RESUMO: O presente trabalho pretende analisar a possibilidade de prorrogação de contrato de obra pública ao termo do prazo fixado, sob o argumento de reconhecida falha de planejamento original, decorrentes de problemas relacionados com o projeto inicial, através de uma análise acerca das disposições da Lei n° 8.666/93, perpassando pelo entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca do tema. Visa-se estabelecer a diferenciação entre os contratos por objeto ou escopo dos contratos por prazo, analisando os limites à vigência dos contratos administrativos, bem como os efeitos do término do prazo em cada espécime, de modo a demonstrar que o contrato de obra pública é condicionado pela entrega do objeto determinado, quando, então, poder-se-á tê-lo por finalizado, e não pelo prazo contratual. Seu maior fim é a conclusão do objeto em si, de forma que o vencimento do prazo não provoca, per si, a conclusão automática do contrato.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Da análise da possibilidade de prorrogação de contrato de obra pública ao termo do prazo fixado. 3. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
Não é raro a Administração Pública se deparar com contratos administrativos de obras públicas que se arrastam por séculos, sem o devido atendimento do interesse público primário, o que gera grande impacto no orçamento público, na medida em que não permite um melhor planejamento da alocação dos recursos públicos exercício após exercício.
Nesse sentido, um grande ponto que é trazido à baila, diz respeito à existência ou não de limites temporais para a vigência de um contrato administrativo. A resposta pressupõe uma atenta análise das disposições da Lei n° 8.666/93, perpassando pelo entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca do tema.
Não há como explorar a matéria, sem demonstrar a diferenciação entre os contratos por objeto ou escopo dos contratos por prazo, de modo a analisar os limites à vigência dos contratos administrativos, bem como os efeitos do término do prazo em cada espécime.
Nesse cotejo, o contrato de obra pública é condicionado pela entrega do objeto determinado, quando, então, poder-se-á tê-lo por finalizado, e não pelo prazo contratual. Seu maior fim é a conclusão do objeto em si, de forma que o vencimento do prazo não provoca, per si, a conclusão automática do contrato.
2. DA ANÁLISE DA POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO DE CONTRATO DE OBRA PÚBLICA AO TERMO DO PRAZO FIXADO
O art. 57, §1º e §2º, da Lei n.º 8.666/93, permite a prorrogação de prazo contratual, mantidas as demais cláusulas, desde que justificada por escrito e autorizada pela autoridade competente, e desde que haja algum dos seguintes motivos, devidamente caracterizados no processo, in verbis:
Art. 57. (...)
§1° Os prazos de início de etapas de execução, de conclusão e de entrega admitem prorrogação, mantidas as demais cláusulas do contrato e assegurada a manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, desde que ocorra algum dos seguintes motivos, devidamente autuados em processo:
I – alteração do projeto ou especificações, pela Administração;
II - superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que altere fundamentalmente as condições de execução do contrato;
III - interrupção da execução do contrato ou diminuição do ritmo de trabalho por ordem e no interesse da Administração;
IV - aumento das quantidades inicialmente previstas no contrato, nos limites permitidos por esta Lei;
V - impedimento de execução do contrato por fato ou ato de terceiro reconhecido pela Administração em documento contemporâneo à sua ocorrência;
VI - omissão ou atraso de providências a cargo da Administração, inclusive quanto aos pagamentos previstos de que resulte, diretamente, impedimento ou retardamento na execução do contrato, sem prejuízo das sanções legais aplicáveis aos responsáveis.
