Resumo: O presente trabalho tem como objetivo analisar a evolução da responsabilidade civil brasileira, partindo-se de uma premissa da irresponsabilidade até a culminação da responsabilidade civil objetiva, subjetiva e, em alguns casos, integral. Dessa forma, transcorremos a evolução histórica da responsabilidade civil brasileira até o presente momento, onde já se discute a responsabilidade objetiva do Estado diante de atos omissivos.
Palavras-chaves: Responsabilidade civil; Estado; Objetiva; Subjetiva.
Sumário: 1 Introdução. 2 Responsabilidade Civil. 3 Da Responsabilidade Civil do Estado. 4 Responsabilidade objetiva do estado e responsabilidade subjetiva do servidor público. 5 Responsabilidade Civil do Estado diante de atos omissivos. 6 Conclusão. 7 Referências Bibliográficas.
O presente trabalho visa a transcorrer as fases evolutivas da responsabilidade civil no Brasil. Desde os tempos do absolutismo onde imperava a irresponsabilidade total até o período contemporâneo onde a responsabilidade assume diversas formas variando conforme a conduta praticada, podendo ser objetiva, subjetiva ou, até mesmo, integral.
Nesse sentido, após a fase da irresponsabilidade do Estado passamos ao período da responsabilidade subjetiva que coincide com o Código Civil de 1916, onde o Estado só possuía o dever de indenizar quando praticava condutas ilícitas.
Já com a Constituição Federal de 1946 passou-se a observar o enquadramente da responsabilidade objetiva do Estado diante de condutas lícitas e lícitas. A responsabilidade objetiva também deu início ao estudo das excludentes da responsabilidade, a saber, culpa exclusiva da vítima, caso fortuito, força maior.
No Brasil, a regra é a responsabilidade objetiva baseada no risco administrativo, a qual permite a exclusão da responsabilidade do Estado diante de situações excludentes. Entretanto, em algumas situações opera com a teoria do risco integral, quando não se admite a exclusão da responsabilidade, como, por exemplos, dano ambiental, dano nuclear.
Diante do exposto, passamos ao estudo de como ocorreu essa evolução da responsabilidade civil do Estado.
A responsabilidade origina-se a partir da violação de uma norma jurídica pré-existente – legal ou contratual. Em virtude da violação da norma jurídica é possível que haja a ocorrência de um dano e, através do instituto da responsabilidade, impor-se-á ao causador de tal dano o dever de indenizar a vítima.
É possível estabelecer diferentes espécies de responsabilidade, dependendo de qual a conduta que gerou o dano e de onde o dever de indenizar for proveniente.
Pode a responsabilidade ser civil ou penal. A responsabilidade será penal quando a norma violadora, de direito público, ensejar um ilícito penal. Da mesma maneira, quando a violação à norma ensejar um ilícito civil, consequentemente, a responsabilidade que incidirá no caso será civil.
Outra espécie de responsabilidade será possível aferir conforme a natureza jurídica da norma pré-existente violada. Assim, sendo a norma violada de ordem contratual, a responsabilidade, consequentemente, será contratual. Caso a norma violada seja a lei propriamente dita, a responsabilidade será extracontratual (ou aquiliana).
A responsabilidade poderá, também, ser subjetiva ou objetiva. Para que incida a responsabilidade subjetiva é necessário que seja comprovado o elemento culpa ou dolo, já a responsabilidade objetiva não exige que os citados elementos estejam presentes, conforme será estudado posteriormente de forma mais detalhada.
Dando continuidade ao estudo da responsabilidade, mais especificamente ao instituto da responsabilidade civil, faz-se necessário notar que o mesmo já era previsto expressamente no Código Civil de 1916. Através do Código Civil de 2002 foi dedicado título específico e autônomo para se tratar do referido tema. Inserido no citado título específico, “Da reponsabilidade civil”, constam os artigos 927 a 954, que disciplinam legalmente o tema. Ainda, o tema é disciplinado através dos artigos 186 e 187, também do Código Civil, que definem o ato ilícito.
