DIEGO VIOLA MARTY
(Orientador)
RESUMO[1]: O presente trabalho visa a tratar a descriminalização do aborto e a autodeterminação da mulher ao próprio corpo. Passa por uma fase introdutória, que objetiva relatar sobre o crime da prática do aborto no Código Penal Brasileiro, elencados nos artigos 124 e 126, que preveem a ilicitude do ato realizado com ou sem o consentimento da mulher, assim como o artigo 128, que possui a previsão da excludente de ilicitude, quando o aborto é praticado por médico nos casos de aborto necessário ou se a gestação é resultante de estupro. Ainda, relata o julgamento da Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54, do Supremo Tribunal Federal, que declarou a inconstitucionalidade do delito, descaracterizando a conduta típica dos artigos 124,126 e 128, I e ll, todos do Código Penal, quando o caso em tela for de feto anencefálico. A seguir, é realizada uma breve análise da influência das Conferências Mundiais nos direitos sexuais e reprodutivos da mulher, são examinados os princípios fundamentais elencados na Constituição Federal que atribuem garantias fundamentais às mulheres, bem como os direitos reprodutivos a elas assegurados. Após, o presente trabalho esclarece como era vista a prática da interrupção da gravidez em alguns povos, através dos séculos. Ainda, demonstra até que ponto a dignidade da pessoa humana do feto pode se sobrepor à dignidade da pessoa humana da gestante, descrevendo se há inviolabilidade do direito à vida do nascituro, fazendo uma breve comparação do aborto no ordenamento jurídico brasileiro com alguns países que já o descriminalizaram. Por fim, explora a descriminalização do aborto voluntário a partir da laicização tardia do Estado, onde tenciona comparar e diferenciar o direito da moral, abordando individualmente os três princípios axiológicos de separação do direito e da moral, para enfim examinar a descriminalização do aborto fundada no garantismo penal.
Palavras-chave: Aborto. Descriminalização. Direitos reprodutivos. Dignidade da pessoa humana. Autodeterminação.
RESUMEN: Este trabajo visa tratar la descriminalisación del aborto y la autoderminación de la mujer con su proprio cuerpo. Pasa por uma fase introdutoria que visa relatar sob el crime de la practica del aborto en el codigo penal brasileño. Pieza que se detalla en los articulos 124 y 126 que estabelecen la ilicitud de la practica con o sin el consentimiento de la mujer. En el artículo 128 posui una excusa legal, cuando el médico hace la practica del aborto cuando se hace necesario o cuando el embarazo es proviniente de una violación. Todavía, el jugamiento de la Ación de Argumentación del Descuprimiento de Precepto Fundamental 54, del Supremo Tribunal Federal, que declaró la inconstitucionalidad del delito, descaracterizando la conducta tipica de los artículos 124, 126 y 128 , I y II, todos del Código Penal, cuando el caso se trata de feto anencefálico. A seguir, un breve análisis de la influencia de las Conferencias Mundiales sobre los derechos sexuale y reproductivos de las mujeres, los principios fundamentales que figuran en la Constitución Federal garantiza que las mujeres que confieren fundamentales y los derechos reproductivos argumentan que les están garantizados. Despues, este trabajo pretende aclarar como se ve la práctica de la interrupción del embarazo en algunas populaciones a través de los siglos. Aún así, intienta demostrar hasta que punto la dignidad de la persona del feto humano puede anular la dignidad humana de las mujeres embarazadas, que describe si hay inviolabilidad del derecho a la vida del niño por nacer, causando una breve comparación de aborto en el sistema jurídico brasileño con algunos países ya despenalizado. Por último, explora la despenalización del aborto voluntario desde finales del secularización del estado, donde se tiene la intención de comparar y contrastar las costumbres adecuadas, de forma individual frente a los tres principios axiológicos de separación de derecho y la moral, para examinar por último, la despenalización del aborto sobre la base de garantismo penal.
Palabras clave: Aborto. Descriminalisación. Derechos reproductivos. Dignidad de la persona humana. Autoderminación.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 A AFIRMAÇÃO CONSTITICIONAL DA MULHER: DIREITO PERSONALÍSSIMO AO PRÓPRIO CORPO. 2.1 O DIREITO À REPRODUÇÃO NAS CONFERÊNCIAS MUNDIAIS. 2.2 DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. 2.3 DOS DIREITOS REPRODUTIVOS DA MULHER. 3 A CONTROVÉRSIA JURÍDICA DA TUTELA PENAL DO CORPO DA MULHER: OS DIREITOS DO FETO. 3.1 BREVE SÍNTESE SOBRE O ABORTO ATRAVÉS DOS TEMPOS. 3.2 O CRIME DE ABORTO NO BRASIL. 3.3 O DIREITO DO FETO. 4 A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO VOLUNTÁRIO A PARTIR DE UMA LAICIZAÇÃO PENAL TARDIA. 4.1 O DIREITO, A MORAL E O ABORTO. 4.2 OS PRINCÍPIOS AXIOLÓGICOS DA SEPARAÇÃO DO DIREITO E DA MORAL. 4.3 A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO A PARTIR DO GARANTISMO PENAL. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
Esta pesquisa se propõe a indagar sobre a descriminalização do aborto e a autodeterminação da mulher ao próprio corpo.
De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro (mais especificamente nos artigos 124 e 126 do Código Penal) é crime a prática de aborto realizado por mulheres, seja com ou sem o seu consentimento. É importante salientar que o Código Penal brasileiro, em seu artigo 128, prevê, como causa excludente de ilicitude, o aborto praticado por médico nos casos de aborto necessário, bem como o aborto no caso de gravidez resultante de estupro.
A Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 54, julgada pelo Supremo Tribunal Federal, foi considerada procedente para declarar a inconstitucionalidade da interpretação de que a interrupção da gravidez de feto anencefálico é conduta típica prevista nos artigos 124, 126 e 128, I e II, todos do Código Penal.
Ainda, a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, caput, estabelece a inviolabilidade do direito à vida, que se inicia com a concepção e estendendo-a até o momento da formação do indivíduo.
Contudo, tal discussão não se cinge apenas a aspectos jurídicos, mas também a aspectos sociais, morais e religiosos. Desta forma, as questões aqui postas são: a dignidade da pessoa humana do feto pode se sobrepor à dignidade da gestante? O Estado tem o direito de tutelar sobre a decisão da gestante ao optar pelo aborto voluntário, bem como penalizá-la por tal decisão?
