MURILO SUDRÉ MIRANDA
(Orientador)[1]
Resumo:Este trabalho foi desenvolvido com o objetivo de analisar a eficácia das Constelações familiares dentro do ordenamento jurídico brasileiro. De que forma ocorre a sua utilização, bem como a sua aplicação, para solucionar os conflitos oriundos do meio familiar. Para tanto, faz-se uso das técnicas de pesquisa bibliográfica, utiliza-se o método indutivo para pesquisar e identificar os conceitos, ideias e posicionamentos doutrinários pertinentes. A partir desses estudos, podemos afirmar que a técnica de Constelação Sistêmica está inclusa em vários Tribunais do país e já conta com estudos que buscam obter dados estatísticos e qualitativos da sua utilização. Trata-se de uma técnica que almeja contribuir para a humanização no tratamento dos processos tradicionais brasileiros, descobrindo a verdadeira origem daquele determinado problema e solucionando-o de uma forma eficaz e pacífica entre as partes.
Palavras-chave: Constelação familiar. Ordenamento jurídico brasileiro. Conflitos familiares.
Abstract: This work was developed with the objective of analyzing the effectiveness of Systemic Constellations within the Brazilian legal system. In what way does their use occur, as well as their application, to resolve conflicts arising in the family environment. To do so, one makes use of the bibliographic research techniques, the inductive method is used to research and identify the relevant doctrinal concepts, ideas and positions. From these studies, we can say that the technique of Systemic Constellation is included in several Courts of the country and already has studies that seek to obtain statistical and qualitative data of its use. It is a technique that aims to contribute to humanization in the treatment of traditional Brazilian processes, discovering the true origin of that particular problem and solving it in an effective and peaceful way between the parties.
Keyworlds: Family constellation. Brazilian legal system. Family conflicts.
1 INTRODUÇÃO
A temática do presente trabalho é analisar a aplicação prática do método psicoterapêutico da Constelação como um meio alternativo de solução consensual dos conflitos inerentes ao poder judiciário, visto que, as maiores demandas estão estritamente ligadas ao Direito de Família. Devido ao tempo de espera para a conclusão de um determinado processo até uma sentença satisfatória ser extremamente elevada nos órgãos jurisdicionais, bem como as peculiaridades de cada um, tem se tornado um dos principais problemas a serem resolvidos pelo ordenamento jurídico brasileiro, por acabar acarretando em um acúmulo de demandas. Com a Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a vigência do Novo Código de Processo Civil, mais precisamente em seu artigo 3º, busca obter uma solução consensual para os conflitos através de mecanismos auto compositivos, na qual são imprescindíveis para o adequado tratamento do mesmo, especialmente a Mediação e Conciliação, onde existe a intervenção de um terceiro imparcial, com o objetivo de promover o acordo entre as partes envolvidas. A implantação de novas possibilidades de resoluções de conflitos possibilita a comunicação entre os litigantes, que favorecem a finalização da origem do problema, bem como contribuindo para a eficácia e celeridade processual. Seguindo esse contexto, se verifica o crescimento da utilização do método psicoterapêutico denominado Constelação Familiar que entra na seara jurídica pela construção do Direito Sistêmico, tendo no Brasil o Juiz Sami Storch como o seu precursor.
A Constelação Familiar é um método psicoterapêutico desenvolvido por Bert Hellinger na década de 1970, após experiências adquiridas nas tribos de Zulus, na qual tem como objetivo analisar e estudar o comportamento de grupos familiares, identificando a origem do problema para solucionar e reestabelecer o vínculo no qual foi rompido devido a sua ancestralidade. Atualmente, a técnica de Constelação Familiar já está sendo aplicada em alguns estados brasileiros objetivando analisar o caso concreto não somente pela ótica racional, mas também utilizando o emocional, sendo uma maneira mais humanizada de resolver os problemas familiares e desta forma, aumentar os índices de acordo. Por isso, essa técnica tem sido um dos instrumentos que estão estabelecendo maior celeridade e solução satisfatória na resolução dos conflitos apresentados ao judiciário brasileiro.
