Resumo: Este presente artigo terá por objeto as características gerais da manifestação bilateral da Administração, ou seja, dos contratos administrativos, bem como o âmbito de incidência das cláusulas exorbitantes, previstas no art. 58 da Lei n° 8.666/93, especialmente no que se refere à aplicação de sanções administrativas ao contratado particular.
Palavras-chaves: Contratos administrativos. Cláusulas exorbitantes. Sanções administrativas. Alcance territorial
Sumário: 1. Introdução – 2. Contratos administrativos – 3. Características dos contratos administrativos – 4. Aplicação de sanções administrativas pela inexecução total ou parcial do ajuste – 4.1 Alcance territorial das sanções dos incisos III e IV do art. 87 da Lei n° 8.666/93 – 5. Conclusão – 6. Referências
1. INTRODUÇÃO
A manifestação do Poder Público pode ocorre de três formas:
a) unilateralmente, através da edição de atos administrativos;
b) bilateralmente, através dos contratos administrativos;
c) multilateralmente, através de convênios e consórcios, atos administrativos complexos, nos quais os particulares aderem à vontade da Administração Pública, para que ambos alcancem o mesmo objetivo, ou através dos contratos de consórcios públicos, regulados pela Lei 11.107/05.
Assim, pode-se dizer que os contratos administrativos são ajustes firmados entre a Administração Pública e o particular, para execução de atividades de interesse público[1]. Sua principal característica é o desequilíbrio contratual em favor do Poder Público, materializando-se através das chamadas cláusulas exorbitantes, em detrimento do interesse particular do contratado.
Conforme será demonstrado, referidas cláusulas decorrem diretamente da Lei, não existindo espaço contratual para serem negociados, razão pela qual pode-se dizer que os contratos administrativos são predominantemente regidos pelo direito público.
Dentre essas cláusulas, o presente artigo dará destaque à aplicação das sanções administrativas, em casos de inexecução parcial ou total do contrato firmado, bem como ao seu alcance territorial, ou seja, se se limita apenas ao ente federativo que aplicou a penalidade ou a todas as esferas de governo.
2. Contratos Administrativos
São regidos predominantemente pelo regime de direito público, cujo interesse público defendido é o primário, ou seja, da coletividade.
Há uma relação de verticalidade, já que há um desequilíbrio natural em favor do Poder Público, pois este está em uma posição de supremacia em relação ao particular, em razão da presença das cláusulas exorbitantes que são cláusulas legais, independentes de previsão contratual (salvo a multa), que asseguram prerrogativas específicas à Administração Pública, dando contorno público ao contrato celebrado pelo Poder Público e estabilizando o vínculo contratual em favor da Administração.
O STJ reconhece a sua natureza de documento público[2], pois emana de ato do Poder Público, logo é título executivo extrajudicial (art. 784, II/CPC), dotado de exigibilidade, certeza e liquidez, uma vez que as obrigações estipuladas ao contratado estão especificadas no contrato e no ato convocatório do certame.
3. Características dos Contratos Administrativos
Os contratos administrativos apresentam 5 (cinco) principais características:
a) Formalismo
Os contratos devem observar formalidades para que sejam válidos, ou seja, serem redigidos, publicados, registrados, arquivados etc. assim, vigora o princípio da solenidade das formas, pelo qual o Estado, por gerir bens públicos, deve atuar de forma transparente. Por outro lado, os contratos privados são regidos pelo princípio da liberdade das formas, podendo os particulares pactuarem livremente, salvo se a lei proibir expressamente.
O art. 55 elenca as cláusulas essenciais dos contratos administrativos. Com relação ao prazo para publicação do contrato, deve-se observar o que prevê o art. 21, parágrafo 1º, Lei nº 8.666/93.
Em razão dessas formalidades, o contrato administrativo deve ser escrito, sendo, via de regra, nulos quando verbais.
Somente são admissíveis contratos verbais excepcionalmente, quando de compras até o valor de R$ 4 mil feitas em regime de adiantamento (art. 60, parágrafo único, Lei nº 8.666/93), isto é, quando o administrador recebeu um adiantamento para fazer frente às despesas futuras de pequeno valor.
b) Celebração Intuitu Personae
Aquele que é contratado deve celebrar o objeto do contrato, não cabendo, em regra, a cessão contratual pelo Princípio da Impessoalidade e da obrigatoriedade da licitação.