A responsabilidade civil tem como objetivo principal a restauração do equilíbrio existente entre a vítima e o causador do dano. Predomina, assim, o princípio da restitutio in integrum, em que há a necessidade de recolocar a vítima à situação que estava anteriormente à lesão.[1]
Classicamente, os elementos necessários para a composição de qualquer espécie de responsabilidade civil são a conduta humana, o nexo de causalidade e o dano, fazendo-se necessário definir brevemente estes elementos. Vejamos.
A conduta humana define-se como sendo um comportamento humano voluntário, que pode ser proveniente de ação ou omissão. Como regra geral, esta conduta humana é proveniente de um ato ilícito (artigo 186, Código Civil), mas, por vezes, poderá ser originada de um ato propriamente lícito.
O nexo de causalidade é o liame existente entre a conduta humana e o dano. Se a conduta do indivíduo não provocou dano, ou se o dano ocorrido não foi provocado pela conduta do indivíduo, não haverá motivo pelo qual responsabilizar tal indivíduo. É preciso que haja vinculação certa entre a conduta provocada e o dano ocasionado.
O dano é a violação ocasionada material, moral ou juridicamente. É o prejuízo sofrido pela vítima, que terá de ser reparado para que o equilíbrio entre as partes seja restaurado.
Historicamente, pela concepção clássica, exigia-se a existência da culpa por parte do agente causador do dano para que restasse configurada a responsabilidade civil. Entretanto, com os avanços de ordem industrial e trabalhista, e com as dificuldades encontradas pelas vítimas em comprovar cabalmente as suas reinvindicações, originou-se a teoria do risco[2].
Através da teoria supramencionada a culpa foi transferida para a ideia do risco, ou seja, será responsável pelo evento danoso, independente do elemento culposo, aquele que expor o outro ao risco de suportá-lo.
A teoria do risco foi concebida principalmente na França, ao final do século XIX, e é o fundamento da responsabilidade objetiva, sem culpa, que é prevista para alguns casos na legislação brasileira, conforme é possível visualizar no parágrafo único do artigo 927, artigo 931, entre outros do Código Civil.[3]
Assim, atualmente, como regra geral, a responsabilidade será subjetiva, sendo necessário analisar, além dos elementos básicos mencionados – conduta humana, nexo causal e dano – a culpa ou o dolo do causador do dano.
Bem como, em casos específicos pela lei, ou quando a atividade naturalmente implicar risco aos direitos de outrem, a responsabilidade poderá ser objetiva, apenas fazendo-se necessário comprovar a conduta humana, nexo de causalidade e o dano, sem necessidade de se analisar o elemento culposo.
A título de complementação, vale a pena transcrever o artigo 927 e seu parágrafo único, que inauguram os dispositivos legais do Título IX, denominado “Da Responsabilidade Civil” do Código Civil:
Artigo 927: Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Nesse contexto, dentre os casos de responsabilidade objetiva previstos em nosso ordenamento legal, faz-se necessário destacar a responsabilidade civil do Estado.
3. Da Responsabilidade Civil do Estado
Conceitualmente, a responsabilidade civil do Estado é a obrigação legal que é imposta ao Estado propriamente dito de efetuar o ressarcimento dos danos causados a outrem por suas atividades.[4]
Em sentido histórico, no Estado despótico e absolutista o princípio da irresponsabilidade vigorava, de modo que, aqueles que sofressem prejuízo, poderiam apenas ingressar com ação em face do funcionário causador do dano, nunca contra o Estado.[5]
Com o passar do tempo a teoria da irresponsabilidade restou superada, passando-se a responsabilizar o Poder Público pelas ações provocadas por seus agentes, todavia, para tanto, exigia-se a comprovação do elemento culposo.
Através da responsabilização do Estado surgiram diversas teorias subjetivistas que definiam os limites e os fundamentos para que restasse concretizada a responsabilidade do Estado.
