RESUMO:O presente artigo tem como objetivo uma breve reflexão sobre os tribunais do MERCOSUL, os quais se diferenciam do modelo de solução de controvérsias da União Europeia em função da supranacionalidade e intergovernamentalidade.
Palavras-chave: MERCOSUL; Tribunais; Intergovernamentalidade.
1. INTRODUÇÃO
Os sistemas de solução de controvérsias assumem características distintas, de acordo com os modelos de integração presentes no cotidiano. O primeiro grande sistema de solução de controvérsias é baseado em um sistema jurídico supranacional, com poder imperativo e supremacia perante o direito interno dos Estados-membros. Este sistema exemplifica o modelo de integração regional aplicado na Europa, o qual apresenta efeito direto e aplicabilidade imediata das normas comunitárias. Há, contudo, outro modelo adotado com o objetivo de solucionar controvérsias, baseado nos Tribunais de Arbitragem. Este modelo tem caráter intergovernamental e as decisões que dele emanam não apresentam característica supranacional e nem aplicabilidade imediata ou efeito direto (MENEZES, 2000, p. 67).
O MERCOSUL adotou o segundo sistema de solução de controvérsias supracitado, ainda que, desde o Protocolo de Olivos, exista o Tribunal Permanente de Revisão.
Em breve retrospectiva, o Tratado de Assunção estabeleceu a negociação direta como primeira forma de solução de controvérsias; caso não houvesse solução oriunda das negociações diretas a lide era remetida ao Grupo Mercado Comum, o qual formularia recomendações; caso o conflito não fosse resolvido no Grupo Mercado Comum, o Conselho do Mercado Comum adotaria as medidas necessárias. No protocolo de Brasília surgiram os Tribunais arbitrais Ad Hoc, que, de acordo com a influência internacional, fizeram uso da arbitragem. O Protocolo de Olivos criou uma instância permanente, similar aos Tribunais de Alçada, convocada a pedido dos Estados-membros: o Tribunal Permanente de Revisão.
É possível dizer que o Tribunal Permanente de Revisão funciona como órgão
revisor dos laudos proferidos pelos Tribunais Arbitrais Ad Hoc, como órgão julgador, em única instância, na hipótese de acesso direto ao Tribunal Permanente de Revisão, como órgão competente para apreciar pedidos de medidas excepcionais e de urgência, e, por fim, como órgão consultivo, competente para emitir opiniões consultivas (MARTINS FILHO, 2010, p. 37).
Entende-se por opinião consultiva, de acordo com o terceiro artigo do Regulamento do Protocolo de Olivos,
o pronunciamento fundamentado do Tribunal Permanente de Revisão em torno de perguntas de caráter jurídico referentes à interpretação e aplicação das normas do MERCOSUL em algum caso concreto, com o objetivo de resguardar sua aplicação uniforme no território dos Estados-membros (RODAS, 2008, p. 10).
O alcance das opiniões consultivas é limitado à normativa comum: tanto as originárias, referentes ao Tratado e os Pactos celebrados, quanto as derivadas, oriundas dos órgãos decisórios do MERCOSUL. É vedada, portanto, a manifestação sobre temas de direito interno dos Estados-membros. Vale salientar, outrossim, que, de acordo com o estabelecido no artigo 11 do Regulamento do Protocolo de Olivos, as opiniões consultivas emitidas pelo Tribunal Permanente de Revisão não serão vinculantes e nem obrigatórias.
Os artigos 03 e 04 do Regulamento do Protocolo de Olivos estabelecem que podem solicitar as opiniões consultivas do Tribunal Permanente de Revisão (I) os Estados-membros; (II) os órgãos decisórios do MERCOSUL (Conselho Mercado Comum e Comissão de Comércio do MERCOSUL) e (III) o Parlamento do MERCOSUL.
Em relação à competência do Tribunal Permanente de Revisão vale salientar que existem três variações, quais sejam: (I) competência concorrente; (II) competência de revisão e (III) competência consultiva.
A competência concorrente se estabelece quando, finda a fase política sem a resolução da controvérsia, a parte poderá, de acordo com o Protocolo de Olivos, proceder de duas formas: a reclamação poderá ser submetida a um Tribunal Arbitral Ad Hoc, constituído especialmente para analisar a lide, ou poderá ser remetida ao Tribunal Permanente de Revisão, que funcionará como única instância. Já a competência de revisão configura o Tribunal Permanente de Revisão como instância recursal. A competência consultiva, por fim, refere-se à solicitação de opiniões consultivas ao Tribunal Permanente de Revisão. Vale salientar que apenas os órgãos da organização de integração com capacidade decisória possuem legitimidade para provocar a consulta. Os Estados-membros, isoladamente, não se encontram legitimados a solicitar opiniões consultivas, pois “legitimidade ativa se dá apenas quando atuarem de forma conjunta, ou seja, por meio de consenso quanto ao objeto e ao conteúdo da consulta, que deve ser apresentada ao Tribunal Permanente de Revisão pela Presidência Pró Tempore (VASCONCELOS, 2009, p.21)”. Os Tribunais Nacionais dos Estados-membros “têm legitimidade ativa apenas no que se refere às questões relacionadas com causas que estejam em tramitação no judiciário do Estado-parte, ao qual pertencem (Idem)”.