O desenvolvimento deste artigo ocorreu com o uso do método indutivo, através da utilização da abordagem sistêmica e das constelações familiares no Direito de família. Os meios utilizados foram a pesquisa bibliográfica em obras de Bert Hellinger, Joan G. Bacardi, concomitante com os dispositivos legais, como a Resolução n.125/10 do Conselho Nacional de Justiça, Lei 13140/15 de Mediação e Lei 13105/15 Novo Código de Processo Civil, em publicações virtuais, artigos, notícias e entrevistas sobre a utilização da abordagem sistêmica e das constelações familiares no Direito pátrio. É nesse contexto que esta pesquisa objetiva analisar a aplicação da técnica da Constelação Familiar como um método eficaz na resolução de conflitos, sendo um instrumento capaz de contribuir para o descongestionamento do sistema judiciário brasileiro.
2 BERT HELLINGER
O alemão Bert Hellinger, psicoterapeuta formado em teologia, pedagogia e filosofia, compreende o início do seu trabalho através do resultado de experiências durante a sua infância. Nascido em 1925 obteve imunidade assegurada contra o discurso nacional – socialista devido à religiosidade e a fé praticada pela sua família. Foi denominado como “inimigo do povo” pela Gestapo e convocado para o serviço militar. Sendo assim, Bert tornou-se soldado aos dezessete anos, enfrentou guerras, derrotas e confinamento em um campo de prisioneiros situado na Bélgica. Foi liberto aos vinte anos de idade e em 1950 ingressou em uma ordem católica na qual foi enviado como missionário para as tribos em Zulus, localizado na África do Sul, no período do apartheid ao longo de dezesseis anos.
Durante o período em que esteve nessas tribos, isso permitiu que conhecesse o necessário da língua para que fosse a comunicação possível entre eles, que além de pregar a fé católica, também lecionou em uma escola. A partir dessa experiência, houve o enriquecimento sobre a sua percepção acerca da diversidade de valores culturais e aprimorou sua habilidade na identificação em sistemas de relacionamentos, bem como o interesse pela comunidade humana. Foi notório perceber as similaridades entre ritos e costumes zulus com elementos advindos da missa católica, que levou ao entendimento que se tratava de manifestações comuns inerentes ao ser humano. A partir desse fato, buscou integrar as culturas de músicas e ritos zulus com as missas cristãs, compreendendo que o Sagrado se encontra em toda parte. O pensamento de Hellinger sofreu modificações ao participar de um curso inter–racial ecumênico de dinâmica de grupo, no qual era um método trazido pelos Estados Unidos por meio do clero anglicano, que enaltecia o diálogo, a fenomenologia e a experiência individual. Foi o primeiro contato com uma nova forma de tratar as almas humanas, e segundo a indagação realizada por um dos instrutores do curso – “O que é mais importante para vocês, seus ideais ou pessoas? Qual das duas coisas vocês sacrificariam?” – Bert direcionou todo o seu trabalho para o ser humano. Após perceber que o sacerdócio já não representava a sua revolução interior, em 1970, após vinte e cinco anos deixou essa ordem e voltou para a Alemanha. Em Viena, se dedicou ao estudo da psicanálise e casou-se. Durante essa formação, ao ler The Primal Scream, foi ao Estados Unidos para obter experiência com Arthur Janov. Entretanto, as tentativas de introdução de um trabalho corporal nas sessões de análise não foram aceitas pela sociedade psicanalítica de Viena. Novamente, foi afrontado pelo seguinte questionamento “O que é mais importante, a lealdade ao grupo ou o amor à verdade e à pesquisa?”. Escolheu seguir o amor. Descobriu as constelações familiares com Ruth McLendon e Leslie Kadis, recebendo delas o treinamento necessário.
Começa a se dedicar a psicoterapia, e a partir das vivências adquiridas nas mais variadas áreas como psicanálise, terapia primal, familiar, transacional e hipnose, além dos conhecimentos adquiridos por vários autores, mas sempre sendo leal a sua própria alma e percepção sobre os fenômenos familiares, desenvolvendo o método terapêutico: constelação familiar.
