RESUMO: Este trabalho apresenta a importância da independência entre instâncias e a própria distinção entre a responsabilidade administrativa com as demais responsabilidades.
Palavras-chave: Independência de instâncias, aplicação de sanção disciplinar, responsabilidade administrativa.
ABSTRACT: This paper presents the importance of independence between instances and the very distinction between administrative responsibility and other responsibilities.
SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Aplicação da sanção disciplinar antes da decisão judicial 3. Conclusão. 4. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Prefacialmente, cabe registrar que, no Ordenamento Jurídico Brasileiro predomina a independência de instâncias.
A independência entre instâncias decorre da separação entre os Poderes e da própria distinção entre a responsabilidade administrativa com as demais responsabilidades.
Assim, em virtude da independência das responsabilidades (sanções penais, civis e administrativas) e, em consequência das respectivas instâncias, a Administração Pública poderá aplicar sanção disciplinar ao servidor, mesmo se ainda em curso a ação judicial a que responde o mesmo fato.
Isto porque, o processo administrativo não se sujeita ao pressuposto de haver prévia definição sobre o fato na esfera judicial.
Desse modo, em princípio, não há necessidade de se aguardar o desfecho de um processo em outra esfera para somente depois apenar um servidor pelo cometimento de falta funcional.
2. APLICAÇÃO DA SANÇÃO DISCIPLINAR ANTES DA DECISÃO JUDICIAL
É possível à Administração infligir sanção disciplinar ao servidor público antes mesmo de julgamento no âmbito judicial, conforme decisões judiciais exaradas a seguir:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. ATO DE DEMISSAO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. PROPORCIONALIDADE DA SANÇAO. OBSERVÂNCIA.
(...)
5. O processo administrativo disciplinar e a ação de improbidade, embora possam acarretar a perda do cargo público, possuem âmbitos de aplicação distintos, mormente a independência das esferas civil, administrativa e penal. Logo, não há óbice para que a autoridade administrativa apure a falta disciplinar do servidor público independentemente da apuração do fato no bojo da ação por improbidade administrativa. Precedentes. STJ- MANDADO DE SEGURANÇA Nº 15.951 - DF (2010/0218083-3) 27/11/2011.
MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. AUDITOR FISCAL DA RECEITA FEDERAL. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. REMESSA DE VALORES PARA O EXTERIOR, SEM DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. CONDUTA ÍMPROBA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR – PAD. PROVA EMPRESTADA DO JUÍZO CRIMINAL. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS CIVIL, PENAL E ADMINISTRATIVA. PENA DE DEMISSÃO IMPOSTA PELA ADMINISTRAÇÃO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. DIREITO LÍQUIDO E CERTO INDEMONSTRADO.
(...)
4. Embora possam se originar a partir de um mesmo fato, a apuração de falta administrativa realizada no PAD não se confunde com a ação de improbidade administrativa, esta sabidamente processada perante o Poder Judiciário, a quem cabe a imposição das sanções previstas nos incisos do art. 12 da Lei n. 8.429/92. Há reconhecida independência das instâncias civil, penal e administrativa. (STJ - MS 12.536/DF, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ de 26.09.08);
APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. DENEGAÇÃO EM 1º GRAU. PRETENSÃO DE QUE O PROCESSO ADMINISTRATIVO SEJA EXCLUÍDO, DIANTE DA EXISTÊNCIA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, ENVOLVENDO OS MESMOS FATOS. IMPOSSIBILIDADE. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS CIVIL, PENAL E ADMINISTRATIVA. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL PACÍFICO. SENTENÇA CORRETA. MANUTENÇÃO. RECURSO DESPROVIDO."A independência entre as instâncias penal, civil e administrativa, consagrada na doutrina e na jurisprudência, permite à Administração impor punição disciplinar ao servidor faltoso à revelia de anterior julgamento no âmbito criminal, ou em sede de ação civil por improbidade, mesmo que a conduta imputada configure crime em tese. Precedentes do STJ e do STF. (...)" (STJ, MS 7.834/DF, Rel. Ministro FELIX FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, J. 13.03.2002, DJ 08.04.2002, p. 127).
