MAURO PASSETI
(Orientador)
Resumo: O presente artigo trata sobre o instituto da imunidade tributária prevista na alínea “d”, inciso VI, do art. 150 da CF/88, também conhecida como imunidade cultural. Visa abordar, em especial, as características dessa imunidade, bem como as controvérsias jurisprudenciais que existiam em torno de algumas peculiaridades desse instituto, mais precisamente no que abrangia aos livros eletrônicos. Por fim, será feita uma análise, tendo em vista as decisões mais recentes, sobretudo do Supremo Tribunal Federal, a qual tende a prevalecer nos Tribunais pátrios dentro do contexto atual de constante evolução.
Palavras-chave: “Imunidade Tributária”; “Imunidade Cultural”; “Livros Eletrônicos”; “Natureza Jurídica”; “Jurisprudência”.
Abstract: This article deals with the institute of tax immunity provided for in item "d", item VI, of art. 150 of CF / 88, also known as cultural immunity. It aims to address, in particular, the characteristics of that immunity, as well as the jurisprudential controversies that existed around some peculiarities of that institute, more precisely that which covered electronic books. Finally, an analysis will be made, in view of the most recent decisions, especially of the Federal Supreme Court, on which position prevails in the Courts of the courts within the current context of constant evolution.Keywords: “Immunity”; “Tax”; “Cultural Immunity”; “Electronic Books”; “Legal Nature”; “Jurisprudence”.
Sumário: 1. Introdução. 2. Limitações constitucionais ao poder de tributar: imunidades. 2.1. A Imunidade Tributária Cultural. 3. A Imunidade dos livros eletrônicos. 4. Conclusões. Referências.
1. Introdução
A Constituição Federal de 1988, ao tratar das limitações do poder de tributar no artigo 150, elenca algumas ocorrências em que será vedada à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos.
Assim, visando a proteção de valores que a República Federativa do Brasil considera essenciais, sejam de cunho político, social, cultural ou moral, foram estabelecidas situações que serão imunes à incidência de impostos.
Dentre as imunidades arroladas no artigo 150, inciso VI, da CF/88, será destacada nesta obra a que consta na alínea “d”, que dispõe ser vedado instituir impostos sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão.
Nesse sentido, primeiramente, será abordada nessa obra as limitações ao poder de tributar do Estado, e até que ponto este pode adentrar na esfera privada do indivíduo, destacando dentre essas limitações o instituto da imunidade tributária.
E partindo desse trâmite, será abordada algumas características das imunidades tributárias pertinentes ao trabalho apresentado, tal como a de caráter objetivo, a diferenciação entre imunidade e isenção, bem como o direcionamento à imunidade prevista na alínea “d”, inciso VI, do art. 150, da CF/88, dentro dessas classificações.
Por último, portanto, o enfoque central vai tratar da imunidade cultural, que é aquela atribuída aos livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão, a qual a Constituição é clara ao vedar a cobrança de impostos relativos a tais bens. A discussão gira em torno se seriam os atuais livros eletrônicos abarcados por esta imunidade, uma vez que o meio de veiculação dos mesmos não ocorre através do papel impresso.
Será analisado o julgamento proferido anteriormente pelo STF, através do voto do Ministro Eros Grau e o entendimento que este possuía acerca dos livros eletrônicos, bem como, em contraponto, será abordada a posição atual do STF, recentemente divulgada.
O presente trabalho, portanto, visa esclarecer alguns institutos que giram em torno da controvérsia dos chamados e-books, trazendo entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do assunto, que, ao que tudo indica, parece ter sido pacificado no âmbito do STF com a seguinte tese:
“A imunidade tributária constante do art. 150, VI, “d”, da Constituição Federal (CF), aplica-se ao livro eletrônico (“e-book”), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo.”
STF. Plenário. RE 330817/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 8/3/2017
Diante do exposto, percebe-se que o presente trabalho traçará o caminho que levou o STF a tal entendimento, bem como analisará a referida conclusão dentro do contexto evolutivo atual.