A Lei de Licitações, no entanto, chega a mitigar esta característica da celebração intuitu personae nos arts. 72 e 78, VI, Lei nº 8.666/93. Ao permitir a subcontratação, ainda que parcial, a lei tolera que pessoa não participante da licitação execute obrigação contida no contrato administrativo excepcionalmente.
Na hipótese de subcontratação do art. 72, Lei nº 8.666/93, não há desconsideração do contrato intuitu personae, pois o subcontratante (vencedor da licitação) continua responsável perante a Administração contratante.
O art. 78, Lei nº 8.666/93, em seu inciso VI, prevê como hipótese de rescisão contratual a subcontratação parcial ou integral quando não houver previsão contratual ou editalícia. Atenua, pois, o rigor do caráter intuitu personae do contrato administrativo.
c) Onerosidade
Em regra, os contatos administrativos são onerosos, têm um custo, até porque os bens públicos só podem ser transferidos de forma gratuita a particulares excepcionalmente.
d) Comutatividade
Os contratos administrativos são comutativos, ou seja, deve haver proporção entre as obrigações das partes contratantes. O que a Administração paga deve corresponder ao serviço prestado ou ao produto fornecido.
Portanto, deve haver uma manutenção das condições apresentadas pelo licitante na proposta, conforme prevê o art. 37, inciso XIX/CR, vigorando o princípio da preservação do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.
e) Cláusulas Exorbitantes
O emprego das cláusulas exorbitantes independe de previsão contratual, pois são prerrogativas do Poder Público em face do particular, cujo principal objetivo é garantir a continuidade do serviço público.
Estas cláusulas estabilizam o contrato em favor da Administração por trazerem prerrogativas legais que beneficiam a Administração, sendo impensáveis nos ajustes firmados entre particulares. O art. 58 da Lei nº 8.666/93 traz um rol exemplificativo de cláusulas exorbitantes:
Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de:
I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado;
II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei;
III - fiscalizar-lhes a execução;
IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste;
V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo.
§1° As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos contratos administrativos não poderão ser alteradas sem prévia concordância do contratado.
§ 2° Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual.
Dentre as cláusulas exorbitantes possíveis de aplicação pela Administração Pública, dar-se-á destaque, no presente trabalho, à aplicação das sanções.
4. Aplicação de Sanções ADMINISTRATIVAS pela inexecução total ou parcial do ajuste
Primeiramente, deve-se destacar o papel da fiscalização, exercido pela Administração Pública, na promoção do acompanhamento e fiscalização da execução dos serviços pelos contratados, os quais se vinculam aos termos da licitação e da proposta vencedora (art. 3°, caput, 7°, § 2°, inciso II, 40, §2°, inciso II, 44, caput, 54, § 1°, 55, inciso XI, e 66, caput todos da Lei n° 8.666/93).
Dessa forma, cabe ao licitante cumprir as determinações editalícias.
Aquele que deu causa ao inadimplemento, total ou parcial, do contrato estará sujeito a sofrer a aplicação de sanções, conforme o pactuado pelos contratantes. Essa prerrogativa está no inciso IV do art. 58 da Lei de Licitações.
As chamadas sanções administrativas estão elencadas nos arts. 86 a 88 da referida lei:
Art. 86. O atraso injustificado na execução do contrato sujeitará o contratado à multa de mora, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato.
§ 1o A multa a que alude este artigo não impede que a Administração rescinda unilateralmente o contrato e aplique as outras sanções previstas nesta Lei.
§ 2o A multa, aplicada após regular processo administrativo, será descontada da garantia do respectivo contratado.
§ 3o Se a multa for de valor superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, a qual será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou ainda, quando for o caso, cobrada judicialmente.
Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
§ 1o Se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responderá o contratado pela sua diferença, que será descontada dos pagamentos eventualmente devidos pela Administração ou cobrada judicialmente.
§ 2o As sanções previstas nos incisos I, III e IV deste artigo poderão ser aplicadas juntamente com a do inciso II, facultada a defesa prévia do interessado, no respectivo processo, no prazo de 5 (cinco) dias úteis.
§ 3o A sanção estabelecida no inciso IV deste artigo é de competência exclusiva do Ministro de Estado, do Secretário Estadual ou Municipal, conforme o caso, facultada a defesa do interessado no respectivo processo, no prazo de 10 (dez) dias da abertura de vista, podendo a reabilitação ser requerida após 2 (dois) anos de sua aplicação. (Vide art 109 inciso III)
Art. 88. As sanções previstas nos incisos III e IV do artigo anterior poderão também ser aplicadas às empresas ou aos profissionais que, em razão dos contratos regidos por esta Lei:
I - tenham sofrido condenação definitiva por praticarem, por meios dolosos, fraude fiscal no recolhimento de quaisquer tributos;
II - tenham praticado atos ilícitos visando a frustrar os objetivos da licitação;
III - demonstrem não possuir idoneidade para contratar com a Administração em virtude de atos ilícitos praticados.
