RESUMO: É notório que a legislação brasileira é alvo de constantes reformas, no âmbito do Direito Penal, novos preceitos são criados no intuito de amplificar a segurança jurídica, sanando em partes as demandas sociais. Neste sentido, é implícito que ao majorar a tutela jurisdicional, vários sistemas externos seriam afetados, no âmbito prisional, observa-se um estigma de degradação e que pouco possibilita a ressocialização do infrator (CAPEZ, 2011). Já no contexto judiciário, o magistrado buscando a recuperação dos transgressores, e ciente da atual situação carcerária, tende a aplicar punições alternativas, como as restritivas de direitos, procurando minimizar a aplicação das penas privativas de liberdade. Assim, é preciso analisar os diferentes posicionamentos da Doutrina e da Jurisprudência, com o fim de enfatizar os benefícios e os malefícios que abraçam a temática, respondendo ao escopo do presente trabalho, que é a aplicação das penas restritivas de direitos como instrumento de pacificação social. Para tal desiderato, será utilizado o método indutivo, precipuamente por meio de análise referencial.
Palavras-Chave: Direito Penal. Penas Restritivas. Prevenção. Reprovação.
1. INTRODUÇÃO:
O problema de superlotação do sistema prisional brasileiro se estende pelo país, embora muitas pesquisas estejam amadurecendo a busca por dados a respeito da temática, não se pode objetivar com absoluta precisão, a origem de tal fenômeno.
Tendo em vista o panorama supracitado, a presente pesquisa aborda a seara das Penas Restritivas de Direitos, mais especificamente sobre a sua funcionalidade na Substituição das Penas Privativas de Liberdade.
Na visão da corrente majoritária de nossa sociedade, o recurso cabível para a vasta pluralidade dos ilícitos cometidos, seria a aplicação das penas Privativas de Liberdade.
Porém, contrapondo a premissa supracitada, alguns Doutrinadores como Fernando Capez alertam sobre os diversos problemas causados pelo cárcere, vejamos:
O 6º Congresso das Nações Unidas, reconhecendo a necessidade de buscar alternativas para a pena privativa de liberdade, cujos altíssimos índices de reincidência (mais de 80%) recomendavam uma urgente revisão, incumbiu o Instituto da Ásia e do Extremo Oriente para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente de estudar a questão. Apresentada a proposta, foi aprovada no 8º Congresso da ONU, realizado em 14 de dezembro de 1990, sendo apelidada de Regras de Tóquio, também conhecidas como Regras Mínimas das Nações Unidas para a Elaboração de Medidas Não Privativas de Liberdade. (CAPEZ, 2011, p. 429).
Observa-se que na concepção de Torres e Capez, as prisões não são salutares no que tange a ultimação deste evento social. Imediatamente, retomam as divergências que cercam a temática.
Antes mesmo de ingressar no escopo da pesquisa, é importante Conceituar as Penas Privativas de liberdade, pois corporificam a própria realidade carcerária.
2. Da Pena Privativa de Liberdade
A Pena Privativa de Liberdade, conforme a própria semântica já aduz, é aquela que restringe o direito de ir e vir do condenado, infligindo-lhe um determinado tipo de prisão. (BARROS, 2004, p. 439).
Observa-se que no conceito supracitado, este tipo de pena pressupõe a intervenção estatal, no que tange a um direito fundamental do cidadão – a liberdade, podendo o regime condenatório ser mais brando ou gravoso, de acordo com a quantidade de pena, ou outros requisitos legais. (CAPEZ, 2011, p. 386).
Portanto, a Pena Privativa de Liberdade, deve ser observada como instrumento de reprovação, prevenção e recuperação, ao passo em que o Estado absorve a liberdade do sujeito, para que, sob o seu domínio, ocorra uma contribuição, efetiva, na busca pela reinserção do delinquente. (CAPEZ, 2011, p. 430).
