RESUMO: O presente trabalho busca analisar os riscos que derivam da quebra da cadeia de custódia, frisando a importância em se manter íntegra a cadeia de custódia. Um um primeiro momento foi abordado de forma geral e introdutória o tema relativo à prova; seu conceito, os princípios correlacionados e a importância da prova para o processo. Por fim, se analisou a estimação da preservação da cadeia de custodia da prova penal, e os riscos derivados de sua quebra. Utilizou-se de pesquisa bibliográfica referente ao tema em questão.
Palavras chave: Direito processual penal, prova penal, cadeia de custódia, quebra da cadeia de custódia.
Sumário: INTRODUÇÃO – 1. CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A PROVA NO PROCESSO PENAL: 1.1 PRINCÍPIOS RELATIVOS À PROVA PENAL; 2 DA CADEIA DE CUSTÓDIA DA PROVA NO PROCESSO PENAL 2.1 DA QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA 3. CONCLUSÃO. 4. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
Nas palavras do professor Aury Lopes Junior (2014) “O processo penal é um instrumento de retrospecção, de reconstrução aproximativa de um determinado fato histórico. Como ritual, está destinado a instruir o julgador, a proporcionar o conhecimento do juiz por meio da reconstrução histórica de um fato”.
Assim, as provas são o meio pelo qual se poderá alcançar essa finalidade de reconstruir o fato delitivo. Em resumo podemos afirmar que as provas servem para formar a convicção (captura psíquica) do magistrado, além de retratar a reconstrução histórica de um acontecimento passado.
Nas lições de Antônio Magalhães Gomes filho (1997)
Os mecanismos probatórios servem à formação do convencimento do juiz e, concomitantemente, cumprem função não menos relevante de justificar perante o corpo social a decisão adotada; assim, considerar a prova como a “alma do processo” tanto pode significar a exaltação do seu valor interno – de instrumento pelo qual o juiz se esclarece sobre os fatos -, como a identificação de um elemento vivificador através do qual a atividade processual assimila valores e símbolos vigentes na sociedade, propiciando em contrapartida, a adesão do grupo ao pronunciamento resultante.
Em outras palavras, além de ser um procedimento cognitivo, a prova é também um fenômeno psicossocial; daí a extraordinária importância da natureza das provas e o modo como elas são obtidas e incorporadas ao processo
De tal importância, é essencial que sejam preservados as fontes de provas acolhidas durante a investigação criminal, devendo todo o procedimento ser usado para conservar e documentar a narrativa cronológica das provas e dos elementos informativos.
O presente trabalho, nesse contexto, apresentado como requisito para obtenção do título de Especialista em Processo Penal, no programa de Pós Graduação da Faculdade Anhanguera, tem como problemática, a importância da preservação das fontes de prova através da manutenção da cadeia de custódia e os eventuais riscos derivados da sua não observância.
O trabalho será dividido em dois capítulos distintos, que analisarão, mediante pesquisa bibliográfica, as questões que, em nosso entender, são de maior relevância na temática abordada.
Em um primeiro momento será abordado de modo geral e introdutório o tema sobre as provas no processo penal, sua base constitucional e sua finalidade, e finalmente, de maneira um pouco mais pontuada, os princípios atinentes à prova penal.
No segundo capitulo, será voltado para o tema relativo à cadeia de custódia; seu conceito, importância e as possíveis consequências de sua não observância: a quebra da cadeia de custódia. A intenção para tanto, não é exaustiva, mas apenas, a partir de noções introdutórias e gerais, chegarmos a situar justamente na preservação das fontes de prova, - a necessária salvaguarda da cadeia de custodia -, e averiguar os riscos derivados da sua eventual ruptura.
1 CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A PROVA NO PROCESSO PENAL
Não pretendendo adentrar no mérito sobre “verdade real e verdade processual”, é importante frisar o papel do direito processual penal na reconstrução do fato pretérito, a fim de trazer o conhecimento necessário acerca do ocorrido para o magistrado. Para tanto, é necessária fazer uma “mínima” reconstrução histórica por meio da produção de provas. “As provas são as matérias que permitem a reconstrução histórica e sobre os quais recai a tarefa de verificação das hipóteses, com a finalidade de convencer o juiz (função persuasiva)” (LOPES JUNIOR, 2014).
