caput, do Código de Processo Civil, são três as condições objetivas que autorizam o ingresso do amicus curiae no processo, são elas: a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda e a repercussão social da controvérsia.
Quanto à relevância da matéria, a lei se utiliza de um termo vago, semelhante ao atribuído à repercussão geral. A doutrina, contornando a precariedade da norma, explica que matéria relevante é aquela que transcende o mero interesse individual das partes. Ou seja, “a matéria discutida em juízo deve extravasar o âmbito das relações firmadas entre os litigantes” (DONIZETTI, p. 342, 2016).
Especificidade do tema objeto da demanda, por sua vez, significa que o objeto da demanda exige conhecimentos particulares, específicos, que justificam a intervenção. “Esse conhecimento, que pode ser técnico ou científico, deve ser útil ao processo e à formação da convicção do juiz ou do órgão julgador para o julgamento da matéria de direito” (DONIZETTI, p. 343, 2016).
No que diz respeito a repercussão social da controvérsia, não deve o julgador observar apenas o aspecto jurídico da causa, devendo, também, levar em consideração os reflexos ou a repercussão que a controvérsia pode gerar para a coletividade. “Questões relevantes do ponto de vista econômico, social, político ou jurídico, que suplantem os interesses individuais das partes, merecem a intervenção de pessoas ou entidades representativas da sociedade civil” (DONIZETTI, p. 343, 2016).
4. Cabimento e momento para a intervenção
Com o advento do novo CPC, a intervenção do amicus curiae passa a ser admissível em as todas instâncias judiciárias, e não apenas nas instâncias superiores como outrora, além de ser aplicável a todos os tipos de processo, sejam de caráter objetivo ou subjetivo. Sem dúvida, este é o ponto de maior inovação em relação ao instituto.
No que tange à ampliação do instituto, dispõe a exposição de motivos do Anteprojeto do novo Código de Processo Civil: “Entendeu-se que os requisitos que impõem a manifestação do amicus curiae no processo, se existem, estarão presentes desde o primeiro grau de jurisdição, não se justificando que a possibilidade de sua intervenção ocorra só nos Tribunais Superiores. Evidentemente, todas as decisões devem ter a qualidade que possa proporcionar a presença do amicus curiae, não só a última delas”.
Daniel Amorim Assumpção Neves, destaca a importância da inovação em sua obra: “(...) O Novo Código de Processo Civil o prevê no capítulo das intervenções de terceiro. O tema é tratado pelo art. 138 do Novo CPC, sendo interessante a inovação do dispositivo legal ao cuidar da intervenção do amicus curiae de forma geral, considerando-se que atualmente há apenas menções pontuais a respeito de sua participação e que o Superior Tribunal de Justiça limita a intervenção do amicus curiae às hipóteses expressamente consagradas em lei, restringindo sua atuação ao processo objetivo, à análise da repercussão geral no recurso, ao julgamento por amostragem dos recursos excepcionais e ao incidente de inconstitucionalidade”(p. 263, 2015).
Além da admissão genérica prevista no art. 138 do novo código de processo civil, existem outras regras, no próprio diploma, que autorizam a intervenção do amicus curiae: art. 959, §§ 1°, 2° e 3° (incidente de arguição de inconstitucionalidade em tribunal); art. 983, caput e § 1° (incidente de resolução de demandas repetitivas); art. 1035, § 4° (procedimento de análise da repercussão geral em recurso extraordinário) e art. 1038 (julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos).
Quanto ao momento para a intervenção, persiste a lacuna legal. O legislador, em que pese as divergências sobre a matéria, não fixou um limite temporal.
A doutrina majoritária entende que “deve-se admitir a intervenção até o início do julgamento da ação ou do recurso no órgão colegiado”. (NEVES, p. 261, 2015)
Do mesmo modo, inclusive, manifestou-se o Superior Tribunal de Justiça (Informativo 540/STJ: Corte Especial, QO no Resp 1.152.218/RS, rel. Min. Luís Felipe Salomão, j. 07.05.2014).
O Supremo Tribunal Federal, em um primeiro momento, tinha outra visão. Todavia, após adotar uma visão mais restritiva, decidiu que a intervenção deve ser admitida a qualquer tempo, desde que antes de conclusos os autos para julgamento (nos processos de primeiro grau), ou até a data da remessa dos autos pelo relator à mesa para julgamento (nos processos perante dos tribunais) (Informativo 543/STF: Tribunal Pleno, ADI 4.071 AgR/DF, rel. Min. Menezes de Direito, j. 22.04.2009). Corroborando, pois, o posicionamento majoritário da doutrina.
