RODRIGO FRESCHI BERTOLO
(Orientador)[1]
RESUMO: O presente Artigo trata de uma breve reflexão que tem por objetivo promover uma análise crítica sobre o sistema de cotas adotado em diversas Universidades Públicas brasileiras. O argumento político-histórico, aplicável essencialmente aos negros, nos diz que estes sofreram injustiças históricas que justificam políticas “corretivas” do governo, uma vez que, o negro trazido ao Brasil na condição de escravo, foi libertado sem que o Estado lhe tivesse oferecido oportunidades concretas de enquadramento e ascensão social. É neste âmbito, que surge o Sistema de Cotas como um possível modo de reparação das injustiças históricas sofridas por minorias ou classes estigmatizadas. Sistema de cotas: abolição do racismo ou “preferência” social? Discriminar a maioria não deixa de ser uma forma de discriminação. Assim sendo, o referido sistema é inconstitucional, pois viola o princípio da igualdade. Uma vez que este propõe-se a beneficiar determinado grupo social, o que implica em concessão de vantagens para determinadas pessoas. A Constituição Federal declara que todos são iguais, sem distinção de cor, raça ou religião. Portanto, ao estabelecer cotas nas universidades aos afrodescendentes, estabeleceu-se o conflito entre os direitos individuais dos que não foram beneficiados e os direitos conferidos a determinado grupo, violando o princípio constitucional da igualdade.
Palavras-chave: afrodescendentes, cotas, universidades.
ABSTRACT:This article aims to publish a critical analysis of the quota system adopted in several Brazilian universities. The political-historical argument, applicable in blacks, sustains us that they suffer the historical injustices that justify "corrective" policies of the government. For, the Negro brought to Brazil as a slave, was released without the subject being brought to society and social ascension. It is in this context that the Quota System appears as a type of payment method for the historical injustices suffered by minorities or stigmatized classes. System of quotas: abolition of racism or social "preference"? Discriminating the majority is still a form of discrimination. Therefore, the said system is unconstitutional, it violates the principle of equality. Since this is a candidate for a social group, which implies granting advantages to certain people. The Federal Constitution declares that all are equal, without distinction of color, race or religion. Therefore, in establishing relationships with communities, the rights granted are not incompatible, the constitutional principle of equality.
Key words: Afrodescendants, quotas, universitie
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. REVISÃO DE LITERATURA. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
Antes de discorrer mais precisamente sobre o tema é primordial entender alguns pontos da história do racismo no Brasil. Mesmo com o passar de longos anos, observamos que o Brasil ainda possui o racismo impregnado em suas entranhas. E com o intuito de amenizar tais prejuízos aos negros, surgiram os sistemas de cotas criados pelo governo. Na verdade, tal sistema é uma cópia de um já implantado nos Estados Unidos, com a tentativa de amenizar a discriminação histórica dos negros, através da integração forçada tanto nas escolas como nos locais de trabalho.
No Brasil, diversas universidades brasileiras adotaram uma proposta de cotas ou reserva de vagas para o ingresso da população afrodescendente no ensino superior, com o propósito de solucionar parte do problema causado em decorrência das desigualdades raciais. No entanto, a admissão nas faculdades públicas do Brasil é altamente competitiva, com muito mais candidatos do que vagas disponíveis. De acordo com as pesquisas realizadas, a cada 1,4 milhões de estudantes admitidos em universidades do Brasil, por ano, apenas 3% se identificam como negros e 18% vêm das escolas públicas onde a maioria dos brasileiros negros estuda.
Assim sendo, as cotas raciais foram concebidas para criar um ambiente acadêmico plural e diversificado, com o propósito de superar desvantagens sociais históricas resultantes da desigualdade racial. Embora os afro-brasileiros representem mais de 60% dos estudantes do ensino primário e secundário, eles estão sub-representados no ensino superior, onde compõem menos de 40% da população estudantil.
Contudo, é preciso considerar que as dificuldades encontradas pelos estudantes negros são as mesmas enfrentadas por estudantes pobres, não negros. Ambos distantes de adentrar pelas portas das universidades, em função de uma educação formal deficitária, oferecida por uma rede pública desqualificada pela falta de investimentos dos sucessivos governos. Nessa trajetória, tanto negros como não negros são componentes de um segmento da sociedade que vive em precárias condições socioeconômicas.