A teoria da culpa civilística introduziu o fundamento de responsabilização do Estado pelos atos causados por seus agentes, contudo, para isto fazia-se necessário a comprovação da culpa. Neste sentido, destaca-se o artigo 15 do Código Civil de 1916, que adotava a teoria em questão:
As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.
Além da culpa civilística, a teoria da culpa anônima, teoria da culpa presumida, teoria da falta administrativa e teoria da culpa administrativa destacam este momento evolutivo. Dentre estas, destaca-se a teoria da culpa administrativa.
Como bem leciona Rui Stocco, no Tratado de Responsabilidade Civil:
A teoria da culpa administrativa representou o primeiro estágio da transição entre a doutrina subjetiva da culpa civil e a tese objetiva do risco administrativo que a sucedeu, pois leva em conta a ‘falta do serviço’ para dela inferir a responsabilidade da Administração. (...). Por ela não se indaga a culpa do agente administrativo, mas apenas da falta objetiva do serviço em si mesmo, como gerador da obrigação de indenizar o dano causado a terceiro. [6]
As teorias supramencionadas evoluíram, de modo que culminaram com a responsabilização objetiva do Estado. É possível estudar a responsabilidade objetiva do Estado através de duas teses principais, sendo elas a teoria do risco administrativo e a teoria do risco integral.
A teoria do risco administrativo, inaugurando a responsabilidade objetiva, prevê, a partir da ocorrência da lesão, a indenização pelo dano causado ao particular pela Administração. Ou seja, não se exige qualquer falta do serviço público (como prevê a teoria da culpa administrativa), nem se exige a comprovação de culpa de seus agentes (como prevê a teoria da culpa civilística).[7]
Através da teoria do risco administrativo dispensa-se a comprovação da culpa da Administração, contudo, permite-se que a Administração Pública demonstre a culpa da vítima, por exemplo, com o intuito de excluir ou atenuar a indenização (caso comprove-se a culpa exclusiva da vítima ou culpa concorrente).
Já a teoria do risco integral não admite qualquer hipótese de excludente. Ou seja, a Administração Pública deverá sempre indenizar o administrado do dano decorrente de sua atividade, assumindo a integralidade do risco de sua atividade.
Como dito inicialmente, o Código Civil de 1916 havia adotado a teoria da responsabilidade civil subjetiva do Estado. Todavia, com o advento da Constituição de 1946, em seu artigo 194, a responsabilidade civil do Estado passou a ser considerada objetiva, como bem é possível notar:
Artigo 194 - As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.
Parágrafo único - Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes.
Isto significa que, a partir do surgimento do ciado diploma legal, um dano promovido pela máquina estatal poderá ser comprovado apenas com a caracterização dos elementos: conduta, nexo causal e dano, não necessitando comprovar se houve atuação culposa ou não por parte do agente causador do dano.
Atualmente, conforme a Constituição Federal de 1988, manteve-se a responsabilidade civil do Estado como sendo objetiva, como é possível denotar através do artigo 37, § 6º do referido diploma legal, que dispõe:
As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Atenta-se que, no mesmo molde e extremamente semelhante à previsão constitucional, o Código Civil de 2002 também confirmou a responsabilização objetiva do Estado, possuindo norma expressa nesse sentido, como é possível visualizar através do artigo 43 do supracitado diploma legal:
As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.
Segundo a doutrina majoritária, a responsabilidade objetiva adotada pela Constituição Federal de 1988 é fundada no risco administrativo, isto porque, para que haja a responsabilização é necessário que haja nexo de causalidade entre o ato provocado pelo agente público e o dano ocasionado. Nos casos em que houver culpa exclusiva da vítima ou culpa concorrente desta, a responsabilidade da Administração Pública poderá ser afastada ou minorada.
Independente da teoria que se adote, é certo que a responsabilidade civil do Estado é objetiva quando restar caracterizado ato danoso praticado por agente público no exercício de atividade estatal.
Todavia, vale a pena ressaltar que parte da doutrina entende que esta responsabilidade civil objetiva persiste apenas quando for caracterizado ato comissivo, de modo que, quando uma omissão for causadora do prejuízo, será necessário analisar o elemento dolo ou culpa.