(TJPR 4602993 PR 0460299-3, Relator: Rogério Ribas, Data de Julgamento: 01/09/2009, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 226)
Processo civil. Improbidade administrativa. Juízo de admissibilidade. Independência das instâncias judicial e administrativa. Existência de indícios. Recebimento da inicial. 1- A realização de processo administrativo disciplinar, bem como de qualquer medida prévia à sua instauração, não pode ser considerada como condição para a propositura de ação de improbidade administrativa. Prevalece, no caso, a regra da independência das instâncias. 2- O juízo de admissibilidade da petição inicial de ação de improbidade administrativa (Lei nº 8.429/92, art. 17, §§ 6º e 8º) não se destina à formação de convicção definitiva e exauriente do magistrado sobre a causa. Nesta sede, tem-se por admissível a demanda desde que haja indícios suficientes a embasar a verossimilhança da conduta ímproba.8.42917§§ 6º8º3- Agravo a que se nega provimento. (TRF 2ª - 161014 RJ 2007.02.01.015979-6, Relator: Desembargador Federal LUIZ PAULO S ARAUJO Fº/no afast. Relator, Data de Julgamento: 08/10/2008, SÉTIMA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: DJU - Data::28/10/2008 - Página::211)
ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO - PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - PRESCRIÇÃO- INOCORRÊNCIA - APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO PENAL - PRECEDENTES - INDEPENDÊNCIA DAS ESFERAS ADMINISTRATIVA E PENAL - PRESCINDIBILIDADE DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA - RECURSO DESPROVIDO.
I - Consoante entendimento deste Superior Tribunal de Justiça, havendo regular apuração criminal, deve ser aplicada a legislação penal para o cômputo da prescrição no processo administrativo. Precedentes.
II - A sanção administrativa é aplicada para salvaguardar os interesses exclusivamente funcionais da Administração Pública, enquanto a sanção criminal destina-se à proteção da coletividade. Consoante entendimento desta Corte, a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa, consagrada na doutrina e na jurisprudência, permite à Administração impor punição disciplinar ao servidor faltoso à revelia de anterior julgamento no âmbito criminal, ou em sede de ação civil, mesmo que a conduta imputada configure crime em tese. Ademais, a sentença penal somente produz efeitos na seara administrativa, caso o provimento reconheça a não ocorrência do fato ou a negativa da autoria. III - Recurso conhecido e desprovido (STJ, RMS 18.688/RJ, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU 09.02.05);
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. POSSIBILIDADE. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS ADMINISTRATIVA E PENAL. PROVIMENTO NEGADO. 1. A despeito das teses que se tem levantado acerca da inconstitucionalidade da aplicação da pena de cassação de aposentadoria de servidor público em processo administrativo disciplinar, seja em razão do caráter contributivo dos benefícios previdenciários, seja à luz dos princípios do direito adquirido e do ato jurídico perfeito, prevalece nesta Corte e no Supremo Tribunal Federal o entendimento de que é possível a aplicação da referida pena, desde que haja expressa previsão legal e que o ilícito administrativo tenha sido cometido pelo servidor ainda na atividade. 2. A sentença proferida no âmbito criminal somente repercute na esfera administrativa quando reconhecida a inexistência material do fato ou a negativa de sua autoria. 3. Recurso ordinário em mandado de segurança não provido, com a revogação da liminar deferida nos autos da MC n. 13.883/RJ (STJ - RMS: 27216 RJ 2008/0150711-9, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 28/04/2015, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/05/2015)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZO QUANTO À AUSÊNCIA DE JUNTADA DE DOCUMENTOS. ABSOLVIÇÃO NA ESFERA PENAL COM BASE NO ART. 386, III e VI, DO CPP. