RESUMO: Esse trabalho trouxe o significado do que vem a ser um ato infracional, sua previsão legal e as consequências de quando a criança ou o adolescente vem a praticá-lo, submetendo-se as medidas de proteção e socioeducativas respectivamente. Esclarece também o que vem a ser um inimputável segundo o código penal e o porquê de o adolescente responder por ato infracional.
Palavras chaves: Adolescente. Ato infracional. Medidas socioeducativas
INTRODUÇÃO
Esse assunto foi escolhido pela importância que se deve dar à infância e a adolescência, por ser o período no qual se desenvolve o caráter da pessoa, um período de aprendizado, de conflitos internos e externos, e também, pelo aumento da violência advinda exatamente deste setor tão frágil da sociedade. A questão do adolescente em conflito com a lei se faz presente no Brasil desde o início de sua colonização. O conceito de ato infracional será abordado fazendo ligação com o adolescente autor deste ato, bem como todas as medidas socioeducativas do Estatuto da Criança e do Adolescente, as sanções que podem ser aplicadas caso seja confirmado o cometimento de algum ato infracional.
Ato infracional
O artigo 103 do ECA, considera ato infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal. De acordo com a lei a criança e o adolescente não praticam crime ou contravenção penal, e sim ato infracional, pois o Direito Penal reconhece que o desenvolvimento incompleto nas primeiras fases da vida é incompatível com a imputabilidade penal.
É importante dizer que não há no Estatuto um rol de condutas que configuram ato infracional. Para saber se uma criança ou adolescente praticou ato infracional, o intérprete deve verificar se houve subsunção a alguma conduta prevista na lei como crime ou contravenção penal. Caso encontre tal conduta, deverá ser aplicado o sistema de apuração de ato infracional presente no Estatuto, que pode culminar na aplicação de alguma medida de natureza socioeducativa ou protetiva[1].
Os adolescentes autores de ato infracional, pela legislação brasileira, são submetidos a medidas socioeducativas. A medida socioeducativa é, ao mesmo tempo, a sanção e a oportunidade de ressocialização, contendo, portanto, uma dimensão coercitiva, uma vez que o adolescente é obrigado a cumpri-la, e educativa, uma vez seu objetivo não se reduz a punir o adolescente, mas prepará-lo para o convívio social[2].
O Código Penal diz em seu artigo 14 que o crime está consumado quando se reúne todos os elementos de sua definição legal; e o crime é tentado quando iniciada a sua execução é interrompido por circunstâncias alheias à vontade do agente. No entanto esta definição, para efeito de pena, só pode ser atribuído aos maiores de 18 anos.
A estrutura do ato infracional segue a do delito, sendo um fato
Em relação à criança e ao adolescente e às suas condutas ilícitas, não se configuram crime ou contravenção na linguagem técnico-jurídica, pois a realidade na qual estão inseridos é diversa. E o tratamento que devem receber é próprio e específico. Enquanto que para o crime e para a contravenção aplica-se pena no seu mais puro significado, para os atos infracionais o legislador atribui medidas específicas em função de sua especial condição de imputação. Assim, esclarece o artigo 104 do Estatuto, os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis[3].
O conceito tripartido de crime é o fato típico, antijurídico e culpável. Um dos elementos que compõem a culpabilidade é a imputabilidade, ou seja, uma pessoa inimputável (que não possui imputabilidade) não comete crime. O Código Penal também faz referência aos menores de 18 anos em seu artigo 27: “Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial”.
Verifica-se que a estrutura do ato infracional segue a do delito, sendo um fato típico e antijurídico, cuja estrutura pode ser assim apresentada:
a) Conduta dolosa ou culposa, praticado por uma criança ou adolescente;
b) Resultado;
c) Nexo de causalidade;
d) Tipicidade (adotando, o Estatuto, a tipicidade delegada, tomando-se “emprestada” da legislação ordinária, a definição das condutas ilícitas);
e) Inexistência de causa de exclusão da antijuridicidade.
Mas não basta a prática de conduta típica e antijurídica para a caracterização do ato infracional. Há necessidade, também, que os agentes somente respondam pelos atos que praticaram na medida de suas culpabilidades, “um vez que possuem capacidade valorativa e liberdade da vontade para aderir ao ilícito ou não, e com a possibilidade de terem diferentes graus de participação”.
O adolescente, portanto, somente responderá pelo seu ato se demonstrada a ocorrência de conduta típica, antijurídica e culpável[4].
Vale destacar, segundo menciona o Estatuto, que a criança também pratica ato infracional, mas a ela não são aplicáveis medidas socioeducativas, apenas medidas de proteção, conforme determina o art. 105[5]. Ao adolescente, podem ser aplicadas medidas socioeducativas ou medidas de proteção (art. 112).
Não fosse isto, observa-se que tanto a criança quanto o adolescente podem praticar ações conflitantes com a lei – então denominadas de atos infracionais – no entanto, o tratamento legal será diverso, pois, como se pode verificar do disposto no art. 105, do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao ato infracional praticado por criança, apenas corresponderão as medidas específicas de proteção, então, previstas no art. 101, daquela legislação especial[6].