Para que estas perguntas sejam respondidas, o presente trabalho analisará a descriminalização do aborto frente a autodeterminação da mulher ao próprio corpo, verificando até que ponto a dignidade da pessoa humana do feto pode se antepor à dignidade da pessoa humana da gestante, expondo quanto a inviolabilidade do direito à vida do nascituro, e confrontando a descriminalização do aborto voluntário a partir de uma laicização tardia do Estado.
Optou-se pelo tema da descriminalização do aborto em virtude de se tratar de tema atual e de vital importância para a sociedade, uma vez que, no ordenamento jurídico nacional, considera-se crime a prática do abortamento realizado pela mulher que não deseja manter a gestação, retirando sua autonomia e seu direito de escolha.
A pesquisa se justifica na medida em que muito se discute acerca do direito à dignidade da pessoa humana e do direito à vida do feto, assim como da dignidade da pessoa humana e do direito da mulher em realizar o aborto, caso assim deseje, em situações não elencadas como excludentes de ilicitude pela legislação Penal.
Assim, o âmago da pesquisa é expor até que ponto o direito à vida do nascituro pode impor-se ao da dignidade da pessoa humana da gestante, que opta pela interrupção da gravidez, e, igualmente, de examinar a descriminalização do aborto voluntário em um Estado que não pode impor preceitos religiosos em seu ordenamento jurídico.
Por fim, averiguaremos a afirmação constitucional da mulher, levando em conta o direito personalíssimo ao próprio corpo, onde se analisará a intervenção das Conferências Mundiais nos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres, quais são os princípios e garantias constitucionais para resguardar e assegurar a autodeterminação da mulher e, por conseguinte, quais são os direitos reprodutivos salvaguardados e como são interpretados ao serem confrontados com o direito do feto.
2 A AFIRMAÇÃO CONSTITUCIONAL DA MULHER: DIREITO PERSONALÍSSIMO AO PRÓPRIO CORPO
2.1 O DIREITO À REPRODUÇÃO NAS CONFERÊNCIAS MUNDIAIS
Os direitos reprodutivos podem ser compreendidos como um composto de vários direitos ligados à livre escolha sobre a reprodução e sexualidade humana, onde cabe ao Estado propiciar o acesso aos serviços de saúde, meios de informação, possibilitando assim um melhor controle de natalidade com menores riscos à saúde. Estes direitos, com o passar dos anos, são cada vez mais discutidos em encontros internacionais e aceitos na esfera dos direitos humanos há pouco tempo.
Muito foi pleiteado pelos direitos das mulheres à sexualidade e à reprodução, tendo em vista que sempre houve um controle masculino em face das decisões femininas, não podendo elas deliberarem sobre seu próprio corpo, inexistindo assim a igualdade de gêneros.[2]
Nessa linha de raciocínio, se entende que, nessa época, o poder de domínio masculino, face à submissão feminina, era obtido através da ordem social, esta que abrangia as atividades laborais, os afazeres estabelecidos a ambos os sexos e, ainda, os ambientes permitidos a serem frequentados.[3] O mundo em sociedade era justificado nas relações sexuais. Bourdieu explica:
Se a relação sexual se mostra como uma relação sexual de dominação é porque ela está construída através do princípio de divisão fundamental entre o masculino, ativo, e o feminino, passivo, e porque este princípio cria, organiza, expressa e dirige o desejo – o desejo masculino como desejo de dominação masculina, como subordinação erotizada, ou mesmo, em última instância, como reconhecimento erotizado de dominação.[4]
A distinção na anatomia sexual do homem e da mulher, assim como a distinção biológica deles eram suficientes, para fundamentar a ordem social. Como veremos, nos dias de hoje, a sexualidade não é mais consagrada como ordem social.
Encontros, como a Primeira Conferência Mundial da Mulher, ocorrido no México, no ano de 1975; a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, organizada pela Organização das Nações Unidas em 1979; a Segunda Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena em 1993; a Conferência do Cairo em 1994; e a Conferência de Beijing de 1995, foram de vital importância para a legitimidade do exercício de direito à liberdade reprodutiva das mulheres e a igualdade de gêneros.
A Primeira Conferência Mundial da Mulher, realizada no México em 1975, ocorreu justamente no Ano Internacional da Mulher, tendo como tema central o fim da discriminação contra a mulher, e foi a primeira conferência que visava a discutir meios de alcançar direitos igualitários entre gêneros sexuais e implementar alternativas. Apesar de não tratar de direitos reprodutivos, essa conferência foi muito importante para buscar extinguir a disparidade sofrida em todos os meios sociais.[5]
Na Conferência sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher, realizada pela Organização das Nações Unidas no ano de 1979, foi aprovada a Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, sendo inicialmente ratificada com restrições pelo Brasil. Nas palavras de Piovesan:
[...] a Convenção objetiva não só erradicar a discriminação contra a mulher e suas causas, como também estimular estratégias de promoção de igualdade. Combina a proibição da discriminação com políticas compensatórias que acelerem a igualdade enquanto processo. Alia à verdade repressivo-punitiva a vertente positivo-promocional.[6]
O artigo 1º da Convenção definiu a discriminação contra a mulher como toda distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro.[7]
Essa Convenção abordou, já em seu preâmbulo, os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, visando a garantir o amplo exercício dos direitos, sejam eles sociais e coletivos, bem como civis e políticos. Ainda, buscou extirpar qualquer tipo de discriminação contra a mulher. Assim dispõe o referido preâmbulo:
Os Estados-partes na Presente Convenção,
Considerando que a Carta das Nações Unidas reafirma a fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor da pessoa humana e na igualdade de direitos do homem e da mulher,
Considerando que a Declaração Universal dos Direitos Humanos reafirma o princípio da não-discriminação e proclama que todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos e que toda pessoa pode invocar todos os direitos e liberdades proclamados nessa Declaração, sem distinção alguma, inclusive de sexo,
Considerando que os Estados-partes nas Convenções Internacionais sobre Direitos Humanos têm a obrigação de garantir ao homem e à mulher a igualdade de gozo de todos os direitos econômicos, sociais, culturais, civis e políticos,
Observando, ainda, as resoluções, declarações e recomendações aprovadas pelas Nações Unidas e pelas agências especializadas para favorecer a igualdade de direito entre o homem e a mulher,
Preocupados, contudo, com o fato de que, apesar destes diversos instrumentos, a mulher continue sendo objeto de grandes discriminações,
Relembrando que a discriminação contra a mulher, violados princípios da igualdade de diretos e o respeito da dignidade humana, dificulta a participação da mulher, nas mesmas condições que o homem, na vida política, social, econômica e cultural de seu país, constitui um obstáculo ao aumento do bem-estar da sociedade e da família e dificulta o pleno desenvolvimento das potencialidades da mulher para prestar serviço a seu país e à humanidade,
Preocupados com o fato de que, em situações de pobreza, a mulher tem um acesso mínimo à alimentação, à saúde, à educação, à capacitação e às oportunidades de emprego, assim como à satisfação de outras necessidades,
Convencidos de que o estabelecimento da nova ordem econômica internacional baseada na eqüidade e na justiça contribuirá significativamente para a promoção da igualdade entre o homem e a mulher,