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. NECESSIDADE DE PRÉVIA SINDICÂNCIA ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE DE INOVAÇÃO NESTA FASE PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. As instâncias das esferas civil, penal e administrativa são autônomas e não interferem nos seus respectivos julgados, ressalvadas as hipóteses de absolvição por inexistência de fato ou de negativa de autoria. (Precedente: RMS 26.510/ RJ, Rel. Min. Cezar Peluso, Tribunal Pleno, DJe 26/3/2010) 2. In casu, a absolvição do recorrente ocorreu com base no art. 386, III (não constituir o fato infração penal) e VI (existirem circunstâncias que excluam o crime ou isentem o réu de pena (arts. 20, 21, 22, 23, 26 e § 1º do art. 28, todos do Código Penal), ou mesmo se houver fundada dúvida sobre sua existência;) , do Código de Processo Penal, não se enquadrando, portanto, nas hipóteses ressalvadas. 3. O jus novarum é vedado no momento da análise do recurso ordinário, por isso que a prévia sindicância administrativa não foi objeto do mandado de segurança, não restando insindicável nesta via. 4. O agravante não demonstrou a existência de prejuízo efetivo em virtude da ausência de juntada de documentos fornecidos pela Inspetoria da Receita Federal em Porto alegre e pela Administradora Hidroviária Docas Catarinense ADHOC. 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STF - AgR RMS: 26951 DF - DISTRITO FEDERAL 0005638-38.2007.0.01.0000, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 03/11/2015, Primeira Turma)
Nesse passo, registramos também o entendimento pacífico do Supremo Tribunal Federal no sentido da independência entre as instâncias administrativa, civil e penal, excetuados os efeitos da decisão proferida nesta última, se assentada a inexistência de autoria ou a inocorrência material do próprio fato, v.g.: Mandado de Segurança n. 22.899, Relator o Ministro Moreira Alves, DJ 16.5.2003; Mandado de Segurança n. 22.155, Relator o Ministro Celso de Mello, DJ 24.11.2006, do qual destacamos o seguinte trecho:
“- As decisões emanadas do Poder Judiciário não condicionam o pronunciamento censório da Administração Pública nem lhe coarctam o exercício da competência disciplinar, exceto nos casos em que o juiz vier a proclamar a inexistência de autoria ou a inocorrência material do próprio fato, ou, ainda, a reconhecer a configuração de qualquer das causas de justificação penal.”
Leo da Silva Alves assevera: “A Administração pode dar curso a processo disciplinar, sem aguardar manifestação do Poder Judiciário. Descabe, portanto, como regra, o sobrestamento do processo[1]”.
Também por este prisma é o entendimento do doutrinador José Olimpio Barbacena Filho[2], ao asseverar que “A Administração Pública tem a obrigação legal de conduzir e decidir acerca de processos administrativos disciplinares instaurados em seu âmbito, pois a instância administrativa não se confunde com a judicial. Mesmo que haja ação de improbidade administrativa ajuizada, isso não é empecilho para que o mesmo fato seja apurado administrativamente e concluído mesmo antes da decisão judicial inerente ao fato porventura em apuração”.
Cabe registrar também que, na absolvição na esfera judicial por insuficiência de provas, não repercute de forma necessária no âmbito disciplinar, até porque outra pode ter sido a interpretação dos fatos nos autos do processo administrativo disciplinar, inclusive em vista de distintos elementos probatórios.
A autoridade administrativa competente tem autonomia para apreciar os mesmos fatos de forma diferente, uma vez que a decisão judicial não tem efeito vinculante, senão esta relacionada ao reconhecimento da inexistência do fato ou negativa de autoria.
O doutrinador português Paulo Veiga e Moura considera que a possibilidade de um comportamento do empregado poder despertar responsabilidade civil, administrativa, criminal, enseja o juízo de que “não impede que haja uma autonomia e independência dos procedimentos destinados a efectivar qualquer uma daquelas responsabilidades, com natural risco de se poderem alcançar conclusões divergentes em ambas as sedes”[3].