É sabido que as cláusulas exorbitantes não precisam constar do contrato. A exceção é a multa, que depende de previsão no edital ou no contrato firmado pelas partes.
As sanções podem ser aplicadas de forma prévia ou concomitante à rescisão. Em regra, não são cumulativas, salvo a multa (art. 87, parágrafo 2°).
Nesse sentido, cabe citar os seguintes precedentes do Tribunal Regional Federal da 2ª Região:
3- Uma vez averiguada a inexecução parcial ou total, bem como o atraso injustificado do contrato, condutas previstas nos arts. 86 e 87 da Lei nº 8.666/93, nasce para o agente administrativo o dever de tomar as providências cabíveis, instaurando o devido processo administrativo, a fim de aplicar as sanções preceituadas. Trata-se a toda vista, de ato vinculado. (AMS 200551010068401[3])
II. Dentre as prerrogativas da Administração Pública encontra-se o poder/dever de impor sanções às pessoas que com ela firmam relações contratuais sem a necessidade de prévio provimento judicial, notadamente em razão de inadimplências obrigacionais, seja por atraso no cumprimento da prestação, seja por inexecução parcial ou integral do objeto contratado. AC 9402213961[4]
Basicamente são 4 (quatro) as sanções: multa, advertência, suspensão de contratar e declaração de inidoneidade.
A suspensão de contratar impossibilita o particular de contratar com o Poder Público por até 2 anos. A declaração de inidoneidade, por sua vez, inibe a empresa de licitar ou contratar com a Administração Pública, não havendo prazo legal máximo para seus efeitos, contudo o parágrafo 3° do art. 87 permite que depois de 2 anos, o particular peça reabilitação, apesar de haver discricionariedade do administrador.
Ambas as sanções dos incisos III e IV do art. 87 produzem efeitos ex nunc: não retroagem a ponto de desconstituírem uma relação contratual já firmada, entendimento já firmado pelo STJ. Ademais, não têm o condão de extinguir relação contratual em curso com outro ente da Administração, mas tão somente impedirá novas contratações.
No entanto, a esfera autônoma de atuação administrativa permite que tais contratos sejam rescindidos, desde que observados os art. 77 a 80 da Lei.
Confira-se o seguinte julgado do STJ, nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR E CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EFEITOS EX NUNC DA DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE: SIGNIFICADO. PRECEDENTE DA 1a. SEÇÃO (MS 13.964/DF, DJe DE 25.5.2009).
1. Segundo precedentes da 1a. Seção, a declaração de inidoneidade só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento (MS 13.101/DF, Min. Eliana Calmon, DJe de 9.12.2008). Afirma-se, com isso, que o efeito da sanção inibe a empresa de licitar ou contratar com a Administração Pública (Lei 8666/93, art. 87), sem, no entanto, acarretar, automaticamente, a rescisão de contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente e em curso de execução, notadamente os celebrados perante outros órgãos administrativos não vinculados à autoridade impetrada ou integrantes de outros entes da Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios). Todavia, a ausência do efeito rescisório automático não compromete nem restringe a faculdade que têm as entidades da Administração Pública de, no âmbito da sua esfera autônoma de atuação, promover medidas administrativas específicas para rescindir os contratos, nos casos autorizados e observadas as formalidades estabelecidas nos artigos 77 a 80 da Lei 8.666/93.
2. No caso, está reconhecido que o ato atacado não operou automaticamente a rescisão dos contratos em curso, firmados pelas impetrantes.
3. Mandado de segurança denegado, prejudicado o agravo regimental (MS 14.002/DF, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 6.11.2009).
Em face das sanções aplicadas, é comum que os sócios da contratada desejem formar uma nova pessoa jurídica, com os mesmos objetivos, para estabelecerem novo contrato com a Administração. Tal hipótese configura abuso de poder, e, com base no art. 50 do Código Civil, permite a desconsideração da personalidade jurídica. Entretanto, no âmbito do Direito Público, não há previsão semelhante expressa em lei. A despeito disso, o STJ já admitiu a desconsideração nos casos de contratos administrativos, até por aplicação do princípio da juridicidade, que amplia o conceito de legalidade:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. SANÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR. EXTENSÃO DE EFEITOS À SOCIEDADE COM O MESMO OBJETO SOCIAL, MESMOS SÓCIOS E MESMO ENDEREÇO. FRAUDE À LEI E ABUSO DE FORMA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NA ESFERA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA E DA INDISPONIBILIDADE DOS INTERESSES PÚBLICOS.
