COAUTORAS:
DANIELLE GAMA COUTO LIMA,
CLÁUDIA VITÓRIA FERREIRA DA HORA,
NAYARA NEVES DA SILVA TUNES[1]
Palavras-chave: Insegurança jurídica; Vulnerabilidade; Código Civil; Consumidor; Internet.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho versa sobre a necessidade de regulamentação dos contratos eletrônicos frente ao Código Civil pátrio, visto que este trouxe para a sociedade mudanças significativas, de modo a demandar alterações no Código Civil, no sentido de inseri-los no rol tipificado dos contratos. Tal feito é de grande relevância no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que esta forma de contratar configura-se enquanto uma modalidade célere e dinâmica.
Paulatinamente o comércio eletrônico vem sendo amplamente difundido à medida que a sociedade é propulsora ativa na evolução das relações sociais. Com o advento da internet e o crescente avanço do comércio eletrônico, bem como a evolução da sociedade, vem à baila a demanda por uma nova modalidade de contrato para regular as relações firmadas perante o âmbito virtual. É nessa conjuntura que nascem os contratos eletrônicos (LIMA, 2004).
No que compete a este trabalho, acreditar-se-á que será de grande valia, posto que o tema possui relevância social e jurídica, implicando para os leitores um conhecimento amplo ao tocar nesses espectros. Nesse sentido, o artigo ora dissertado tem por finalidade assinalar acerca da pendência de regulamentação dos contratos eletrônicos frente ao Código Civil brasileiro de 2002, bem como argumentar acerca da vulnerabilidade do consumidor, que vêm se embasando unicamente em legislações esparsas.
O presente trabalho foi desenvolvido mediante levantamentos bibliográficos, encontrados na Biblioteca da UniFG, na respectiva parte que toca ao curso de Direito, abarcando a disciplina de Direito Civil – Contratos, bem como utilizou-se como embasamentos, artigos científicos disponibilizados em sites e revistas jurídicas que versam acerca da temática.
OS CONTRATOS ELETRÔNICOS
No que concerne ao entendimento a que se propõe este trabalho, faz juz apresentar alguns conceitos, iniciar-se-á pela definição de contrato que, conforme Gonçalves (2014, p.21) “o contrato é a mais comum e a mais importante fonte de obrigação”. Para o civilista “o contrato é uma espécie de negócio jurídico que depende, para a sua formação, da participação de pelo menos duas partes”. (GONÇALVES, 2014, p.21)
Já no que se refere aos contratos eletrônicos, Glanz (1998) apud Cesaro Júnior (2012, p. 2) ensina que “o contrato eletrônico, portanto, nada mais é do que um contrato tradicional celebrado em meio eletrônico, ou seja, através de redes de computadores – é aquele celebrado por meio de programas de computador ou aparelhos com tais programas”.
Se faz mister registrar o posicionamento de Leal (2007, p.82) acerca da atipicidade dos contratos eletrônicos. Conforme a autora: “(...) na falta de legislação específica que regule os contratos eletrônicos, estes se incluem na categoria de contratos atípicos e de forma livre”.
Nesse sentido, os contratos eletrônicos são classificados com base na forma como o computador é utilizado para a celebração do contrato. Conforme a doutrina majoritária, dentre eles Lôbo (2012, p. 34, 35), os contratos eletrônicos podem ser classificados em três espécies:
(...) contratos interpessoais, contratos sistêmicos e contratos interativos. No primeiro tipo as pessoas utilizam o meio eletrônico para veicular oferta e aceitação, através de mensagens eletrônicas (principalmente e-mails). No segundo, os contratos são firmados mediante troca de informações entre sistemas informatizados. No terceiro, há típicos contratos de adesão, tendo uma pessoa interessada de um lado e sítio virtual do outro, muito utilizado para a aquisição de bens e serviços oferecidos on-line, ou para reserva de hotéis, viagens, espetáculos.
Ante o exposto, entende-se que não existe uma forma única pela qual se realizam os contratos eletrônicos, pois, como assinala Lôbo (2012), essa classificação dependerá da maneira como o computador é utilizado e dos agentes que nele atuam.
OS CONTRATOS ELETRÔNICOS E SEUS REQUISITOS DE VALIDADE
Trata-se o contrato eletrônico de negócio jurídico e, portanto, deve obedecer a determinados elementos, assim como nos contratos em geral, cujos elementos são subjetivos, objetivos ou formais. Desta forma, no que tange aos elementos subjetivos observa-se as características das partes, como a manifestação da vontade, a capacidade, a aptidão específica para contratar e o consentimento do agente, em que este deve ser livre de quaisquer vícios (GONÇALVES, 2014).