5. Procedimento da intervenção
A intervenção do amicus curiae pode ocorrer de forma voluntária (requerida pelo próprio terceiro, não titular de interesse próprio, discutido no processo) ou forçada (requerida pelas partes ou determinada de ofício pelo juiz ou relator). Aliás, é a única espécie de intervenção de terceiros que pode ser determinada de ofício, pelo juiz ou tribunal.
Frise-se que, antes do novo CPC, não era possível a determinação de ofício.
Conforme o §1° do art. 138 do CPC, a intervenção do amicus curiae não implica alteração de competência, nem autoriza a interposição de recursos, salvo duas exceções previstas em lei: o cabimento de embargos de declaração, disposto no §1°, do art. 138 do CPC e o cabimento de recurso contra a decisão que julgar o incidente de resolução de demandas repetitivas, previsto no §3° do supracitado dispositivo.
No tocante à ilegitimidade recursal, não houve inovação, apenas foi consagrado o entendimento do Superior Tribunal Federal sobre o assunto (STF, Decisão Monocrática: ADI 3.346 AgR-ED/DF, rel. Min. Marco Aurélio, j. 28.04.2009, DJe 86, 11.05.2009; ADI 3.931/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, j. 28.10.2008, DJe 212, 07.11.2008). Por outro lado, muito elogiada foi a inclusão de regra que impede a modificação de competência.
Sobre a questão, preceitua Daniel Amorim Assumpção Neves: “Como sabido, a competência em razão da pessoa é absoluta, e a intervenção de terceiro pode passar a exigir aplicação de regra de competência que até então era inaplicável ao caso concreto. Segundo a regra elogiada, a intervenção do amicus curiae não modifica a competência, de forma que, por exemplo, ingressando no processo em trâmite perante a Justiça Estadual uma fundação federal como amicus curiae, o processo não será remetido à Justiça Federal” (p. 264, 2015).
Deferida a intervenção, em decisão irrecorrível (melhor seria o uso da expressão despacho) do juiz ou relator, o terceiro será intimado a se manifestar no prazo de 15 (quinze) dias, conforme reza o art. 138, caput, do CPC.
O referido prazo, “deve ser contado levando-se em conta o seguinte: a partir da juntada, aos autos, do comprovante de intimação e os quinze dias devem ser contados em dias úteis” (BUENO, p. 118, 2011).
6. Poderes processuais do amicus curiae
O novo código de processo civil não enfrentou a questão e a matéria continua a gerar polêmica.
Ao contrário do esperado, a lei não fixou um rol discriminando os poderes.
O art. 138, § 2°, do novo CPC se limitou a prever que: “caberá ao juiz ou relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os poderes do amicus curiae”.
Dessa forma, discute a doutrina que poderes seriam esses. Se estaria adstrito à mera apresentação de petição, por exemplo, ou se abrangeria outras faculdades, tais como: juntar documentos, elaborar quesitos para serem respondidos por peritos, fazer sustentação oral perante o tribunal, participar de audiências públicas etc).
Sobre os poderes do amicus curiae, preceitua Marcus Vinicuis Rios Gonçalves: “A participação do amicus curiae consistirá basicamente em emitir uma manifestação, opinar sobre matéria que é objeto do processo em que ele foi admitido. A manifestação não é, propriamente, no sentido de que o juízo acolha ou desacolha a ação. Ele opinará sobre a questão jurídica, suas repercussões e sua relação com o interesse institucional do qual ele é portador. (...) Também não cabe a ele praticar atos processuais, além daquele relativo à sua manifestação. Por isso, ao contrário de um assistente simples que pode praticar, em regra, quase todos os atos processuais próprios das partes, desde que elas não se oponham, a intervenção do amicus curiae é restrita” (p.267, 2016).
Defendendo uma visão mais ampla, preleciona Elpídio Donizetti: “Em que pese a generalidade da redação, é preciso levar em consideração que a atuação do amicus curiae há de ser capaz de influenciar o julgamento da lide, aprimorando a decisão jurisdicional. Para tanto, deve o amicus curiae desempenhar todo e qualquer ato processual que seja correlato para se atingir essa finalidade, como, por exemplo, requerer a produção de provas e manifestar-se oralmente” (p. 344, 2016).
