PEDRO MANOEL CALLADO MORAES
(Orientador)
RESUMO: O presente estudo tem por finalidade analisar a obrigação dos filhos de amparar seus genitores na velhice, tanto na esfera material, quanto na afetiva. Verifica-se que o assunto é de suma importância e relevância no âmbito jurídico e nas relações humanas, uma vez que o não cumprimento dessa obrigação que lhe é determinada por meio de dispositivos legais, teorias e princípios norteadores do direito, viabiliza a compensação por danos morais. Esse abandono afetivo inverso acarreta sofrimento ao idoso, a dor, a angústia, a tristeza e pode até contribuir para o agravamento de doenças e, em última instância, acelerar sua morte.
Palavras-chave: Abandono afetivo inverso. Danos morais. Responsabilidade civil.
ABSTRACT: The purpose of this study is to analyze the obligation of children to support parents in old age, both in the material and affective spheres. It is verified that the subject is of great importance and relevance in the legal and human relations, since the non-fulfillment of this right that is assured to it, through devices, theories and guiding principles of the law, makes possible the compensation for damages morals, through civil liability. This reverse affective abandonment brings suffering to the elderly, the pain of anguish, sadness and may even contribute to the worsening of illnesses and, ultimately, accelerate their death.
Keywords: Reverse affective abandonment. Moral damages. Civil liability.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO 4 2. DESENVOLVIMENTO 4 2.1. PRINCIPAIS DIREITOS DOS IDOSOS NA LEGISLAÇÃO 4 2.1.1. ESTATUTO DO IDOSO 4 2.1.2. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 5 2.1.3. CÓDIGO CIVIL DE 2002 5 2.2. PRINCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO DE FAMÍLIA 6 2.2.1. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA 6 2.2.2. PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE 7 2.2.3. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR 8 2.3. RESPONSABILIDADE CIVIL 8 2.4. PRESSUPOSTOS DE RESPONSABILIDADE CIVIL 9 2.4.1. AÇÃO OU OMISSÃO VOLUNTÁRIA 9 2.4.2. DANO 10 2.4.3. NEXO CAUSAL 10 2.4.4. CULPA EM SENTIDO ESTRITO 11 2.5. OBRIGAÇÃO DOS FILHOS COM SEUS PAIS IDOSOS 11 2.5.1. ABANDONO AFETIVO 12 2.5.2. ABANDONO MATERIAL 13 2.6. PROJEITO DE LEI 13 2.7. JURISPRUDÊNCIAS FAVORÁVEIS AO CABIMENTO DA REPARAÇÃO MORAL 14 2.7.1. JURISPRUDÊNCIA DESFAVORÁVEL 15 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS 15 4. REFERÊNCIAS 16
Neste viés, este texto pretende analisar a possibilidade de cunho obrigacional de reparações de danos morais sofridos por pais idosos, derivado do abandono afetivo de seus filhos, fundamentado no ordenamento jurídico brasileiro vigente.
Embora sejam inúmeras as legislações que asseguram aos idosos o dever de proteção dos familiares, em especial os filhos, ocorre que na realidade temos muitos casos em que eles negam a prestar assistência material e imaterial. Esse desamparo familiar dificulta a velhice, causando limitações e angústias emocionais imensuráveis.
A fim de angariar argumentos convincentes para este trabalho, buscam-se princípios norteadores do direito, tais como da dignidade da pessoa humana, da afetividade e da solidariedade, bem como análise de dispositivos da Constituição Federal de 1988, Política Nacional do Idoso, Código Civil de 2002 e Estatuto do Idoso.
Nessa relação entre pais e filhos a Constituição Federal/1988 traz em seu artigo 229 a obrigação dos filhos de amparar e ajudar os pais na velhice, independente de laços afetivos.
É preciso levar em consideração que tal omissão de afeto acarreta danos psíquicos. Portanto, o trabalho em tela mostra o abandono como conduta ilícita figurando indenização por danos morais sob a responsabilidade do filho pelo não cumprimento mínimo de afeto e atenção.
2.1. PRINCIPAIS DIREITOS DOS IDOSOS NA LEGISLAÇÃO
Está entre suas diretrizes: a proteção em relação a casos de violência e abandono de idosos por seus familiares, inclusive tipificando essa conduta como infração penal, cuja pena varia de seis meses a três anos de detenção e multa. Contudo, nos casos em que o idoso é privado de cuidados indispensáveis a pena prevista é de dois meses a um ano de prisão, além de multa.