Outra perspectiva a ser analisada é aplicabilidade dos princípios que fundamentam a finalidade da pena, na visão de Miguel Reale, “não sendo mais entendida como expiação ou retribuição de culpa, mas sim como instrumento de ressocialização do condenado” [...] (Reale, 1998), ou seja, o cumprimento da pena teria desígnio de reformar o condenado, buscando na pena a instrumentalização para retornar ao convívio harmonioso com a sociedade.
Cabe o questionamento em nossos dias atuais, se a premissa da ressocialização é aplicável, visto que na maioria das vezes, os cárceres refletem a situação deplorável dos detentos. (CAPEZ, 2011, p. 429).
Fato é, que a grande maioria dos presos retornam para as celas pouco tempo depois de receberem a liberdade, sendo esta a verdadeira sentença do ex-detento. (CUNHA, 2016, p. 453).
Tendo em vista o declínio das Penas Privativas de Liberdade, surge no âmbito jurídico, o questionamento sobre a real eficácia das Penas Restritivas de Direitos na esfera criminal, sendo este o próximo tema a ser analisado.
3. Das Penas Restritivas de Direitos
Ao legislador incumbe à percepção da problemática jurídico-estatal, e, ao intuir que determinado preceito legal não está apresentando a eficácia apropriada, mister se faz adoção de medidas, para tutelar os anseios sociais.
Na busca por uma solução que ultimasse o problema da falta de vagas do sistema prisional, e que abarcasse a problemática da ressocialização de ex-detentos, o legislador foi sensível ao dar primazia à aplicação das Penas Restritivas de Direitos como instrumento preventivo, abrangendo, igualmente, sua finalidade retributiva. (CUNHA, 2016, p. 454).
As Penas Restritivas de Direitos são espécies de penas alternativas, e visam substituir as Penas Privativas de Liberdade, quando as últimas possuírem um menor grau de punição. (CUNHA, 2016, p. 454).
Colhe-se o Artigo 43 do Código Penal Brasileiro, elucidando as Penas Restritivas de Direitos:
Art. 43. As penas restritivas de direitos são:
I – prestação pecuniária;
II – perda de bens e valores;
III – (VETADO)
IV – prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas;
V – interdição temporária de direitos;
VI – limitação de fim de semana.
As restrições para aplicação das Penas Restritivas de Direitos far-se-ão nos seguintes termos:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:
I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
III – a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente.
§ 1o (VETADO)
§ 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos.
§ 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.
§ 4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão.
§ “5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.”.
Desde que atendidos os requisitos transcritos acima, como o Limite da Pena, e os requisitos Subjetivos do Agente, o Magistrado poderá aplicar as Penas Restritivas de Direitos, substituindo as Penas Privativas de Liberdade.
É importante destacar, que a aplicação das Penas Restritivas de Direitos materializam um direito subjetivo do apenado, portanto, preenchidos os requisitos legais, a sua concessão torna-se obrigatória. (CUNHA, 2016, p. 454).
No campo Jurisprudencial, é possível colher diversos entendimentos favoráveis à aplicação das Penas Restritivas de Direitos, vejamos:
APELAÇÃO CRIMINAL. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO. FRAUDE. INSTALAÇÃO DE DISPOSITIVO ELETRÔNICO EM TERMINAL DE AUTOATENDIMENTO DA CEF. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE MANTIDA. CULPABILIDADE. NEUTRA. MONTANTE ADEQUADO. PENA DEFINITIVA. DIMINUIÇÃO EM RAZÃO DA TENTATIVA. APLICAÇÃO DE PERCENTUAL MÍNIMO. CONSIDERAÇÃO DO ITER CRIMINIS PERCORRIDO. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. ABERTO. SUBSTITUIÇÃO POR DUAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. 1. A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras absolutamente objetivas para a fixação da pena. Precedentes do STF. [...] (TRF4, ACR 5000799-46.2014.404.7201, SÉTIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 07/12/2016).