Wambier e Talamini salientam que há uma indiscutível “gama mínima de poderes” (p. 382, 2016), pois já estabelecida por lei: a possibilidade de manifestação escrita em quinze dias (art. 138, caput, do CPC/2015); a legitimidade para opor embargos de declaração (art. 138, § 1º, do CPC/2015); a possibilidade de sustentação oral e a legitimidade recursal nos julgamentos de recursos repetitivos (art. 138, § 3º, do CPC/2015).
O STF já decidiu pela possibilidade de fazer sustentações orais, de propor a requisição de informações adicionais, de designação de peritos, de convocação de audiências públicas, bem como de recorrer da decisão que haja denegado seu pedido de admissão no processo (STF, ADPF. 187/DF, rel. Min. Celso de Mello, j. 15.06.2001).
Ainda sobre os poderes processuais, é mister ressaltar que a decisão que define tais poderes é irrecorrível (art. 138, caput, c/c art. 138, §2°, do cpc). Logo, embora possa tolher consideravelmente os poderes do amicus curiae, este não poderá interpor recurso.
Wambier e Talamini, entretanto, advertem para a possibilidade do terceiro ingressar com mandado de segurança contra a referida decisão.
“(...) não é de se descartar que se profiram decisões diretamente gravosas à esfera jurídica do amicus curiae (p. ex., o juiz o condena em litigância de má-fé ou determina que ele arque com verbas de sucumbência no processo). Uma vez que não cabe recurso contra eles, o amicus poderá valer-se do mandado de segurança (art. 5º, LXIX, da CF/1988; art. 5º, II, da Lei 12.016/2009, a contrario sensu)” (p. 382, 2016).
7. A importância da participação do amicus curiae para o processo
O amicus curiae ingressa no feito para emitir conhecimentos técnicos e/ou científicos, específicos, necessários para o julgamento da causa. E ao fornecer tais elementos, auxiliando o magistrado a formar sua convicção, garante não só a qualidade das decisões judiciais, mas também a legitimação social da tutela jurisdicional e a efetivação do princípio da cooperação.
Nessa linha, discorrem Wambier e Talamini e também Bueno, respectivamente:
“A participação do amicus curiae, com o fornecimento de subsídios ao julgador, contribui para o incremento de qualidade das decisões judiciais. Amplia-se a possibilidade de obtenção de decisões mais justas – e, portanto, mais consentâneas com a garantia da plenitude da tutela jurisdicional (art. 5º, XXXV, da CF/1988)” (p. 378, 2016).
“O amicus curiae deve ser entendido como um especial terceiro interessado que, por iniciativa própria (intervenção espontânea) ou por determinação judicial (intervenção provocada), intervém em processo pendente com vistas a enriquecer o debate judicial sobre as mais diversas questões jurídicas, portando, para o ambiente judiciário, valores dispersos na sociedade civil e no próprio Estado, que, de uma forma mais ou menos intensa, serão afetados pelo que vier a ser decidido, legitimando e pluralizando, com a sua iniciativa, as decisões tomadas pelo Poder Judiciário” (p. 115, 2011).
Ademais, ao permitir (e principalmente generalizar) a intervenção de pessoas, entidades ou órgãos no processo, para manifestação de opinião sobre questões relevantes (do ponto de vista econômico, social, político ou jurídico), que superem os interesses individuais, o instituto assegura o amplo debate e a participação ativa da sociedade nos processos de decisão. E, por conseguinte, concretiza vários princípios de ordem constitucional, são eles: democrático, da soberania popular, do acesso à jurisdição.
Sobre a questão, Medina afirma: “(...) a intervenção do amicus curiae vem ao encontro da ideia de status activus processualis: as partes têm direito de participar democraticamente do processo, de modo a poder influir decisivamente na criação da solução jurisdicional a ser dada ao problema. Assim, na medida em que os problemas jurídicos interessam não apenas às partes, mais a uma parcela mais ampla da sociedade, ou a toda a sociedade, deve o sistema possibilitar a participação de terceiros que, de modo representativo, possam expor, no processo, o ponto de vista das esferas individuais ou dos grupos afetados. Se é certo que os grupos atingidos pela decisão judicial a ser proferida não decidem com o Estado, não menos acertado e dizer que à sociedade devem ser assegurados instrumentos de participação no procedimento, a fim de que possa informar-se, analisar as opções que no processo são colocadas, indicar suas objeções a que uma ou outra solução seja escolhida, e ter suas objeções analisadas pelo Poder Judiciário. A participação do amius curiae no processo, assim, liga-se à noção de direito de participação procedimental, que é inerente à ideia de Estado Democrático de Direito” (p. 248 e 249, 2016).