Assim, já nos é permitido afirmar que é através do processo penal que o Estado irá fornecer instrumentos necessários para a reconstrução de um determinado fato, visando futuramente a aplicação ou não do jus puniendi, sendo a prova o mecanismo escolhido para tanto. A prova irá, então, exercer um papel fundamental dentro do processo, pois é através dela que será possível a reconstrução dos fatos para que o julgador forme sua convicção.
Enquanto o processo penal pode ser entendido de forma simplificada sendo o meio pelo qual o Estado, através de uma série ordenada de atos realizados sob a égide do devido processo legal, procede à reconstrução dialética dos fatos propostos na inicial acusatória, com vistas a determinar a viabilidade, ou não, de aplicação do jus puniendi, pode-se dizer que a prova se constitui no elemento mais importante dessa almejada reconstrução e da própria atividade processual, pois é através dela que se recria na mente do julgador como tais fatos ocorreram, dando-lhes indispensáveis subsídios para o julgamento, funcionando como a verdadeira “alma do processo” [...] (SOUZA, 2014)
Segundo o professor Nereu José Giacomolli (2015)
Provar no processo é demonstrar ao julgador, dar-lhe a conhecer a existência de um determinado fato (que), num espaço (onde) e tempo (quando) razoáveis. Também é proceder a verificação dos impulsos criadores do fato (porque) e as circunstâncias deste (como), para que possa ser emitido um juízo acerca das situações processuais que se desenvolvem nos autos, bem como acerca da responsabilidade criminal do imputado. Assim, prova, na perspectiva totalizante, vincula-se ao resultado.
Dessa forma, a produção probatória tem como finalidade a produção de elementos que visam demonstrar a existência (ou não) de um determinado fato pretérito e todas as circunstancias que o circundam. Assim, é através dessa produção probatória que o magistrado terá elementos necessários para formar sua convicção.
De tal modo, os mecanismos de prova servem para concretizar o convencimento do magistrado e justificar a decisão que eventualmente for tomada. Tal como enfatiza o professor Aury Lopes Junior (2014) “O processo penal e a prova nele admitida integram o que se poderia chamar de modos de construção do convencimento do julgador, que formará sua convicção e legitimará o poder constituído na sentença”.
“Em sentido amplo, provar significa demonstrar a veracidade de um enunciado sobre um fato tido por ocorrido no mundo real. Em sentindo estrito, a palavra prova tem vários significados”. O processualista elenca três sentidos para a palavra prova: prova como atividade probatória, prova como resultado e prova como meio. Prova como atividade probatória seria o conjunto de atividades de constatação e manifestação de um fato em busca da verdade: “como a produção dos meios e atos praticados no processo visando o convencimento do juiz sobre a veracidade (ou não) de uma alegação sobre um fato que interesse à solução da causa”. A prova como resultado seria caracterizada pela formação da convicção do juiz no curso da instrução processual: “é a convicção sobre os fatos alegados em juízo pelas partes”. E a prova como meio, seriam os: “instrumentos idôneos à formação da convicção do órgão julgador acerca da existência (ou não) de determinada situação fática [...]”. (BRASILEIRO, 2014)
Nos ensinamentos de Gustavo Badaró, prova é tudo aquilo que é apto para a construção de um conhecimento de algo ou alguma coisa à outrem. Dessa forma, os meios de prova compõem os utensílios pelos quais são introduzidos no processo os elementos de prova. Diferente da atividade probatória, essa, é constituída pelos atos praticados pelas partes na construção histórica de um fato. (BADARÓ, 2016).
Dessa forma, é importante fazer também uma pequena distinção entre, meios de prova, elementos de prova e fontes de prova.
Meios de provas são os instrumentos ou atividades pelos quais os elementos de prova são introduzidos no processo, eles são utilizados pelas partes para adentrar no processo alguns dos elementos extraídos das fontes de prova.
Elemento de prova são todos os fatos ou situações em que reside a convicção do juiz, tais como a revista pessoal, resultado de perícia, depoimento de testemunhas e etc., o que geralmente é extraído antes da valoração judicial.
Por fim, a fonte de prova é caracterizada por pessoas ou coisas das quais possa se conseguir a prova, via de regra anteriores ao processo.