Nesse diapasão:
No nosso entendimento, qualquer que seja a qualificação imputada ao risco – risco integral ou risco administrativo – a responsabilidade do Estado será em sua plenitude OBJETIVA, em se tratando de procedimento COMISSIVO, onde basta o nexo de causalidade entre o evento danoso e o agente público lesionador, não se cogitando de culpa ou dolo de seu autor. Todavia, quando esse comportamento ilícito é OMISSIVO, isto é, quando os danos são debitados ao Estado, embora não diretamente causador por este, mas o são por ação alheia a ele, a responsabilidade é SUBJETIVA. Essa omissão se configura nos casos de inércia, culpa relacionada à irresolução, à preguiça, à hesitação, à falta de prontidão, de determinação, de presteza, de zelo, em uma palavra, quebra do dever funcional do agente administrativo.[8]
Apesar de existirem posicionamentos divergentes quanto a pontos específicos na matéria que diz respeito à responsabilidade civil do Estado, não há qualquer discussão acerca da sua caracterização como, regra geral, sendo objetiva. Assim, em virtude de previsão expressa constitucional e legalmente, o Estado responderá de forma objetiva pelos danos que seus agentes causarem a terceiros.
A responsabilidade civil pode ser objetiva ou subjetiva. Como regra geral, a responsabilidade é subjetiva, de modo que, a responsabilidade objetiva somente poderá ser aplicada quando lei expressa autorizar ou conforme o caso concreto, como bem leciona o caput do artigo 927 do Código Civil[9].
A responsabilidade objetiva tem como fundamentação teórica a teoria do risco, que leva em consideração a potencialidade de causar danos, a exposição a um perigo que a atividade traz.
Como já visualizado, a responsabilidade do Estado enquadra-se como objetiva, ou seja, não carece de comprovação do elemento dolo ou culpa. Ou seja, se a vítima ingressar com ação em face do Estado, apenas compete-lhe comprovar o prejuízo que sofreu, a autoria e o nexo causal.[10]
O Estado, pessoa jurídica de direito público, é um ente abstrato, impossibilitado de agir de forma direta. Assim, faz-se necessário a intermediação de seus agentes ou órgãos, que exercem, na prática, as funções estatais.
Não interessa se este fenômeno trata-se de representação ou não, basta analisar se o agente ou órgão causador do dano estava exercendo uma atividade estatal, para que seja possível atribuir a responsabilidade do dano causado pelo órgão ou agente ao Estado.[11]
Visualiza-se esta atribuição conforme a previsão constitucional do artigo 37, §6º, através da qual é possível constatar que se atribui ao Estado a responsabilidade de qualquer dano que órgãos ou agentes ocasionarem, quando estes estiverem no exercício de atividade estatal. Assim, caberá ao Estado reparar o prejuízo e responsabilizar-se pelo dano causado, seja de forma objetiva (como leciona o dispositivo) ou subjetiva (para parte da doutrina, nos casos omissivos).
Através da leitura do artigo 37, § 6º da Constituição Federal, de plano, é possível extrair a previsão acima citada. Contudo, é importante esclarecer alguns conceitos que se inserem no texto legal. Vejamos.
O artigo aplica-se às pessoas jurídicas de direito público, ou seja, a Administração Direta – União, Estados e Municípios – autarquias e fundações públicas de direito público. Bem como, aplica-se às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de servido público, ou seja, as empresas públicas e sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos, fundações públicas de direito privado que prestem serviços públicos e pessoas privadas delegatárias de serviços públicos. Não se incluem nesse conceito as empresas públicas e sociedades de economia mista exploradoras de atividade econômica.
Destaca-se que, de forma literal, atribui-se a responsabilidade aos danos que os agentes das pessoas jurídicas acima citadas causarem. Insta salientar que a expressão “agente” diz respeito aos servidores públicos (agentes das pessoas jurídicas de direito público) e aos empregados das entidades de direito privado que são prestadoras de serviço público.[12]
A título de complementação, agente público é aquele que exerce função pública de forma temporária ou permanente, com ou sem remuneração. É um conceito amplo e genérico, que abrange diversas espécies, como servidores públicos, funcionários e até mesmo, por exemplo, o mesário em uma eleição, jurado no Tribunal do Júri.