- A constituição de nova sociedade, com o mesmo objeto social, com os mesmos sócios e com o mesmo endereço, em substituição a outra declarada inidônea para licitar com a Administração Pública Estadual, com o objetivo de burlar à aplicação da sanção administrativa, constitui abuso de forma e fraude à Lei de Licitações Lei n.º 8.666/93, de modo a possibilitar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica para estenderem-se os efeitos da sanção administrativa à nova sociedade constituída.
- A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, desconsiderar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular.
- Recurso a que se nega provimento. (RMS 15166 / BA; RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2002/0094265-7; Relator(a) Ministro CASTRO MEIRA; Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA; Data do Julgamento 07/08/2003; Data da Publicação/Fonte DJ 08/09/2003 p. 262 RDR vol. 27 p. 378 RSTJ vol. 172 p. 247)
4.1 alcance TERRITORIAL das sanções dos incisos III e IV do art. 87 da lei n° 8.666/93
A doutrina se divide sobre a abrangência territorial das sanções administrativas previstas pela Lei n° 8.666/93, em outras palavras, se elas se limitam ao ente que as aplicou ou a Administração Pública como um todo.
Hely Lopes Meirelles[5] entende que as sanções se limitam ao ente federativo em que a sanção foi aplicada, com base na autonomia dos entes federativos e da regra constitucional da licitação, que deve ser regida pela competitividade, logo a restrição dos efeitos territoriais permite uma maior competição nas licitações dos outros entes.
Maria Sylvia Di Pietro[6], numa posição intermediária, defende que o efeito sancionatório é extensivo para a declaração (deve ser recepcionada pelos outros entes) e restritivo para a suspensão. Para o autor, como o art. 87, IV, Lei 8.666/93, faz alusão à "Administração Pública", cujo conceito está no art. 6°, XI, da mesma lei, a sanção deve ser estendida a todos os entes federativos.
De outro modo, como o art. 87, III, Lei 8.666/93, faz alusão à "Administração", cujo conceito está no art. 6°, XII, da mesma lei, a sanção deve ficar restrita ao ente em que foi aplicada.
José dos Santos Carvalho Filho[7], numa interpretação teleológica do artigo, entende que o efeito é sempre extensivo, e a sanção deve ser aplicada ante todos os entes federativos, pois, em sua visão, o objetivo do legislador foi justamente inflingir ao contratante violador um selo de inidoneidade perante toda a Administração Pública, sob pena de colocar em risco o interesse público e a moralidade administrativa.
O STJ defende que as sanções se estendem para todos os entes da federação em qualquer dos casos:
ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE EXARADA PELO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. IMPOSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. APLICAÇÃO A TODOS OS ENTES FEDERADOS.
1. A questão jurídica posta a julgamento cinge-se à repercussão, nas diferentes esferas de governo, da emissão da declaração de inidoneidade para contratar com a Administração Pública, prevista na Lei de Licitações como sanção pelo descumprimento de contrato administrativo.
2. Insta observar que não se trata de sanção por ato de improbidade de agente público prevista no art. 12 da Lei 8.429/1992, tema em que o Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência limitando a proibição de contratar com a Administração na esfera municipal, de acordo com a extensão do dano provocado. Nesse sentido: EDcl no REsp 1021851/SP, 2a. Turma, Relatora Ministra Eliana Calmon, julgado em 23.6.2009, DJe 6.8.2009.
3. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: (...) IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública (art. 87 da Lei 8.666/1993).
4. A definição do termo Administração Pública pode ser encontrada no próprio texto da citada Lei, que dispõe, em seu art. 6o., X, que ela corresponde à Administração Direta e Indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas.
5. Infere-se da leitura dos dispositivos que o legislador conferiu maior abrangência à declaração de inidoneidade ao utilizar a expressão Administração Pública, definida no art. 6o. da Lei 8.666/1993. Dessa maneira, conseqüência lógica da amplitude do termo utilizado é que o contratado é inidôneo perante qualquer órgão público do País. Com efeito, uma empresa que forneça remédios adulterados a um município carecerá de idoneidade para fornecer medicamentos à União.