O sistema de cotas é uma medida equivocada do governo brasileiro de demonstrar que se preocupa em resolver os problemas sociais. Sendo, portanto, motivo de grandes divergências. Um dos pontos mais debatidos, sem dúvida, encontra-se no fato de que os brasileiros estão sendo forçados a definir quem é negro. Um processo considerado intrigante e estranho, pois mais de 300 termos podem ser usados para designar a cor da pele, do crioulo de pele escura ao brancarão de pele clara. Ressaltando ainda, que os relacionamentos racialmente misturados são a norma e não a exceção.
Diante disso, a literatura revisada vem propor uma análise crítica sobre o sistema de cotas no Brasil, bem como uma reflexão acerca de sua eficiência em relação à busca pela igualdade e redução das injustiças.
De acordo com a literatura revisada, não é disseminando as diferenças que o resultado do preconceito irá diminuir ou, menos ainda, se extinguir (FONSECA, 2010). Numa tentativa eivada ao fracasso, foi sancionada a Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012, conhecida como a Lei de Cotas, sancionada pela Presidente da República, atribui cota de 50% das vagas em instituições e universidades federais destinadas a estudantes egressos de escolas públicas e com renda familiar igual ou inferior a um salário-mínimo e meio per capita, também adota critérios raciais para a cota (pretos, partos e indígenas) e posteriormente, em 2014, houve a promulgação da Lei nº 12.990/14 - Reserva aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.
De acordo com Guarnieri e Melo Silva (2017, p.184),
Diversos fóruns de discussão foram formados e se tornaram verdadeiros ringues compostos por diferentes segmentos e atores sociais (acadêmicos, filósofos, militantes de movimentos sociais, representantes da sociedade civil, entre outros grupos) em torno do embate dicotômico entre os que defendiam as cotas como iniciativa de valorização e inclusão étnico-racial e os que as condenavam como prática discriminatória e inconstitucional. Alastrou-se pelo país o mal-estar gerado pelos possíveis impactos destrutivos de uma política “racializadora” em um país miscigenado como o Brasil. Os atritos ideológicos foram sendo cada vez mais exaltados em função das expectativas “devastadoras” das cotas para a sociedade e para a qualidade do Ensino Superior na opinião dos grupos contrários a essa política pública.
O sistema de cotas é tão absurdo quanto estabelecer que um determinado percentual de cargos públicos seja ocupado por negros ou alunos de escolas públicas. Esta é mais uma manobra política de natureza claramente ideológica. Dá-se aos pobres o seu lugar para conservá-los como tais. É notória a existência de desigualdades a serem enfrentadas pelos negros que, nesta sociedade, possuem menos escolaridade, salário, saúde, emprego e moradia que os brancos e asiáticos. Entretanto, não é suficiente ancorar a luta contra o preconceito e a discriminação que atingem a população negra brasileira com um imperativo moral que se estabelece exaltando a particularidade.
É necessário considerar que as dificuldades encontradas pelos estudantes negros são as mesmas enfrentadas por estudantes pobres, filhos de trabalhadores não negros, que chegam às portas da universidade e não conseguem adentrá-las, em função de uma educação formal deficitária, oferecida por uma rede pública desqualificada pela falta de investimentos dos sucessivos governos. Também eles são componentes de um segmento da sociedade que vive em precárias condições socioeconômicas. Em suma, o funil do ensino superior é necessário sim. Uma vez que esta permanece sendo a única maneira de se filtrar quem de fato merece entrar na Universidade.
