Resumo: O presente artigo tem o escopo de abordar a temática da inconstitucionalidade do artigo 702, da CLT, com a redação dada pela Lei n. 13.467/2017 (reforma trabalhista). Para tanto, o artigo faz sucinta exposição sobre o advento da reforma trabalhista. Após isso, expõe as alterações promovidas pela reforma, no teor do artigo 702, da CLT e tece breves considerações sobre o princípio da separação dos poderes, expresso no artigo 2º, da CF/88. Superados esses pontos, o artigo apresenta os argumentos favoráveis e contrários ao reconhecimento da inconstitucionalidade do artigo 702, da CLT, com a redação dada pela Lei n. 13.467/2017, por violação ao princípio da separação dos poderes. Por fim, o artigo relata o atual estágio em que se encontra essa discussão no âmbito dos tribunais pátrios, apresentando, a partir do conteúdo exposto, uma conclusão acerca do tema.
Palavras-chaves:Reforma Trabalhista. Artigo 702, da CLT. Princípio da separação dos poderes. Inconstitucionalidade.
Sumário: Introdução. O inciso I, alínea f, e os parágrafos 3º e 4º, do artigo 702, da CLT, inseridos pela Lei n. 13.467/2017. Violação ao princípio da separação dos poderes. Conclusão. Referências.
Introdução
A Lei n. 13.467/2017, denominada no meio jurídico de reforma trabalhista, alterou diversos dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho-CLT. Publicada em 14 de julho de 2017 e vigente desde 11 de novembro de 2018, esse diploma legislativo trouxe polêmicas alterações normativas, tanto no que concerne a normas relacionadas ao direito material, quanto no que se refere ao direito processual do trabalho.
Entre as alterações normativas que versam sobre os dispositivos de ordem processual, a Lei n. 13.467/2017 estabeleceu, por meio da redação trazida ao inciso I, alínea f e aos parágrafos 3º e 4º, do artigo 702, da CLT, que os Tribunais do Trabalho deverão observar um novo e obrigatório procedimento, quando da elaboração dos seus enunciados de uniformização jurisprudencial.
Assim como se deu com diversos outros dispositivos introduzidos na Consolidação das Leis do Trabalho-CLT pela reforma trabalhista, essa imposição legislativa recebeu, desde o início da vigência da lei, críticas robustas de parcela da comunidade jurídica.
Segundo respeitável posição doutrinária, ao impor ao Poder Judiciário a forma pela qual a sua jurisprudência, doravante, deverá ser consolidada, o legislador ordinário incorreu em patente violação ao princípio da separação dos poderes, expressamente previsto no artigo 2º, da Constituição Federal.
O presente artigo busca analisar os argumentos que fundamentam a alegação de afronta a esse relevante princípio existente no ordenamento jurídico pátrio, tendo ainda o desiderato de expor a posição da corrente contrária, que defende inexistir a alegada violação.
O inciso I, alínea f, e os parágrafos 3º e 4º, do artigo 702, da CLT, inseridos pela Lei n. 13.467/2017
Já no início do ano de 2018, com apenas poucos meses do início da vigência da Lei n. 13.467/2017, já era possível identificar na comunidade jurídica diversas críticas ao teor desse diploma, que consubstancia a denominada reforma trabalhista.