2. Limitações constitucionais ao poder de tributar: imunidades.
A supremacia do interesse público sobre o privado coloca o Estado numa posição de preponderância em suas relações com particulares, especialmente no que tange ao bem comum da sociedade. No entanto, este poder estatal de interferir na esfera individual não é absoluto, não sendo, portanto, ilimitada a possibilidade de cobrança de tributos.
Logo, o poder de tributar do Estado encontra limites, e alguns desses estão elencados na CF/88, artigo 150[1], sendo a imunidade um dos institutos jurídicos que excepcionam a ocorrência do fato gerador, ou seja, trata-se de uma não incidência constitucional de tributo.
Pode-se afirmar, portanto, que quando a própria Constituição delimita a competência do ente federativo, impedindo-o de definir determinadas situações como hipóteses de incidência de tributos, está se falando do instituto da imunidade.
A imunidade algumas vezes é confundida com o instituto da isenção que, por sua vez, trata-se da dispensa LEGAL, do pagamento do tributo. Verifica-se, portanto, que enquanto a imunidade é uma dispensa prevista na Constituição Federal, a isenção pode ser concedida por meio de lei de competência do ente político instituidor do tributo.
A imunidade tributária pode ser classificada de diversas formas, quais sejam: quanto ao parâmetro para concessão – que podem ser subjetivas, objetivas e mistas; quanto à origem – ontológicas e políticas; quanto ao alcance – gerais e específicas; quanto à forma – explícitas e implícitas; e quanto à necessidade regulamentação – incondicionadas e condicionadas.
Antes de adentrar especificamente na imunidade cultural, cumpre tecer breves explanações acerca dessa classificação.
A imunidade subjetiva leva em consideração as pessoas beneficiadas, enquanto a imunidade objetiva leva dispõe que o bem que é imune. Por sua vez, a imunidade mista leva em consideração as duas coisas ao mesmo tempo. Como exemplo de imunidade subjetiva, destaca-se a prevista na alínea “a”, inciso VI, do art. 150, da CF/88, no que tange o patrimônio, renda ou serviços dos entes públicos. Nota-se aqui que a pessoa que está sendo tributada que será relevante para a incidência ou não do tributo, no caso, são os entes públicos. Já a imunidade objetiva se observa na norma que trata sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão, que será visto com mais detalhe adiante. Por fim, a imunidade mista se encontra presente ao tratar do ITR, cuja imunidade prevista no art. 153, §4º, II, da CF/88, leva em consideração os dois aspectos.
A imunidade ontológica diz respeito ao seu caráter fundamental, cuja a existência não traz maiores controvérsias e se justifica no princípio da isonomia, a exemplo da imunidade tributária recíproca, que visa assegurar o pacto federativo. A política trata de uma opção do legislador, que escolheu imunizar certas situações por conta de política tributária, visando outros interesses.
A de alcance geral, como o próprio nome alude, estabelece vedação a todos os entes tributantes, ao passo que a específica restringe a apenas um tributo de competência de uma dada pessoa jurídica.
As imunidades consideradas explícitas são aquelas expressas no texto constitucional, enquanto as implícitas seriam extraídas de princípios constitucionais, e não da norma escrita.
Por fim, existem as imunidades incondicionadas, que não necessitam de nenhuma regulamentação para que possam produzir efeitos, e as condicionadas, que ao contrário, carecem de regulamentação, ou sejam, precisam preencher certos requisitos para que possam gozar do benefício da imunidade.
Após análise perfunctória, portanto, de como podem ser classificadas as imunidades tributárias, o tópico a seguir abordará especificamente sobre a imunidade cultural e o seu enquadramento dentro da classificação acima explicada.