A crença de que o acesso ao ensino superior deve ser universalizado é responsável pelos péssimos profissionais colocados no mercado. O acesso ao ensino superior, assim como ao mercado de trabalho, deve ser alcançado por mérito. Assim sendo, não se pode estabelecer critérios senão o da competência advinda da melhor capacidade acadêmica. Até porque os alunos negros são privilegiados com base em um fator (raça) que não guarda correspondência com as aptidões exigidas dos demais candidatos. Os estudantes que prestam o vestibular são submetidos a uma avaliação do conhecimento adquirido no ensino fundamental e médio, independentemente de raça ou cor. Por outro lado, não vislumbra-se como aplicável ao ensino superior o Princípio da Isonomia, pois o ensino superior não se presta para isso, uma vez que, os princípios da igualdade e da isonomia são feridos na infância, quando a criança tem que parar de estudar para complementar a renda familiar; e feridos no ensino público fundamental, quando o Estado disponibiliza uma sala de aula com professores mal remunerados e despreparados. A capacidade acadêmica nada mais é do que a capacidade intelectual trabalhada e desenvolvida ao longo de anos de estudos de qualidade. Dividir a população em classes, raças ou religiões continua sendo dividir, e não há qualquer relação entre a raça dos alunos e o que se mede no vestibular. Tendo em vista que, por vezes, um branco será preterido (ainda que com notas superiores à de um negro) somente por causa de sua cor.
Atribuir tratamento jurídico diverso para os estudantes negros e pardos significa, portanto, beneficiar esse grupo de pessoas, discriminando-os favoravelmente em detrimento de outras pessoas em igual situação, ferindo o princípio da igualdade. O princípio da igualdade pode ser entendido de duas formas: a teórica (amparada constitucionalmente), que tem por finalidade evitar a distribuição de privilégios discriminados; e a prática, que visa ajudar na diminuição dos efeitos decorrentes da desigualdade, no caso concreto. A forma teórica do princípio da igualdade (igualdade formal) nada mais é do que a igualdade garantida através dos textos normativos. Ou seja, a lei concede idêntica relação de direitos e deveres, sem nenhum tipo de discriminação. A igualdade formal (descrita no texto de lei) possui dupla intenção, uma é conceder a todas as pessoas igual distribuição de direitos e deveres. E a outra é garantir que não haja qualquer forma de privilégio a grupos ou pessoas por parte do Estado.
Um exemplo da igualdade formal em nosso ordenamento jurídico é o artigo 5º da Constituição Federal:
“Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos seguintes termos:
I – homens E mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição; [...];
XLI – a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais; [...]
XLII – a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito a pena de reclusão, nos termos da lei”.
A igualdade material, por sua vez, é o princípio da igualdade na prática, onde, todas as pessoas, possuindo as mesmas oportunidades, são iguais. Ou seja, não deve haver qualquer diferenciação, combatendo as desigualdades existentes, para que assim o plano jurídico tenha eficácia na atuação do princípio da isonomia. A Constituição Federal garante a igualdade sem distinção de qualquer natureza, abrangendo brasileiros natos ou naturalizados, sendo que o rol elencado nessa Constituição não é taxativo, e sim exaustivo, abrangendo qualquer caso de desigualdade.
Para os contrários a implantação de cotas, esse sistema fere em absoluto o princípio da igualdade. Fere, ainda, o objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, que é reduzir as desigualdades sociais e regionais, elencado no artigo 3º da Constituição Federal. O artigo 5º da Constituição Federal, por sua vez, é amplamente atingido pelo sistema de cotas, posto que, estabelece que todos são iguais perante a lei. Ou ao menos deveriam ser. Alertam ser inconstitucional também por tratar-se de afrontar o inciso III do artigo 19 da Constituição Federal, tendo em vista que é expressamente vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos municípios criar distinções entre brasileiros ou preferências entre si, sendo justamente o que o sistema de cotas faz.
Por causa da disputa de admissão em universidades aqui, o Supremo Tribunal foi solicitado a decidir sobre a constitucionalidade das cotas raciais. Implementadas de acordo com a Lei de Cotas do Brasil, essas medidas visam garantir que as universidades públicas brasileiras reflitam a população diversificada do país. A implementação dessas medidas representa um grande salto, mas o Brasil ainda enfrenta muitos obstáculos para tornar seu sistema de ensino superior mais democrático, pois mais da metade da população do Brasil identificou no censo como raça negra ou mestiça, mas apenas 10% desse grupo chegaram à universidade.