3 CONSTELAÇÃO FAMILIAR NA PRÁTICA TERAPÊUTICA
O método de constelação nos mostra como somos afetados emocionalmente pelas gerações passadas e como afetaremos as gerações futuras. Considera o indivíduo como pertencente de um determinado sistema, estudando as emoções e energias inconscientes. Trata-se de uma técnica dentro do campo da psicoterapia breve, que objetiva a libertação do ser humano sobre a dificuldade de relacionamento com as pessoas do meio familiar por um bloqueio inconsciente devido a sua ancestralidade. Caso tal bloqueio não seja rompido, existe uma tendência em seguir um padrão anterior.
De acordo com Jakob Robert Schneider, um dos mais experientes terapeutas na linha criada por Bert Hellinger (2007, p.63):
A constelação familiar é entendida como um método sistêmico, em muitos sentidos. Ela vê o cliente individual, desde o princípio, junto com as pessoas relevantes em seus campos de relações. Dificilmente haverá um método que permita vivenciar tão explicitamente, e de uma forma tão condensada, abrangendo espaço e tempo, as influências numa família. Nas constelações, vemos os sistemas de relações, de certa maneira, “em ação”. O conceito do “envolvimento” exprime a interconexão dos destinos que se manifestam, em número maior ou menor, maios ou menos simultaneamente.
Esse procedimento sistêmico, nos demonstra que a Constelação Familiar toma como pressuposto metodológico os sistemas familiares com relação as questões vivenciadas por gerações anteriores, como, por exemplo, mortes precoces, suicídios, tragédias, depressões e conflitos entre ascendentes e descendentes, podendo inconscientemente afetar a vida de seus familiares com novos suicídios, relações de conflito, transtornos físicos e psíquicos, dificuldade de estabelecer relações duradouras com parceiros e conflitos intermináveis entre familiares. O Autor chama isso de herança afetiva, que é a transmissão transgeracional de conflitos emocionais ou psíquicos quando um determinado ancestral deixa situações por resolver dentro do meio familiar, onde os seus descendentes, conscientemente ou não, carregarão consigo os sentimentos e pensamentos oriundos desse conflito, que em muitas vezes, acabam reproduzindo-o em suas vidas.
Na prática, as vivências de Constelação Familiar podem ser aplicadas de uma forma individual, entre facilitador e cliente, através de desenhos, bonecos e figuras, ou pode ser feita coletivamente, por intermédio do constelador, cliente, representante e plateia, na qual é escolhido pessoas que não se conhecem e ambas sem nenhuma informação prévia, para representarem um tema específico e vivenciarem aquelas experiências em grupo. Ao longo do processo de constelação, o profissional qualificado que está redigindo esta técnica, utiliza frases adequadas para gerar um efeito imediato nos representantes, que acarretam em características emocionais e físicas de um ente familiar.
Essas representações consistem numa espécie de simulação do sistema. Nelas, constelador e constelado posicionam as pessoas, ou as figuras e bonecos, para representar os componentes do sistema familiar. Com a finalidade de orientar a representação do sistema, o constelador pede ao indivíduo que posicione as pessoas ou figuras e bonecos de acordo com determinado conflito ou situação que lhe ocorreu e que será objeto de Constelação. O cliente posiciona todos os escolhidos para representarem as pessoas, segundo o terapeuta, e senta-se, para observar a movimentação na qual ocorrerá. A representação é um dos principais fenômenos que ocorrem neste tipo de método, pois tanto o terapeuta quanto os participantes disponibilizam suas percepções para visualizarem o que acontece na dinâmica do sistema do cliente. Esta visualização ocorre de diversas maneiras: as pessoas têm sensações físicas como tremores, arrepios, dores, calor, frio, suores; sentimentos diversos como alegria, raiva, tristeza, desconfiança, entre outros.