2.1 A Imunidade Tributária Cultural.
A imunidade concedida aos livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão surgiu com o escopo de acabar com a censura indireta que estes sofriam quando o conteúdo apresentado era contrário às ideias do governo, posto que nesses casos era demasiadamente onerado o imposto cobrado. Esta situação perdurou durante a ditadura conhecida como o Estado Novo, no governo de Getúlio Vargas, vindo a ser conferida a imunidade tributária ao papel, somente com a Constituição Federal de 1946.
Desse modo, pode-se concluir o porquê desta imunidade ser chamada de cultural, visto que foi criada com o intuito de garantir a liberdade de expressão, bem como divulgar a cultura e o ensino.
Conforme visto linhas acima, as imunidades tributárias podem ser classificadas em imunidades subjetivas ou objetivas, no que tange ao parâmetro para concessão. A primeira leva em consideração as pessoas que serão beneficiadas pela imunidade; a segunda, por sua vez, o objeto, recai sobre bens, não sobre pessoas.
Pode-se concluir, portanto, que a imunidade tributária conferida na alínea “d”, inciso VI, do art. 150 da CF/88, traz uma espécie de imunidade puramente objetiva, pois recai sobre “livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão”.
É importante frisar que não importa o conteúdo veiculado, a CF/88 não fez restrição alguma no sentido de só conferir imunidade aos livros, jornais e periódicos que tivessem apenas um conteúdo educativo ou cultural. Logo, é vedado ao legislador infraconstitucional restringir algo que o constituinte não fez, tendo o Supremo Tribunal Federal já se posicionado neste sentido, tendo como o exemplo clássico, o álbum de figurinhas, cuja imunidade tributária é pacífica.
Tal norma constitucional possui eficácia plena e aplicabilidade imediata, sendo, portanto, uma imunidade tributária incondicionada, de modo que não necessita de regulamentação nenhuma para que produza todos os seus efeitos de direito.
É uma imunidade de alcance geral, explícita e política.
A sua classificação quanto política será de suma importância para o entendimento deste trabalho, pois é muito relevante que se entenda que a imunidade conferida no art. 150, inciso VI, alínea “d”, da CF/88 foi uma opção do legislador constitucional, e vem sendo expandida cada vez mais pela doutrina e jurisprudência a fim de englobar situações semelhantes e não previstas pelo constituinte à época da elaboração da norma, ante a ausência dos avanços tecnológicos no âmbito da leitura.
Logo, a imunidade atribuída aos livros, jornais, periódicos e do papel destinado à sua impressão não existe por decorrência lógica, e sim por uma questão de política tributária, e preservação de valores constitucionais como a difusão da cultura, do ensino e da liberdade de expressão. E por se tratar, portanto, de uma escolha legislativa, que será esmiuçada a seguir a abordagem relativa à incidência desta imunidade aos livros eletrônicos, também conhecidos como e-books.
3. A Imunidade dos livros eletrônicos.
A questão sobre a incidência ou não da imunidade tributária cultural aos livros eletrônicos sempre foi muito controvertida. O tema, inclusive, ganhou contornos mais elucidativos com o julgado proferido pelo STF em março deste ano (2017), que mudou diametralmente a maneira como vinha sendo tratado os livros eletrônicos no âmbito da jurisprudência.
Até então, esse tipo de livro era tratado como software, levando aos tribunais a entenderam por um certo tempo pela não incidência da imunidade cultural, posto se tratar de uma mercadoria destinada à produção e comercialização. Veja-se como explicitou em decisão monocrática o Ministro Eros Grau à época:
Decisão: Interpuseram recursos extraordinários o Município de São Paulo e a Fazenda do Estado de São Paulo contra decisão do tribunal a quo, que em sede de embargos infringentes entendeu ser o pleito contido na inicial procedente – declaração de inexistência de relação jurídica entre os recorrentes que os autorizam a exigir ICMS e/ou ISS sobre a veiculação de informações na forma de CD-ROM – modificando o entendimento adotado em segunda instância, para declarar que na hipótese não há de se falar em nenhum dos supracitados impostos, mas em produto favorecido pela imunidade tributária prevista no art. 150, VI, letra ´d´, da CB/88.