De acordo com o Art. 1º do Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03) é idoso toda pessoa com idade igual ou superior a 60(sessenta) anos.
O dever dos filhos de cuidado com seus pais idosos está também previsto no dispositivo contido no 3º, §1º, inciso V, da Lei nº 10.741/03, com a priorização do alimento do idoso por sua própria família (...). O descumprimento dessa obrigação pode resultar na prisão civil do inadimplente.
O dispositivo previsto no art. 43, inciso II, do Estatuto do Idoso, apresenta uma situação relevante ao tema em que o idoso poderia estar em risco por omissão ou abuso da família, curador ou entidade de atendimento.
Todas essas situações revelam a preocupação da sociedade em proteger a pessoa humana na sua velhice.
2.1.2. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Aqui são apresentados um rol de Princípios Constitucionais do Direito de família, tendo em comum o objeto que compõe o respeito recíproco entre pais e filhos, sendo os pais incumbidos por assistir, criar e educar os filhos menores e estes ampará-los na velhice, ou seja, na carência e enfermidade de seus pais.
Dispõe o Art. 229 da CF: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores; os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência e enfermidade”.
A família, por certo, é o âmago da sociedade, responsável pelo crescimento do indivíduo. É um verdadeiro laboratório no qual somos educados para a consciência.
Dentre os direitos dos idosos estabelecidos nos vários artigos do Código Civil, destacam-se os de natureza alimentar, tais como o direito de receber pensão alimentícia dos filhos e parentes quando não possuírem meios de sustentação própria ou recursos capazes de garantir sua subsistência.
Esses alimentos são compreendidos tanto na forma de alimentos, na sua forma literal, quanto a recursos para remédios, despesas de casa, assistência médica e outras necessidades.
A finalidade do direito de alimentos é assegurar o direito à vida.
Art. 1694- Podem os parentes, os conjugues ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com o da sua condição social, inclusive para atender as necessidades de sua educação.
§1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos de pessoa obrigada.
§2 Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os plateia.
Art. 1696- O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
2.2. PRINCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO DE FAMÍLIA
2.2.1. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
O princípio da dignidade da pessoa humana está previsto do Art. 1º, III, da CF/88, e trata de um valor moral inerente à pessoa, sendo esse o princípio máximo do Estado democrático de direito ou o princípio dos princípios, pois todos os seres humanos são dotados desse preceito.
A dignidade da pessoa humana é ampla, abrangendo uma diversidade de valores sociais atribuídos em razão e consciência humana, sendo seu principal objetivo o respeito recíproco.
Nessa linha, o homem deixa o meio individualista e atinge o meio social em busca da felicidade e do bem viver comum.
No âmbito do Direito de Família encontramos fundamento à dignidade da pessoa humana na Carta Constitucional aos idosos, cujo Art. 230 atribuiu à família, ao Estado e a sociedade a obrigação de ampará-los: “A família, a sociedade e o Estado tem o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes direito a vida”.
A família deixa de ter uma função meramente produtiva e reprodutiva e passa a ser a essência de afeto e de solidariedade e, por esse motivo, esse princípio impõe deveres de assistência imaterial como prestação de cuidados, atenção, apoio físico e moral.
Esse amparo moral pelo abandono afetivo não tem capacidade de obrigar a amar, mas sim de educar pedagogicamente o filho. Isso porque é dever dos pais prestar auxílio moral e material por toda a vida aos seus filhos, e, em contrapartida, é dever dos filhos prestar também assistência aos seus pais durante a velhice deles.
2.2.2. PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE
Com o passar dos tempos e com a evolução da sociedade, a afetividade tornou-se comum na doutrina contemporânea dando origem a novos costumes, valores, pensamentos e interpretações que influenciam o meio jurídico no comando das relações familiares.
Mesmo não constando a expressão “afeto” na Lei das Leis, a dignidade humana passa a ter reconhecimento no direito de família, nas relações de comunhão de vida, relações sociais, respectivamente composta pelos pais e seus descendentes, incluindo os filhos adultos.