Servidor público designa os agentes que mantem relação funcional com o Estado sob a forma de regime estatutário. Já empregado público identifica os agentes que mantém vínculo funcional com a administração pública sob regime contratual trabalhista – celetista.
Dando continuidade ao estudo da responsabilidade objetiva, atribuí-la ao Estado é, de certo modo, reconhecer a desigualdade jurídica que há entre o Estado e o particular, decorrente das prerrogativas de direito público inerente àquele. Assim, se todos os administrados são beneficiados pelos fins buscados pela Administração, todos devem suportar os riscos de tal atividade. Nesse diapasão:
A nosso ver, a fundamentação da responsabilidade estatal reside na busca de uma repartição isonômica, equânime, do ônus proveniente de atos ou dos efeitos oriundos das atividades da Administração. Evita-se, com a repartição, entre todos os cidadão, do ônus financeiro da indenização, que somente alguns suportem os prejuízos ocorridos por causa de uma atividade desempenhada pelo Estado no interesse de todos.[13]
Deste modo, é de todo direito a vítima optar por ingressar com a ação indenizatória de responsabilidade civil em face do Estado, já que, como supracitado, deverá apenas comprovar a atuação danosa do autor, nexo causal e o prejuízo.
De modo diverso, caso a vítima ingressasse com a ação diretamente em face do servidor público, originaria mais um elemento a ser comprovado. Isto porque, a responsabilidade do servidor é subjetiva, carecendo que a culpa também seja cabalmente comprovada.
Em uma análise mais técnica e processual da matéria, destaca-se que a ação de indenização proposta pela vítima do evento danoso em face da Fazenda Pública caracteriza-se como uma ação pessoal.
Como já visualizado, a responsabilidade estatal encontra guarida constitucional, estando expressamente previsto que as pessoas jurídicas de direito público e as prestadoras de serviço público respondem de forma objetiva.
5. Responsabilidade Civil do Estado diante de atos omissivas
Atualmente, vem ganhando força a corrente doutrinária que defende a possibilidade de responsabilização do Estado diante de condutas omissivas praticadas por seus agentes. Nesse sentido, há entendimento no sentido que quando o Estado atua na condição de garante do sujeito será possível sua responsabilização objetiva, mesmo diante de atos omissivas. É o caso de homicídios ocorridos dentro de presídios, uma vez que o Estado tem o dever de garantir a incolumidade física do preso, deve ser responsabilidade de forma objetiva caso algum detento seja assassinado por outro detento. Nesse sentido, vem decidido o Supremo Tribunal Federal, in verbis:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR MORTE DE DETENTO. ARTIGOS 5º, XLIX, E 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A responsabilidade civil estatal, segundo a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 6º, subsume-se à teoria do risco administrativo, tanto para as condutas estatais comissivas quanto paras as omissivas, posto rejeitada a teoria do risco integral. 2. A omissão do Estado reclama nexo de causalidade em relação ao dano sofrido pela vítima nos casos em que o Poder Público ostenta o dever legal e a efetiva possibilidade de agir para impedir o resultado danoso. 3. É dever do Estado e direito subjetivo do preso que a execução da pena se dê de forma humanizada, garantindo-se os direitos fundamentais do detento, e o de ter preservada a sua incolumidade física e moral (artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal). 4. O dever constitucional de proteção ao detento somente se considera violado quando possível a atuação estatal no sentido de garantir os seus direitos fundamentais, pressuposto inafastável para a configuração da responsabilidade civil objetiva estatal, na forma do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal. 5. Ad impossibilia nemo tenetur, por isso que nos casos em que não é possível ao Estado agir para evitar a morte do detento (que ocorreria mesmo que o preso estivesse em liberdade), rompe-se o nexo de causalidade, afastando-se a responsabilidade do Poder Público, sob pena de adotar-se contra legem e a opinio doctorum a teoria do risco integral, ao arrepio do texto constitucional. 6. A morte do detento pode ocorrer por várias causas, como, v. g., homicídio, suicídio, acidente ou morte natural, sendo que nem sempre será possível ao Estado evitá-la, por mais que adote as precauções exigíveis. 7. A responsabilidade civil estatal resta conjurada nas hipóteses em que o Poder Público comprova causa impeditiva da sua atuação protetiva do detento, rompendo o nexo de causalidade da sua omissão com o resultado danoso. 8. Repercussão geral constitucional que assenta a tese de que: em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte do detento. 9. In casu, o tribunal a quo assentou que inocorreu a comprovação do suicídio do detento, nem outra causa capaz de romper o nexo de causalidade da sua omissão com o óbito ocorrido, restando escorreita a decisão impositiva de responsabilidade civil estatal. 10. Recurso extraordinário DESPROVIDO[14].