§2o Toda prorrogação de prazo deverá ser justificada por escrito e previamente autorizada pela autoridade competente para celebrar o contrato. (grifos)
Como se observa, a Administração deve justificar por escrito eventuais prorrogações, dentre as hipóteses do art. 57, §1º. Observando as recomendações do TCU neste ponto:
- Assunto: CONTRATOS. DOU de 13.05.2010, S. 1, p. 138. Ementa: alerta a uma prefeitura no sentido de que se abstenha de efetuar prorrogações contratuais, fundamentadas em justificativas que configurem má-gestão administrativa, tais como atrasos na entrega de materiais pelos fornecedores e demora no pagamento de medições, visto não serem estas aptas a respaldar as mencionadas prorrogações, o que poderá ensejar futuras punições por descumprimento ao disposto no art. 57, §1º da Lei nº 8.666/1993 (item 1.5, TC-032.893/2008-9, Acórdão nº 2.014/2010-2ª Câmara).
Não menos, as justificativas deverão existir nas hipóteses de alteração contratual, no caso presente, por sua vez, amparado no que prescreve o art. 65 da Lei nº 8.666/93:
Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos:
I - unilateralmente pela Administração:
a) quando houver modificação do projeto ou das especificações, para melhor adequação técnica aos seus objetivos;
b) quando necessária a modificação do valor contratual em decorrência de acréscimo ou diminuição quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei;
(...)
§1º O contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condições contratuais, os acréscimos ou supressões que se fizerem nas obras, serviços ou compras, até 25% (vinte e cinco por cento) do valor inicial atualizado do contrato, e, no caso particular de reforma de edifício ou de equipamento, até o limite de 50%(cinqüenta por cento) para os seus acréscimos. (grifos)
Em qualquer situação legal, a necessidade de demonstração da subsunção a uma das hipóteses tratadas na Lei nº 8.666 faz-se imperiosa, devendo ser expressamente tratada nos autos pela Administração, pois a ocorrência ou não de um dos eventos ali dispostos implica na completa distinção entre as providências que devem ser adotadas pela Administração.
Como forma de aclarar o tema, transcrevemos trecho do artigo de Marcelo Bruto da Costa Correia[1]:
A persistente existência de contratos com a Administração Pública com períodos de vigências que ultrapassam, até mesmo, uma década, resultantes, não raro, do desequilíbrio fiscal do Estado, a provocar seguidas paralisações nas execuções de obras, tem lançado sobre a doutrina e a jurisprudência necessárias e acirradas discussões sobre os limites à vigência dos contratos administrativos.
A primeira questão que se põe a quem se proponha a enfrentar o assunto atine à existência ou não de limites temporais para a vigência de um contrato administrativo. A resposta pressupõe atenta análise das normas que disciplinam o prazo de vigência dos contratos administrativos e as interpretações doutrinárias e jurisprudenciais a elas correlatas.
Introdutoriamente, imprescindível é a distinção entre os contratos de obras públicas e os demais, cuja natureza seja diversa.
Caracteriza os primeiros o fim perseguido pela Administração ao celebrá-los: a execução de um objeto pré-determinado cuja entrega coroa a conclusão dos objetivos contratuais.
Desta forma, o contrato de obra pública é condicionado pela entrega do objeto determinado, quando, então, poder-se-á tê-lo por finalizado. Ao revés, o contrato, por exemplo, de prestação de serviços, consubstancia-se no oferecimento de serviços, tal qual pactuado, durante o transcorrer de um prazo contratualmente estabelecido, integrando este período - o prazo – em que são prestados os serviços à própria dimensão do objeto.
Ponderadas essas características, nota-se que o trespasse do prazo provoca efeitos bem diferentes para cada espécime contratual acima mencionada.
Partindo desta premissa de que o prazo provoca diferentes efeitos sobre subespécies de contratos administrativos, pode-se afirmar, portanto, que os contratos administrativos subdividem-se em contratos por objeto e contratos por prazo. Exemplo dos primeiros é a empreitada de obra; dos segundos, o contrato de prestação de serviços de vigilância ou asseio e conservação.
Os efeitos do término do prazo em cada espécime são obviamente diferentes porque, nessas duas modalidades contratuais, o lapso temporal desempenha função bastante distinta. No contrato de empreitada, o prazo contratualmente estabelecido não serve à definição do objeto, mas apenas à demarcação do tempo concedido ao contratado para a sua entrega. No contrato de vigilância, o prazo contratual define a própria extensão e valor do objeto (ex.: prestação do serviço de vigilância por seis meses).