Para fins didáticos, discorre sobre o princípio em questão LÔBO (2000,):
Projetou-se no campo jurídico- constitucional, a afirmação da natureza da família como grupo social fundado essencialmente nos laços de afetividade, tendo em vista que consagra a família como unidade de relação de afeto, após o desaparecimento da família patriarcal, que desempenha funções precaucionais, econômicas, religiosas e políticas.
Sendo assim, o afeto passa a ter valor jurídico na esfera das relações familiares, consolidadas na dignidade da pessoa humana.
No tocante aos idosos, ainda que exista o dever de cuidado determinado pelo Estatuto do Idoso, há obrigação determinada pelo respeito em virtude dos laços afetivos familiares que não carecem de regulamentação.
Em tal contratação observa-se que a ausência de afeto pode gerar problemas psíquicos, conforme observa-se as sábias palavras de RODRIGUES (2005, p. 775):
O convívio e relacionamento entre as pessoas, além de ser intrínseco a sua formação, ao seu desenvolvimento e, portanto ao próprio envelhecimento, são fatores imprescindíveis a maturação física e psíquica do ser humano, ao falar-se em convívio e relacionamento, há que se realçar que eles se apresentam em diversos setores da vida, tais como na família, na comunidade, no trabalho, enfim, na sociedade em geral
2.2.3. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE FAMILIAR
A solidariedade está presente nas relações familiares, porque ela deve existir nos relacionamentos pessoais, tutelando as formas de associações humanas.
Ser solidário significa responder pelo outro, preocupar-se com a outra pessoa. No âmbito familiar possui caráter ainda maior porque compreende ser afetivo, social, moral, patrimonial, espiritual e sexual.
Observa-se palavras de LISBOA (2002, p. 54) que:
O princípio em questão “são vetores que indicam o dever de cooperação mútua entre membros da família e entre os parentes, para fins de assistência material (afeto) e material (alimentação, educação, laser)
O princípio da solidariedade, pelo ponto de vista afetivo vinculado aos familiares, resulta na prestação, na ajuda mútua e recíproca. Portanto, a família está inegavelmente envolvida na base solidária de ordem constitucional.
Conceito: Conjuntos de medidas preventivas ou reparatórias para a proteção de danos, sejam eles materiais, morais ou qualquer outra modalidade eventualmente reconhecida.
A responsabilidade civil é a obrigação que uma pessoa tem de compensar a outra por prejuízos causados por uma obrigação não cumprida. A doutrina indica dois parâmetros para a classificação da responsabilidade civil: a presença de culpa, que é dividida em objetiva e subjetiva, e em relação a norma violada, que pode ser contratual ou extracontratual.
Para a doutrinadora DINIZ (2008, p. 36), a responsabilidade civil define-se:
É a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causando a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva) ou, ainda, de simples imposição legal (Responsabilidade objetiva)
Entende-se por responsabilidade civil subjetiva o dano causado a terceiro em razão de ato do próprio imputado, ou de terceira pessoa por quem ele responde. A partir daí está fundamentada a teoria da culpa. O dever de indenizar exige, na espécie, o elemento culpa.
Já a responsabilidade civil objetiva é aquela em que o elemento culpa não é fundamental para que haja a obrigação de indenizar.
O Código Civil também prevê em seu Art. 928 a responsabilidade subsidiária dos pais pelos danos causados por seus filhos.
Ensina Inácio de CARVALHO NETO (2007, p. 19):
A responsabilidade civil expande-se por todos os ramos do direito civil e também transitada pelo Direito de família, tanto em seus aspectos pessoais de vinculo familiar, como da violência familiar, é perceptível quão fértil e importante é encontrar amparo às lesões graves, pelos quais já não é aceito que reine o temor sobre o silêncio reverencial do parente ofendido
2.4. PRESSUPOSTOS DE RESPONSABILIDADE CIVIL
2.4.1. AÇÃO OU OMISSÃO VOLUNTÁRIA
De acordo com RODRIGUES (1995, p. 6):
Como requisito crucial da responsabilidade civil, estabeleceu o legislador que o prejuízo causado deve ser resultante de conduta humana (comissiva ou omissiva), violadora de um dever contratual, legal ou social.