Em resposta a essas altas lacunas educacionais, o Congresso do Brasil votou em 2012 um plano para implementar a Lei de Cotas. Por infligir diversos institutos legais solicitou-se o auxílio do Supremo Tribunal Federal do Brasil, que através de uma decisão pioneira, decidiu por unanimidade que as cotas raciais usadas nas universidades públicas são constitucionais. O Tribunal emitiu sua decisão em abril de 2012 após dois dias de deliberação após um debate acirrado que desafiou o ideal brasileiro de “democracia racial”. Com essa decisão, legisladores brasileiros deram início a leis de ação afirmativa voltadas para combater a discriminação e educar o povo historicamente marginalizado. Os proponentes vêem esse movimento expansivo como a base para a possibilidade de ampliar as oportunidades para as minorias no Brasil.
Entretanto, a decisão proferida pelo Superior Tribunal Federal (STF) no que concerne a ADPF 186, diz que o Partido Político Democratas (DEM) defende que o acesso aos direitos fundamentais no Brasil não é negado aos negros, mas aos pobres. Assim sendo, o debate gerado entre a UnB e o DEM não trata apenas de uma questão racial, mas de um problema econômico atrelado à questão racial. Dessa forma, não podemos deixar de nos perguntar quais serão as consequências das políticas de cotas raciais para a diminuição do preconceito.
Neste contexto, cento e treze intelectuais brasileiros, entre eles antropólogos, sociólogos, historiadores, juristas, jornalistas, escritores, dramaturgos, artistas, ativistas e políticos preocupados com as consequências da adoção de cotas raciais para o acesso à Universidade redigiram uma carta contra as leis raciais no Brasil. No documento, os subscritores alertam que “o racismo contamina profundamente as sociedades quando a lei sinaliza às pessoas que elas pertencem a determinado grupo racial - e que seus direitos são afetados por esse critério de pertinência de raça”. Ressaltando, ainda, que as cotas raciais proporcionam privilégios a uma ínfima minoria de estudantes de classe média, conservando intacta, atrás de seu manto falsamente inclusivo, uma estrutura de ensino público arruinada, conforme versa a Liminar 186 do Acórdão, DJ 20.10.2014.
Sendo assim, devemos pensar a questão em face do modelo de educação brasileiro como um todo para não buscarmos soluções apenas na etapa universitária. A valorização e fomento de políticas públicas prioritárias e inclusivas voltadas às etapas anteriores (educação básica) e alternativas (cursos técnicos) são fundamentais para que não assumamos a universidade como único caminho possível para o sucesso profissional e intelectual.
Por fim, o Tribunal rejeitou tal alegação, encontrando nas quotas o melhor método para resolver as desigualdades raciais que nunca haviam sido confrontadas desde a abolição da escravatura em 1888. O Tribunal decidiu que as cotas raciais eram a melhor opção transitória para fechar a lacuna da desigualdade no ensino superior. Essa lacuna é uma questão importante, já que a maioria dos afro-brasileiros continua morando em favelas e recebendo uma fração dos salários da classe alta e predominantemente branca.
Desde a sua publicação as vagas reservadas para estudantes marginalizados deveriam estar de acordo com a porcentagem da população minoritária no estado em que cada universidade pública está localizada. Os proponentes da política da universidade aclamavam a vitória legal como um dos muitos passos necessários para garantir que as populações marginalizadas, particularmente os afro-brasileiros, tivessem acesso a uma educação adequada e a uma colocação profissional avançada. Os afro-brasileiros constituem cerca de setenta por cento daqueles que vivem abaixo da linha da pobreza e apenas 2,2% acessam o ensino superior. Grande parte da população afro-brasileira permanece nos escalões mais baixos dos setores socioeconômicos do país e recebe educação precária nas escolas primárias públicas.
Os opositores das cotas raciais veem a política como um remédio racial para uma questão socioeconômica. Os críticos acreditam que a categorização da população por raça criará uma fracionalização dos brasileiros ao longo das linhas raciais e poderá resultar na oficialização da discriminação racial. Alguns veem as cotas como um racismo reverso que viola diretamente a Constituição brasileira, favorecendo os estudantes afro-brasileiros no processo de seleção altamente competitivo para as universidades públicas, enquanto outros vêem as cotas raciais como uma solução importada dos Estados Unidos que é incompatível com as relações raciais brasileiras. Esses opositores mantêm um firme ideal de “democracia racial”, ou a ideia de que as classes raciais do Brasil nunca foram claramente definidas.