Não obstante, ainda prevalece na doutrina o entendimento acerca da responsabilidade subjetiva do Estado diante de atos omissivos, com fulcro na teoria do risco administrativo. Sendo assim, necessário que o particular prove a omissão estatal, dano, nexo de causalidade e culpa administrativa (serviço público não funcionou ou funcionou de forma ineficiente) para que seja possível uma indenização.
6. Conclusão
A responsabilidade civil passou por uma enorme evolução desde o período absolutista até a fase contemporânea. Tal evolução foi incentivada pela consagração de direitos e garantias fundamentais conquistadas pelo cidadão. Nesse sentido, o Estado passou de opressor a garantidor de direitos.
Atualmente, o Estado responde de maneira objetiva diante de suas condutas comissivas praticadas, podendo responsabizar subjetivamente seus servidores pelos atos praticados, quando diante de condutas dolosos ou culposas.
Além do mais, na doutrina ainda prevalece o entendimento da responsabilidade subjetiva do Estado diante de atos omissivisos, sendo necessário, para fins de indenização, que fique demonstrada a omissão estatal, dano, nexo de causalidade e culpa administrativa.
Entretanto, a jurisprudência já caminha no sentido de permitir a responsabilização objetiva do Estado diante de atos omissivos quando na posição de garante de direitos, o que, novamente, demonstra que o presente tema é sempre objeto de evolução.
_______. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Disponível no site:
. Acesso em: 13/06/2017.
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[1] CAVALIERI FILHO, Sergio, Programa de Responsabilidade civil – 9 ed. – São Paulo: Atlas, 2010, p. 13
[2] PINTO, Eduardo Viana, Responsabilidade civil de acordo com o novo Código Civil – 1. ed. – Porto Alegre: Síntese, 2002, p.100
[3] CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit., p. 17
[4] CAHALI, Yussef Said, Responsabilidade Civil do Estado – 3. ed. – São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais Ltda., 2007, p. 13
[5] CAVALIERI FILHO, Sergio, op. cit., p. 239
[6]STOCO, Rui, Tratado de Responsabilidade Civil – 7. ed. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 994
[9] VENOSA, Sílvio de Salvo, Direito civil: responsabilidade civil – 6.ed. – São Paulo: Atlas, 2006, p. 11
[10] VENOSA, Sílvio de Salvo, op. cit., p. 88
[11] PEREIRA, Caio Mário da Silva, Instituições de Direito Civil – 12 ed – Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 129
[12] ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente, Direito Administrativo Descomplicado – 18 ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 726
[13] Op. cit., p. 725
formado na Universidade Federal de Santa Maria - UFSM, advogado, pós-graduado em Direito Previdenciário pela Universidade Anhanguera-UNIDERP, ex-servidor público do Instituto Nacional de Serviço Social - INSS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Raul Cesar Junges. Da evolução da responsabilidade civil no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 jun 2017, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50323/da-evolucao-da-responsabilidade-civil-no-brasil. Acesso em: 23 dez 2024.
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