As medidas socioeducativas devem ser aplicadas quando se observar a prática de ato infracional pelo adolescente.
Medida socioeducativa é a resposta estatal dotada de coercibilidade (o adolescente deverá se submeter, querendo ou não), dirigida ao jovem que pratica ato infracional; de natureza sancionatória (o que garante o direito de defesa do infrator), que busca inibir a reincidência de sua ação (para a proteção do grupo social, e preservação a segurança e da ordem públicas), com conteúdo pedagógico[7].
O Estatuto e o Código Penal em relação ao tempo do crime/ ato infracional adotam a teoria da atividade, artigo artigo 4º, do Código Penal.
O Estatuto e o Código Penal adotam o mesmo princípio, o da atividade. Considera-se praticado o ato infracional/ crime no momento da ação ou da omissão, ainda que outro seja o do resultado (Estatuto, artigo 104, p. ú.; Cód. Penal, art. 4º). Dessa forma, se o adolescente, na véspera de completar 18 anos, atira na vítima, que fica agonizando no hospital e falece dias depois, quando o adolescente já completara a maioridade, ser-lhe-á aplicado o Estatuto, pois a conduta (atirar) foi praticada quando era inimputável[8].
Outro ponto importante no Estatuto é sobre o Prazo de Internação Provisória, que se difere da Medida de Internação, em que o adolescente pode ser apreendido em flagrante de ato infracional ou por ordem da autoridade judiciária, (artigo 106)[9]. Uma vez apreendido em qualquer dessas situações, deve-se verificar a possibilidade de sua liberação imediata, conforme art. 107, parágrafo único[10] e art. 174[11]. Não sendo liberado, o adolescente permanece internado durante o processo de apuração do ato infracional que lhe foi atribuído. O prazo máximo de internação provisória a que o adolescente está submetido é de 45 dias, por determinação dos artigos 108[12] e 183[13].
O Estatuto da Criança e do adolescente disciplinou em capítulo próprio as chamadas medidas socioeducativas. No artigo 112, o legislador especifica quais medidas socioeducativas poderão ser aplicadas pelo Juiz da Vara da Infância e da Juventude na hipótese da prática de ato infracional, que deve ser levado em conta sempre a capacidade do adolescente para cumpri-la, bem como as circunstâncias e a gravidade da infração cometida. São elas:
Este rol das medidas é taxativo, limitado pelo princípio da legalidade, sendo vedada a imposição de medidas diversas das apresentadas no artigo 112, do ECA.
Mas a referência das medidas é sempre a da pena. A advertência, materializada por meio da repreensão, da ameaça de sanções mais graves, corresponde a uma punição que encontra parâmetros na admoestação da suspensão condicional da pena (art. 160 da LEP). A obrigação de reparar o dano tem relação evidente com a prestação pecuniária do art.45, § 1º, bem como se assemelha a todas as condicionantes para concessão de direitos na esfera da suspensão condicional da pena (art. 78, § 2º, do CP) e do livramento condicional (art. 83, IV, do CP).
A prestação de serviços à comunidade, como medida socioeducativa, é similar em tudo à modalidade de pena restritiva de direitos de mesmo nome, instituída na maioria das legislações penais de adultos desde os anos 70 na Europa. Foi introduzida no Brasil pela Reforma da Parte Geral de 1984, tendo sido seu alcance alargado pela Lei 9.714/1998. A liberdade assistida nada mais é do que o probation da legislação anglo-americana, que encontra parâmetro legal aproximado em nossa suspensão condicional da pena. O regime de semiliberdade é a perspectiva juvenil do sistema progressivo das penas privativas de liberdade , previsto no Código Penal. Por fim, a internação, prevista nos arts. 121 e ss. da Lei 8.069/1990, Estatuto da Criança e do Adolescente, é o principal eufemismo para as penas privativas de liberdade dos arts. 33 e ss. do CP[14].
A Política de proteção integral divide em dois grandes grupos as medidas socioeducativas: medidas não privativas de liberdade, que são: advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços, liberdade assistida (ECA, 116, 117, 118)[15], e medidas privativas de liberdade: inserção em regime de semiliberdade, internação em estabelecimento educacional (ECA, 120, 121)[16].
As primeiras medidas tem conteúdo essencialmente educativo e devem ser aplicadas conforme indicações do próprio Estatuto, já as segundas que correspondem à institucionalização devem ser aplicadas excepcionalmente.
Essas medidas socioeducativas têm caráter educacional e não punitivo, onde se procura combater a criminalidade, com o trabalho de recuperação desses adolescentes infratores, que dependem da implementação de políticas sociais básicas, das políticas assistenciais e dos diversos programas de proteção especial que atendem a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social[17].
O Estatuto também especifica em seu artigo 112, parágrafo 3º[18] que os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental devem receber tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.