Com a decisão do Supremo Tribunal do Brasil e a subsequente Lei de Cotas Sociais, o Brasil tomou medidas fundamentais para cumprir suas obrigações sob a Convenção das Nações Unidas contra a Discriminação na Educação, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). A política do Brasil está de acordo com o Artigo 1, Seções (a) e (b) da Convenção, que convoca os Estados Partes a eliminar a discriminação educacional que priva o acesso dos cidadãos ao ensino superior. Ao implementar uma política nacional que promova mais igualdade nas oportunidades educacionais, o Brasil adotou um método efetivo de reforma que é recomendado no Artigo 4 da Convenção.
De acordo com suas obrigações previstas no Artigo 1, Seção 4 da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, o Brasil tem a responsabilidade de garantir o avanço de um grupo racial que pode exigir proteção para garantir um direito humano fundamental. Protege as reformas do Brasil porque, uma vez atingidos os objetivos pretendidos, eles não favorecerão os afro-brasileiros, como sugerem os críticos da política. Essas medidas também podem ser incorporadas em campos sociais, educacionais e econômicos, de modo que todas as populações marginalizadas possam desfrutar de igual acesso a um direito humano fundamental.
A raça não será o principal fator na determinação do acesso ao ensino superior, mas sim um fator levado em consideração, em conformidade com o Artigo 13, Seção 2 (c) do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. A política do Brasil permite que as universidades atendam os grupos mais vulneráveis sem discriminação. Em vez de manter um status quo que prejudicou um segmento maciço de sua população, a política do Brasil oferece amplo acesso ao direito humano da educação, que é exigido pelo Pacto. Para os apoiadores das cotas, esses esforços visam expandir o ensino superior para brasileiros marginalizados coincidem com as obrigações internacionais do Brasil. A política de cotas raciais não viola, mas legitimamente protege os direitos humanos concedidos a todos os cidadãos e será crucial para garantir o crescimento contínuo do Brasil como uma potência global. Mas os críticos das medidas dizem que o governo está simplesmente piorando um problema difícil, voltando-se para o que eles consideram ser uma solução importada dos Estados Unidos, um país no qual as definições e relações raciais são muito diferentes.
Alguns oponentes das cotas raciais também argumentam que o racismo não é uma característica da sociedade brasileira e que as condições para os negros melhorarão à medida que a pobreza for gradualmente eliminada. Mas os defensores dos direitos civis apontam para estatísticas que mostram que os brancos brasileiros ganham mais, vivem mais, recebem mais educação e são menos propensos a serem presos do que os cidadãos negros.
Sob o novo sistema para admissão em faculdades adotado aqui, todos os candidatos que se declararem descendentes de africanos nos formulários de admissão são considerados negros e recebem tratamento preferencial. Mas isso levou a queixas de abusos, nos quais os estudantes que não têm a pele escura ou características consideradas africanas, incluindo descendentes de asiáticos ou judeus se autodenominaram negros para melhorar suas chances de serem admitidos. Entre os defensores das cotas, a simpatia do governo à sua posição está estimulando um debate paralelo sobre qual porcentagem deve ser reservada para os negros.
De acordo com dados do censo, cerca de 45% dos 175 milhões de brasileiros se consideram negros ou pardos, uma designação ampla e deliberadamente vaga que pode ser aplicada tanto a pessoas mestiças quanto a descendentes de indianos. Mas muitos dos que mais pressionam pelas cotas argumentam que o teto deve ser estabelecido, pelo menos no momento, em 20%, qualquer coisa, além disso, está condenada ao fracasso e levaria a uma convulsão social.
Outros afirmam que as cotas devem variar de estado para estado e se basear na porcentagem da população que é preta ou parda. Mais de 80% das pessoas no estado do nordeste da Bahia se enquadram nessa categoria, enquanto menos de 10% da população em estados no extremo sul da fronteira com a Argentina se descrevem como afro-brasileiros.
Segundo Mello (2002, p. 10), “a lei não deve ser fonte de privilégios ou perseguições, mas instrumento regulador da vida social que necessita tratar equitativamente todos os cidadãos”.