Nas palavras de DINIZ (2007, p. 38-39) nos ensina:
A ação, elemento constituído da responsabilidade, vem o ser humano, comissivo ou omissivo, ilícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiros, a, o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado
A ação poderá ser reconhecida, por exemplo, através de atos de maus tratos do filho com os pais, ou até mesmo atitudes que atinjam o direito e interesses do idoso, como por exemplo, interná-lo precariamente em um asilo.
A omissão é reconhecida, entre outras modalidades de conduta, por meio da negligência, em que um filho deixa de prestar auxílio moral e material aos seus os pais.
O dano é um dos elementos que caracteriza a responsabilidade civil no tocante ao prejuízo causado a outra pessoa. Esse dano refere-se tanto aos bens materiais quanto aos ligados a pessoa humana, tais como a vida, a honra e a saúde, ou seja, são os danos morais.
Danos materiais são aqueles que atingem o patrimônio corpóreo de uma pessoa. O Art. 402 do Código Civil destaca que os danos emergentes são aqueles que efetivamente a vítima perdeu, e, quanto os lucros cessantes, referem-se àquilo que o sujeito deixou de lucrar em virtude do evento danoso.
GAGLIANO E FILHO (2015, p.32) conceituam como causador do dano também a omissão do ofensor, a saber: Dano a prejuízo como sendo a lesão a um proveito jurídico tutelado patrimonial ou não causado por omissão do sujeito infrator.
O intuito do dano patrimonial é reparar a coisa, recompondo seu estado anterior. Já reparação para o dano moral, busca-se a compensação pela ofensa injusta experimentada pela vítima, uma vez que não é possível voltar ao estado anterior.
No sentido de tema tratado, o dano material pode ser percebido, por exemplo, quando o filho não presta alimentos ao pai idoso, e o dano moral quando um filho insulta um pai, lhe nega afeto, ocasionando um dano de natureza imaterial, consistente na dor, na frustração, na decepção, propiciando a obrigação de indenização, em especial porque um filho não pode ser o causador desse resultado aos pais.
O nexo causal é requisito indispensável para a configuração da responsabilização civil, pois é o elo entre a causa e o resultado que gera o dever de indenizar a vítima pelos danos sofridos pela conduta humana, que poderá ter sido omissiva ou comissiva. No contexto, pode ser a conduta dolosa ou culposa no sentido estrito, praticada pelo filho para com seu pai idoso.
“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligencia a imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
Sobre o nexo causal diz CAVALIERI FILHO (2011, p. 46):
Não basta, portanto, que o agente tenha praticado uma conduta ilícita; tampouco que a vítima tenha sofrido um dano. É preciso que esse dano tenha sido causado pela conduta ilícita do agente, que exista entre ambos uma necessária relação de causa e efeito
2.4.4. CULPA EM SENTIDO ESTRITO
O elemento culpa pode se dar pela imprudência que é a falta de cuidado na ação, pela negligência, que é a omissão, ou pela imperícia, que é a falta de qualificação profissional.
Nas palavras de CAVALIERI FILHO (2014, p. 45-46):
Tanto no dolo como na culpa há conduta voluntária do agente, só que no primeiro caso a conduta já nasce ilícita, portanto a vontade se dirige a concretização de um resultado antijurídico o dolo abrange a conduta e o efetivo lesivo dele resultante, enquanto que no segundo conduta nasce licita, tornando-se ilícita na medida em que se desvia dos padrões socialmente adequados. O juízo de desvalor no dolo incide sobre a conduta, ilícita desde a sua origem; na sua culpa, incide apenas sobre o resultado.
O autor ensina que existem dois critérios de aferição da previsibilidade: o objetivo e o subjetivo. O primeiro tem em vista o homem médio, diligente e cauteloso. Pelo critério subjetivo a previsibilidade deve ser apurada tendo em vista as condições pessoais do sujeito, como idade, sexo, grau de cultura, etc..
2.5. OBRIGAÇÃO DOS FILHOS COM SEUS PAIS IDOSOS
O tema em questão é munido de muitas controvérsias e discussões por existirem doutrinadores que afirmam que não é possível obrigar alguém amar ou sentir afeto por outra pessoa, mesmo que este seja seu pai ou sua mãe.