(Despacho publicado no DJU II de 28.01.2005, p. 18/19).
2. Trata o recurso interposto pela Municipalidade de São Paulo de requerer seja afastada a imunidade concedida – porque específica para livros, periódicos, jornal ou de papel destinado a sua impressão – para fins de fazer incidir sobre o serviço o ISS, na forma do inciso III do art. 156 da CB/88.
3. Requer, a Fazenda do Estado de São Paulo, por via extraordinária, com fundamento na alínea ´a´ do inciso III do art. 102 da CB/88, seja assegurada a supremacia do art. 150, inciso VI, ´d´, da CB/88, para que a comercialização do produto CD-ROM seja onerada com o ICMS.
4. A respeito do tema, é de se verificar o julgamento do RE 176626, do qual foi relator o Min. Sepúlveda Pertence, DJU de 11/12/1998, ementado nos seguintes termos:
EMENTA: I.(…). II. RE: questão constitucional: âmbito de incidência possível dos impostos previstos na Constituição: ICMS e mercadoria. Sendo a mercadoria o objeto material da norma de competência dos Estados para tributar-lhe a circulação, a controvérsia sobre se determinado bem constitui mercadoria é questão constitucional em que se pode fundar o recurso extraordinário. III. Programa de computador (software): tratamento tributário: distinção necessária. Não tendo por objeto uma mercadoria, mas um bem incorpóreo, sobre as operações de ´licenciamento ou cessão do direito de uso de programas de computador´ matéria exclusiva da lide, efetivamente não podem os Estados instituir ICMS: dessa impossibilidade, entretanto, não resulta que, de logo, se esteja também a subtrair do campo constitucional de incidência do ICMS a circulação de cópias ou exemplares dos programas de computador produzidos em série e comercializados no varejo – como a do chamado ´software de prateleira´ (off the shelf) – os quais, materializando o corpus mechanicum da criação intelectual do programa, constituem mercadorias postas em comércio. (STF, RE 285.870-6/SP, Rel. Min. Eros Grau, j. 03.12.2004, DJ 03.02.2005)
Contudo, atualmente, é imperiosa a necessidade de os tribunais pátrios, assim como o mundo jurídico como um todo, acompanhar a evolução da tecnologia e reconhecer a propagação cada vez mais dos livros eletrônicos, que já é uma realidade consagrada. Ao deixar de conceder a referida imunidade aos e-books, é ignorar todo o sentido desta, cujo objetivo primordial é a difusão do conhecimento, da cultura e da liberdade expressão, direitos fundamentais garantidos pela Carta Magna brasileira.
Nesse sentido, no julgamento do RE 330817, o STF decidiu que a imunidade tributária constante do art. 150, VI, “d”, da CF/88, aplica-se ao livro eletrônico (e-book), inclusive aos suportes exclusivamente utilizados para fixá-los.
Em seu voto, o Ministro Dias Toffoli, faz uma explanação sobre o significado do papel, a fim de chegar à conclusão se este seria um elemento acidental ou essencial do livro. Entende-se como acidental o elemento cuja sua inexistência não retira a substancialidade do objeto, enquanto essencial o torna imprescindível para sua existência. Assevera o Ilmo. Ministro:
“A propósito, os estudiosos do assunto mostram que os livros já foram feitos dos mais variados materiais: entrecasca de árvores; folha de palmeira; bambu reunido com fios de seda; a própria seda; placas de argila; placas de madeira e marfim; tijolos de barro; papiro; pergaminho (proveniente da pele de carneiro). Vai nesse sentido a acepção de número 7 do citado Houaiss: “7. conjunto de lâminas de qualquer material, em formato de folha, ger. unidas umas às outras como as folhas de um livro”. Assim, a variedade de tipos de suporte (tangível ou intangível) que um livro pode ter aponta para a direção de que ele só pode ser considerado como elemento acidental no conceito de livro. Se isso não fosse o bastante, registre-se que não é necessário o livro ter o formato de códice para ser considerado como tal. A Biblioteca de Alexandria, por exemplo, era formada por cerca de quinhentos mil rolos de papiro armazenados em nichos. Na antiguidade, a Ilíada, de Homero, era composta por 24 rolos de papiro, formando 24 livros; “apenas muito tempo depois, esses livros foram reunidos em um, sendo reinterpretados como ‘capítulos’ individuais” (FISCHER, Steven Roger. História da Leitura. São Paulo: UNESP, 2006, p. 44 e 54).”