As opiniões emitidas pelo Tribunal Permanente de Revisão, conforme o décimo primeiro artigo do Regulamento do Protocolo de Olivos supracitado, não apresentam efeitos vinculantes ou obrigatórios, servindo, apenas, como orientação para a aplicação do direito regional.
O Protocolo de Olivos manteve o procedimento arbitral ad hoc do Protocolo de Brasília quando não tiver sido possível solucionar a controvérsia através de meios diplomáticos e políticos.
O Tribunal Arbitral Ad Hoc
é composto por três árbitros e se constitui com a indicação de cinco, sendo que dois deles tornam-se suplentes. Dois são indicados por cada uma das partes litigantes e o quinto por consenso. [...] O Tribunal Ad Hoc pode realizar reuniões em qualquer um dos Estados-parte e é constituído para julgar controvérsias específicas, dissolvendo-se tão logo a questão em litígio seja solucionada. Os honorários dos árbitros correm por conta do Estado que os designou (VASCONCELOS, 2009, p. 17).
A RES. Nº 54/03 criou o Tribunal Administrativo Laboral do MERCOSUL, o qual é a única instância jurisdicional para resolver reclamações referentes à área administrativa e trabalhista dos funcionários do MERCOSUL.
O Tribunal Administrativo Laboral é composto por quatro membros titulares indicados pelo Estados-membros, que serão designados pelo Grupo Mercado Comum por dois anos, renováveis por igual período. Os membros deverão ser juristas e, se possível, com experiência em questões administrativas e trabalhistas.
Os funcionários do MERCOSUL, mesmo depois de terminado o cargo, e toda pessoa contratada para obras e serviços na esfera do MERCOSUL possuem legitimidade para recorrer ao Tribunal Administrativo Laboral.
A supranacionalidade, característica do modelo europeu, impõe a prevalência das decisões comunitárias sobre o interesse dos Estados-membros, através de uma estrutura institucional autônoma e independente.
A intergovernamentalidade adotada pelo processo de integração do MERCOSUL, todavia, tem como característica a relação de dependência entre as decisões do bloco econômico e a vontade política dos Estados-membros.
O sistema de solução de controvérsias do MERCOSUL não alcançou o nível de integração da União Europeia, contudo pode ser considerado “um instrumento original e adaptado ao nível de desenvolvimento do processo de integração [...], fortalecendo-o (ARAUJO, 2008, p. 153)”, de acordo com as suas limitações.
REFERÊNCIAS
ARAUJO, Nadia de. O 2º Laudo do Tribunal Permanente de Revisão: Questões Processuais na Consolidação do Sistema de Revisão. Revista Brasileira de Arbitragem, São Paulo, v. III, n. 12, p.148-158, 2007.
MARTINS FILHO, Marcos Simões. A solicitação de opiniões consultivas ao tribunal permanente de revisão do MERCOSUL: a técnica para que sejam realizadas consultas pelo judiciário brasileiro. 2010. 197 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Direito, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2010. Disponível em: https://goo.gl/wZ4lRG. Acesso em: 28 nov. 2016.
MENEZES, Wagner. Lineamentos para a sistematização do estudo do Direito da Integração. Revista dos Tribunais, São Paulo, ano 89, v. 773, p. 52 – 73, mar. 2000.
RODAS, João Grandino. A Competência do Tribunal Permanente de Revisão do Mercosul para emitir Opiniões Consultivas. 2008. Disponível em: https://goo.gl/oOmURO. Acesso em: 28 nov. 2016.
VASCONCELOS, Raphael Carvalho de. O Sistema de Solução de Controvérsias do MERCOSUL. Revista Ética e Filosofia Política, Juiz de Fora, v. 11, n. 2, p.01-30, jun. 2009.
Universidade Federal da Paraíba. Graduando em Direito.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAMOS, Victor Alexandre Costa de Holanda. Tribunais do MERCOSUL e os reflexos da intergovernamentalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jun 2018, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51946/tribunais-do-mercosul-e-os-reflexos-da-intergovernamentalidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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