De fato, desde o início da vigência dessa lei, passou a ser cada vez mais habitual a afirmação de que a referida reforma, na realidade, não tinha o desiderato de aumentar o número de postos de trabalho e tampouco o de “modernizar” as relações laborais, ao contrário do que sustentavam aqueles que a defendiam, à época em que foi votada, aprovada e promulgada.[1]
Segundo a posição contrária à reforma trabalhista, a Lei n. 13.467/2017 viola princípios comezinhos do direito do trabalho, o que é evidente pela simples análise da forma como se deu o processo de tramitação legislativa desse diploma.[2] Afirma-se que, aprovada sem qualquer debate com os reais interessados sobre o tema (trabalhadores e suas entidades representativas), a Lei n. 13.467/2017 representa ruptura do processo democrático que sempre fundamentou o ramo jurídico laboral, tendo como nítido e único propósito o de atender às reivindicações dos representantes dos setores econômicos, descontentes com a queda da sua margem de lucro, resultante da crise econômica pela qual, afirma-se, passa atualmente o Brasil.[3]
Tanto no que concerne às normas de direito material quanto no que se refere às de direito processual, tornou-se corrente a posição de que muitos dispositivos trazidos pela Lei n. 13.467/2017 objetivaram, na realidade, censurar a atividade até então desenvolvida pelo Tribunal Superior do Trabalho –TST, caracterizado, segundo algumas vozes, como uma Corte detentora de uma posição ativista e excessivamente protecionista.[4]
Homero Batista Mateus da Silva afirma que esse propósito do legislador reformista está evidente no teor do artigo 8º, §2º, da CLT, que preceitua serem infensas às súmulas e a outros enunciados de jurisprudência do TST a criação de obrigações às partes da relação laboral não previstas em lei. Para o autor, é lamentável que o legislador tenha se posicionado dessa forma em relação à atividade do Tribunal Superior do Trabalho, já que essa Corte, quando edita esses enunciados, na realidade, nada mais faz senão a criação de uma forma efetiva de pacificação do conflito, já que, não raras vezes, há um vazio legislativo acerca desses temas (ex: súm 331, do TST).[5]
Esse desiderato do legislador reformista, no que concerne aos dispositivos de ordem processual, é identificado, entre outras hipóteses, pela redação dada ao inciso I, f, e aos parágrafos 3º e 4º, do artigo 702, da CLT, pela Lei n. 13.467/2017. A partir da vigência desse diploma, os referidos parágrafos passaram a estabelecer um grau de exigência mais rigoroso para que o Tribunal Superior do Trabalho e os Tribunais Regionais do Trabalho possam elaborar as suas súmulas. Vejamos, por oportuno, o teor desses dispositivos:
Art. 702. Ao Tribunal Pleno compete:
I - em única instância:
(...)
f) estabelecer ou alterar súmulas e outros enunciados de jurisprudência uniforme, pelo voto de pelo menos dois terços de seus membros, caso a mesma matéria já tenha sido decidida de forma idêntica por unanimidade em, no mínimo, dois terços das turmas em pelo menos dez sessões diferentes em cada uma delas, podendo, ainda, por maioria de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de sua publicação no Diário Oficial;
§ 3o As sessões de julgamento sobre estabelecimento ou alteração de súmulas e outros enunciados de jurisprudência deverão ser públicas, divulgadas com, no mínimo, trinta dias de antecedência, e deverão possibilitar a sustentação oral pelo Procurador-Geral do Trabalho, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, pelo Advogado-Geral da União e por confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito nacional.
§ 4o O estabelecimento ou a alteração de súmulas e outros enunciados de jurisprudência pelos Tribunais Regionais do Trabalho deverão observar o disposto na alínea f do inciso I e no § 3o deste artigo, com rol equivalente de legitimados para sustentação oral, observada a abrangência de sua circunscrição judiciária.
Ao tratar do teor do artigo acima transcrito, Volia Bomfim Cassar afirma que, de fato, o objetivo do legislador, no que concerne à forma de consolidação da jurisprudência, foi frear o “ativismo” do TST e dos TRT’s, mediante um dificultoso processo de criação, alteração e supressão de súmulas. A fim de esclarecer essa assertiva, a autora exemplifica com a situação do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, com sede no Rio de Janeiro. Nessa Corte, nas palavras de Volia Bomfim, as regras previstas no novel artigo 702, da CLT, passaram a exigir que sete, das dez Turmas existentes no Tribunal, tenham que se manifestar de forma unânime, para o fim de que uma súmula seja aprovada, o que passa a ser demasiadamente dificultoso[6].