Isto posto, nos contratos que se extinguem pela conclusão de seu objeto (contratos por objeto), o vencimento do prazo não provoca, per si, a conclusão automática do contrato, tal como ocorre nos contratos por prazo, nos quais, ao término do prazo, está entregue o objeto - “oferecimento dos serviços pelo período determinado” - e finalizado o contrato.
Após fazer a diferenciação entre os contratos por objeto ou escopo dos contratos por prazo, o autor ataca o ponto central da questão pertinente à consulta formulada pela Administração, nos seguintes termos:
Nos contratos por objeto, alcançado o prazo, há de se averiguar se foi efetivamente entregue o objeto pactuado, suscitando-se, então, o exame da ocorrência ou não de mora da contratada no cumprimento de suas obrigações, com a consequente aplicação das sanções contratuais, por, eventualmente, não ter entregue as obras concluídas dentro do lapso de tempo estipulado - obviamente, apenas se responsabiliza a contratada se tiver dado causa ao fato que impediu o cumprimento do prazo.
Assim, os prazos previstos nos contratos por objeto são prazos moratórios, o que significa dizer que a expiração dos mesmos não extingue o ajuste. É que nos contratos que se extinguem pela conclusão do seu objeto, a prorrogação independe de aditivo ou de nova licitação, porque, embora ultrapassado o prazo, o contrato continua em execução até que seja entregue o objeto ou rescindida a avença, por uma das hipóteses legais.
De se concluir, então, que, no contrato de obras, ao revés de ser limite inexorável a pôr fim à relação contratual, o prazo opera como obrigação temporal para a entrega da obra, ou seja: é o período em que, findo, deverá o contratado entregar o objeto, sob pena de operar-se sua mora (por óbvio, se culpa sua houver). Não é, pois, prazo extintivo, mas obrigação temporal para a entrega da obra, sob pena de se aplicar sanção ao contratado inadimplente - sanção que pode subsumir-se, inclusive, na rescisão do contrato, embora, evidentemente, a inadimplência do contratado no cumprimento dos prazos pode ser causa para rescisão, nos termos do art. 78 da Lei Federal nº 8.666/1993.
A doutrina acima ressaltada faz alusão aos ensinamentos do mestre Hely Lopes Meirelles, ressaltando o que segue:
A extinção do contrato pelo término de seu prazo é a regra dos ajustes por tempo determinado. Necessário é, portanto, distinguir os contratos que se extinguem pela conclusão de seu objeto e os que terminam pela expiração do prazo de sua vigência: nos primeiros, o que se tem em vista é a obtenção de seu objeto concluído, operando o prazo como limite de tempo para a entrega da obra, do serviço ou da compra sem sanções contratuais; nos segundos o prazo é de eficácia do negócio jurídico contratado, e assim sendo, expirado o prazo, extingue-se o contrato, qualquer que seja a fase de execução de seu objeto, como ocorre na concessão de serviço público, ou na simples locação de coisa por tempo determinado. Há, portanto, prazo de execução e prazo extintivo do contrato. (Licitação e contrato administrativo. 10. ed. São Paulo: RT, p. 230)
(...)
Nos demais contratos, como no de empreitada de obra pública, não se exige, nem se justifica cláusula de prorrogação, porque o contrato não se extingue pela fluência do prazo fixado, mas sim pela conclusão da obra. Nestes contratos o prazo é apenas limitativo do cronograma físico, e será prorrogado (com ou sem mora das partes) tantas vezes quantas sejam necessárias para a conclusão da obra independentemente de previsão contratual. (Op. cit., idem, ibidem)
Portanto, razoável que a Administração deva investigar os reais motivos que determinaram o atraso nas obras, diante sobretudo da alteração contratual, e prorrogar o contrato efetivamente se entender configurada cabalmente as hipóteses legais, não deixando de apurar eventual falha da administração, considerando hipótese em que a contratada atribui o retardamento do andamento da obra em razão de conduta da própria administração e o reconhecimento por ela própria de existência erros de planejamento.