Salientando que a eliminação do apartheid, de todas as formas de racismo, discriminação racial, colonialismo, neocolonialismo, agressão, ocupação estrangeira e dominação e interferência nos assuntos internos dos Estados é essencial para o pleno exercício dos direitos do homem e da mulher,
Afirmando que o fortalecimento da paz e da segurança internacionais, o alívio da tensão internacional, a cooperação mútua entre todos os Estados, independentemente de seus sistemas econômicos e sociais, o desarmamento geral e completo, e em particular o desarmamento nuclear sob um estrito e efetivo controle internacional, a afirmação dos princípios de justiça, igualdade e proveito mútuo nas relações entre países e a realização do direito dos povos submetidos à dominação colonial e estrangeira e a ocupação estrangeira, à autodeterminação e independência, bem como o respeito da soberania nacional e da integridade territorial, promoverão o progresso e o desenvolvimento sociais, e, em conseqüência, contribuirão para a realização da plena igualdade entre o homem e a mulher,
Convencidos de que a participação máxima da mulher, em igualdade de condições com o homem, em todos os campos, é indispensável para o desenvolvimento pleno e completo de um país, para o bem-estar do mundo e para a causa da paz,
Tendo presente a grande contribuição da mulher ao bem-estar da família e ao desenvolvimento da sociedade, até agora não plenamente reconhecida, a importância social da maternidade e a função dos pais na família e na educação dos filhos, e conscientes de que o papel da mulher na procriação não deve ser causa de discriminação, mas sim que a educação dos filhos exige a responsabilidade compartilhada entre homens e mulheres e a sociedade como um conjunto,
Reconhecendo que para alcançar a plena igualdade entre o homem e a mulher é necessário modificar o papel tradicional tanto do homem, como da mulher na sociedade e na família,
Resolvidos a aplicar os princípios enunciados na Declaração sobre a Eliminação da Discriminação contra a Mulher, e, para isto, a adotar as medidas necessárias a fim de suprimir essa discriminação em todas as suas formas e manifestações.[8]
Referido evento trouxe consigo a viabilidade de descriminalizar o aborto, tendo em vista que a decisão de gerar ou não um feto só poderia advir, exclusivamente, de deliberação da mulher.[9]
Durante a Segunda Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, ocorrida em 1993, além das ratificações das conferências anteriores, houve também a confirmação do direito à igualdade entre homens e mulheres. Afirmou-se, ainda, que a democracia apenas ocorreria, dentre outros fatores, a partir da conquista e proteção dos direitos humanos no plano interno e externo.[10]
Essa Conferência arguiu, em seu artigo 18,[11] que mulheres e meninas possuem direitos humanos universais, sendo eles indivisíveis e inalienáveis. Asseverou que as mesmas possuem pleno direito de colaborar com a vida social, econômica, política, civil, cultural, dentre outros. Salientou a necessidade do Estado garantir os direitos de forma respeitável e igualitária, com o intuito de possibilitar a efetivação das liberdades fundamentais e dos direitos humanos.
Com a realização da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento do Cairo no ano de 1994, reconheceu-se, como direitos humanos, os direitos reprodutivos à sexualidade, a reprodução e a saúde sexual, sem qualquer discriminação ou imposição. Sancionou-se que é direito individual da mulher definir, sem qualquer meio de coerção e de forma responsável, o direito à maternidade, devendo o Estado disponibilizar as formas para obtenção deste direito.[12]
Nessa linha, Gonçalves e Chambouleyron indicaram:
[...] a Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (Cairo, 1994), cujo produto final foi uma Declaração e um Plano de Ação, tratou do crescimento populacional sob a perspectiva do direito ao desenvolvimento e dos direitos reprodutivos. Com isso, a saúde sexual e reprodutiva passou a ser entendida como um aspecto indispensável ao completo bem-estar de homens e mulheres. As esferas da sexualidade e da reprodução, portanto, passaram a ser protegidas por direitos humanos reconhecidos em consenso, ao menos no âmbito internacional.[13]
Em 1995, a Quarta Conferência Mundial Sobre Mulheres, em Beijing, proporcionou um debate a respeito da consolidação dos direitos humanos das mulheres, reafirmando a necessidade de garantir equidade de gênero em todas as áreas e fortalecer os direitos reprodutivos das mulheres. Como plataforma de ação, propôs-se a possibilidade de revisão nas leis que penalizavam as mulheres que realizavam abortos ilegais, reconhecendo, assim, o aborto como questão de saúde pública.[14]
O artigo 97 da referida plataforma é claro ao elucidar que a interrupção da gravidez de forma clandestina é uma questão de saúde pública, devido aos riscos que se submete a gestante e, ao fim, aduz que a mulher tem pleno direito ao planejamento familiar. Assim, tem-se:
Artigo 97. Ademais, a saúde da mulher está exposta a riscos particulares devidos à inadequação dos serviços existentes e à falta desses serviços para atender às necessidades relativas à sexualidade e à saúde. As complicações relacionadas com a gravidez e o parto, em muitas partes do mundo, contam-se entre as principais causas de mortalidade e morbidade das mulheres em idade reprodutiva. Existem, em certa medida, problemas similares em alguns países com economia em transição. O aborto em condições perigosas põe em perigo a vida de um grande número de mulheres e representa um grave problema de saúde pública, porquanto são as mulheres mais pobres e jovens as que correm os maiores riscos [...] A capacidade da mulher para controlar sua própria fecundidade constitui uma base fundamental para o desfrute de outros direitos. A responsabilidade compartilhada, pela mulher e pelo homem, das questões relativas ao comportamento sexual e reprodutivo é indispensável para a melhoria da saúde da mulher.[15]
Ainda, ao final do artigo 106K, a plataforma de ação de Beijing aduziu que os governos devem ponderar sobre a revisão das leis que estabelecem normas punitivas para mulheres que praticam o abortamento ilegal:
Artigo 106K. [...] Insta-se a todos os governos e às organizações intergovernamentais e não governamentais pertinentes a revigorar o seu compromisso com a saúde da mulher, a tratar os efeitos sobre a saúde dos abortos realizados em condições inadequadas como sendo um importante problema de saúde pública e a reduzir o recurso ao aborto mediante a prestação de serviços mais amplos e melhorados de planejamento familiar. [...] Em todos os casos, as mulheres devem ter acesso a serviços de boa qualidade para o tratamento de complicações derivadas de abortos. Serviços de orientação, educação e planejamento familiar pósaborto devem ser oferecidos prontamente à mulher, o que contribuirá para evitar abortos repetidos”, considerar a possibilidade de rever as leis que prevêem medidas punitivas contra as mulheres que se tenham submetido a abortos ilegais.[16]
Assim, as Conferências Mundiais tiveram grande importância para os direitos reprodutivos, uma vez que não trataram apenas da reprodução humana mas, também, da autodeterminação pessoal do livre exercício sexual. Diversos países, como França, Canadá, Holanda e Rússia descriminalizaram a prática do abortamento em decorrência dos debates ocorridos nas conferências.[17]
Conforme Nascimento Filho,[18] os movimentos feministas, ocorridos pelo mundo, também foram de extrema importância para determinar que a mulher, e somente ela, tem o encargo de optar pela gestação ou pela contracepção, uma vez que, em grande parte dos casos, é a única a suportar as sequelas de sua vida sexual.