Em suma, para que o julgador eventualmente profira uma decisão, é necessário que que tal deliberação seja pautada na maior expectativa de veridicidade, o que será possível através da produção probatória.
Nesse sentido, para que o magistrado profira a decisão, é necessário que se convença da maior probabilidade de veracidade de uma hipótese em relação à outra. E é através da produção de provas que ocorrerá a formação desse convencimento, observando-se, sobretudo, o direito ao contraditório à ampla defesa e ao devido processo legal. (EBERHARDT, 2016)
Desta forma, já efetuado tais limites conceituais sobre a prova penal no direito processual brasileiro, será analisado de forma breve os princípios processuais aplicados a ela, para que assim, os limites constitucionais sejam respeitos, e a eventual prova seja licita.
1.1PRINCÍPIOS RELATIVOS À PROVA PENAL
Segundo a Carta Magna, ninguém poderá ser privado de sua liberdade sem o devido processo legal, e de tal princípio derivam tantos outros princípios e garantias fundamentais, sendo que muitos deles estão intimamente ligados a produção probatória.
O primeiro princípio importante de se considerar relativo a atividade probatória no processo penal brasileiro é o princípio da dignidade da pessoa humana. A busca da verdade pelo Estado, por meio dos elementos de prova deve bastar-se a este princípio, pois, não será possível a adoção de qualquer meio de prova que atente contra a dignidade da pessoa humana, o que levaria a aniquilamento da estrutura republicana brasileira (NICOLITT, 2014).
A presunção de inocência, também consagrado pela Constituição Federal (1988), assegura que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória”. Nas palavras do professor Nereu Giacomolli (2014) “em essência, o ser humano nasce inocente, permanece inocente até que o Estado afaste esse estado natural e jurídico, de modo consistente, através do devido processo constitucional e convencional”.
Assim, tal princípio impõe que não pode ser considerado culpado o acusado antes do transito e julgado da sentença condenatória, incumbindo à acusação o encargo de afastar tal presunção de inocência.
Vale lembrar que diante do estado de inocência, a acusação irá representar apenas mera presunção de culpabilidade para o órgão julgador, e apenas será convertido em um futuro juízo condenatório somente após a sua constatação pela acusação, não sendo necessário que o acusado comprove sua inocência. Em outras palavras, o que deve ser provado é a culpa, e nunca o estado de inocência (GIACOMOLLI, 2014).
Ao lado do princípio da presunção da inocência, temos o princípio da proibição das provas ilícitas. Sendo inadmissível no processo qualquer prova obtida por meios ilícitos (NICOLLIT, 2014).
Tal vedação é decorrência direta do Estado Democrático de Direito, que não se pode admitir a punição do indivíduo a qualquer custo. Para o Professor Aury Lopes (2014), é de suma importância que se comece fazendo uma diferença entre provas ilícitas e provas ilegítimas (as provas ilícitas todas aquelas que ferem algum preceito constitucional ou legal, e as ilegítimas são aquelas obtidas mediante desobediência à uma norma processual).
A distinção é ainda mais importante se formos considerar que a prova ilícita que não é passível de repetição, já que o vício se vincula ao momento de sua obtenção, e a prova ilegítima poderia sim ser repetida, já que o defeito se dá exclusivamente na dimensão processual.
Dessa forma, devem ser entendidas também como ilícitas, as provas por derivação – provas que são adquiridas por meio de uma prova ilícita -, trata-se da chamada “teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree). “No sistema processual brasileiro não havia previsão acerca da ilicitude por derivação, ou seja, da obtenção de uma prova (lícita) por um meio ou metodologia probatórios ilícitos. É o denominado efeito expansivo da ilicitude ou prova reflexa (GIACOMOLLI, 2014).
Assim, para o professor Nereu Giacomolli (2014), “admitir que a prova derivada de uma ilicitude seria incrementar a utilização de procedimentos inconstitucionais e inconvencionais que, indiretamente, surtiriam efeito”. Mesmo havendo exceções à teoria dos frutos da árvore envenenada, não é objeto do trabalho estuda-las, apenas retratamos a importância de fazer menção da existência de tais exceções.