Sobre o assunto, ensina Jessé Torres Pereira Junior:
Decorrente embora de incúria administrativa, a necessidade da modificação deverá ser atendida, promovendo-se as alterações correspondentes no contrato, para que não sofra o interesse público. Porém, estará a Administração no dever de apurar responsabilidades, inclusive para investigar se os erros de projeto, especificação ou quantificação não terão sido de indústria, no propósito de favorecer ou afastar fornecedores ou empreiteiras. (Op. cit., idem, ibidem)
Mesmo que eventualmente haja incúria administrativa de um agente público, a fim de que não sofra o interesse público, pode ser promovida a alteração do objeto contratado caso seja:
(...) constatada a existência de erro ou omissão relevante nos projetos das obras de interesse da Autarquia, proceda à devida apuração das responsabilidades do projetista e do setor competente que aprovou o projeto, principalmente se da falha resultou prejuízo para a administração ou grave perturbação da execução normal dos serviços (item 9.2.1, TC-000.880/2005-6, Acórdão nº 2.242/2008-Plenário)
Por isso, deve haver pronunciamento da área técnica sobre a possibilidade de ter havido erro passível de apuração de responsabilidade (Acórdão nº 355/2001 – Plenário).
Noutro sentido, se entender que o atraso na execução da obra pode ser tributado à empresa Contratada, deve a administração iniciar o procedimento de aplicação de penalidade, oficiando a contratada para apresentar defesa, no prazo legal, sob pena de aplicação das sanções previstas na lei, no edital e no contrato, sem prejuízo do dever de indenizar os prejuízos causados à Administração, com o posterior registro das sanções no sistema eletrônico pertinente.
Nesse prisma, se o atraso decorrer de dolo ou culpa do contratado, o mesmo deve ser sancionado, independentemente da prorrogação ou extinção do contrato, que apenas se opera com a conclusão e recebimento do objeto, nos moldes supra.
Assim, a Administração deve verificar se houve atraso culposo por parte do contratado, o que pode ensejar a multa moratória prevista no art. 86, da Lei n.º 8.666/93, ou as sanções previstas no contrato.
Não é demais ressaltar que no âmbito do TCU, a questão formal do prazo de vigência dos contratos foi suplantada em virtude de circunstância materiais, nos seguintes processos: Acórdão Plenário n.º 1.740/2003, Decisão Plenário n.º 732/1999, Decisão n.º 606/1996 e Acórdão 1º Câmara n.º 1.980/2004, senão vejamos:
34. Citem-se decisões do Tribunal em que a questão formal do prazo de vigência dos contratos foi suplantada em virtude de circunstâncias materiais: TC 925.214/1998-1 - Decisão 732/1999 - Plenário - Voto do Relator, Ministro Bento Bugarin:
No entanto, ao meu ver, inexistindo motivos para sua rescisão ou anulação, a extinção de contrato pelo término de seu prazo somente se opera nos ajustes celebrados por tempo determinado, nos quais o prazo constitui elemento essencial e imprescindível para a consecução ou eficácia do objeto avençado, o que não é o caso do contrato firmado pelo DER/MG, no qual a execução da obra é o seu objetivo principal. Dessa forma, não havendo motivos para a cessação prévia do ajuste, a extinção do contrato firmado com o DER/MG operar-se-ia apenas com a conclusão de seu objeto e recebimento pela Administração, o que ainda não ocorreu. (Acórdão n.º 1.980/2004 – 1º Câmara).
Com o término do prazo de vigência do contrato do contrato administrativo, eventual aditamento perde sua eficácia momentânea, de modo que, apenas é possível conceder efeito retroativo capaz de suscitar sua convalidação, exatamente por se tratar de contrato por escopo, isto é, possibilidade de estender pacto cujo termo final já se operou de pleno direito ou sua eficácia lhe tenha sido retirada pela própria administração, quando não diligencia antecedentemente nem programa sua renovação a tempo de evitar a extinção de sua vigência.