Partindo da ideia, então, de que o livro pode ser composto por qualquer ferramenta, não necessariamente o papel, o Ministro Dias Toffoli adentrou na discussão dos livros eletrônicos, cujo suporte ao qual é veiculado é o menos importante no quesito imunidade tributária.
Logo, não importa se o conhecimento está sendo propagado através de um papel, de uma mídia ou de um áudio. A norma tributária imunizante existe para facilitar a difusão da cultura, seja ela de que forma for, e não pode se tornar obsoleta mediante o avanço das tecnologias disponíveis.
O direito deve acompanhar o progresso e a ele se adaptar, novas situações vão surgir sempre, e o mundo jurídico não pode ficar alheio a elas, e foi nesse sentido que o Ministro Dias Toffoli continuou o seu voto:
“Vide que os fundamentos racionais que levaram à edição do art. 150, VI, d, da CF/88 continuam a existir mesmo quando se levam em consideração os livros eletrônicos (e-book), inequívocas manifestações do avanço tecnológico que a cultura escrita tem experimentado. Consoante a interpretação evolutiva da norma, conclui-se que eles estão inseridos no âmbito dessa imunidade tributária. Segundo Fischer, o “e-book está apenas dando os primeiros passos e ainda é cedo para saber qual será seu formato definitivo. O modo pelo qual a humanidade lerá no futuro por certo será bastante diferente do que conhecemos hoje” (ibidem, p. 295). Assim, a interpretação das imunidades tributárias deve se projetar no futuro e levar em conta os novos fenômenos sociais, culturais e tecnológicos. Com isso, evita-se o esvaziamento das normas imunizantes por mero lapso temporal, além de se propiciar a constante atualização do alcance dos seus preceitos.”
Diante das explanações feitas linhas acima, depreende-se que o cerne da questão se trata mais da função social que os livros exercem, independente do suporte ao qual são produzidos. A controvérsia em torno dos livros eletrônicos não mais existe, reconhecendo o STF que estes também são dotados da imunidade tributária conferida aos livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
Assim, ao analisar o assunto, percebe-se que o importante não é saber tão somente se a imunidade cultural abarca ou não os livros eletrônicos numa visão puramente econômica, e sim nos valores que a Constituição Federal quis preservar, nas garantias estabelecidas por ela.
4. Conclusões
A CF/88 traz na alínea “d”, inciso VI, do art. 150 a imunidade tributária, conhecida como imunidade cultural, a qual veda a cobrança de impostos sobre os livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
O objetivo dessa norma imunizante é facilitar a propagação da cultura, do ensino, bem como da liberdade de expressão, que fora outrora tolhida em virtude do regime ditatorial instalado durante o Estado Novo, entre os anos de 1937 e 1945.
Partindo dessa premissa, chegou-se no STF a discussão acerca da possibilidade de ser atribuída a referida imunidade tributária também aos livros eletrônicos, tendo o Supremo reconhecido a repercussão geral do tema.
Tal entendimento trouxe uma reviravolta no mundo jurídico em torno desse assunto.
Isto porque, a recente decisão do STF, proferida em março de 2017, foi no sentido diametralmente oposto ao que se vinha decidindo nos tribunais pátrios, cuja decisão mais emblemática teve como relator o Ministro Eros Grau, que atribuiu aos livros eletrônicos a mesma natureza dos softwares, ou seja, mera mercadorias destinadas à comercialização e que por isso deveriam ser tributados.