Outrossim, as provas ilícitas são inadmissíveis no ordenamento brasileiro, e devem também, ser desentranhadas do processo.
Dessa forma, todas as provas apresentadas aos autos merecem ser contestadas pela parte interessada, como contraprova, tratando-se de legítima garantia processual. No artigo 5º, LV, da Constituição Federal, prevê que, aos litigantes, em processo judicial ou administrativos, e aos acusados em geral, serão assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios a ela inerentes. Dessa forma, qualquer prova que não for submetida ao crivo de contraditório não pode ser considera pelo magistrado.
Desta feita, a garantia do contraditório tem como condão, proporcionar as partes o exercício processual dialético e participativo, tal como nos ensina Nereu Giacomolli (2014) “A garantia do contraditório propicia às partes o exercício processual dialético e participativo, após o conhecimento das proposições, alegações, provas, matéria fática, teses jurídicas, contribuindo e influindo na construção do processo e do decisum, de forma democrática”.
Ao falar do princípio do contraditório, o professor Aury Lopes Jr. (2014), leciona que este “deve ser visto como um direito de participar, de manter uma contraposição em relação à acusação e de estar informado de todos os atos desenvolvidos no ter procedimental.”
Novamente, voltamos à importância do convencimento do juiz, este, que, deverá formar sua convicção na livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial. Não podendo o juiz formar sua convicção tão-somente em elementos informativos colhidos na fase de investigação. Tal como leciona André Nicoliti
[...] o devido processo legal é um conjunto de princípios, como o contraditório, a ampla defesa, a presunção de inocência, a motivação e etc. Aqui isso fica muito evidente, pois temos que trabalhar também com o princípio da presunção de inocência, o que impõe à acusação o ônus da prova e ainda como regra de julgamento o in dubio pro reo. Destarte, se a prova produzida sob o crivo do contraditório, por si só, é incapaz de possibilitar a formação de um juízo condenatório, está evidenciada insuficiência de prova, impondo-se a absolvição do réu. (NICOLITT, 2015)
Por sua vez, o princípio da ampla defesa é diretamente relacionado com o princípio do contraditório. Pois como foi exposto, um dos principais condões do contraditório é garantir a paridade de armas, e o princípio da ampla defesa assegura ao acusado não só direito à uma defesa pessoal (exercida pela próprio acusado/investigado, podendo ser manifestada pelo depoimento pessoal, ou até mesmo pelo direito de permanecer em silêncio), mas também uma efetiva defesa técnica (defesa por pessoa habilitada no exercício da advocacia).
2 DA CADEIA DE CUSTÓDIA DA PROVA NO PROCESSO PENAL
Não há como o juiz pautar seu convencimento em uma prova que não se conhece as fontes. Nas palavras de Geraldo Prado (2014), no atual processo penal é de suma importância que se possa verificar “a estrita legalidade da obtenção e preservação dos meios de prova – isto é, da escrupulosa legalidade do acesso às fontes de prova e da manutenção destas fontes em condição de serem consultadas, oportunamente, pelas partes”
Entretanto, apenas conhecer a fonte inicial da prova não é suficiente, é necessário que se conheça a integralidade da cadeia de custódia.
Podemos definir cadeia de custódia como sendo uma ciclo de atos/eventos que devem manter a idoneidade e integridade dos elementos que serão eventualmente utilizados como provas.
A estimação pela integral preservação da cadeia de custodia atinge todo o sistema penal na qual a prova está inserida, devendo todos os atores serem responsáveis pela sua integridade.
Nas palavras de Alberi Espindula (2013), a cadeia de custódia nada mais é do que a “garantia de total proteção aos elementos encontrados e que terão um caminho a percorrer, passando por manuseio de pessoas, análises, estudos, experimentações e demonstração – apresentação, até o ato final do processo criminal”
Segundo Marinho (2011), o Estado não deve apenas preservar a idoneidade e integridade da prova penal, mas também, tem o dever de mostrar a história da prova, a sua natureza, origem, e etc. E só assim, poderá se dizer que a prova foi produzida de maneira cristalina, já que foi possível manter a memória da prova em todas as fases.