Ademais, não é absolutamente razoável que se associe a falta de eventual pagamento sobre os serviços já prestados pela empresa, como empecilho para retardar as diligências para a prorrogação contratual em detrimento do mesmo interesse público que administração toma de suporte fático para justificar a necessidade de conclusão da obra.
Por muitas vezes, a Administração Pública no exercício da atividade administrativa acaba por desencadear uma sucessão de faltas inexplicáveis, ausências, como de planejamento inadequado.
Apropriadamente, em se tratando de ausência de planejamento, a situação nos parece similar às consequências previstas na Orientação Normativa nº 11/2009-AGU que enfatiza, destacando:
A CONTRATAÇÃO DIRETA COM FUNDAMENTO NO INC. IV DO ART. 24 DA LEI Nº 8.666, DE 1993, EXIGE QUE, CONCOMITANTEMENTE, SEJA APURADO SE A SITUAÇÃO EMERGENCIAL FOI GERADA POR FALTA DE PLANEJAMENTO, DESÍDIA OU MÁ GESTÃO, HIPÓTESE QUE, QUEM LHE DEU CAUSA SERÁ RESPONSABILIZADO NA FORMA DA LEI.
INDEXAÇÃO: DISPENSA DE LICITAÇÃO. EMERGÊNCIA. CONTRATAÇÃO DIRETA. FALTA DE PLANEJAMENTO. DESÍDIA. MÁ GESTÃO. RESPONSABILIDADE. APURAÇÃO.
REFERÊNCIA: art. 24, inc. IV, da Lei nº 8.666, de 1993; Acórdão TCU 1.876/2007-Plenário.
Nesse diapasão, se é essa a causa determinante, o Tribunal de Contas da União já decidiu que o planejamento inadequado por parte da administração traduz-se em medida de apuração de responsabilidade, na forma a seguir:
Mediante pedido de reexame, responsável, reitor da Universidade Federal do Tocantins – UFT, manifestou seu inconformismo diante do Acórdão 3.489/2009 – 2ª Câmara, proferido em sede de processo de representação, no qual fora apenado com a multa prevista no art. 58, II, da Lei 8.443/92, por conta da realização indevida de contratação emergencial, por dispensa de licitação (art. 24, inc. IV, da Lei 8.666/93), de serviços de vigilância armada e desarmada, tendo entendido o Tribunal que a emergência, essencialmente, ocorrera da ausência de planejamento adequado. Após descrever todo o iter pela qual passou a contratação, enfatizando a morosidade havida, o relator, no voto, destacou que “os gestores deflagraram um processo licitatório sem ao menos definir as necessidades da Administração, o que mais uma vez contribuiu para o atraso verificado na condução do certame”. Além disso, quanto a uma alegada carência de pessoal, observou “se tratar de fato previsível a ser contornado com um adequado planejamento, o que não ocorreu”. Por tudo, concluiu que “restou devidamente evidenciado que a contratação emergencial decorreu da ausência de planejamento adequado por parte da administração da entidade”. Assim, por considerar, ainda, que a penalidade aplicada anteriormente seria compatível com o grau de reprovabilidade verificado na conduta inquinada, votou pelo não provimento do recurso, no que foi acompanhado pelos demais ministros da 2ª Câmara. Acórdão n.º 7557/2010-2ª Câmara, TC-030.657/2008-2, rel. Min. Benjamin Zymler, 07.12.2010.