6. A norma geral da Lei 8.666/1993, ao se referir à inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, aponta para o caráter genérico da referida sanção, cujos efeitos irradiam por todas as esferas de governo.
7. A sanção de declaração de inidoneidade é aplicada em razão de fatos graves demonstradores da falta de idoneidade da empresa para licitar ou contratar com o Poder Público em geral, em razão dos princípios da moralidade e da razoabilidade.
8. O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento de que o termo utilizado pelo legislador - Administração Pública -, no dispositivo concernente à aplicação de sanções pelo ente contratante, deve se estender a todas as esferas da Administração, e não ficar restrito àquela que efetuou a punição.
9. Recurso Especial provido (REsp. 520.553/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 10.2.2011).
ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO DE PARTICIPAÇÃO EM LICITAÇÕES. MANDADO DE SEGURANÇA. ENTES OU ÓRGÃOS DIVERSOS. EXTENSÃO DA PUNIÇÃO PARA TODA A ADMINISTRAÇÃO.
1. A punição prevista no inciso III do artigo 87 da Lei nº 8.666/93 não produz efeitos somente em relação ao órgão ou ente federado que determinou a punição, mas a toda a Administração Pública, pois, caso contrário, permitir-se-ia que empresa suspensa contratasse novamente durante o período de suspensão, tirando desta a eficácia necessária. 2. Recurso especial provido. (REsp 174.274/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/10/2004, DJ 22/11/2004 p. 294)
ADMINISTRATIVO – MANDADO DE SEGURANÇA – LICITAÇÃO – SUSPENSÃO TEMPORÁRIA – DISTINÇÃO ENTRE ADMINISTRAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA - INEXISTÊNCIA – IMPOSSIBILIDADE DE PARTICIPAÇÃO DE LICITAÇÃO PÚBLICA – LEGALIDADE – LEI 8.666/93, ART. 87, INC. III.
- É irrelevante a distinção entre os termos Administração Pública e Administração, por isso que ambas as figuras (suspensão temporária de participar em licitação (inc. III) e declaração de inidoneidade (inc. IV) acarretam ao licitante a não-participação em licitações e contratações futuras.
- A Administração Pública é una, sendo descentralizadas as suas funções, para melhor atender ao bem comum.
- A limitação dos efeitos da 'suspensão de participação de licitação não pode ficar restrita a um órgão do poder público, pois os efeitos do desvio de conduta que inabilita o sujeito para contratar com a Administração se estendem a qualquer órgão da Administração Pública.
- Recurso especial não conhecido (REsp nº 151.567, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ 14.04.2003).
5. CONCLUSÃO
Percebe-se, portanto, que a Administração deve conduzir seus trabalhos em estrita observância às regras estampadas na legislação vigente, devendo aplicar as penalidades cabíveis, em caso de inexecução parcial ou total pelo contratado, não decorrendo de mera escolha do gestor público.
Ao contrário, cabe à Administração dar cumprimento à regra constante na Lei de Licitações, fazendo garantir a aplicação das sanções administrativas previstas na legislação, as quais, quando aplicadas, não devem se limitar à esfera das quais foram originadas, mas terem aplicação em todos os entes federados.
6. REFERÊNCIAS
- Cretella Júnior, José. Das Licitações Públicas , ed. Forense, 2ª edição, p. 341, 2003).
- Justen Filho, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos , ed. Aide: 2003, 4ª edição, p. 476
- Meirelles, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 31º.ed. São Paulo: Malheiros Editora, 2005, p. 243
- Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 25ª. ed. São Paulo, Atlas, 2012, p. 281
- Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 30. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2016, p. 305
- Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos – 4ª. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015
[1] Oliveira, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos – 4ª. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015, p. 206
[2] AgInt no REsp 1523938 / RS - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2015/0071004-2
[3] Fonte: E-DJF2R - Data::06/12/2010 - Página::299
[4] Fonte: DJU - Data::05/11/2007 - Página::220
[5] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 31º.ed. São Paulo: Malheiros Editora, 2005, p. 243
[6] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 25ª. ed. São Paulo, Atlas, 2012, p. 281
[7] Carvalho Filho, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 30. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Atlas, 2016, p. 305
Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense/RJ<br>Advogada da União. Pós-Graduada em Especialização em Direito Constitucional.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: KABOUDI, Layla. A aplicação de sanções administrativas nos contratos administrativos e sua abrangência territorial Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 ago 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52123/a-aplicacao-de-sancoes-administrativas-nos-contratos-administrativos-e-sua-abrangencia-territorial. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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