De grande importância foram os debates ocorridos com o passar dos anos nas conferências mundiais, fundamentalmente no que tange a autodeterminação na mulher à reprodução, posto que maiores foram os avanços para assegurar a liberdade de exercício, não mais permitindo que elas fossem subjugadas a vontades externas.[19]
2.2 DOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
A Constituição Federal de 1988 confirmou o Estado Democrático de Direito no Brasil. Nascida após décadas de ofensas aos Direitos Humanos, a Carta Magna institucionalizou, em seu texto constitucional, direitos e as garantias fundamentais.
Após vinte e um anos de ditadura militar no Brasil, a redemocratização possibilitou uma maior eficácia dos direitos dos cidadãos, garantindo a todos direitos básicos tais como a dignidade da pessoa humana e o exercício pleno da cidadania.[20]
Nas palavras de Sarlet:
No que concerne ao processo de elaboração da Constituição de 1988, há que se fazer referência, por sua umbilical vinculação com a formatação do catálogo dos direitos fundamentais na nova ordem constitucional, à circunstância de que esta foi resultado de um amplo processo de discussão oportunizado com a redemocratização do País após mais de vinte anos de ditadura militar.[21]
Foi a partir da instauração da Constituição de 1988, com a previsão dos direitos e deveres individuais e coletivos, que os cidadãos, como tais, foram lembrados. Nessa linha é o entendimento de Pinho:
A Constituição de 1988 foi a primeira a estabelecer direitos não só de indivíduos, mas também de grupos sociais, os denominados direitos coletivos. As pessoas passaram a ser coletivamente consideradas. Por outro lado, pela primeira vez, junto com direitos foram estabelecidos expressamente deveres fundamentais. Tanto os agentes públicos como os indivíduos têm obrigações específicas, inclusive a de respeitar os direitos das demais pessoas que vivem na ordem social.[22]
Em seu artigo 1º, a Constituição Federal aborda direitos fundamentais, dentre os quais o da dignidade da pessoa humana e o da cidadania. Como enfatiza Piovesan[23], a efetivação dos direitos fundamentais, à luz do princípio democrático, tem como componente essencial a união do Estado Democrático de Direito e dos direitos fundamentais.
Quanto ao tema, destaca Cogan que:
A Magna Carta, em seu artigo 1º, consagrou o Estado Democrático de Direito, expressamente adotado e, com o contexto democrático que se insurgia conta a tradição politicamente autoritária, o novo texto constitucional vem ao encontro das modernas aspirações sociais, prestigiando a nítida separação de papéis entre acusador, julgador e defensor, bem como conferindo ao acusado inúmeros direitos até então desprezados. Desta forma, a Constituição Federal veio no intuito de consagrar princípios fundamentais, a fim de resguardar a dignidade da pessoa humana e, sobretudo os direitos e garantias daqueles que se vêem acusados da prática de delitos.[24]
Como se percebe, o Estado Democrático de Direito, ao legitimar no artigo 1º da Constituição Federal os direitos e garantias fundamentais, trouxe uma nova perspectiva aos cidadãos quanto seus direitos primordiais. Garantiu-se, assim, a todos, maior eficácia na execução do pleno exercício da cidadania e na tutela da dignidade humana.
O artigo 3º, IV, expõe a promoção do bem a todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de preconceito, reafirmando o direito a dignidade da pessoa humana e a cidadania. Conforme sugere Nascimento Filho[25], a promoção do bem a todos, relaciona os direitos fundamentais com os direitos reprodutivos sem que haja alguma forma de discriminação.
Ao tratar dos direitos individuais, o artigo 5º, caput, deixa claro o princípio da igualdade, ao relatar que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. O inciso I deste mesmo artigo reafirma o princípio da igualdade de gêneros, quando destaca que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, não podendo, então, existir qualquer tipo de tratamento diferenciado entre os mesmos.
Nessa linha, Silva[26] assevera que a igualdade é fundamental para o exercício da democracia, pois não permite discriminação ou distinção, nem pode ser vista de forma individualista ou ainda que desconsidere a desigualdade entre grupos, garantindo, desta forma, isonomia perante a aplicação das leis.
A igualdade não pode ser tratada apenas de maneira formal, posto que há necessidade de resguardar e implementar direitos e obrigações de forma igual, vedando a diferenciação, salvo nos pressupostos constitucionais previstos, e de maneira sempre mais benéfica para a mulher. Desta mesma forma comenta Nascimento Filho:
Não se trata, pois, de simples igualdade formal. É mais do que igualdade perante a lei: deve-se buscar, implementar e proteger o direito a uma igualdade em direitos e obrigações. [...] Com efeito, veda-se qualquer modalidade de discriminação, com exceção das hipóteses previstas no texto constitucional e sempre de modo favorável à mulher.[27]
Por conseguinte, não mais se pode sustentar que o homem é superior a mulher, uma vez que a Carta Magna os equiparou. No momento em que há um processo de desigualdade entre homens e mulheres, existe uma violação constitucional, pois a igualdade descrita na Constituição Federal é em direitos e deveres, e não apenas em face de uma lei.[28]
Silva ainda esclarece:
[...] Mais relevante ainda é que não se trata aí de mera isonomia formal. Não é igualdade perante a lei, mas igualdade em direitos e obrigações. Significa que existem dois termos concretos de comparação: homens de um lado, mulheres de outro. Onde houver um homem e uma mulher, qualquer tratamento desigual entre eles, a propósito de situações pertinentes a ambos os sexos, constituirá uma infringência constitucional.[29]
Logo, não resta dúvidas de que a Constituição assegura que homens e mulheres são iguais perante a lei e, consequentemente, devem ser tratados do mesmo modo, sem qualquer distinção.