Francisco Antônio de Oliveira também crítica o teor dado ao artigo 702, da CLT, pela Lei n. 13.467/2017, mas o faz por outros motivos. Para o autor, o procedimento trazido pelo legislador apenas torna o processo do trabalho mais burocrático, já que os ministros do Tribunal Superior do Trabalho não alterarão o seu convencimento tão somente pelos argumentos expostos pelos diversos órgãos elencados no § 3o , do artigo em comento. Além disso, segundo o autor, não faz qualquer sentido que haja um regramento legislativo para que os Tribunais Trabalhistas consolidem a sua jurisprudência, e não haja essa imposição para os demais tribunais do país.[7]
Independentemente desses posicionamentos, fato é que, diante da minuciosa regulamentação estabelecida pela Lei n. 13.467/2017 acerca da forma pela qual os Tribunais Trabalhistas, doravante, passarão a consolidar os seus entendimentos jurisprudenciais, surgiu, na doutrina, forte manifestação no sentido de que essas normas violam o princípio da separação dos poderes. Segundo os adeptos dessa posição, esse regramento legislativo traz medida que afronta a autonomia do Poder Judiciário, tratando-se, portanto, de norma destinada a ser reconhecida como inconstitucional pelas Cortes do país.
Violação ao princípio da separação dos poderes
O princípio da separação dos poderes tem a sua origem na antiguidade grega. Em sua obra A Política, Aristóteles propôs a existência de três funções distintas, exercidas pelo mesmo poder soberano: a função de editar normas; a de aplicá-las ao caso em análise; e a de resolver de forma unilateral os litígios que decorressem da aplicação dessa lei.[8]
Muito tempo depois, John Locke também chegou a tratar do assunto. Com efeito, conquanto não seja habitual citar esse autor quando se discorre acerca dessa matéria, fato é que John Locke escreveu sobre o tema da separação dos poderes 50 (cinquenta) anos antes de Montesquieu. Para John Locke, a separação deveria se dar entre Executivo, Legislativo e Federativo, sendo essa última função caracterizada como a atribuição de relacionamento com outros Estados.[9]
Foi com Montesquieu, todavia, que a teoria de Aristóteles foi de fato aprimorada. Por meio da obra O Espírito das Leis, esse autor defendeu que as três funções identificadas pelo filósofo grego deveriam ser exercidas por três órgãos diversos, autônomos e independentes entre si. Essa evolução da teoria da separação dos poderes foi concebida em um contexto histórico reacionário, em um Estado Liberal que combatia o absolutismo, em que todos os poderes e as funções do Estado eram concentrados na figura do Rei.[10]
Na Constituição de 1988, o princípio da separação dos poderes é expresso no artigo 2º, da CF/88, que afirma serem poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
No que concerne ao tema ora em análise, o princípio da separação dos poderes propugna a existência de um Poder Judiciário independente, com autonomia suficiente para o fim de que não se veja a mercê da intervenção e da ingerência dos Poderes Legislativo e Executivo, formando com esses um todo harmônico, tal como imaginado desde a época de Montesquieu.
Para tanto, a Carta Magna de 1988 estabelece em seu artigo 96, inciso I, a, que compete privativamente aos tribunais “eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos”. Além disso, no seu artigo 99, a Constituição Federal, assegura ao Poder Judiciário autonomia administrativa e financeira.
Considerando o teor do artigo 96, inciso I, a,e o do artigo 99, ambos da CF/88, e diante da redação dada ao inciso I, f, e aos parágrafos do artigo 702, da CLT, pela Lei n. 13.467/2017, vê-se parecerem bem fundamentas as razões daqueles que sustentam ter a reforma trabalhista incorrido em violação ao princípio da separação dos poderes. Afinal, garantidas aos órgãos do Poder Judiciário a autonomia e a independência para elaborarem os seus regimentos internos, como poderia o legislador ordinário tratar com tamanha minúcia e exaustão a forma pela qual os Tribunais do Trabalho passarão a ter que se organizar, para o fim de estabelecer os seus enunciados de jurisprudência consolidada?