Portanto, fixadas as possíveis situações de alteração contratual e o modo correto de a Administração proceder ao ajuste, a atuação do gestor passa necessariamente, sob pena de responsabilização perante o TCU, pela adoção das seguintes medidas:
a) exigir que o projeto básico, com os elementos descritivos a ele pertinentes, seja tecnicamente adequado e atualizado, no momento da realização da licitação de obras públicas, conforme prescrevem os arts. 6º, inciso IX, e 7º, ambos da Lei 8.666/93, evitando-se alterações contratuais que o desnaturem ou que sejam motivadas por erros grosseiros, omissões, insuficiências ou obsolescência do projeto básico, o qual deve permitir a correta aferição dos quantitativos de serviços necessários à execução integral da obra;
b) ainda que a licitação seja para contratação de obra no regime de empreitada por preço global, o edital deverá expressamente adotar critério de aceitabilidade de preços unitário e global, como determina o art. 40, inciso X, da Lei 8.666/93;
c) havendo necessidade de celebração de aditivos contratuais, certificar-se de que a alteração contratual não se destina a suprimir a vantagem econômica inicialmente obtida pela Administração (“jogo de planilha”), devendo a revisão ser coerente com o projeto básico;
d) na eventualidade de ter sido celebrado termo aditivo que evidencie a prática do “jogo de planilha”, deverá ser exigida a restauração do desconto percentual ofertado inicialmente pela licitante vencedora, a fim de manter as condições efetivas da proposta e preservar a vantagem do contrato e, se for o caso, anulado o termo aditivo modificador das condições originais;
e) afastada essa hipótese, sendo a alteração tecnicamente justificável, por corresponder a um avanço qualitativo ou quantitativo genuíno em relação ao projeto da obra (art. 65, inciso I, alíneas “a” e “b”, da Lei 8.666/93), e efetuada exclusivamente para atender ao interesse público e não para propiciar ganhos indevidos, tudo amplamente comprovado, se o termo aditivo vier a reduzir ou suprimir o desconto originalmente concedido sobre o orçamento-base, essa circunstância acarretará a presunção de possível desequilíbrio econômico-financeiro do contrato, a ser completa e cabalmente confirmada ou refutada pela Administração, oferecendo-se ampla oportunidade de manifestação da empresa contratada;
f) na celebração de aditivos contratuais nos quais são acrescidos os quantitativos de serviços já previstos, os preços unitários devem limitar-se, no máximo, pelo valor de mercado. Caso o valor do contrato seja inferior ao de mercado, prevalece o da avença, consoante prescreve o art. 65, § 1º, da Lei 8.666/93; e
g) na celebração de aditivos contratuais nos quais são acrescidos novos itens de serviços, não previstos no contrato original, os preços unitários devem ser deduzidos dos preços dos itens congêneres previstos no contrato original e das condições licitadas, não se admitindo que, nas suas composições de preço, constem custos elementares de insumos diferentes dos atribuídos aos mesmos insumos em composições preexistentes nem taxas de consumo ou de produtividade em visível desacordo com as especificadas em composições semelhantes, atentando-se para o fato de que o preço de mercado sempre deverá servir de limitante superior. (AC-1755-43/04-P Sessão: 10/11/04)
Deve-se ainda levar em conta que, a prorrogação de contrato administrativo certamente gerará acréscimo no valor da obra, desta forma além dos cuidados anteriormente mencionados deve-se: exigir a complementação do valor da garantia; haver manifestação do ordenador de despesas sobre a disponibilidade orçamentária para atender ao acréscimo pretendido; ser feito o prévio empenho, conforme determina o art. 60 da Lei nº 4.320/1966, e também demonstrada a regularidade fiscal da empresa e que não tenha ocorrido nenhuma causa que implique em rescisão contratual.
Registre-se também que o fato de que os termos aditivos somente poderem ter efeitos prospectivos, não havendo amparo legal para se proceder alteração de contrato, cujo objeto já tenha sido executado na prática. Qualquer execução de serviço que já tenha sido realizada em desacordo com o contrato, não pode ser protegido por um ajuste posterior, devendo serem pagos na forma de indenização com o fim e evitar enriquecimento sem causa da administração.