O constelador tendo como base os seus estudos e percepções sobre os conhecimentos sistêmicos, baseado nas leis do amor, através de certos comandos consegue reestabelecer vínculos interrompidos e promover reconciliações, analisando as reações e sentimentos oriundos deste processo, identificando em qual ponto ocorreu o emaranhamento e foram desrespeitados os princípios sistêmicos. Isso é possível, pois devido este método o cliente consegue enxergar a “alma” daquele indivíduo do âmbito familiar na qual tem conflito, muitas vezes entendendo a origem oculta dos problemas em torno da relação que pode ser uma repetição de um padrão anterior daquele sistema familiar.
Segundo Bert Hellinger (2006, p.7):
Na terapia familiar sistêmica, trata-se de averiguar se no sistema familiar ampliado existe alguém que esteja emaranhado nos destinos de membros anteriores dessa família. Isso pode ser trazido à luz através do trabalho com constelações familiares. Trazendo-se à luz os emaranhamentos, a pessoa consegue se libertar mais facilmente deles.
Quando mencionamos a palavra emaranhamento, estamos afirmando que alguém da família retoma e revive inconscientemente o destino de um familiar que viveu em uma geração anterior. Só é possível alterar essa situação através do conhecimento do emaranhamento para então se livrar dele.
É possível identificarmos o emaranhamento através de indícios ou características repentinas exageradas. Segundo Hellinger (2003, p.105)
Situações não-resolvidas do passado expressam-se em relaciona- mentos posteriores sob a forma de ações impulsivas e deslocadas ou de senti- mentos exagerados. A identificação com outra pessoa gera impressões como “parece que não sou eu” ou “alguma coisa tomou conta de mim”. Sempre que uma pessoa exibe emoções inusitadamente fortes ou comportamentos incompreensíveis, nos termos da situação atual, podemos suspeitar da existência de alguma complicação sistêmica. Isso também é verdadeiro quando a pessoa tem dificuldades inexplicáveis para conversar com outra ou reage de maneira incompreensível — como se estivesse sob o jugo de conflitos e ansiedades invisíveis. Pessoas que teimam sempre em ter razão costumam estar com emaranhamentos. Quando “brigam” com veemência e mordacidade excessivas, talvez estejam representando algum outro membro do sistema. Havendo um bode expiatório na família atual, usualmente houve outro na geração anterior e convém observar isso com cuidado. Qualquer reação ou emoção exagerada, deslocada ou ampliada pode denunciar uma identificação.
Para que seja possível a solução do emaranhamento, é de suma importância a identificação do familiar que foi excluído, e logo em seguida conscientizar a pessoa emaranhada para que se torne possível reestabelecer a união familiar. Geralmente, a pessoa excluída sofreu algum tipo de injustiça. Os demais membros do grupo familiar se consideram superiores a ele sob uma ótica moral, por acreditarem que por alguma atitude ou rumo que optou na vida seja mau. Com isso, há uma necessidade de integração de todos os membros do grupo, sendo necessário que uma pessoa mais nova represente a excluída, assumindo esse papel inconscientemente.
Esse fenômeno é constatado nas Constelações familiares, demonstrando a influência dos nossos antepassados em nossas vidas como algo muito presente, principalmente quando ocorre a não aceitação de uma determinada característica daquele ente familiar ou quando negamos partes da nossa própria história. Buscando o conhecimento da origem do conflito, é possível aquela pessoa afetada agir e mudar a situação vivida.
3.1 AS LEIS QUE COMPÕEM AS ORDENS DO AMOR
Para Bert Hellinger, existem três leis sistêmicas que são responsáveis por nortearem as constelações familiares, são elas: a necessidade do pertencimento, o equilíbrio entre o dar e receber e a hierarquia entre os membros, que atuam ao mesmo tempo e exercem papel fundamental no equilíbrio e manutenção do sistema familiar.