O princípio da dignidade da pessoa humana não é apenas constitucional, indo além das garantias e dos direitos fundamentais, visto que, além de possuir aplicação aos demais direitos, é imprescindível dispensar a todo o ser humano tratamento digno e respeitável.
Todas as normas jurídicas sujeitam-se ao princípio da dignidade da pessoa humana, tendo-a como um fundamento norteador, devendo estas normas serem analisadas e empregadas a partir deste princípio. Desta forma entende Magalhães:
O princípio da dignidade humana é o fundamento filosófico e jurídico dos direitos humanos e se expressa nestes direitos, funciona também como metanorma, indicando como devem ser interpretadas e aplicadas as outras normas e princípios, em especial as normas definidoras de direitos fundamentais, ampliando o seu sentido, reduzindo-os ou auxiliando em conflitos entre direitos fundamentais. A dignidade da pessoa humana é a chave de interpretação material das demais normas jurídicas.[30]
Ao tratar do tema, Freitas[31] indicou não se poder abordar a dignidade da pessoa humana sem tratar do direito à vida, na medida em que esta estrutura o Estado Democrático, garantindo-se direitos e deveres e, ainda, justificando a existência e a tutela da pessoa humana.
Pela doutrina, é visto como um princípio essencial, uma vez que este não é percebido apenas como um mero dogma, mas como um vetor que possui expansão de sua interpretação em todos os ramos do direito. Ainda, se verifica a partir da importância de analisar o cumprimento das garantias de estabilidade social.[32]
Nesse contexto, contribuiu Piovesan, apontando que:
Considerando que toda a Constituição há de ser compreendida como unidade e como sistema que privilegia determinados valores sociais, pode-se afirmar que a Carta de 1988 elege o valor da dignidade humana como valor essencial, que lhe dá unidade de sentido. Isto é, o valor da dignidade humana informa a ordem constitucional de 1988, imprimindo-lhe uma feição particular.[33]
Tal princípio é de vital importância, como explica Cogan[34], ao determinar que se trata de um meta-princípio, sujeitando todos aos outros princípios, pois se trata de um vértice para todo o ordenamento jurídico, norteando normas constitucionais e decisões judiciais, com o fito de garantir uma vida digna a todas as pessoas.
De acordo com Prado[35], a dignidade da pessoa humana é prerrogativa intrínseca de todo o ser humano que objetiva o desenvolvimento independente e absoluto da personalidade individual, devendo o Estado oportunizar meios de garantir que sejam respeitados os direitos fundamentais, assim como de retirar possíveis barreiras que impossibilitem sua concretização. A mais disso, tal princípio norteia todo o ordenamento jurídico, possuindo juízo axiológico e vinculando, de forma absoluta, sua atividade normativa.
Nessa linha, pontificou Fachin, in verbis:
Sobre a dignidade da pessoa humana, pode-se afirmar que, no sentido em que é compreendida contemporaneamente como princípio fundamental de que todos os demais princípios derivam e que norteia todas as regras jurídicas, não foi constituída como valor fundamental desde os primórdios da história. Ou seja, não derivou de algum direito ideal constituído previamente ao ordenamento jurídico e válido perenemente. Ao contrário, a sua validade e eficácia, como norma que foi elevada acida das regras e princípios, derivam da necessidade própria da sua integração e sua proteção nos sistemas normativos.[36]
Por essa senda, é possível dizer que, sendo a dignidade da pessoa humana um princípio soberano que percorre todo o ordenamento jurídico e sustenta os demais princípios fundamentais, uma lei que a infrinja poderia ser considerada inconstitucional.[37]
Destaca-se, ainda, que a Constituição Federal apresenta, no artigo 226, §7º, o direito à liberdade familiar, fundando-se nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável. Conforme mostra o texto constitucional, cabe ao casal a livre decisão de seu planejamento familiar, devendo o Estado possibilitar meios educacionais e científicos para a execução desse direito e coibir qualquer coerção por parte de instituições oficiais ou privadas.
Percebe-se que este dispositivo constitucional, ao assegurar que cabe somente ao casal decidir sobre o planejamento familiar, embasando-se na dignidade da pessoa humana e afirmando o direito à liberdade de escolha, acaba por excluir da esfera da antijuridicidade o aborto, podendo, dessa forma, ser considerado uma forma para o planejamento familiar. Aqui é importante referir que, ao considerar a interrupção da gestação como um método contraceptivo, não quer dizer estejam excluídas outras formas admitidas para este planejamento familiar.
Ao corroborar com o planejamento familiar a partir da paternidade responsável, se poderia suprir o aborto do rol de ilícitos penais, uma vez que não se pode proibir qualquer espécie de contracepção – partindo da idéia que a prática do abortamento também é um método contraceptivo - para que a família se mantenha dentro do número pretendido de filhos.
Como explica Dias:
Atentando a essa realidade é que a Constituição (art 226, § 7º), ao proclamar como bem maior a dignidade humana e garantir o direito à liberdade, subtraiu o aborto da esfera da antijuridicidade. No momento em que é admitido o planejamento familiar e proclamada a paternidade responsável, não é possível excluir qualquer método contraceptivo para manter a família dentro do limite pretendido. Assim, frente a norma constitucional, que autoriza o planejamento familiar, somente se pode concluir que a prática do aborto restou excluída do rol dos ilícitos penais. Mesmo que não se aceite a interrupção da gestação como meio de controlar a natalidade, inquestionável é que gestações involuntárias e indesejadas ocorrem e, somente se for respeitado o direito ao aborto, a decisão sobre o planejamento familiar se tornará efetivamente livre.[38]
Referido dispositivo, ao estabelecer que compete ao Estado proporcionar recursos educacionais e científicos para o exercício deste direito, demonstra que, além de fornecer informações de métodos de prevenção, deve também conceder os meios contraceptivos, os quais incluem os preservativos, as pílulas contraceptivas, a pílula do dia seguinte, a colocação do dispositivo intrauterino, o procedimento de laqueadura, bem como a interrupção da gestação pelas redes públicas de saúde.[39]
Como se observa, os princípios constitucionais citados trouxeram garantias de suma relevância aos cidadãos, em especial às mulheres. Equiparadas em direitos e deveres aos homens, garantiu-lhes a igualdade em todas as áreas sem qualquer discriminação, concedendo-lhes tratamento íntegro e apropriado, bem como estabelecendo que cabe somente a entidade familiar determinar a quantidade de filhos que pretende ter.