Assim são considerados agentes capazes aqueles que estão dispostos nos artigos 3º e 4º do Código Civil brasileiro de 2002. Quanto à capacidade das partes, Diniz (2003, p. 28) preceitua que “é a força propulsora do contrato, é ele quem cria a relação jurídica que vincula os contraentes sobre determinado objeto”. Contudo, é importante ressaltar que nem todo agente capaz é legítimo, haja vista que a legitimidade traz relação do agente com o objeto (DINIZ, 2003). Conforme Diniz (2003, p. 28) legitimação é a “aptidão específica para contratar, pois a ordem jurídica impõe certos limites à liberdade de celebrar determinados contratos”.
Quanto aos elementos objetivos, estes estão relacionados com o objeto da relação jurídica contratual. Conforme o art. 104, II do Código Civil brasileiro de 2002 – “O objeto deve ser lícito, possível, determinado ou determinável” (BRASIL, 2002).
Cabe destacar ainda, que qualquer contrato pode ser celebrado por meio eletrônico, exceto aqueles que a lei exija forma especial. Desta maneira, segundo Diniz (2003), atualmente não há rigor quanto à forma, pois somente a declaração volitiva é capaz de estabelecer o liame obrigacional entre os contraentes, gerando efeitos volitivos independentemente da forma em que se revista. Neste sentido, o artigo 104, III, do Código Civil de 2002 estabelece como um de seus requisitos que a forma seja prescrita ou não defesa em lei.
FORMAÇÃO DOS CONTRATOS EM ÂMBITO ELETRÔNICO
O campo virtual repercute diretamente na esfera civil, de modo a influenciar os contratos. Na era da informação, a sociedade atua como sujeito ativo nas características de um Direito Digital[2], apontando à celeridade, à dinamicidade, à autorregulamentação, à existência de poucas leis, à prática costumeira e ao uso de analogia (PINHEIRO, 2008 apud TARTUCE, 2014).
Em contrapartida à comumente utilização dos contratos eletrônicos, há uma pendência legislativa em torno desta modalidade contratual dada a sua complexidade e pelo fato de não estar abarcado pela estrutura normativa civil (DINIZ, 2014). Todavia, menciona Tartuce (2014, p. 131) que tal caducidade legislativa “não impede a aplicação das regras do atual Código Civil”.
Consoante Tartuce (2014), umas das dificuldades encontradas pelos doutrinadores do Direito é debater sobre temas contemporâneos, dentre eles a formação dos contratos pela internet. Este doutrinador defende que o contrato eletrônico é formado, em regra, entre presentes:
Entendemos que o contrato cuja proposta se deu pela via eletrônica não pode ser considerado inter absentes, mas inter praesentes (...). Isso, pelo que consta do art. 428, I, segunda parte (...). Ora, a internet convencional é meio semelhante ao telefone, já que a informação é enviada via linha. Aliás, muitas vezes, a internet convencional é até mais rápida do que o próprio telefone. O que dizer então da internet ‘banda larga’, via cabos? Trata-se de meio de comunicação mais rápido ainda. Não há como associar o e-mail, portanto, ao contrato epistolar. Logicamente, há uma maior proximidade quanto ao telefone do que à carta, reconhecido seu caráter misto de proposta. (...) estamos inclinados a afirmar que, quando a proposta é feita pela via digital, não restam dúvidas que o contrato é formado entre presentes (TARTUCE, 2014, p. 133).
Em posicionamento contrário, aduz a civilista contemporânea Diniz (2014, p. 798) que “o contrato eletrônico é uma modalidade de negócio à distância ou entre ausentes, efetivando-se via internet por meio de instrumento eletrônico, no qual está consignado o consenso das partes contratantes”.
Ante a divergência exposta, tem-se o posicionamento do clássico doutrinador Orlando Gomes que, a princípio, não se pode determinar o contrato como inter absentes ou inter praesentes.
Não é possível qualificar a priori os contratos celebrados por meios eletrônicos (dentre estes os meios informáticos) como contratos entre presentes ou entre ausentes. Esta qualificação dependerá das características do meio em questão. Nas hipóteses em que for possível e usual a aceitação imediata, tais como teleconferência, videoconferência e meios de comunicação em tempo real (como os chats); aplicar-se-ão as regras dos contratos entre presentes. Ao contrário; os contratos concluídos por meio da troca de mensagens eletrônicas (e-mail), ou diretamente nos endereços eletrônicos de empresas na Internet, devem ser considerados contratos entre ausentes, aplicando-se lhes, então, o art 434 do Código Civil (GOMES, 2009, 81).