Segundo Elza Vicente Carvalho, consultora em desenvolvimento humano, terapeuta e consteladora familiar sistêmica (2012, p.43):
Quando estas ordens são aplicadas, cessa a responsabilidade por injustiças cometidas no grupo familiar. As culpas e as consequências retornam às pessoas a que pertencem, e começa a reinar a compensação por meio do bem, substituindo a necessidade sinistra de equilibrar por meio do funesto, que gera o mal a partir do mal. O sucesso acontece quando os mais novos aceitam o que receberam dos mais velhos, apesar do preço, e os honram, independentemente do que tenham feito. Os excluídos recuperam seu direito de ser acolhidos e nos abençoam ao invés de nos amedrontarem. Quando lhes damos um lugar em nossa alma, ficamos em paz com eles. A partir do momento que estamos de posse de todos os que nos pertencem, de todos os que fazem parte do nosso sistema familiar, sentimo-nos inteiros e plenos no amor que pode fluir e crescer. Aquilo que se coloca a caminho, sem nenhuma intenção, sem medo e sem vontade de ajudar alguém de qualquer maneira. Por meio do trabalho com os representantes podemos verificar que eles se movimentam sob o impulso da alma e encontram soluções que estão além da influência do constelador ou do terapeuta.
De acordo com a lei do pertencimento, cada pessoa que integra um sistema deve ser por todos os seus membros reconhecida e aceita como parte integrante, tendo seu papel e lugar dentro dele respeitado por todos. Em um sistema familiar, todos os membros da família são únicos e têm o direito de pertencer àquele grupo independente de suas características físicas ou emocionais. Assim, além da necessidade de ser respeitada a ordem de chegada de cada um, também é preciso que haja entre os membros o reconhecimento da importância de cada integrante do sistema, de modo que nenhum deles sinta-se excluído. Isso porque, quando ausente a lei do pertencimento, de forma consciente ou não, o membro descendente ou colateral ao excluído sente o desejo de reparar a injustiça cometida contra aquele, tomando para si a responsabilidade de restaurar a ordem dentro do sistema e restabelecer o seu equilíbrio. Tal comportamento, que faz com que os descendentes ou colaterais assumam posturas negativas oriundas da exclusão de um membro do sistema, numa tentativa frustrada de nele restaurar a ordem.
A segunda lei se trata sobre a necessidade de existir equilíbrio dentro dos relacionamentos que se estabelecem entre os membros de um determinado grupo, se situando em posições equivalentes, advertindo que para o equilíbrio das relações é de suma importância a movimentação direcionada à preservação da paridade entre seus membros, isto é, entre o crédito e débito gerado pelo dar e tomar de uma maneira harmoniosa e equivalente.
A terceira e última lei sistêmica é o equilíbrio, ou também chamada de lei do dar e receber. Todo ser humano é dotado de necessária capacidade de troca. A mesmo tempo em que oferece seus dons e habilidades, espera receber o que considera importante para suas necessidades e seu desenvolvimento pessoal. Assim, em uma relação sistemicamente equilibrada, os membros do sistema dão aquilo que são capazes e recebem com gratidão e respeito aquilo que lhes é dado, compreendendo as capacidades e limitações de quem lhe dá. A hierarquia, o pertencimento e o equilíbrio são naturalmente buscados pelas pessoas devido às pressões e impulsos do instinto, da necessidade e do reflexo, da mesma forma como buscam-se satisfações de necessidades físicas.
Destarte, justifica-se o reestabelecimento das leis sistêmicas nas entidades familiares, através da técnica de Constelação Familiar, como possível método de solução de conflitos justamente por serem ordens naturalmente buscadas pelos seres humanos em seus relacionamentos, eficácia da técnica e sua aplicabilidade no âmbito jurídico será discutida no próximo subtítulo.
4 EXPRESSÃO DIREITO SISTÊMICO
É possível afirmar que um conflito surge em decorrência de uma frustação vivida anteriormente pela parte envolvida, conforme exemplifica Sami Storch (2010) em seu artigo denominado - que o direito sistêmico?:
O direito sistêmico se propõe a encontrar a verdadeira solução. Essa solução não poderá ser nunca para apenas uma das partes. Ela sempre precisará abranger todo o sistema envolvido no conflito, porque na esfera judicial – e às vezes também fora dela – basta uma pessoa querer para que duas ou mais tenham que brigar. Se uma das partes não está bem, todos os que com ela se relacionam poderão sofrer as consequências disso. Exemplifico: Uma pessoa atormentada por motivos de origem familiar pode desenvolver uma psicose, tornar-se violenta e agredir outras pessoas. Quem tem a ver com isso? Todos. Toda a sociedade. Adianta simplesmente encarcerar esse indivíduo problemático, ou mesmo matá-lo (como defendem alguns)? Não. Se ele tiver filhos que, com as mesmas raízes familiares, apresentem os mesmos transtornos, o problema social persistirá. A solução sistêmica, nesse caso, deve ter em vista a origem familiar do indivíduo. Não haverá real solução de outra forma.