2.3 DOS DIREITOS REPRODUTIVOS DA MULHER
Direitos reprodutivos representam um direito individual de escolha em procriar, abarcando ainda a opção pelo momento mais propício para a concepção, sem a interferência do Estado. Nesse sentido, Lobo e Zapater entendem que:
Os direitos reprodutivos consistem na faculdade garantida a todo indivíduo de optar por se reproduzir ou não, no momento e frequência que desejar e espaçando cada concepção conforme esse seu desejo [...] Trata-se de direitos relacionados, em primeiro lugar, com direitos fundamentais individuais, posto que tanto homens e mulheres devem ter assegurado esse direito, bem como pelo fato de ser o livre exercício dos direitos reprodutivos corolário do direito à liberdade de escolha. Assim, a garantia constitucional de exercício dos direitos reprodutivos como direito individual deve se manifestar na ausência de qualquer interferência por parte do Estado nas decisões individuais a respeito de ter ou não, filhos, quantos e quando.[40]
Apesar de não haver referências explícitas na Constituição, sabe-se que a vida do nascituro é protegida no texto constitucional através de normas preestabelecidas[41]. Contudo, com base nos princípios trabalhados, há claramente uma questão controversa, qual seja: quando os direitos da vida humana (ainda em formação) violam os direitos fundamentais da gestante.
O artigo 5º, caput, da Constituição Federal, traz como direito principal ao ordenamento jurídico o direito fundamental à vida, proteção estendida à criança em formação. Obviamente que tal direito também abrange as mulheres. Assim, no caso da interrupção da gestação, ocorre um confronto entre o direito do feto à vida e o direito da gestante de dispor de seu corpo.[42]
Conforme relata o Dossiê Aborto inseguro, o Instituto Alan Guttmacher realizou no ano de 2000, uma estimativa da quantidade de abortos clandestinos realizados unicamente com dados do Sistema Único de Saúde brasileiro e, a conclusão foi de que a totalidade poderia variar de 750 mil a 1 milhão e 400 mil abortos. Vale acrescentar ainda, que tal panorama foi baseado nos relatos de profissionais da saúde que presenciaram a internação de mulheres em decorrência do abortamento provocado de forma clandestina, e que tais mulheres representam apenas de um terço a um quinto daquelas que realizaram a mesma prática, mas não se dirigiram a hospitais.[43]
Nesse mesmo sentido, a Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal, no ano de 2015, em audiência pública para debater a questão do aborto, realizou a Estatística do Aborto, na qual, dentre vários aspectos debatidos, constatou-se que, no Brasil, são realizados, ao ano, de 1 milhão a 1 milhão e 500 mil interrupções voluntárias de gestação.[44]
Ocorre que, ao tratar de forma igualitária a vida ainda em desenvolvimento uterino, resguardando-a constitucionalmente em sentido amplo, direitos fundamentais da gestante são confrontados e um acaba prevalecendo ao outro.[45]
A Constituição, ao legitimar o direito à vida, não atribuiu juízo de valor maior a vida extrauterina em detrimento a intrauterina, assim como não faz diferenciação entre elas. O reconhecimento do direito à vida está abrangendo todas as formas de existência humana, sejam elas na fase embrionária, em desenvolvimento ou após o nascimento.[46]
Tessaro[47] afirma que a proteção constitucional não é garantia ao nascituro de que possui status de pessoa, porque este não é sujeito de direitos e deveres, apenas sendo a ele resguardados interesses patrimoniais pelo direito civil. Ainda, para a autora, não se poderia dar caráter de valor maior ao direito à vida da criança que está por vir em relação aos demais direitos, pois o legislador assim não os valorou, não podendo, assim, acabar se sobrepondo aos outros.
Nessa perspectiva, Pedroso[48] propõe que, em alguns casos, pode haver confronto entre o bem jurídico da vida e direitos fundamentais, devendo haver um juízo avaliativo, no caso concreto, de qual direito deve prevalecer, mas que é necessário sempre levar em conta três aspectos que predominam sobre o direito à vida, sendo eles: a autonomia reprodutiva e a liberdade de escolha da mulher que não deseja continuar gestando; o direito à privacidade sem a interferência do Estado na decisão do aborto; e, finalmente, o direito à igualdade, posto que mulheres com rendimentos mais elevados realizam abortos de maneira mais segura do que aquelas com rendimentos mais baixos.
A discussão em tela retrata um confronto entre direitos fundamentais[49] onde de um lado está o direito à vida do feto e, do outro, dois direitos fundamentais da mulher, os relativos à integridades física e psíquica. Para o autor, o aborto é uma questão de igualdade, uma vez que o encargo da gestação é apenas da gestante, e o direito de interromper esta gravidez equipara-as aos homens. Neste contexto, assevera Barroso:
No plano do valor intrínseco, o debate sobre o aborto representa uma colisão entre valores e direitos fundamentais. Para aqueles que acreditam que o feto deve ser tratado como uma vida humana que se inicia com a fecundação-premissa admitida apenas para fins de argumentação- o aborto claramente configura uma violação do direito à vida do feto. Esse é o principal argumento subjacente ao movimento pró-vida, servindo de fundamento para a conclusão de que o aborto é moralmente errado. Por outro lado, a gravidez e o direito de interrompê-la possuem implicações sobre a integridade física e psíquica da mulher, sobre o poder de controlar o seu próprio corpo. Além disso, o aborto também deve ser considerado como um questão de igualdade, pois como apenas as mulheres carregam o ônus integral da gravidez, o direito de interrompê-la coloca-as em uma posição equivalente à dos homens.[50]
Como se percebe, é imprescindível dizer que o direito da gestante, nesses casos, deve ser predominante, devendo preponderar a autonomia de vontade da mulher (no sentido de determinar se vai continuar ou interromper a gestação) ao direito à vida do nascituro. De qualquer sorte, isto não quer dizer que a vida intrauterina não deva ter nenhuma espécie de proteção.