Entende-se, pois, que o sistema de cotas é a síntese da política brasileira mais voltada para alternativas imediatistas e “politicamente corretas”. Justificar o sistema de cotas alegando que inteligência não escolhe raça ou camada social não basta. É necessário promover a capacidade, não o paternalismo. O país só terá a ganhar se todos forem alfabetizados e tiverem à disposição um ensino médio profissionalizante de excelente qualidade, precedido de um ensino fundamental decente. O ensino superior não é para todos, mas para alguns – os mais preparados. Diploma de ensino superior não deve ser sinônimo de vida digna.
Deixa-se, portanto, os paliativos demagógicos de lado e passa-se a adotar políticas sérias, de longo prazo, mas de sucesso garantido. É disso que o país precisa. Quando parar de definir brancos ou negros e passar a definir apenas como brasileiros, terá meio caminho andado para acabar com esses arroubos de insensatez demagógica e começará a andar no caminho da justiça social.
O Brasil necessita estabelecer a construção de uma educação pública de qualidade como prioridade, em todos os níveis de Governo, visando à formação integral do aluno. Pois é DEVER do Estado efetivar a educação “mediante a garantia de acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um”, conforme o inciso V do artigo 208 da Constituição Federal. A verdade é que todo esse debate sobre cotas e quem é negro não passa de uma distração, mascarando questões bem mais sérias.
A literatura revisada demonstra que o sistema de cotas para negros nas universidades públicas brasileiras fere os princípios constitucionais diferenciando os brasileiros quanto a sua raça. O sistema se opõe também ao artigo 19 da Constituição Federal que proíbe a União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios criar qualquer distinção entre brasileiros ou preferências entre si. O estudo realizado propõe uma análise crítica acerca do sistema de cotas vigente no Brasil. Pois o sistema de cotas raciais para negros, nas universidades públicas do Brasil, que segue o princípio da igualdade material, pode ser considerado acima de tudo inconstitucional, apesar da votação unanime do STF.
O Supremo Tribunal Federal, em julgamento histórico (abril de 2012), pela dimensão da causa objeto da demanda, julgou constitucional a adoção de cotas para ingresso nas universidades públicas brasileiras, bem como, explicitou e fundamentou os motivos que levaram a tal entendimento, ou seja, acerca dos fundamentos que amparam tais ações, ditas afirmativas.
O referido sistema garante que parte das vagas disponibilizadas seja reservada aos negros e pardos, independentemente de sua classificação. Ou seja, independente do mérito, levando em consideração unicamente o critério da cor da pele. Inconstitucionalidade cristalina, posto que o mesmo fere o princípio da igualdade, implicando em concessão de vantagens para determinadas pessoas. A Constituição Federal declara que todos são iguais, sem distinção de cor, raça, religião.
Segundo a Constituição Federal a lei deve ser aplicada igualmente a todas as pessoas, não prejudicando nem beneficiando nenhuma pessoa, com exceção dos deficientes físicos, conforme se verifica no Artigo 37 do mesmo diploma legal. Não é, pois, conferindo diploma de nível superior aos “socialmente excluídos” que os Princípios Constitucionais serão alcançados. Pois o negro incluso nas universidades públicas a partir do sistema de cotas continuará sendo visto como “inferior” perante a sociedade, uma vez que para ingressar no nível superior de ensino, ele teve de ser favorecido devido a sua “inferioridade intelectual” em relação ao branco.
O Estado tem é a obrigação de trabalhar para promover adequadamente o desenvolvimento intelectual de todos os brasileiros, desde os níveis mais básicos da educação. As ações afirmativas, no que tangem ao sistema de cotas, em nada contribuem para instituir uma sociedade mais justa e igualitária, conforme preconiza nossa Constituição Federal. Ninguém deveria ingressar em uma universidade ou mesmo ocupar um cargo público em razão de sua cor ou classe econômica, mas sim por ser merecedor de ocupar tal posição. Até porque com educação pública de qualidade, as cotas não seriam necessárias.
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[1] Docente do Curso de Ciências Sociais e Jurídicas da Universidade Brasil – Fernandópolis-SP.
Bacharelanda do Curso de Direito pela Universidade Brasil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MIRANDA, Marília Macedo. Sistema de cotas: abolição ao racismo ou "preferência" social? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 maio 2018, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51766/sistema-de-cotas-abolicao-ao-racismo-ou-quot-preferencia-quot-social. Acesso em: 23 dez 2024.
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