O Direito Sistêmico, tendo como base a Constelação Familiar objetiva realizar as decisões judiciais mais humanizadas e harmoniosas entre os envolvidos, buscando através desta técnica conhecer a origem do problema apresentado, compreendendo e analisando sob esta nova perspectiva as dificuldades pessoais envolvidas na ação. Portanto, a expressão Direito Sistêmico representa a atuação dos operadores do direito, não com um olhar apenas processualista, mas sim, sistêmico, aonde as Leis Sistêmicas são aplicadas aos conflitos, seja em vivências coletivas ou em audiências de mediação.
5 CONSTELAÇÃO FAMILIAR NO JUDICIÁRIO BRASILEIRO
A constelação sistêmica é uma abordagem que está sendo constantemente relacionada com o Direito de família devido ao alto índice de acordos obtidos entre as partes quando ocorre a sua aplicação. Esse meio alternativo de resolução de conflitos permite identificar os emaranhamentos presentes naquele problema específico e a partir disso, estabelecer decisões que gerem harmonia e aceitação por todos os envolvidos, acarretando na resolução mais rápida e eficiente dos processos judiciais. Desenvolvida pelo teólogo, filósofo e psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, a técnica de constelação familiar foi trazida para o Judiciário brasileiro em 2012, pelo juiz Sami Storch, da 2ª Vara de Família de Itabuna, na Bahia. Atualmente no Brasil, em pelo menos 11 estados (Goiás, São Paulo, Rondônia, Bahia, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Paraná, Rio Grande do Sul, Alagoas e Amapá) e o Distrito Federal, os tribunais já aderiram a este método com o objetivo de aumentar o número de acordos consensuais entre os litigantes. A medida adotada está em conformidade com a Resolução CNJ n. 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o novo Código de Processo Civil, que estimulam práticas que proporcionam tratamento adequado dos conflitos de interesse do Poder Judiciário.
A técnica ocorre antes das sessões de conciliação mediante vivências coletivas e vem sendo utilizada como reforço para solucionar os conflitos familiares, visando encontrar uma verdadeira solução sistêmica. Ainda que existam leis reconhecidas e implementadas na sociedade, nem sempre as relações humanas se estabelecem somente conforme elas.
A sessão de Constelação Familiar ocorre inicialmente através de uma palestra proferida pelo juiz sobre os vínculos familiares, as causas das crises nos relacionamentos e a melhor forma de lidar com esses conflitos. Logo após, existe um momento de meditação, para que cada um avalie seu sentimento. A partir disso, é que de fato inicia-se o processo de Constelação. Durante a prática, os cidadãos começam a manifestar sentimentos ocultos, chegando muitas vezes às origens das crises e dificuldades enfrentadas.
As partes envolvidas em um processo judicial são convidadas e não intimadas, a comparecerem a dinâmica, momento em que conseguirão ver melhor o emaranhamento que se encontram envolvidas, ampliando mais a consciência, por consequência as partes passam a ver a situação com uma visão mais profunda e ampliada, por que não apenas o problema foi visto, mas o sistema familiar de cada um, assim ficam mais propensas a firmaram um acordo em audiência.
Além das dinâmicas coletivas o pensamento sistêmico também está sendo aplicado nas audiências, aonde o Juiz, Conciliador ou Mediador faz questionamentos sobre o campo familiar dos envolvidos e utiliza palavras ou frases chaves que dão todo o significado, permitindo um bom termo aquela situação em conflito, resolvendo o emaranhamento existente naquele sistema familiar, permitindo que todos os envolvidos reconheçam os sentimentos expostos e visualizem a importância de cada um.