Nessa mesma linha de pensamento compactua Venosa (2010, p. 536): “a contratação por computadores assim como pelos aparelhos de fax serão entre presentes ou entre ausentes, dependendo do posicionamento das partes quando das remessas das mensagens e documentos”. Destarte, nota-se que não dá para determinar, de imediato, a formação dos contratos eletrônicos. Essa determinação dependerá do posicionamento das partes contratantes ao se vincularem.
TEMPO E LUGAR DO CONTRATO ELETRÔNICO
No tocante ao tempo de aperfeiçoamento do contrato, quando se reputa concluso o contrato eletrônico, aduz Gonçalves (2012) que, se feito entre presentes, este conclui-se com a aceitação imediata da proposta pelo oblato. Por outro lado, quando a formação do contrato for entre ausentes, há várias teorias para explicar, o momento de conclusão: Teoria da Informação ou Cognição e a Teoria da Agnição, cuja se divide em Declaração propriamente dita, Expedição e Recepção (GONÇALVES, 2012).
Acolhe o Código Civil brasileiro de 2002, em seu art. 434, para determinar o instante em que se forma os contratos, a Teoria da Agnição, na sua espécie Expedição. No entanto, para os contratos formados por via eletrônica, por força do Enunciado nº 173 do Conselho da Justiça Federal e do Superior Tribunal de Justiça[3] adota-se a Teoria da Agnição, em sua espécie Recepção. Destarte, verifica-se que o tempo de aperfeiçoamento do contrato será aquele em que o proponente receber a mensagem de aceitação, ainda que não a leia (GONÇALVES, 2012).
Superada a análise do tempo em que se aperfeiçoa o contrato formado pela internet, analisar-se-á o lugar em que tal contrato foi celebrado. Aduz o art. 435 do Código Civil brasileiro de 2002: “Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto”. Ensina Gonçalves (2012) que para partes contratantes residente no mesmo país adotar-se-á o local em que a proposta foi feita.
Não obstante, para aqueles contratos celebrados em âmbito internacional, prescreve o art. 9º, § 2º, da Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro: “a obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente”. Leciona Diniz (2014) que na seara internacional, a determinação do lugar onde se tem concluído o contrato é fundamental, visto que é sob sua égide que se determina o foro competente, bem como a lei que regerá a relação contratual.
NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO DOS CONTRATOS ELETRÔNICOS FRENTE À SUA INSEGURANÇA JURÍDICA
Paulatinamente, o Direito evolui com o tempo na medida em que a sociedade evolui, a fim de atender às necessidades e anseios da população e os novos conflitos nascentes. Consoante essa afirmação, destaca-se o posicionamento de Gandini (2014), no sentido de que o autor compreende que as sociedades são dinâmicas, ou seja, “evoluem continuamente com o passar do tempo, de forma que o Direito, quando visa a regular os hábitos e atividades sociais, deve necessariamente acompanhar esta evolução, de forma a alterar ou dar novas interpretações às regras jurídicas existentes” (GANDINI, 2014, p. 5). Nesse sentido, percebe-se que as leis estão sempre atualizando-se conforme a necessidade e novas leis sendo criadas à medida que novas situações carecem de amparo do poder legislativo (GANDINI, 2014).
Assim, surgem alguns questionamentos no sentido do não amparo dos contratos eletrônicos pelo Código Civil, cujo se tornou algo que atinge a maior parte dos cidadãos brasileiros, os quais fazem uso dos meios eletrônicos para realizarem algum tipo de contrato. Isso implica dizer, consoante os posicionamentos de Mello e Perico (2012) que os negócios via internet têm alcançado grandes proporções, configurando-se em algo que se tornou comum e corriqueiro nas práticas dos brasileiros. Atualmente se constata a necessidade de um dispositivo que dê amparo legal aos contratos eletrônicos “visto que a Internet ampliou e facilitou de sobremaneira a compra e venda, ficando o comércio eletrônico, dependente do ordenamento jurídico.” (ROCHA, 2016, p.1).