E ainda:
PENAL. CONTRABANDO DE MEDICAMENTOS. CONSTITUCIONALIDADE DO ART. 273 DO CÓDIGO PENAL. MÉDIA QUANTIDADE DE FÁRMACOS APREENDIDOS. APLICAÇÃO DO PRECEITO SECUNDÁRIO DO ART. 33 DA LEI Nº 11.343/06. AUTORIA, MATERIALIDADE E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO. DOSIMETRIA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 231 DO STJ. TRANSNACIONALIDADE. ART. 40, I, DA LEI Nº 11.343/06. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/06. REGIME INICIAL ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. [...] 6. Satisfeitos os requisitos do art. 44 do Código Penal e tendo em vista que a medida se mostra suficiente para a justa repressão e prevenção delitiva e atende aos objetivos ressocializantes da lei penal, deve a pena corporal ser substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade, pelo tempo da condenação, e pecuniária. (TRF4, ACR 5016370-72.2014.404.7002, SÉTIMA TURMA, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 09/09/2016).
Da jurisprudência analisada percebe-se a inclinação dos magistrados ao aplicar as penas restritivas de direitos, visando resguardar os interesses da coletividade, por meio da ressocialização dos detentos.
Não obstante, alguns Doutrinadores como Rogério Sanches Cunha e Rogério Greco avalizam a sua existência, afirmando uma tendência do Direito Penal moderno. (CUNHA, 2016, p. 454) (GRECO, 2015, p. 599).
Do exposto verifica-se que a substituição da pena, pode ser benéfica a toda a sociedade, tendendo à recuperação, e a rápida reintegração social do condenado, sem que esta experiência lhe traga prejuízos.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa teve como objeto as Penas Restritivas de Direitos enquanto instrumento de prevenção e reprovação dos delitos. De maneira sintética, foram analisadas no Primeiro Capítulo, as Noções Conceituais das Penas Privativas de Liberdade.
Já no Segundo Capítulo, chegou-se ao escopo do trabalho, com a análise das Penas Restritivas de Direitos. Nesse prisma, também foram tratadas as conceituações iniciais, para, ao final, retirar os principais questionamentos acerca do tema, isto é, se é válido o esforço do legislador pátrio, ao editar a categoria das Penas Restritivas de Direitos.
Hodiernamente, é possível afirmar que o Direito Penal brasileiro tende a evitar as Penas Privativas de Liberdade de curta duração, pois as referidas sanções acabaram se mostrando ineficazes ao longo do tempo.
Assim, é importante frisar, que as Penas Restritivas de Direitos tendem a solucionar certas demandas sociais que não exigem tamanho rigorismo penal, incluindo os referidos infratores em um sistema que busca primordialmente a ressocialização.
Conclui-se, portanto, que a legislação possui total coerência, na medida em que evita a inclusão inadvertida de infratores no sistema carcerário, que em nada beneficiariam a população em geral.
REFERÊNCIAS
BARROS, Flávio Augusto Monteiro. (2004) Direito Penal: Parte Geral. São Paulo. Editora Saraiva.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, parte geral. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral. 4. ed. Salvador: JusPODIVM, 2016.
GRECO, Rogério. Curso de direito penal. 17. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2015.
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Human Rights Watch, O Brasil atrás das Grades. Disponível em: www.hrw.org/portuguese/reports/presos/.
MONTEFUSCO, Roberto. Penas Restritivas de Direitos: Uma abordagem sobre a aplicação efetuada pelos juízes das varas criminais do recife. Serv. Soc. Soc., São Paulo, n. 107, jul./set. 2011.
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Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB. Mestrando em Desenvolvimento Regional, pela Universidade Regional de Blumenau, Graduado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARíLSON THOMAZ JúNIOR, . As penas restritivas de direitos: instrumentos de prevenção e reprovação criminal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 fev 2017, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49370/as-penas-restritivas-de-direitos-instrumentos-de-prevencao-e-reprovacao-criminal. Acesso em: 23 dez 2024.
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