O Estado também não tem apenas o dever de preservar a integridade e idoneidade da prova, mas, também de mostrar a história da prova, ou seja, a sua origem, sua natureza, como foi coletada, hora e data de cada ato, como foi acondicionada, transportada, armazenada e analisada com registro de todos os atos integrante da cadeia de custódia. Desse modo, podemos dizer que a prova fora produzida de forma transparente e com qualidade, permitindo assegurar a memória de todas as fases. (MARINHO, 2011)
Assim, podemos dizer que a cadeia de custódia é formada por uma série de procedimentos técnicos e científicos que irão prover a informação necessária para demostrar que a prova foi mantida integre desde a sua origem.
De especial relevo para a análise de valoração das provas o momento em que ela é colhida, que pode coincidir com o momento em que ela é apresentada em Juízo, mas na prática isso quase não acontece. Informações são coletadas durante a investigação criminal, são ordenadas, esclarecidas, explicadas ou não, depois outras são acrescentadas. Na fase investigativa preliminar não há rito, e a investigação evolui conforme estratégia dos agentes que dela são encarregados. Todos os dados são processados em análise e se convertem em suporte para o início da ação penal. (MENDRONI, 2015)
Geraldo Prado (2014), acredita ser a cadeia de custódia ser um dispositivo que visa assegurar a integridade dos elementos de prova. Já que o conhecimento das fontes de prova pela defesa é mais do que fundamental.
O rastreamento das fontes de prova será um tarefa impossível se parcela dos elementos probatórios colhidos de forma encadeada vier a ser destruída. Sem esse rastreamento, a identificação do vínculo eventualmente existente entre uma prova aparentemente lícita e outra, anterior, ilícita, de que a primeira é derivada, dificilmente será revelado. (PRADO, 2014)
Em outras palavras, a cadeia de custódia é “um dispositivo dirigido a assegurar a fiabilidade do elemento probatório, ao colocá-lo sob proteção de inferências capazes de falsificar o resultado da atividade probatória” (PRADO, 2014).
De acordo com Alberi Espindula (2009), que leciona sobre a cadeia de custódia em relevo:
Claro está que a finalidade da cadeia de custódia é para assegurar a idoneidade dos objetos e bens escolhidos pela perícia ou apreendidos pela autoridade policial, a fim de evitar qualquer tipo de dúvida quanto à sua origem e caminho percorrido durante a investigação criminal e o respectivo processo judicial.
Importante esclarecer que a cadeia de custódia não está restrita só ao âmbito da perícia criminal, mas envolve desde a delegacia policial, quando apreende algum objeto e já deve observar com rigor tais procedimentos da cadeia de custódia. Podemos voltar mais ainda: qualquer policial, seja ele civil ou militar, que for receptor de algum objeto material que possa estar relacionado a alguma ocorrência, deve também – já no seu recebimento ou achado – proceder com os cuidados da cadeia de custódia. E essas preocupações vão além da polícia e da perícia, estendendo-se aos momentos de trâmites desses objetos da fase do processo criminal, tanto no ministério público quanto na própria justiça. Os procedimentos da cadeia de custódia devem continuar até o processo ter transitado em julgado.
Nas palavras de Marinho (2011):
A cadeia de custódia é constituída por uma série de atos interligados, sem deixar lacuna, visando a segurança e confiabilidade do processo em que os vestígios estão submetidos, bem como a manutenção da integridade conforme sua natureza. Todos os atos devem ser registrados, inclusive os profissionais que preservaram o local e os que manusearam com os vestígios desde a coleta, transporte, recebimento pelos órgãos de perícia oficial e armazenamento.
Assim, como noticia Prado (2015) “a exigência da preservação da cadeia de custódia das provas configura elemento fundamental de adequação do processo penal ao estado de direito”.
A cadeia de custódia é o principal meio para que uma prova se mantenha licita e íntegra. A responsabilidade de conservação da idoneidade processual da prova e das fontes de prova são partilhadas a todos os agentes do Estado. A obrigação de atos uniformizados é de suma importância, para que diante dos questionamentos da defesa do acusado, as provas permaneçam fortes e confiáveis, servindo de elemento ímpar para convicção do magistrado.