Destarte é mister salientar que o Direito deve caminhar junto à evolução tecnológica de modo a amparar as relações contratuais via internet, tendendo a proporcionar uma maior segurança jurídica aos contratantes. Nesse sentido, explica Engelke (2009), que a falta de regulamentação faz com que se questione os efeitos, a segurança e a validade dos documentos digitais. Nessa seara escreve a autora que:
A utilização dos meios de comunicação virtual, usado como suporte na internet expandiu o comércio eletrônico. Contudo a falta de regulamentação enseja questionar os efeitos, a segurança e, notadamente, a validade dos documentos digitais, justamente porque tais documentos não compõem o mundo material, palpável, geram receio de que possam ser alterados (ENGELKE, 2009, p.59).
Não obstante, ensina Diniz (2006) apud Engelke (2009, p. 59) que “essa problemática gerada pelo comércio eletrônico e pelos contratos via internet tem grande relevância no mundo jurídico pela sua enorme complexibilidade e pelo fato de não estar estruturada normativa, jurisprudencial e doutrinariamente”. Ademais, menciona-se o posicionamento adotado por Gandini (2014) frente à insegurança da sociedade e do Direito em relação aos contratos eletrônicos. Nesse sentido, o autor esclarece que
(...) muitos ordenamentos jurídicos não estavam preparados para lidar com esse fenômeno, pois a maioria dos Estados preceitua regras de validade dos negócios jurídicos baseados em documentos escritos e memorizados sobre o papel. Assim, com essa nova forma de negociar e "assinar" alguns questionam a natureza jurídica, os efeitos, a segurança e, principalmente, a validade dos documentos digitais, diante da inicial insegurança do Direito e da sociedade perante eles (GANDINI, 2014, p.2).
Diante da falta de atenção dada pelo legislador aos contratos eletrônicos, cabe ao magistrado o desafio de buscar a solução que melhor atenda a solução para uma situação em determinado caso concreto. Nesse sentido, Leal (2007, p.67) elucida que “conquanto os contratos eletrônicos mereçam atenção especial do legislador, enquanto isso não ocorrer, a segurança das relações jurídicas deve ser mantida, não se podendo deixar a descoberto as transações efetuadas em ambiente virtual”.
Nessa ótica, surge também para os contratantes uma divergência quanto ao que aplicar na ocorrência de problemas diante desses contratos. Desta forma, conforme ensina Leal (2007) não se pode negar que a criação de leis detalhadas para o comércio eletrônico e, especificamente, para o contrato eletrônico é uma necessidade latente. Com a criação de lei específica, esses contratos não ficarão apenas subordinados aos requisitos de validade dos contratos em geral, e sim aos seus próprios requisitos específicos, conferindo segurança à contratação por meio eletrônico.
Os contratos eletrônicos no Brasil vêm crescendo sem qualquer regulamentação específica, o que depreende um conflito e uma incerteza quanto ao instrumento do qual far-se-á uso em caso de problemas decorrentes dessa relação contratual. Ou seja, a ausência de lei própria faz com que se busquem meios aplicáveis à matéria, que já existam no ordenamento jurídico, para esclarecer questões que façam referência à validade das contratações via internet, e decidir sobre os elementos probantes (ROCHA, 2016).
O doutrinador Coelho (2009), ensina que apesar da falta de regulamentação específica dos contratos eletrônicos é mister compreender que os direitos dos consumidores não se alteram. Conforme o autor o fato de se ter realizado a venda em um estabelecimento físico ou virtual não vai alterar em nada os direitos dos consumidores e os correlatos deveres dos empresários, sendo que o contrato eletrônico de consumo entre brasileiros está sujeito aos mesmos princípios e regras aplicáveis aos demais contratos disciplinados pelo Código de Defesa do Consumidor (COELHO, 2009).
Por essa razão, nota-se que há a necessidade da reformulação das leis brasileiras, sobretudo o Código Civil, adequando-o à nova realidade, em busca de dar amparo legal para os contratos eletrônicos. Na ausência de legislação específica o Brasil adota, para os contratos eletrônicos, algumas legislações esparsas. A Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional (UNICITRAL) é uma das leis que regem o comércio internacional. De acordo com Mello e Perico (2012), essa lei tem a responsabilidade de criar normas que tenham capacidade de universalização e harmonização dos contratos realizados em nível internacional.
Com o objetivo de garantir a validade jurídica e a autenticidade dos documentos eletrônicos foi criada a assinatura digital pela Medida Provisória n. 2.200/01(MELO, PERICO, 2012). “A edição da Medida Provisória de nº 2.200-2, de 24.08.2001, acabou por instituir o sistema de Chaves Públicas, denominado ICP-Brasil, que servirá para certificar as chamadas assinaturas digitais” (MOLINA, 2008, p.48).