Nesse sentido, Homero Batista Mateus da Silva[11] assevera que o Poder Executivo, verdadeiro patrocinador do projeto de lei que originou a reforma trabalhista, e o Poder Legislativo, denominado pelo autor como o fiador desse projeto, não poderiam interferir no Poder Judiciário com tamanha intensidade. Segundo a posição do autor, tratar acerca do número de acórdãos necessários para o fim de que seja levada à votação uma posição jurisprudencial, sob quais circunstâncias e sobre quais requisitos essa votação ocorrerá, consiste em obra de tamanha “sofisticação” que chega a tangenciar à própria proibição da formação de jurisprudência.
Nas palavras de Homero, a reforma trabalhista, quanto à redação dada ao inciso I, f, e aos parágrafos do artigo 702, da CLT, representa intervenção de tal monta na autonomia do Poder Judiciário, que constitui verdadeira violação ao princípio da separação dos poderes, previsto no artigo 2º, da Carta Magna, já que, na prática, impõe que a Justiça do Trabalho se manifeste com menor frequência e sobre temas mais restritos.
Flávio da Costa Higa[12], ao tratar sobre a questão, recorda que o Supremo Tribunal Federal, em outras oportunidades, já decidiu que “nenhum poder estranho aos Tribunais dispõe de legitimidade jurídico constitucional para regular, em sede normativa, a própria ordem dos trabalhos judiciários” (STF – ADI 1.105-7, Pleno, DJ 27.4.2001). Ainda conforme pesquisa do autor, no mesmo sentido, a Suprema Corte afirmou que “nem o Poder Executivo e nem o Poder Legislativo podem editar normas sobre os trabalhos internos das Cortes Judiciárias” (STF, ADI 2.790-3, Pleno, DJ 12.5.2006).
Não obstante a bem fundamentada posição dos autores acima citados, vê-se, porém, que ela não é uníssona na doutrina.
Gustavo Filipe Barbosa Garcia[13] se posiciona de forma contrária ao reconhecimento da inconstitucionalidade do teor do inciso I, alínea f, e dos parágrafos 3º e 4º, acrescidos ao artigo 702, da CLT, pela Lei 13.467/2017.
Para o autor, a temática concernente aos regimentos internos e à competência e à forma de funcionamento dos órgãos jurisdicionais e administrativos dos tribunais, tal como expõe o artigo 96, inciso I, a, da Constituição Federal de 1988, não guarda correspondência com o procedimento de aprovação e a alteração de súmulas e outros enunciados de jurisprudência. Segundo pensa Gustavo Filipe, o referido preceito constitucional, na realidade, quando determina ser competência dos tribunais a elaboração dos seus regimentos internos, afirma também expressamente que esse regramento deve sempre observar as normas de processo e as garantias processuais das partes.
Em outras palavras, assevera o autor que as “normas de processo”, a exemplo daquelas que versam sobre a forma como deve se dar a elaboração dos enunciados de jurisprudências nos tribunais, devem sim ser previstas em lei, cuja competência, frisa-se, é privativa da União. Não há razão, portanto, segundo essa posição, para se defender que cabe aos tribunais legislar sobre matéria processual, seja por meio do regimento interno, seja por outras modalidades de atos administrativos e judiciários, como resoluções e instruções normativas.
Gustavo Filipe conclui a sua posição afirmando que reconhece que na esfera cível, o Código de Processo de 2015, também com natureza de lei ordinária, adotou um critério diverso no que concerne à edição dos enunciados de súmulas, remetendo o tema à “forma estabelecida” e aos “pressupostos fixados no regimento interno” (artigo 926, parágrafo 1º, do CPC) dos tribunais. Daí, segundo o autor, pode-se até se dizer que o rigor exigido pela reforma trabalhista foi excessivo, não podendo se afirmar, porém, como dito, que se trata o teor do artigo 702, da CLT, trazido pela Lei 13.467/2017, de norma inconstitucional, por violação ao princípio da separação dos poderes.