Tal prática mostra de forma imparcial, clara e inequívoca o real problema, facilitando uma melhor compreensão às partes, aos juízes, servidores e advogados, enfim, a todos os que estão envolvidos na solução daquela demanda. Facilitando a realização de um acordo e atendendo o interesse dos litigantes, trazendo paz, equilíbrio e harmonia. A Constelação Familiar é um instrumento que quando utilizada nos processos familiares pode trazer melhora nos resultados obtidos a respeito daquele processo, por acarretar em uma solução pacífica e aceita por ambas as partes envolvidas.
Sami Storch em seu blog (direitosistemico) explica da seguinte forma:
A abordagem sistêmica do direito, portanto, propõe a aplicação prática da ciência jurídica com um viés terapêutico – desde a etapa de elaboração das leis até a sua aplicação nos casos concretos. A proposta é utilizar as leis e o direito como mecanismo de tratamento das questões geradoras de conflito, visando à saúde do sistema “doente” (seja ele familiar ou não), como um todo.
Em 2012, o Juiz de direito Sami Storch do Tribunal de Justiça da Bahia, implantou essa abordagem no ordenamento jurídico brasileiro e criou a expressão Direito sistêmico, começando a utilizar essa técnica de uma maneira discreta, fazendo a aplicação da mesma aos cidadãos envolvidos em ações judiciais como divórcio, alimentos e guarda, na Vara de Família do município de Castro Alves, a 191 km de Salvador. Foram seis reuniões, com três casos “constelados” por dia. Das 90 audiências dos processos nos quais pelo menos uma das partes participou da vivência de constelações, o índice de conciliações foi de 91%; nos demais, foi de 73%. Nos processos em que ambas as partes participaram da vivência de constelações, o índice de acordos foi de 100%.
De acordo com Sami Storch: “ a Constelação Familiar é um instrumento que pode melhorar ainda mais os resultados das sessões de conciliação, abrindo espaço para uma Justiça mais humana e eficiente na pacificação dos conflitos. “
Além de advogados e juízes, os chamados consteladores podem exercer outras profissões, como psicólogos por exemplo. O resultado é um tipo de “terapia”, que permite às pessoas que são parte de um litígio enxergar como o padrão familiar deu origem aquele comportamento especifico.
Fazendo a dramatização dos conflitos, a constelação busca trazer à tona questões pontuais mal resolvidas contidas no sistema familiar (mortes precoces, perdas e rupturas, por exemplo) que seriam capazes de influenciar comportamentos futuros dos membros da família, sendo em sua maioria inconscientes.
Ainda que as constelações não substituam (e tenham aplicações distintas de) outras formas de psicoterapia e mediação, juízes defensores da prática dizem que esses traumas costumam ser identificados em intervenções rápidas, em torno de meia a uma hora, em dramatizações coletivas ou sessões sigilosas individuais, na qual permitem que as pessoas vejam os seus conflitos sob outra ótica. Apesar de ainda não existir dados nacionais sobre o uso dessa terapia na Justiça nem de seu impacto, em 2016 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), identificou que 11 estados brasileiros (mencionados acima) já aderiram a este meio. É respaldado por uma resolução do próprio CNJ, que recomenda "mecanismos de soluções de controvérsias" dentro do sistema judicial.
De acordo com a juíza Claufia Spagnuolo, da 11ª Vara de Família na região de Santo Amaro, bairro na xona sul da capital paulista: "Estamos tentando fazer com que se torne algo mais uniforme, para que o cidadão que chegue aqui saiba que ela existe e veja como é aplicada”, afirma a respeito da utilização da Constelação.
Quando o judiciário trata as questões familiares sobre a perspectiva dos processos tradicionais, sem buscar resolver o real motivo daquela demanda, ocorre um grande desgaste emocional dos envolvidos e um custo financeiro ao Estado, que mais tardiamente que ocorra, por não ter sanado a origem do conflito, retornará a ser discutido judicialmente.