Depois, “sobretudo nos processos de cunho precipuamente objetivo (ações diretas de controle de constitucionalidade; mecanismos de resolução de questões repetitivas etc.), a admissão do amicus é um dos modos de ampliação e qualificação do contraditório” (WAMBIER; TALAMINI, p. 378, 2016). É o que Cassio Scarpinella chama de contraditório presumido ou institucionalizado.
Segundo o Bueno: “(...) não há como recusar ser, o amicus curiae, agente do contraditório. “Contraditório” no sentido de “cooperação”, de “coordenação”, de “colaboração”, em consonância, pois, com o “modelo constitucional do direito processual civil brasileiro”. Um contraditório cujo exercício amplo encontra fundamento normativo também nos arts. 339 e 341 do Código de Processo Civil vigente e encontra eco seguro nos arts. 364 e 366 do Projeto. Trata-se, em suma, de um “contraditório presumido”, um “contraditório institucionalizado”: contraditório que deve ser entendido e aplicado à luz de uma sociedade e de um Estado plural como fator decisivo e essencial para a tomada de decisões pelo Estado no exercício de qualquer uma de suas funções, inclusive, como interessa para cá, o exercício da função jurisdicional” (p. 115, 2011).
Alexandre Freitas Câmara também destaca a figura do amicus curiae como instrumento de ampliação do contraditório: “Não se pode deixar de destacar a relevância da intervenção do amicus curiae para a ampliação do contraditório, o que é especialmente relevante naqueles processos em que são apreciadas demandas massificadas, repetitivas, ou em qualquer outro caso de que possa provir uma decisão que tenha eficácia de precedente vinculante. Pois é exatamente por isso que o próprio CPC prevê a atuação de amici curiae no incidente de arguição de inconstitucionalidade (art. 947 do novo CPC), no incidente de resolução de demandas repetitivas (art. 980 do novo CPC) e nos recursos especiais e extraordinários repetitivos (art. 1.035, § 2º do novo CPC). É que em todos esses casos a decisão a ser proferida terá eficácia vinculante, o que exige – como requisito da legitimação constitucional de tais decisões e de sua eficácia – um contraditório ampliado, fruto da possível participação de todos os setores da sociedade e do Estado que podem vir a ser alcançados. Pois o instrumento capaz de viabilizar essa ampliação do contraditório é, precisamente, o amicus curiae” (p. 232, 2016).
Diante do exposto, resta evidente a relevância do amicus curiae para o processo.
CONCLUSÃO
A Lei n° 13.015/2015, acertadamente, além de disciplinar o instituto do amicus curiae, ampliou o cabimento dessa intervenção, antes restrito a casos específicos. Atualmente, esse terceiro poderá ingressar em juízo e colaborar para o julgamento da causa, em qualquer procedimento ou instância, desde que atendidos os requisitos previstos em lei.
O novo Código de Processo Civil, sem dúvida, enfrentou questões polêmicas do antigo código, tais como a natureza jurídica da figura e o procedimento para a intervenção. Porém, não regulou o momento da intervenção, os poderes processuais do amicus curiae, entre outros pontos que também suscitam divergências na doutrina e/ou jurisprudência.
De qualquer forma, é inegável a contribuição das inovações introduzidas pelo novo código de processo civil, no que se refere ao amicus curiae. E mais do que isso, a relevância do instituto para o ordenamento jurídico brasileiro, tendo em vista as suas funções de legitimador das decisões judiciais, concretizador de diversos princípios de ordem constitucional e processual (democrático, da soberania popular, do acesso à jurisdição e da cooperação) e de amplificador do contraditório.
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Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Tiradentes de Sergipe - UNIT. Pós-Graduada em Direito Penal e Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito Prof. Damásio de Jesus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BATISTA, Daisy Cristina Oliveira. O instituto do amicus curiae no novo Código de Processo Civil brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 fev 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49090/o-instituto-do-amicus-curiae-no-novo-codigo-de-processo-civil-brasileiro. Acesso em: 23 dez 2024.
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