Vê-se, portanto, que o tema é controverso, existindo argumentos judiciosos nos dois sentidos.
Diante da controvérsia instaurada na comunidade jurídica, a discussão sobre a (in)constitucionalidade do artigo 702, da CLT, chegou rapidamente ao Tribunal Superior do Trabalho, órgão do Poder Judiciário que, em última análise, como visto, é por certo o principal interessado no célere deslinde da questão
Em 20 de novembro de 2017, mediante a Resolução Administrativa 1.937, o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho aprovou o novo texto do Regimento Interno dessa Corte, dando nova redação ao artigo 75, desse diploma. O inciso VII, desse artigo do Regimento, passou a afirmar que compete ao Tribunal Pleno “estabelecer ou alterar súmulas e outros enunciados de jurisprudência uniforme, pelo voto de pelo menos 2/3 (dois terços) de seus membros, caso a mesma matéria já tenha sido decidida de forma idêntica por unanimidade em, no mínimo, 2/3 (dois terços) das turmas, em pelo menos 10 (dez) sessões diferentes em cada uma delas, podendo, ainda, por maioria de 2/3 (dois terços) de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de sua publicação no Diário Oficial”.
Verifica-se que a redação trazida ao artigo 75, do Regimento Interno, do TST, pela Resolução Administrativa 1.937 é consentânea com o teor do novel artigo 702, da CLT.
Todavia, em fevereiro de 2018, nos autos do processo E-RR-696-25.2012.5.050463, a Comissão de Jurisprudência e Precedentes Normativos, do TST, emitiu parecer ao Tribunal Pleno dessa Corte, no sentido de que, entre outros vícios[14], o artigo 702, da CLT, com a redação dada pela Lei 13.467/2017, é uma norma inconstitucional, pois viola o artigo 99, da Constituição Federal, que prevê a autonomia do Poder Judiciário, afrontando, por consequência, o princípio da separação dos poderes.
Conclusão
A reforma trabalhista trouxe diversas repercussões não apenas na vida dos trabalhadores e dos empregadores, como também no meio jurídico. Diante da avassaladora quantidade de alterações promovidas pela Lei 13.467/2017 e da forma açodada com a qual se deu o processo legislativo que originou esse texto legal, todos aqueles que lidam, de alguma forma, com a Justiça do Trabalho, também tiveram o seu cotidiano afetado.
As normas de direito processual do trabalho não fugiram a essa regra. Tampouco as atividades desenvolvidas pelas Cortes Trabalhistas. A Lei 13.467/2017, ao dar nova redação ao inciso I, f, e aos parágrafos 3º e 4º, do artigo 702, da CLT, estabeleceu um rigoroso procedimento, a ser respeitado pelo Tribunal Superior do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho, quando elaborarem as suas súmulas de jurisprudência.
Parte da doutrina alega que esse minucioso regramento viola o princípio da separação dos poderes, expresso no artigo 2º, da CF/88, haja vista que, em última análise, impõe à Justiça do Trabalho uma limitação, determinando que ela se manifeste com menor frequência e sobre temas mais restritos. Outra corrente, todavia, baseando-se precipuamente no teor do artigo 96, inciso I, da CF/88, afirma que não há inconstitucionalidade a ser reconhecida. Essa segunda posição defende que os regimentos internos dos tribunais, mesmo no que concerne às regras referentes aos moldes de elaboração dos enunciados de jurisprudência, devem sempre respeitar as “normas de processo”, cuja competência é, de fato, privativa da União.
Esse tema, ao que parece, chegará de forma célere ao Supremo Tribunal Federal.
No âmbito do Tribunal Superior do Trabalho a questão já foi levada ao Pleno, por meio de relevante parecer da Comissão de Jurisprudência e Precedentes Normativos, do TST, que se posicionou pela inconstitucionalidade do artigo 702, da CLT, com a redação dada pela reforma trabalhista.