Por outro lado, temos aqueles que reconhecem a indenização proveniente de abandono moral ou material como caráter punitivo, compensatório e educativo para com seus pais que atingem a velhice, período da vida que necessitam de uma maior assistência das pessoas próximas. A vista disso é essencial observar cada caso em particular, verificando se é ou não passivo de indenização, conforme expõem a desembargadora Ana Maria Pereira de Oliveira (TJ/RJ 2009) “Inicialmente é preciso salientar que a questão de abandono afetivo é matéria polêmica e controvertida, razão pela qual é preciso cautela e prudência na análise do caso concreto”.
O abandono de idosos por familiares torna-se cada dia mais corriqueiro. Vários são os casos de filhos que abandonam seus pais em asilos com a desculpa que voltarão mais tarde para buscá-los e não retornam mais.
Através dessas atitudes os idosos perdem o contato com seus familiares, violando o dispositivo 3º do Estatuto do Idoso, surgindo então a obrigação pelo descumprimento do dever de convivência familiar.
Essa supressão de direito do convívio familiar acarreta numerosos danos altamente prejudiciais à saúde psíquica do idoso, tais como angústia, tristeza, saudade imensa, rejeição. Tudo isso contribui consideravelmente para a redução de sua expectativa de vida.
Nesse contexto AZEVEDO (2004, p. 14) ensina que:
O descaso entre pais e filhos é algo que merece punição, é abandono moral grave que precisa merecer severa atuação do poder judiciário, para que se preserve não o amor ou a obrigação de amar, o que seria impossível mais a responsabilidade ante o descumprimento do dever de cuidar, que causa o trauma moral da rejeição e da indiferença
Também convém a admissibilidade da reparação moral inserida no art. 186 do Código Civil.
Toda legislação deixa evidente a obrigação e o dever dos filhos perante pais idosos. As atribuições de responsabilidades devem ser recíprocas, ou seja, os pais são responsáveis em amparar seus filhos, e, em contrapeso, os filhos também o são na velhice de seus pais.
Outro dispositivo fundamental para apreciação da conduta como punitiva está disposta no art. 4º do Estatuto do Idoso: “Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei”.
Incide na ação ou omissão de dar provimento na subsistência da pessoa idosa.
Artigo 244 do Código Penal: “Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do conjugue, ou de filho menor de 18 (dezoito) ” anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhe proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada fixada ou majorada, deixar sem justa causa de socorrer descendente ou ascendente gravemente enfermo.
No dia 12 de novembro de 2008, o Deputado Carlos Bezerra apresentou o Projeto de Lei 4.294, que visa a previsão expressa da responsabilidade civil por abandono de idosos no Código Civil e no Estatuto do Idoso.
O esboço busca incluir um parágrafo ao art. 3º do Estatuto do Idoso, apresentando que “o abandono afetivo sujeita os filhos ao pagamento de indenização por dano moral”, sendo que as obrigações entre pais e filhos são recíprocas não se limitando apenas em auxílio material”.
É notório que não se pode obrigar filhos e pais a se amarem. Mas, a lei deve prever o mínimo, qual seja, conceder ao prejudicado indenização pelo dano sofrido, caracterizado pela solidão, pelo isolamento, pela tristeza, entre outros, sempre tendo como causa omissão de afeto e atenção mínimas primordiais.
A relatora da Comissão de Seguridade Social e Família- Deputada Jô Moraes, votou pela aprovação do projeto em 16 de setembro de 2010. Ela explicitou a importância de ingressar na lei a obrigação presumida de se pagar indenização por dano moral oriundo do abandono afetivo por familiares.
Em 13 de Abril de 2011 a Comissão de Seguridade Social e Família aprovou unanimemente o projeto nos termos do parecer da relatora, porém, desde 2013 ele foi adiado pelo então Presidente da Comissão de Constituição de Justiça e de Cidadania, Deputado Décio de Lima.
2.7. JURISPRUDÊNCIAS FAVORÁVEIS AO CABIMENTO DA REPARAÇÃO MORAL
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. POSSIBILIDADE. 1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. 2. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88. 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia de cuidado importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. 4. Apesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em relação à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formação psicológica e inserção social. 5. A caracterização do abandono afetivo, a existência de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes por demandarem revolvimento de matéria fática não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do recurso especial. 6. Recurso Conhecido e Provido. 7. Votação Unânime. (TJ-PI - AC: 00017611820078180140 PI 201200010014128, Relator: Des. José James Gomes Pereira, Data de Julgamento: 04/09/2013, 2ª Câmara Especializada Cível, Data de Publicação: 17/09/2013) disponível em: .