Em Goiás por exemplo, no ano de 2015, o CNJ premiou um projeto da comarca de Goiânia, que usou as constelações em mediações judiciais, com índice de solução de cerca de 94% em disputas familiares.
Desta forma, com o auxílio do trabalho de profissionais, como no caso do magistrado Sami Storchque citado acima, visam realizar uma abordagem sistêmica do Direito através de técnicas alternativas para a resolução de conflitos levados ao Judiciário, sendo possível afirmar através do estudo desta pesquisa que a aplicação das Constelações Familiares gera resultados efetivos na solução duradoura, pacífica e eficaz entre os problemas ocasionados nos membros do sistema familiar.
Com isso, vemos a importância da Constelação Familiar para o Direito, especificamente neste caso no âmbito familiar, e também para a sociedade, pois, sendo os conflitos resolvidos a partir da revelação de suas causas mais profundas, isto é, da origem do qual desencadeou aquele problema, eles não retornarão mais ao Judiciário devido a insatisfação dos envolvidos sobre as decisões proferidas, acarretando consequentemente em economia para o Estado e o descongestionamento da máquina judiciária.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da situação atual de congestionamento processual em que se encontram os órgãos jurisdicionais brasileiros e com o advento do novo Código de Processo Civil que permite a introdução de novas maneiras de meios que levem a resolução dos conflitos, a busca pela solução consensual entre as partes através de novos métodos vem se tornando mais comum. O Poder Judiciário juntamente com a sociedade tem caminhado ao encontro destas técnicas de ação para resolverem a raiz do problema de uma maneira duradoura e eficaz. O método de Constelação Familiar por exemplo, pode ser empregado para auxiliar pessoas a identificar a origem do problema através de emaranhamentos presentes em sua vida e a partir disso, solucionar o conflito apresentando, reestabelecendo as ordens sistêmicas ocultas do amor que são responsáveis pelo equilíbrio do sistema familiar.
As Ordens do Amor ou Lei Sistêmicas são a base para se criar o pensamento sistêmico, pois quando elas estão em harmonia, ou seja, são respeitadas dentre do sistema familiar, existe o equilíbrio entre as relações. Quando são desrespeitadas, acarretam em emaranhamento nas gerações e consequentemente em conflitos familiares. Através da aplicação da constelação, é possível que os operadores de direito identifiquem se essas ordens estão em desiquilíbrio e encontrem a solução para o problema apresentado ao judiciário, desencadeando em uma decisão pacífica e harmônica, devido a aceitação da mesma por ambas as partes.
O Poder Judiciário vem utilizando o emprego da técnica de Constelação Familiar aliada ao Direito de Família, por exemplo, em questões como divórcio, pensão, guarda de filhos e em alguns casos, até mesmo em inventários. Tem se tornado cada vez mais aplicada na esfera jurisdicional. Com a aplicação deste meio, os processos tradicionais estão sendo tratados de uma forma mais humanizada, aumentando o maior número de acordos.
Por fim, conclui-se que apesar da técnica psicoterapêutica de Constelação Familiar ser algo novo no âmbito jurisdicional, tal instrumento é de grande relevância na solução dos conflitos familiares, por identificar o real motivo do problema naquele determinado sistema familiar e de fato resolvê-lo, crescendo a cada dia mais, por ser um instituto que proporciona um suporte eficaz em beneficio tanto aos operadores do direito, bem como para a sociedade.
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[1] Professor de Direito Processual Civil da Faculdade Católica do Tocantins. Especialista em Direito do Estado pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce (FADIVALE) e Especialista em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS) e Advogado. E-mail: [email protected]
Bacharelanda do curso de Direito pela Faculdade Católica do Tocantins - FACTO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Vanívea Sena. A eficácia da aplicação do método constelação sistêmica como forma de resolução dos conflitos inerentes ao Direito de Família Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 maio 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51776/a-eficacia-da-aplicacao-do-metodo-constelacao-sistemica-como-forma-de-resolucao-dos-conflitos-inerentes-ao-direito-de-familia. Acesso em: 23 dez 2024.
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