No entanto, em voto coerente e vanguardista, o Ministro Dias Toffoli fixou a tese de que a imunidade tributária mencionada na alínea “d”, inciso VI, do art. 150, da CF/88, se aplica sim aos livros eletrônicos, concluindo que o papel é apenas um dentre outros instrumentos existentes de difusão do conhecimento. A ratio essendi da norma é a proteção da cultura, do saber, da liberdade de expressão, e não o papel.
Desse modo, a forma como esses valores serão veiculados é irrelevante. Os livros eletrônicos surgiram através de um avanço da tecnologia, que é uma constante no progresso do mundo todo, não podendo ser ignorada. A realidade aponta cada vez mais para os usos dos e-books em detrimentos dos livros impressos, e é dever do direito acompanhar essas mudanças.
Diante do exposto, percebe-se que o mundo jurídico está se abrindo para os avanços tecnológicos, e em posição de vanguarda, vem atribuindo o devido valor às suas normas, extraindo delas a sua essência a fim de acompanhar a evolução da sociedade.
REFERÊNCIAS.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: . Acesso em: 18 jul. 2017.
______. Lei nº 5.172 (1966). Código Tributário Nacional. Brasília, DF, 25 out. 1966. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm. Acesso em: 19 jul. 2017.
______. Supremo Tribunal Federal. RE 330.817. Relator: Min. Dias Toffoli. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE330817.pdf
Acesso em: 19 jul. 2017.
______. Supremo Tribunal Federal. RE 285.870. Relator: Min. Eros Grau. 3 fev. 2005. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCLA%2E+E+285870%2ENUME%2E%29+NAO+S%2EPRES%2E&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/cqxx85k Acesso em: 19 jul. 2017.
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário/Ricardo Alexandre – 11. Ed. rev. atual. E ampl – Salvador – Ed. JusPodivm, 2017.
NOVAIS, Rafael. Coleção Descomplicando – Direito Tributário – 2. Ed. rev. atual. E ampl – Recife-PE – Ed. Armador, 2016.
[1] Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:
I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça;
II - instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;
III - cobrar tributos:
a) em relação a fatos geradores ocorridos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado;
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou;
c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b;
IV - utilizar tributo com efeito de confisco;
V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;
VI - instituir impostos sobre:
a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;
b) templos de qualquer culto;
c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;
d) livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão.
e) fonogramas e videofonogramas musicais produzidos no Brasil contendo obras musicais ou literomusicais de autores brasileiros e/ou obras em geral interpretadas por artistas brasileiros bem como os suportes materiais ou arquivos digitais que os contenham, salvo na etapa de replicação industrial de mídias ópticas de leitura a laser.
§ 1º A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155, III, e 156, I.
§ 2º A vedação do inciso VI, "a", é extensiva às autarquias e às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, no que se refere ao patrimônio, à renda e aos serviços, vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes.
§ 3º As vedações do inciso VI, "a", e do parágrafo anterior não se aplicam ao patrimônio, à renda e aos serviços, relacionados com exploração de atividades econômicas regidas pelas normas aplicáveis a empreendimentos privados, ou em que haja contraprestação ou pagamento de preços ou tarifas pelo usuário, nem exonera o promitente comprador da obrigação de pagar imposto relativamente ao bem imóvel.
§ 4º As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c", compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais das entidades nelas mencionadas.
§ 5º A lei determinará medidas para que os consumidores sejam esclarecidos acerca dos impostos que incidam sobre mercadorias e serviços.
§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g.
§ 7º A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido.
Graduada pela Universidade Federal da Bahia. Especialização em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ASSIS, Claudia Machado de. Imunidade tributária dos livros eletrônicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 set 2018, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52195/imunidade-tributaria-dos-livros-eletronicos. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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