Essencialmente, para uma mulher exercer plenamente o direito à liberdade, é necessário que ela tenha plena disponibilidade do próprio corpo, podendo fazer o que desejar com ele. No momento em que o Estado restringe seu direito de decidir pela gestação ou contracepção, não tendo ela autonomia sobre sua vontade e seu corpo, lhe é retirado um direito primordial.[51]
Como sugere Dworkin:
As leis que proíbem o aborto, ou que o tornam mais difícil e caro para as mulheres que desejam fazê-lo, privam as mulheres grávidas de uma liberdade ou oportunidade que é crucial para muitas delas. Uma mulher forçada a ter uma criança que não deseja porque não pode fazer um aborto seguro pouco depois de ter engravidado não é dona de seu próprio corpo, pois a lei lhe impõe uma espécie de escravidão. Para muitas mulheres, ter filhos indesejados significa a destruição de suas próprias vidas, porque elas próprias não deixaram ainda de ser crianças, porque não mais poderão trabalhar, estudar ou viver de acordo com o que consideram importante, ou porque não têm condições financeiras de manter os filhos.[52]
Nesse sentido, também é o posicionamento de Mendes:
O direito à autodeterminação, especificamente quanto ao direito de decidir sobre ser ou não mãe, é um direito que é, ao mesmo tempo, fundamental e exclusivo das mulheres porque forma um todo com a liberdade pessoal (autodeterminação) da mulher em optar em se tornar mãe. Trata-se, portanto, de uma liberdade negativa, de uma alternativa de ação.[53]
Afinal, a Constituição não estabeleceu o momento em que se inicia a vida, sendo esta uma concepção pessoal de cada uma, com base em pretensões morais e religiosas. Nessa linha, a ilicitude da prática abortiva equivaleria a obrigação de ser mãe e formar um filho.[54]
Imprescindível dizer que retirar o direito de escolha da gestante, não lhe permitindo dispor sobre seu corpo, ofende frontalmente à dignidade da pessoa humana no que se refere à igualdade de gênero, posto que desrespeita sua autonomia.
3 A CONTROVÉRSIA JURÍDICA DA TUTELA PENAL DO CORPO DA MULHER: OS DIREITOS DO FETO
3.1 BREVE SÍNTESE SOBRE O ABORTO ATRAVÉS DOS TEMPOS
Etimologicamente, aborto, deriva de abortus, que significa privação do nascimento. A prática do abortamento consiste em suspender a gestação, eliminando o produto da concepção de forma dolosa, independente do momento em que a gestação se encontra.[55]
Conforme informa Matielo[56] existem relatos da utilização deste método de interrupção da gravidez expostos na China, por volta do século XXVIII antes de Cristo.
A prática do aborto com o decorrer dos séculos foi debatida e analisada por muitos povos, dentre eles os israelitas, os mesopotâmicos, os romanos e os gregos. Contudo, vale destacar que estes povos não se preocupavam com o aborto pelo seu viés criminal, mas sim por suas implicações morais.[57]
Matielo[58] assevera que, em remotas legislações, algumas civilizações incriminavam a prática do abortamento com penas importantes, sendo excepcionalmente aceitável a concessão da interrupção da gestação fundada em severos requisitos, posto que a regra era sua proibição com base em preceitos morais e legais.
Ainda assim, apesar do abortamento não ser aceito pela maioria dos povos, aqueles que autorizavam a utilização de métodos abortivos, o faziam sob o pretexto de que tal prática tinha como objetivo o controle do crescimento da população.[59]
O Código de Hamurabi, assim como a Bíblia, se fixava muito mais a ideia de compensar ou ressarcir o dano causado, do que se detinha a prática da interrupção da gravidez. Por sua vez, o Código de Manu, aplicado na Índia, ponderava o aborto como um ato criminoso onde, se deste ato resulta-se na morte da mulher da casta dos padres, o responsável era castigado com penas corporais, inclusive podendo ser condenado à morte. Aqui, é importante frisar que tal penalidade era equivalente a aniquilar com a vida de um Brahmane.[60]
Outro exemplo é o código de conduta da Pérsia, que determinava que, caso a mulher, por vergonha, destruísse seu feto, seus pais responderiam juntamente com a mesma, sendo execrados nas ruas e, após, executados. Ainda, para gregos, romanos, cínicos e estóicos, chegou-se a ser aconselhada a prática ilimitada do abortamento. Contudo, esta determinação foi, numa determinada época, coibida, sob o fundamento de que, sendo a mulher submissa ao marido, as leis deveriam salvaguardar os direitos do pai. Gregos e romanos apenas aconselhavam a interrupção da gravidez no caso de gravidez fora do matrimônio.[61]
Os filósofos Platão e Aristóteles defendiam a prática da interrupção da gravidez como forma de conter o crescimento da população. Aristóteles arguia que o aborto poderia ser praticado se este ocorresse antes do feto receber os sentidos e a vida, porém não especificou qual o momento da ocorrência desse fato. Sócrates, outro filósofo, também defendia o abortamento, porém usando a liberdade de escolha como argumentação para tal prática.[62]
Relata, ainda, Matielo[63] que, durante o período da República romana, em que a vaidade levava as gestantes a praticarem a interrupção da gestação, criou-se a Lei Cornélia, que condenava a mulher que consentisse com o aborto à pena de morte, bem como aos que a auxiliavam.
Por fim, com o surgimento do Cristianismo, alterou-se a visão quanto a prática do aborto. O mesmo continuou a ser considerado um ato proibido. Entretanto, a preocupação da época era com a alma do nascituro, se até aquele momento já havia sido ou não concedida por Deus.[64]
Como se pode perceber, o assunto sempre foi muito debatido com o passar dos séculos, sendo, por muitos, apontado como problema e, por outros, como uma prevenção.
3.2 O CRIME DE ABORTO NO BRASIL
No Código Criminal de 1830 foi especificado pela primeira vez como crime a prática de aborto. Na época, foi previsto, no artigo 199, como crime o aborto consentido e o sofrido. A gestante não era punida em qualquer uma das hipóteses, sendo imposta somente a terceiros a responsabilidade da execução do aborto.[65]
Dom Pedro I, ao promulgar o referido código criminal, quanto a interrupção da gravidez, estabeleceu que:
Artigo 199. Occasionar aborto por qualquer meio empregado interior, ou exteriormente com o consentimento da mulher pejada.
Penas – de prisão com trabalho por um a cinco annos.