CONCLUSÃO
O presente artigo procurou esclarecer a definição de ato infracional, trazido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que se assemelha ao conceito de crime ou contravenção penal quando da subsunção do ato infracional a norma penal, segundo o artigo 103 da Lei 8.069/90. Também trouxe o conceito tripartite de crime adotado pelo Direito Penal e ao final as medidas socioeducativas previstas no ECA, sobre as sanções aplicáveis às crianças e adolescentes decorrentes de ato infracional.
REFERÊNCIAS
BARROS, Guilherme Freire de Melo; GARCIA, Leonardo de Medeiros; THOMÉ, Romeu. Direitos Difusos: Ambiental, ECA e Consumidor – Coleção para exame da OAB - Vol. 12- 2. ed. rev., atual e ampl - Salvador: Editora Juspodivm, 2014.
NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010.
RAMIDOFF, Mário Luiz. Lições de direito da criança e do adolescente. 2.ed. Curitiba: Juruá, 2010.
ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo, SANCHES, Rogério Cunha. Estatuto da criança e do adolescente comentado artigo por artigo. – 6. Ed. rev. Atual e ampl. – São Paulo: Editora Revistados Tribunais, 2014.
SHECAIRA, Sérgio Salomão. Sistema de garantias e o direito penal juvenil. 2.ed. ver. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.
VOLPI, Mário. Sem liberdade, sem direitos: a experiência de privação de liberdade na percepção dos adolescentes em conflito com a lei. São P
[1] ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo, SANCHES, Rogério Cunha. Estatuto da criança e do adolescente comentado artigo por artigo. – 6. Ed. rev. Atual e ampl. – São Paulo: Editora Revistados Tribunais, 2014, p. 329.
[2] VOLPI, Mário. Sem liberdade, sem direitos: a experiência de privação de liberdade na percepção dos adolescentes em conflito com a lei. São Paulo: Cortez, 2001, p. 66.
[3] NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010, p. 201.
[4] ROSSATO, Luciano Alves; LÉPORE, Paulo Eduardo, SANCHES, Rogério Cunha. Estatuto da criança e do adolescente comentado artigo por artigo. – 6. Ed. rev. Atual e ampl. – São Paulo: Editora Revistados Tribunais, 2014, p. 325-326.
[5] ECA. Ao ato infracional praticado por criança corresponderão as medidas previstas no art. 101.
[6] RAMIDOFF, Mário Luiz. Lições de direito da criança e do adolescente. 2.ed. Curitiba: Juruá, 2010, p. 73.
[7] NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010, p. 216.
[8] BARROS, Guilherme Freire de Melo; GARCIA, Leonardo de Medeiros; THOMÉ, Romeu. Direitos Difusos: Ambiental, ECA e Consumidor – Coleção para exame da OAB - Vol. 12- 2. ed. rev., atual e ampl - Salvador: Editora Juspodivm, 2014, p. 175.
[9] ECA. Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente.
[10] ECA. Art. 107, Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata.
[11] ECA. Art. 174. Comparecendo qualquer dos pais ou responsável, o adolescente será prontamente liberado pela autoridade policial, sob termo de compromisso e responsabilidade de sua apresentação ao representante do Ministério Público, no mesmo dia ou, sendo impossível, no primeiro dia útil imediato, exceto quando, pela gravidade do ato infracional e sua repercussão social, deva o adolescente permanecer sob internação para garantia de sua segurança pessoal ou manutenção da ordem pública.
[12] ECA. Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias.
[13] ECA. Art. 183. O prazo máximo e improrrogável para a conclusão do procedimento, estando o adolescente internado provisoriamente, será de 45 (quarenta e cinco) dias.
[14] SHECAIRA, Sérgio Salomão. Sistema de garantias e o direito penal juvenil. 2.ed. ver. e atual. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 192.
[15] ECA. Art. 116. Em se tratando de ato infracional com reflexos patrimoniais, a autoridade poderá determinar, se for o caso, que o adolescente restitua a coisa, promova o ressarcimento do dano, ou, por outra forma, compense o prejuízo da vítima. Art. 117. A prestação de serviços comunitários consiste na realização de tarefas gratuitas de interesse geral, por período não excedente a seis meses, junto a entidades assistenciais, hospitais, escolas e outros estabelecimentos congêneres, bem como em programas comunitários ou governamentais. Art. 118. A liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente.
[16] ECA. Art. 120. O regime de semiliberdade pode ser determinado desde o início, ou como forma de transição para o meio aberto, possibilitada a realização de atividades externas, independentemente de autorização judicial. Art. 121. A internação constitui medida privativa de liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
[17] NAVES, Rubens; GAZONI, Carolina. Direito ao futuro: desafios para a efetivação dos direitos das crianças e dos adolescentes. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010, p. 218.
[18] ECA. Art. 112, § 3º. Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições.
Especialista em Direito Penal e Processo Penal com capacitação para o Ensino no Magistério Superior pela Faculdade Damásio. Graduado em Direito pela Faculdade dos Guararapes/PE.<br> <br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JUNIOR, José Custódio da Silva. Ato Infracional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 fev 2017, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49203/ato-infracional. Acesso em: 23 dez 2024.
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