Como já mencionado anteriormente, o artigo 229 da Constituição Federal de 1988 afirma que o dever de cuidado é reciproco entre pais e filhos “Os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
“Amar é faculdade, cuidar é dever”, afirma a ministra do STJ, Fátima Nancy Andrighi.
Neste entendimento, merece destaque a primeira sentença aderente ao reconhecimento do abandono afetivo (dos pais para os filhos) julgada em 2012, em que o STJ por maioria de voto (cinco a quatro) obrigou um pai de Sorocaba (SP) a pagar à filha indenização de R$ 200 mil por abandono afetivo.
Através dessa primeira condenação verificamos a consolidação de que se é possível a indenização por abandono afetivo de um filho pelo seu genitor, também será consolidado pela de analogia ao abandono afetivo inverso, visto que se há a mesma razão deve-se aplicar a mesma norma: Art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto Lei 4657/42): “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
2.7.1. JURISPRUDÊNCIA DESFAVORÁVEL
Apelação civil ação civil pública ministério publicado estado do Paraná. Proteção de direitos e interesses dos idosos indeferimento da Petição Inicial por ausência de interesse processual pleito pelo reconhecimento do abandono dos demais filhos da idosa doente e imposição do dever de amparo descabimento pedidos que fogem da seara de atuação do poder judiciário. Afetividade que não pode ser imposta. Sentimento subjetivo. Ausência de interesse Processual. Petição Inicial indeferido. Ausência de Julgamento do mérito. Sentença mantida. Recurso conhecido e desprovido. 1.a demanda visa à coação dos filhos para que prestem auxilio afetivo e de cuidado com a mãe idosa e enferma, o que não pode ser determinado pelo Poder Judiciário.2. Os laços afetivos são sentimentos sujeitos e que devem partir de cada ser humano naturalmente, sendo inviável a sua imposta. 3. A demanda não se confunde com pedido de alimentos, pois este não foi um requerimento inicial e, nesta fase processual, implica em inovação recursal, conforme o Art. 157 do Código de Processo Civil .4. Reconhecimento da ausência de interesse processual do ministério público de indeferimento da petição inicial conforme Art. 295,inc 3, Código de Processo Civil.5.Recurso conhecido e desprovido. (TJPR-12ª Código Civil- ac-1386909-3-região metropolitana de Londrina Foro Central de Londrina – Rel: Joeci Machado Carmargo-Uninime-J09.03.2016). Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/diarios/documentos/318031878/andamento-do-processo-n-1386909-3-apelacao-civel-30-03-2016-do-tjpr>.
O exposto neste trabalho de conclusão de curso teve como tema central o abandono afetivo inverso e a busca pela responsabilidade civil dos filhos para com os pais idosos.
Para isso, busca-se mostrar que o afeto e o abandono são fatores sociais e psicológicos suscetíveis de aplicação jurídica, pois a falta de apreço pode firmar em dano moral. Trata-se de uma ofensa que atinge os princípios da personalidade e da dignidade da pessoa humana.
Conforme apresentado, as decisões reconhecidas e providas enaltecem os princípios e direitos formulados aos idosos. Sob esta ótica é possível a identificação de que o abandono afetivo é ato ilícito, sujeito de pagamento indenizatório.
São inúmeras as divergências sobre o assunto, porém é necessário que se avalie cada caso em particular.
Por fim, vale salientar que a possibilidade de aplicação dessa teoria não caracteriza na falta de amor e carinho, tendo em vista que são sentimentos um tanto quanto difíceis de serem impostos às pessoas, mas sim a omissão quanto ao amparo e auxílio mínimo indispensáveis, garantidos em nosso conjunto normativo.
A Constituição e o Supremo: dos Princípios Fundamentais. Publicado dia 26/07/2011 às 16:06:35. Disponível em: >.
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Bacharelanda do curso de Direito pela Universidade Brasil, campus Fernandópolis- SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIAS, Jéssica Brassaroto. Abandono afetivo inverso: responsabilidade civil dos filhos em relação aos pais idosos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 maio 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51742/abandono-afetivo-inverso-responsabilidade-civil-dos-filhos-em-relacao-aos-pais-idosos. Acesso em: 23 dez 2024.
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