Em resumo, podemos traduzir a cadeia de custodia em uma série de atos que tem como principal finalidade impedir a manipulação indevida por parte dos custodiados após a apreensão dos elementos probatórios. Com o objetivo mor de zelar pela idoneidade e integridade dos elementos probatórios que eventualmente irão servir para prevenir uma possível decisão errônea venha a ser dada pelo magistrado, iludido por aquela falsa convicção formada por elementos que não tiveram suas fontes preservadas.
2.1 DA QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA
Como já foi exposto, a cadeia de custódia consiste em assegurar a idoneidade da prova obtida, buscando evitar qualquer tipo de dúvida quanto à sua fonte, o modo como foi colhida, o caminho percorrido, etc. A quebra da cadeia de custódia consiste justamente no não cumprimento dessa finalidade.
Uma das feições mais difíceis na obtenção das fontes de prova versa em preservar a integridade de todo um processo que foi realizado minuciosa e sigilosamente, e que se não for preservado irá comprometer todo o conjunto de elementos que foram colhidos. É justamente, a quebra da cadeia de custodia que se tenta evitar a tudo custo.
Comprovado a quebra da cadeia de custódia todo os elementos ocorridos após, deverão ser inutilizados e desentranhados do processo. Com a devida exclusão física da prova e de todas que dela foram derivadas. Pois, trata-se de verdadeira ilicitude da prova, devendo o magistrado reconhecer a sua ilicitude e sua eventual extensão.
A teoria da quebra da cadeia da custódia da prova, ou “break on the chain of custody”, é frequentemente alegada quando não é disponibilizado para defesa a forma integral das provas. Ou seja, quando houve em qualquer tipo de ruptura da cadeia de custódia da prova, por exemplo, quando uma prova não passou pelo crivo do contraditório.
Geraldo Prado (2014) notícia que, qualquer interrupção, mesmo que consentida na cadeia de custódia, haverá o enfraquecimento ou destruição da prova. Por esse motivo, ele acredita que o melhor modo é que a cadeia de custódia seja formada pelo menor número de custodiados possíveis. Afina, quanto menor o número de pessoas que tiverem acesso aos elementos probatórios, menos eles serão manipulados. E ao final, menos correrá o risco da quebra da cadeia de custodia.
Para o autor (PRADO, 2014), ocorrendo a quebra da cadeia de custódia, não há de se verificar se houve ou não má-fé do agente custodiado, mas que, deve-se impor de plano o in dubio pro reo. Pois, com a destruição dos meios informativos é impossível o exercício do direito de defesa e da própria fiscalização judicial. Já que elimina qualquer tipo de possibilidade de se ter acesso a informações que, de primeira mão, poderiam justificar a intervenção da natureza cautelar, podendo ainda, se relacionar com outros elementos de prova. (PRADO, 2015)
Com efeito, em um processo penal que se legitima a partir da verdade processual, hão de vigorar providências que resguardem de fato o caráter cognitivo da persecução penal, que não se justifica juridicamente quando fundadas em impressões pessoais, sentimentos ou valores pré-concebidos, a dispensar a incidência e operação de elementos informativos obtidos de modo lícito. (PRADO, 2015)
Nas provas que servem como verdadeira evidência, tais como o DNA ou as interceptações telefônicas, a inquietação sobre a quebra da cadeia de custódia é ainda maior, pois se valem como meios para obtenção da incessável “busca pela verdade”, pois, muitas vezes os juízes constroem a maior parte de seus convencimentos em cima delas, como se elas bastassem por si próprias.
A rigor, além de escavar lacunas nos elementos probatórios e torná-los porosos e carentes de dados capazes de orientar em outra direção a conclusão judicial acerca dos fatos penalmente relevantes, a quebra da cadeia de custodia indica a perversão dos fins da cautelar: no lugar da “aquisição” e “preservação” de elementos informativos, a medida tende a instrumentalizar ações abusivas de supressão de alguns destes elementos, esgrimindo os remanescentes com apoio no efeito alucinatório das evidências. (PRADO, 2015)
Por fim, verificando a quebra da cadeia de custódia, a prova será excluída do processo, tornando-se ilícita. Pois, é justamente a cadeia de custódia que irá garantir que a prova passou pelos transmites do contraditório e ampla defesa, não desmerecendo nenhuma garantia processual, fazendo com que se torne possível a paridade de armas no processo. Desta feita, a não preservação dos meios de prova acarreta ao descrédito da prova, podendo levar a nulidade de todo o processo.