O fato de o Pleno do TST, quando ainda passados poucos dias do início da vigência da reforma trabalhista, já ter alterado o seu regimento interno, não faz com que a questão tenha perdido a importância. Afinal, diversas vozes, dentro e fora do Poder Judiciário, manifestaram-se contrárias à nova redação do artigo em comento. Ademais, conforme exposto nesse artigo, o regramento não restringe apenas a atividade do Tribunal Superior do Trabalho, vinculando também o procedimento existente nos Tribunais Regionais. Além disso, nada impede que o TST altere novamente o seu Regimento Interno, principalmente se a inconstitucionalidade for reconhecida pelos tribunais pátrios.
Por certo, as vozes contrárias ao procedimento trazido pela reforma trabalhista ganharão eco quando os jurisdicionados perceberem o quão limitada e restrita se tornará a atuação e a uniformização da jurisprudência das Cortes Trabalhistas. Por ora, resta-nos aguardar a definição das Cortes de cúpula do Poder Judiciário, acerca do tema.
Referências
CASSAR, Vólia Bomfim. Comentários à Reforma Trabalhista. 2. ed. Forense:Rio de Janeiro; Método: São Paulo, 2018.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 9 ed. São Paulo:Atlas, 2001.
OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Reforma Trabalhista. São Paulo: LTr, 2018
SANCHES, Diego Catelan. É tudo uma grande farsa, não é? In: Revista Ltr. Vol. 81, n.11 (nov.). LTr:São Paulo 2017.
SILVA, Homero Batista Mateus da. Comentários à reforma trabalhista. Análise da Lei 13.467/2017 – Artigo por artigo. 2. ed. São Paulo:RTr, 2018.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. 22 ed. São Paulo:Malheiros, 2003.
[1] SILVA, Homero Batista Mateus. Comentários à reforma trabalhista. Análise da Lei 13.467/2017 – Artigo por artigo. 2. ed. São Paulo:RTr, 2018. pp. 13-14.
[2] CASSAR, Vólia Bomfim. Comentários à Reforma Trabalhista. 2. ed. Forense:Rio de Janeiro; Método: São Paulo, 2018. pp. 13-14.
[3] SANCHES, Diego Catelan. É tudo uma grande farsa, não é? In: Revista Ltr. Vol. 81, n.11 (nov.). LTr:São Paulo 2017. p. 1323.
Disponível em: http://domtotal.com/noticia/1198946/2017/11/impactos-da-reforma-trabalhista-na-jurisprudencia-do-tst/. Acesso em: 30/05/2018.
[5] SILVA, Homero Batista Mateus. op. cit. p. 27.
[6] CASSAR, Vólia Bomfim. Op. cit. pp. 133-134.
[7] OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Reforma Trabalhista. São Paulo: LTr, 2018. pp. 103-104.
[8] MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 9 ed. São Paulo:Atlas, 2001. p. 359.
[9] MORAES, Alexandre de. op. cit. p. 359.
[10] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. 22 ed. São Paulo:Malheiros, 2003. p.109
[11] SILVA, Homero Batista Mateus. op. cit. p. 155.
[14] Diz-se entre outros vícios porque, ainda segundo o relatório da Comissão de Jurisprudência e Precedentes Normativos, o artigo 702, da CLT, foi represtinado pela reforma trabalhista, o que é vedado pelo ordenamento jurídico (artigo 2º, §1º, do DL 4657/42). Esse entendimento deriva do fato de que a Lei 7.701/88, ao reorganizar as competências do TST, havia revogado tacitamente o artigo 702, da CLT, já que o artigo 16, da lei promulgada em 1988, afirmou expressamente que estavam revogadas as disposições contrárias a este diploma.
Mestrando do programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Especialista em Direito do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP. Graduado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Procurador da Universidade de São Paulo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Mauricio Evandro Campos. A nova redação do artigo 702, da CLT, e o princípio da separação dos poderes Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 jun 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51869/a-nova-redacao-do-artigo-702-da-clt-e-o-principio-da-separacao-dos-poderes. Acesso em: 23 dez 2024.
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