RESUMO: O presente artigo disserta sobre a supressão da obrigatoriedade da contribuição sindical com o advento da Lei 13.467/2017 (“reforma trabalhista”). Busca-se indicar os principais pontos de discussão acerca da constitucionalidade desta alteração.
PALAVRAS-CHAVE: Lei 13.467/2017. Contribuição Sindical. Obrigatoriedade. Constitucionalidade formal.
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Desenvolvimento 3. Conclusão 4. Referências Bibliográficas.
1. Introdução
O fim da obrigatoriedade do “imposto sindical” é um dos pontos mais controversos da reforma trabalhista, eis que impõe a reestruturação completa do sistema de financiamento das entidades sindicais brasileiras. Destaca-se que a arrecadação da contribuição foi de R$ 3,18 bilhões em 2015 e de R$ 3,5 bilhões em 2016.
Maurício Godinho Delgado e Gabriela Neves Delgado, neste sentido, afirmam:
“(...) Com a mudança específica que realizou, atingindo em cheio a contribuição sindical obrigatória - que existe há cerca de oito décadas na ordem jurídica do País -, sem dúvida provocará alteração muito substancial na estrutura do sindicalismo brasileiro, pois afetará, cirurgicamente, o seu fluxo de recursos econômico-financeiros; em síntese, afetará, substancialmente, o custeio das entidades sindicais.[1]
Entretanto, debate-se a constitucionalidade formal desta alteração, conforme iremos analisar.
2. Desenvolvimento
Com o advento da lei 13.467 de 2017, a contribuição sindical passou a ser uma faculdade dos empregados. Ou seja, os empregadores ficam obrigados a descontar da folha de pagamento dos seus empregados as contribuições devidas ao sindicato, quando por estes notificados, apenas se devidamente autorizados pelos empregados (art 545 c/c art 578 c/c art 579, todos da CLT).
Desse modo, a contribuição sindical passou a ter natureza jurídica preponderantemente privada. Deixou de ter natureza tributária, já que não é mais uma prestação compulsória.
Contudo, tal modificação ainda não encontrou estabilidade. Foram propostas diversas ações de declaração de inconstitucionalidade com o escopo de rever a desobrigação da contribuição sindical - ADIs 5810, 5811, 5813 e 5815.
Na ADI 5810, a Central das Entidades de Servidores Públicos sustenta a necessidade de edição de lei complementar para alterar a regra de recolhimento da contribuição sindical, uma vez que se instituiu regra geral de isenção ou não incidência de obrigação, porque foi criada nova norma possibilitando a definição da base de cálculo do tributo por decisão do próprio contribuinte.
Esta alega ainda que a nova regra interfere no princípio da isonomia tributária, dividindo os contribuintes entre categorias de optantes e isentos. Ademais sustenta também a violação aos princípios da representatividade e da unicidade sindical.
Já na ADI 5811, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Movimentação de Mercadorias em Geral e Logística, foi ventilado que a contribuição sindical tem natureza tributária e, portanto, é obrigatória a todos os trabalhadores da categoria, sindicalizados ou não, uma vez que o tributo, como tal, é uma obrigação compulsória. Por essa razão não seria possível estabelecer a contribuição sindical como voluntária, uma vez que a finalidade da contribuição sindical é defender os interesses coletivos ou individuais da categoria, e essa representação independe de autorização ou filiação.
Por sua vez, nas ADIs 5813 e 5815 alegam que as novas regras trazem renúncia fiscal. Sendo que o art. 150, §6º da CR/88, veda a concessão de subsídio ou isenção a não ser por lei específica que regule exclusivamente o tema. Sustentam ainda ofensa à Convenção 144 da Organização Internacional do Trabalho, segundo a qual mudanças na legislação de natureza social necessita da ampla participação dos empregados e empregadores.
Percebe-se, portanto, que o tema central das referidas ADIs é a impossibilidade de lei ordinária dispor sobre tributos. Em suma, afirmam que a contribuição sindical tinha natureza de tributo e que só poderia ser modificada por lei complementar.
Neste sentido, existem precedentes jurisprudenciais, acolhendo o pedido de determinados sindicatos, em casos concretos específicos. Por exemplo, a juíza Patrícia Pereira de Santanna, da 1ª Vara do Trabalho de Lages (SC), acolheu pedido de um sindicato e anulou o fim da contribuição sindical obrigatória que é destinada à entidade.
A natureza de tributo da contribuição sindical, segundo essa decisão, deriva do fato de que 10% dela é revertida para os cofres da União (para a Conta Especial Emprego e Salário). Dessa maneira, quaisquer modificações deveriam se dar por meio de lei complementar, e não pela Lei 13.467/2017, que é ordinária.
Outrossim, salienta que a reforma trabalhista não poderia ter tornado o instituto da contribuição sindical facultativo, já que tributo "é toda prestação pecuniária compulsória" (art. 3º do CTN). Na sentença afirma que não se trata de ser a favor ou contra a contribuição sindical ou à representação sindical dos empregados, ou, ainda, de estar de acordo ou não com o sistema sindical brasileiro tal como existe atualmente. Explicita trata-se, sim, de questão de inconstitucionalidade, de ilegalidade da Lei e de segurança jurídica. Isto porque, segundo a decisão, a Lei nº 13.467/2017 promoveu a alteração da contribuição sindical de forma inconstitucional e ilegal.