CONCLUSÃO
Ao decorrer do trabalho, viu-se a importância do instituto da prova para o processo penal. Analisou-se algum dos principais princípios atinentes à prova e ressaltou-se a importância da preservação destes para garantir a licitude da prova penal, e assim ser possível falar em um processo penal democrático.
A partir do estudo dos princípios, - cujo o fundamental expoente é o devido processo legal -, ficou claro que, falar que a completa descrição dos atos da cadeia de custódia forma uma verdadeira e legitima garantia fundamental e processual para as partes.
Dada a importância mor da prova para o processo penal, viu-se a necessidade de se garantir que as provas sejam zelas desde sua colheita até o fim do processo.
Constatou-se que a cadeia de custódia, tem como finalidade impedir a manipulação indevida do material coletado após sua apreensão, visando obter a máxima autenticidade dos elementos probatórios que servirão para impedir uma possível decisão errônea por parte do magistrado, deixando cristalino: o caminho percorrido, os meios utilizados e a origem dos materiais colhidos.
E que a constatação de eventual quebra da cadeia de custódia deslegitima a prova penal, tornando-a ilícita. Devendo ser inutilizada e desentranhada do processo. Observando também as provas que derivaram daquela.
REFERÊNCIAS
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EBERHARDT, Marcos. Provas no processo penal: análise crítica, doutrinária e jurisprudencial. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2016.
ESPINDULA, Alberi. Perícia Criminal e Cível: uma visão geral para peritos e usuários da perícia. 3ª ed: Campinas: Millenium, 2009
GIACOMOLLI, Nereu José. Valor da Prova no âmbito da cooperação jurídica internacional em matéria criminal. In: PRADO, Geraldo; GIACOMOLLI, Nereu José et al (Orgs). Prova Penal: Estado Democrático de Direito. Florianópolis: Empório do Direito, 2015.
GOMES FILHO, Antonio Magalhães. Direito à prova no processo penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1997.
GRECO FILHO, Vicente; GRECO, Alessandra Orcesi Pedro. A prova penal no contexto da dignidade da pessoa humana. Disponível em: http://grecofilho.com.br/Artigos. Último acesso em 15 jul. 2016.
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LOPES JUNIOR, Aury. Direito Processual Penal. 11ª edição. São Paulo: Saraiva, 2014
MARINHO, Girlei Marinho. CADEIA DE CUSTÓDIA DA PROVA PERICIAL <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/9024/RELAT%C3%93RIO%20COMPLETO%20DEFESA.pdf?sequence=1>. Acesso em: 27 jun. 2016
MATTOS, Saulo Murilo de Oliveira. O ônus da prova na ação penal condenatória: aspectos principiológicos e jurisprudenciais. 1º edição. Florianópolis: Empório do Direito, 2016.
MENDRONI, Marcelo Batlouni. Provas no processo penal: estudo sobre a valoração das provas penais. – 2ª ed. – São Paulo: Atlas, 2015.
PRADO, Geraldo. Prova penal e sistema de controles epistêmicos: a quebra da cadeia de custódia das provas obtidas por métodos ocultos. – 1º ed. – São Paulo: Marcial Pons, 2014
SEVERO, Maria Alice dos Santos. Quebra da cadeia de custódia na operação ouro verde: a preservação das fontes de prova penal e sua confiabilidade. Disponível em: http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2015_1/maria_severo.pdf. Acesso em: 26 jun, 2016.
SOUZA, Sergio Ricardo de. Manual da prova penal constitucional. – 2º ed. – Curitiba: Juruá, 2014.
TARUFFO, Michele. A prova. Tradução José Gabriel Couto. – 1º ed. – São Paulo: Marcial Pons, 2014
Mestranda em Ciências Criminais pela PUCRS, Especialista em Processo Penal, Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ZAGHLOUT, Sara Alacoque Guerra. Cadeia de custódia da prova penal: a importância da preservação das fontes de prova e da sua fiabilidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 abr 2017, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49828/cadeia-de-custodia-da-prova-penal-a-importancia-da-preservacao-das-fontes-de-prova-e-da-sua-fiabilidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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