É que mesmo que não houvesse um contrato entre as partes, ainda assim subsistiria o dever de indenizar o particular pelo serviço executado. Neste sentido confira o eminente administrativista Marçal Justen Filho:
A questão se torna ainda mais complexa se o terceiro tiver executado, total ou parcialmente, as prestações que o contrato (nulo) lhe impunha. A Administração Pública tem de arcar com as conseqüências dos atos praticados por seus agentes. Em caso de ato lesivo ao particular, a Administração está obrigada a indenizar, de modo mais amplo e complexo, as perdas e danos daquele derivadas. Nem se pode cogitar de enriquecimento sem causa da Administração Pública. Se a Administração recebesse a prestação executada pelo particular e se recusasse a cumprir o contrato por invocar sua nulidade, haverá seu locupletamento indevido. (Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Ed. Dialética, 2000, p. 534)
Eventual decisão por parte da Administração no sentido de superar o vício formal em favor da regular conclusão da obra deve estar voltada ao atendimento do interesse público, devendo o gestor do contrato certificar-se a respeito da inexistência de qualquer lesão ao erário ou irregularidade na execução do contrato, sem que se desconsidere o risco da desaprovação por parte dos órgãos de fiscalização, a despeito dos precedentes acima reproduzidos, tudo independentemente da necessidade de se apurar eventual responsabilidade no controle dos contratos administrativos.
3. CONCLUSÃO
Nesse contexto, se não houver motivo para a extinção do contrato, que tem por objeto uma modalidade de obra (art. 6º, inc. I, da Lei n.º 8.666/93), a extinção da obrigação não se opera em virtude do decurso do prazo, mas apenas com a conclusão do objeto e o recebimento pela Administração, de forma que a extensão de vigência encontra-se sob inteira responsabilidade da administração pela emissão de seu juízo de conveniência quanto ao prazo solicitado para sua concretização e razoabilidade de seu estabelecimento, desde que comprovada a necessidade e justificadas as alterações quantitativas e qualitativas que estão sujeitas aos limites preestabelecidos nos §§ 1º e 2º do art. 65 da Lei nº 8.666/93.
Por fim, insta consignar que na hipótese do gestor público desidiosamente deixar de prorrogar a tempo os contratos administrativos deve-se a Administração apurar tais fatos, de forma que medidas corretivas e(ou) punitivas sejam tomadas no sentido de que se evitem situações semelhantes no futuro. Desta feita, ainda que haja embasamento doutrinário e alguns precedentes do TCU amparando a possibilidade de continuidade da execução da obra mesmo após o fim da vigência do contrato de escopo, como demonstrado por meio do presente trabalho, em razão da natureza do vinculo obrigacional existente entre as partes, é medida adequada a devida apuração da faltas funcionais, mediante regular apuração da responsabilidade de quem lhe deu causa, amparado no mandamento preconizado no art. 143 da Lei n° 8.112/90, que determina a apuração imediata de ato irregular ou ilegal no serviço público, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, neste último caso enquanto prontamente identificável o seu autor, sem prejuízo do envio dos autos ao conhecimento do controle interno e Ministério Público para as providências cabíveis.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Correia, Marcelo Bruto da Costa. O Prazo de Vigência dos Contratos Administrativos de Obras. Revista IOB de Direito Administrativo nº 51 – Março/2010 - Doutrina
PEREIRA JÚNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Ed. Dialética, 2000, p. 534.
[1]Correia, Marcelo Bruto da Costa. O Prazo de Vigência dos Contratos Administrativos de Obras. Revista IOB de Direito Administrativo nº 51 – Março/2010 - Doutrina
: advogado, formado em Direito pela Universidade Tiradentes (2012), especialista em Direito Administrativo pela Universidade Anhanguera (2015), e pós-graduando em Direito Público pelo Instituto Elpídio Donizetti (2017).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MENESES, José Wilton Florêncio. Da possibilidade de prorrogação de contrato de obra pública após o termo do prazo fixado Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 jun 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50197/da-possibilidade-de-prorrogacao-de-contrato-de-obra-publica-apos-o-termo-do-prazo-fixado. Acesso em: 23 dez 2024.
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