Destaca-se que o art 146 da CRFB/88 aduz que cabe à lei complementar regular as limitações constitucionais ao poder de tributar (inciso II) e estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes; b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários (inciso III).
Por sua vez, o art 149 da CRFB/88 dispõe que “compete exclusivamente à União instituir contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse das categorias profissionais ou econômicas, como instrumento de sua atuação nas respectivas áreas, observado o disposto nos arts. 146, III, e 150, I e III, e sem prejuízo do previsto no art. 195, § 6º, relativamente às contribuições a que alude o dispositivo”. Dessa forma é nítida a imprescindibilidade da edição de lei complementar para regular as limitações constitucionais ao poder de tributar.
Ressalta-se que quando a CRFB/88 exige lei, tanto pode ser editada lei complementar como a ordinária, ou seja, a lei complementar pode dispor sobre matéria que a ela não esteja expressamente reservada. Entretanto, não pode a lei ordinária regular o campo reservado à lei complementar.
Isto posto, resta esperar a consolidação da jurisprudência quanto a natureza jurídica da contribuição sindical. Caso seja reconhecida a natureza tributária da mesma, a tendência é que seja declarada a inconstitucionalidade da supressão da obrigatoriedade sob o aspecto formal.
3. Conclusão
Como referido, a supressão da obrigatoriedade da contribuição sindical ainda não encontrou estabilidade, eis que foram propostas diversas ações de declaração de inconstitucionalidade com o escopo de rever a desobrigação da contribuição sindical. Ademais, também foram apresentadas diversas emendas ao texto da MP 808/2017 com o intuito de recriar o imposto sindical ou, ao menos, criar nova forma de financiamento compulsório para sustentar o sistema sindical.
Salienta-se a proposta de criação da contribuição negocial, que passaria a ser devida por todos os empregados eventualmente beneficiados em uma negociação coletiva. Cabe ressaltar que por terem sido mantidos a representação por categorias e a unicidade sindical por base territorial mínima de um município, se aprovada a contribuição negocial, terá efeitos similares ao imposto sindical. Isto porque a representação da entidade sindical alcança toda a categoria.
Neste ponto, ressalta-se, independentemente da constitucionalidade formal da norma que tornou facultativo o imposto sindical, que este constituía, segundo parcela da doutrina, um entrave para a liberdade sindical plena (art 8º da CR e CADH), eis que é um resquício corporativista da “Era Vargas”. Os defensores desta corrente afirmam que o fim do imposto sindical é medida adequada para a concretização da unidade sindical, conferindo maior legitimidade e representatividade às entidades associativas, pois dependerão da vontade dos trabalhadores em contribuir para a manutenção financeira dos sindicatos.
Entretanto, afirmam também que o fim da obrigatoriedade deveria ter sido acompanhado da extinção de outros resquícios corporativistas como a unicidade sindical por base territorial mínima de um município (art 8º, II da CRFB/88) e a categorização obrigatória. Ressalta-se que tais resquícios impedem que o Brasil (mesmo sendo membro nato da OIT desde sua fundação) ratifique a Convenção nº 87 da OIT – uma das “Core Obligations”.
Neste sentido, cabe citar o Ministro Godinho:
“Derivada de lei e incidindo também sobre os trabalhadores não sindicalizados, a receita tem indisfarçável matiz parafiscal. Com isso, atrai severas críticas quanto agressão que propiciaria aos princípios da liberdade associativa e da autonomia dos sindicatos. Entretanto, contraditoriamente, sua manutenção na ordem jurídica foi autorizada pelo Texto Máximo de 1988 (art. 8º, IV, in fine: “independentemente da contribuição prevista em lei”) — embora a regra constitucional não impeça a revogação dos preceitos legais instituidores da verba”. [2]
Conclui-se ser necessário aguardar a consolidação da jurisprudência acerca do tema, destacando-se que em sede de “correição parcial” o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), Ministro João Batista Brito Pereira, suspendeu liminar que obrigava as empresas Aliança Navegação e Logística e Hamburg Süd Brasil a recolher a contribuição sindical de empregados. O Ministro afirmou que o cumprimento imediato da determinação do TRT criaria hipótese de “lesão de difícil reparação”, eis que impôs gastos sem a fixação de garantias caso, ao final, entenda-se pela constitucionalidade formal da supressão da obrigatoriedade da contribuição sindical.
4. Referências Bibliográficas
DELGADO, Mauricio Godinho. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017 I Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. - São Paulo : LTr, 2017.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho / Mauricio Godinho Delgado. — 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017.
[1] DELGADO, Mauricio Godinho A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017 I Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. - São Paulo : LTr, 2017. p. 238
[2] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho / Mauricio Godinho Delgado. — 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017. p. 1530.
Graduado em Direito pela PUC-RJ. Especialista em Direito Público pela UCP-RJ. Servidor público federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, José Felippe Rangel da. Supressão da obrigatoriedade da contribuição sindical mediante lei ordinária Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 abr 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51598/supressao-da-obrigatoriedade-da-contribuicao-sindical-mediante-lei-ordinaria. Acesso em: 23 dez 2024.
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