O Brasil, como já insistentemente afirmado não possui legislação que regule especificamente acerca da contratação por meio eletrônico, no entanto, existem, é verdade, alguns Projetos de Lei em tramitação pelo Congresso e a grande maioria deles são baseados na Lei Modelo UNCITRAL. Conforme Molina (2008), a Comissão de Informática da OAB, por exemplo, apresentou anteprojeto de lei em meados do ano 2000, que pretendia, entre outros tópicos, dar mais segurança tanto para o consumidor quanto para o empresário que utilizem o comércio telemático. De acordo com o autor “o projeto também tem por base a Lei Modelo da UNCITRAL e se divide em duas partes, onde a primeira trata do comércio eletrônico de forma global e a derradeira, do comércio eletrônico e da assinatura digital” (MOLINA, 2008, p.48). O autor faz menção ainda ao Código de Defesa do Consumidor, esclarecendo que este “veio para corrigir o desequilíbrio que existe entre fornecedor e consumidor, posto que antes dele não existia legislação específica que protegesse esse último” (MOLINA, 2008, p,51).
Ainda, de acordo com Molina (2008), o CDC além de ser o instrumento que deve ser eleito nas eventuais lides que envolvam tratos telemáticos, ainda “pode ser considerado como verdadeiro redentor daqueles que se utilizam de tal modalidade contratual, em razão, principalmente, de não haver regulação específica da matéria” (MOLINA,2008, p.58). Caso não houvesse a legislação consumerista o internauta consumidor, apesar da existência do Código Civil, poderia enfrentar problemas insolúveis, pois dentre os inúmeros problemas dos Contratos Telemáticos, um dos que merecem mais atenção é a insegurança que paira no ambiente virtual. (MOLINA, 2008)
Outro instrumento que merece atenção é o Decreto nº 7.962, de 15 de março de 2013 que veio regulamentar o CDC no que dispõe sobre a contratação no comércio eletrônico. Este
discorre acerca da necessidade de informações claras sobre o produto, o serviço, o fornecedor, o atendimento facilitado ao consumidor e o respeito ao direito de arrependimento (TEIXEIRA, 2013 apud ROCHA, 2016, p.10). De acordo com Rocha (2016, p.11) “esse decreto é falho no que tange às sanções e punições específicas para atos ilícitos cometidos contra os consumidores no comércio eletrônico. Além de não possuir força normativa suficiente para obrigar ou desobrigar o cumprimento do fornecedor”. Deste modo, o que se percebe é que as discussões sobre a necessidade de se regular os tratos telemáticos no Brasil não é recente, no entanto, o Brasil se conforma com o debate, chegando ao absurdo de projetos de lei relevantes ficarem anos para serem votados (MOLINA, 2008).
Ante a carência legislativa, nota-se quanto aos consumidores uma vulnerabilidade, de modo que as soluções do código de defesa do consumidor e das legislações esparsas para o comércio eletrônico não são aptas para o saneamento de toda a demanda de conflitos gerados no comércio eletrônico. (ROCHA, 2016)
A VULNERABILIDADE DOS INDIVÍDUOS PERANTE O COMÉRCIO ELETRÔNICO
É notório a vulnerabilidade dos indivíduos no que toca as relações constituídas pelo meio virtual, atingindo até o âmbito internacional, haja vista a falta de regulamentação civil para os contratos aperfeiçoados (MARQUES, 2002).
No âmbito virtual, os produtos à venda são adquiridos e entregues em momento posterior, imediato ou não (MARQUES, 2002). Marques (2002) pontua que os problemas mais comuns, na seara virtual, são a não entrega do produto adquirido ou quando este produto é entregue em endereço errôneo. Ademais, assevera Marques (2002) ainda, que a lei a ser aplicada em caso de conflito, bem como a jurisdição competente também se faz um problema, quando há “falha na segurança com os dados do consumidor, dados privados, como o seu número de cartão de crédito, a falha na cobrança no cartão de crédito (cobrança a mais, cobrança antes da entrega etc.), as diferenças entre as fotografias do site e os produtos recebidos” (MARQUES, 2002, p. 71 e 72).
Outro problema identificável neste âmbito, quanto à vulnerabilidade do consumidor, circunda na esfera em que o clique indesejado acarreta em uma compra involuntária (MARQUES, 2002) quando há “a impossibilidade de executar o direito de arrependimento (produto aberto, software já enviado, endereço incongruente ou incompleto)” (MARQUES, 2002, p. 71).