Vale ressaltar também o entendimento da doutrina[4], em relação a sentença penal absolutória, proferida por insuficiência de provas quanto à autoria, ou porque a prova é insuficiente para a condenação, não vincula a esfera disciplinar.
Julgou o Superior Tribunal de Justiça[5]:
“A decisão administrativa disciplinar não resta afetada por sentença penal de absolvição por insuficiência de provas e o juízo administrativo não precisa aguardar trânsito em julgado de decisão criminal para aplicar pena disciplinar”.
A corroborar o exposto acima, insta transcrever o entendimento da doutrina de Hely Lopes Meirelles:
“A punição administrativa ou disciplinar não depende de processo civil ou criminal a que se sujeite também o servidor pela mesma falta, nem obriga a Administração a aguardar o desfecho dos demais processos, nem mesmo em face da presunção constitucional de não culpabilidade. Apurada a falta funcional, pelos meios adequados (processo administrativo, sindicância ou meio sumário), o servidor fica sujeito, desde logo, à penalidade administrativa correspondente. A punição interna, autônoma que é, pode ser aplicada ao servidor antes do julgamento judicial do mesmo fato. E assim é porque, como já vimos, o ilícito administrativo independe do ilícito penal. A absolvição criminal só afastará o ato punitivo se ficar provada, na ação penal, a inexistência do fato ou que o acusado não foi seu autor” (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros Editores, 30ª ed., p. 481).
Ademais, a atuação do Poder Judiciário, no tocante ao controle jurisdicional do processo administrativo, cingir-se ao campo da legalidade e regularidade do ato administrativo.
Por exemplo, a aplicação da pena disciplinar (administrativo) e a decisão judicial em ação civil pública (cível) instauradas pelos mesmos fatos, em regra, não se vinculam, por visarem resultados diversos.
Ressalta-se que, a responsabilidade administrativa do empregado será afastada somente quando a absolvição criminal negar a existência do fato ou sua autoria, conforme entendimento da doutrina e jurisprudências retromencionadas.
3. CONCLUSÃO
Portanto, em regra, a independência entre as instâncias penal, civil e administrativa, consagrada na doutrina e na jurisprudência, permite à Administração Pública impor punição disciplinar ao servidor faltoso, independentemente do julgamento do ato na esfera judicial.
4. REFERÊNCIAS
ALVES, Léo da Silva. Processo disciplinar em 50 questões. Brasília: Brasília Jurídica, 2002.p.56.
Revista da CGU, Ano VI, Julho/2011, ISSN 1981-674X, fl. 160
MOURA. Paulo Veiga e. Estatuto Disciplinar dos trabalhadores da Administração Pública anotado. 2ed. Coimbra: Coimbra Ed., 2011, p.101.
CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 13 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. P.579
NOTAS:
[1][1] ALVES, Léo da Silva. Processo disciplinar em 50 questões.Brasília: Brasília Jurídica, 2002.p.56.
[2] Revista da CGU, Ano VI, Julho/2011, ISSN 1981-674X, fl. 160
[3] MOURA. Paulo Veiga e. Estatuto Disciplinar dos trabalhadores da Administração Pública anotado. 2ed. Coimbra: Coimbra Ed., 2011, p.101.
[4] CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 13 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005. P.579
[5]MS Nº 8.111 - DF (2001/0195679-7)
Graduação pelo Centro Universitário de Rio Preto-UNIRP/SP. Pós-Graduado em Direito Público pela Fortium-DF.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Carlos Alberto Fonseca Seixas de. Independência de instâncias e a responsabilidade disciplinar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 mar 2017, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49712/independencia-de-instancias-e-a-responsabilidade-disciplinar. Acesso em: 23 dez 2024.
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