É certo que, na contratação física, há para o indivíduo a oportunidade de verificar o produto, objeto da contratação, bem como aclarar quaisquer dúvidas acerca do objeto. Em contrapartida, nos contratos firmados por via eletrônica, a parte contraente não tem acesso físico ao bem, ficando a mercê de informações genéricas, fornecidas por terceiros alheios à fabricação do produto (SCHREIBER, 2014).
Contrário à fragilidade do consumidor nas relações virtuais aduz Jorge (2017, p. 40) apud Coelho (2015) que “a vulnerabilidade do consumidor, no comércio eletrônico, é a mesma a que se expõe no físico; e, em alguns casos, é até menor. (...) A exposição do consumidor a constrangimentos é visivelmente maior no comércio físico do que no eletrônico (...)”. No entanto, ensina Scheiber (2014, p. 15) que o consumidor
(...) poderia buscar, em outros sites da internet, informações, avaliações e depoimentos sobre a qualidade do produto e do fornecedor – alguns sites de compras, inclusive, já fornecem avaliações como parte da sua estratégia comercial –, mas tal conduta é, na prática, rara, seja porque tais informações, potencialmente infinitas, não se encontram ordenadas de modo a facilitar a pesquisa do consumidor, seja porque não são tidas como inteiramente confiáveis, diante das suspeitas de que se prolifera na internet a manipulação das ferramentas de avaliação por meio da contratação remunerada de usuários para que se manifestem sobre certos produtos e serviços (em uma forma oculta e deturpada de marketing, típica do ambiente virtual). O consumidor eletrônico acaba, assim, dispondo paradoxalmente de pouca informação sobre o objeto da sua contratação.
Ante o exposto, coleciona aos ensinamentos de Marques (2002) que a proteção do consumidor passivo[4] configura-se como um desafio para o Direito, tendo em vista o binômio: proteção do consumidor, trazido pelo Código de Defesa do Consumidor ente a pendência do Código Civil versus a troca de relações em âmbito global. Nesse sentindo, corrobora a autora que a resultante deste binômio, diante de um caso concreto, não seria a exclusão destas regulamentações (nacional e internacional), e sim uma colaboração destas, de modo que o Direito Internacional Privado atua de forma direta ou ao lado daquelas leis indicada ao caso, haja vista o conflito de leis.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como dito alhures, a sociedade, hoje vivendo a “Era da informação”, acabou introduzindo o contrato eletrônico a essa nova realidade, sendo que grande parte dos brasileiros fazem uso da internet para realização de algum tipo de contrato, em alguma das modalidades das quais dispõe esse sistema interativo.
Nesse sentido, em face do exposto, embora haja várias leis esparsas além do Código de Defesa do consumidor, para regulamentar as relações consumeristas em âmbito virtual, observa-se que essas não são aptas para sanar todos os problemas decorrentes desse tipo de contratação, de modo que ainda há uma vulnerabilidade dos indivíduos frente à pendência de legislação específica, posto que os contratos eletrônicos configuram-se como uma modalidade de contrato atípico, exigindo com a evolução da sociedade uma regulamentação civil que supra as necessidades que exige as relações contratuais civilistas. A tipificação trará aos contratantes eletrônicos, portanto, maior segurança frente a realização desse tipo de contrato, diminuindo assim a vulnerabilidade destes diante de um sistema que se respalda em legislações esparsas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[1]Acadêmicas do curso Bacharelado em Direito do Centro Universitário FG – UniFG.
[2] “O Direito Digital consiste na evolução do próprio Direito, abrangendo todos os princípios fundamentais e institutos que estão vigentes e são aplicados até hoje, assim como introduzindo novos institutos e elementos para o pensamento jurídico, em todas as suas áreas”.
[3] “A formação dos contratos realizados entre pessoas ausentes, por meio eletrônico, completa-se com a recepção da aceitação pelo proponente”.
[4] “Consumidor que recebe a informação, a oferta e que contrata em seu país, sem deslocamento físico (por exemplo, o consumidor que contrata pela Internet, em sua casa, a compra de uma filmadora diretamente de fornecedor com sede no Exterior)”.
Graduada em História pela Universidade do Estado da Bahia (2010 - 2014). Tem como principais linhas de pesquisa temas relacionados à escravidão e família. Tem experiência na área educacional. Atua como educadora no Município de Caetité desde 2009. Já lecionou para o Ensino Infantil e Fundamental I e II. Atualmente cursa bacharelado em Direito pelo Centro Universitário - FG (UniFG).
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