Se este crime for commetido sem consetimento da mulher pejada
Penas – dobradas.[66]
Como se percebe, tal artigo de lei previa, à época, a sanção para o crime de abortamento consentido, que era a pena de prisão com trabalho por um a cinco anos, enquanto para o crime de abortamento sofrido havia a cominação de o dobro da mesma pena.
O Código Criminal de 1890 aclamou o tema nos artigos 300 a 302, tratando como ilícito penal o aborto com ou sem eliminação do feto.
O artigo 300 consistia em criminalizar a interrupção da gravidez, tendo havido ou não a expulsão do feto. Previa que, na primeira hipótese, a sanção seria a prisão de dois à seis anos, enquanto na segunda hipóteses seria de seis meses a um ano. Ainda, em seu parágrafo primeiro, previu a pena de seis a vinte e quatro anos se, em consequência do aborto, a gestante viesse a falecer. Por fim, o mesmo artigo estabeleceu, no parágrafo segundo, penalidade ao médico ou à parteira que cometesse tal prática, estipulando que também seria de seis a vinte e quatro anos, bem como retirava-lhes o direito de exercício da profissão pelo menos período de tempo da condenação:
Artigo 300. Provocar abôrto, haja ou não a expulsão do fructo da concepção:
No primeiro caso - pena de prisão cellular por dous a seis annos.
No segundo caso - pena de prisão cellular por seis mezes a um anno.
§ 1º Si em consequencia do abôrto, ou dos meios empregados para provocal-o, seguir-se a morte da mulher:
Pena - de prisão cellular de seis a vinte e quatro annos.
§ 2º Si o abôrto for provocado por medico, ou parteira legalmente habilitada para o exercicio da medicina:
Pena - a mesma precedentemente estabelecida, e a de privação do exercicio da profissão por tempo igual ao da condemnação.[67]
Já o artigo 301 tratou do aborto realizado com a concordância da gestante, onde determinou a pena privativa de liberdade de um a cinco anos, bem como, em seu parágrafo primeiro, tratou da interrupção da gravidez nos casos em que a prática era realizada para ocultar a desonra da mulher:
Artigo 301. Provocar abôrto com annuencia e accordo da gestante:
Pena - de prissão cellular por um a cinco annos.
Paragrapho unico. Em igual pena incorrerá a gestante que conseguir abortar voluntariamente, empregado para esse fim os meios; e com reducção da terça parte, si o crime for commettido para occultar a deshonra propria.[68]
Previu, ainda, no artigo 302, a penalização ao médico ou da parteira que, ao praticar o aborto necessário, por negligência ou imperícia, causasse a morte da gestaste. A sanção para este caso era a prisão por dois meses à dois anos e, ainda, a impossibilidade de exercer a profissão pelo mesmo período de pena:
Artigo 302. Si o medico, ou parteira, praticando o abôrto legal, ou abôrto necessario, para salvar a gestante de morte inevitavel, occasionar-lhe a morte por impericia ou negligencia:
Pena - de prisão cellular por dous mezes a dous annos, e privação do exercicio da profisão por igual tempo ao da condemnação.[69]
Nesse sentido, ao tratar do tema, assevera Fernandes[70] que, quando em decorrência de meio abortivos e havendo a eliminação do feto, a sanção era mais rígida. Em se tratando de abortamento praticado para encobrir desonra sofrida, era aplicada atenuante especial de pena. Já no caso de aborto sofrido, resultando a morte da gestante, era qualificado. Somente era permitido o abortamento no caso de morte iminente da gestante, punindo apenas se realizado por médico.
Por sua vez, o Código Penal brasileiro vigente, promulgado em 1940, dispôs sobre o aborto praticado, de forma dolosa, pela gestante ou por terceiros durante todo o período gestacional.
O artigo 124 consiste em penalizar a gestante que induzir o aborto ou que permitir que outra pessoa realize esta interrupção. Em outras palavras, pune a própria mulher que realiza o abortamento ou mesmo que permita que outra pessoa o faça. Para a mulher que autorizar a prática da interrupção, as penas vão de um a três anos de detenção. Desta forma segue: “Art. 124 - Provocar aborto em si mesma ou consentir que outrem lho provoque: Pena - detenção, de um a três anos”.[71]
Já para o terceiro que provocar a interrupção da gestação, com o consentimento da gestante, a previsão do delito está no artigo 126, com pena de reclusão variando de um a quatro anos.
Ainda, no parágrafo único do artigo 126, há a previsão de sanção de reclusão, de um a quatro anos, quando o abortamento for executado em mulher com menos de quatorze anos, em alienada ou débil mental, ou se ainda exercido mediante fraude, grave ameaça ou violência:
Artigo 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante:
Pena - reclusão, de um a quatro anos.
Parágrafo único. Aplica-se a pena do artigo anterior, se a gestante não é maior de quatorze anos, ou é alienada ou débil mental, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência.[72]
No artigo 127, o legislador previu a forma qualificada do aborto, com aumento da pena de um terço quando a gestante sofre lesão corporal de natureza grave e duplicada caso venha a óbito. Vale destacar que a forma qualificada, neste caso, observa a previsão do aborto consentido pela gestante:
Artigo 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentadas de um terço, se, em consequência do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevém a morte.[73]
Aqui é importante ressaltar que o artigo 128 do Código Penal prevê a causa excludente de ilicitude do aborto quando for praticado por médico em duas hipóteses: ao tratar-se de aborto terapêutico, visando a salvar a vida da gestante; bem como quando disser respeito ao aborto necessário ou aborto sentimental, decorrente de gravidez resultante de estupro:
Artigo 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:
I - se não há outro meio de salvar a vida da gestante;
II - se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.[74]
É importante destacar que, no caso de aborto sentimental, o Código Penal não solicita qualquer tipo de documentação, ou até mesmo boletim de ocorrência. A simples declaração da mulher grávida que sofreu violência sexual basta para a realização do procedimento, não cabendo ao médico contestar da gestante. A gestante, neste caso deve ser aconselhada a tomar as devidas providências policiais e judiciais, mas caso não o faça, a interrupção da gestação não lhe pode ser negada.
Desta forma, o Ministério da Saúde esclarece em sua norma denominada Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes:
O Código Penal não exige qualquer documento para a prática do abortamento nesse caso, a não ser o consentimento da mulher. Assim, a mulher que sofre violência sexual não tem o dever legal de noticiar o fato à polícia. Deve-se orientá-la a tomar as providências policiais e judiciais cabíveis, mas caso ela não o faça, não lhe pode ser negado o abortamento. O Código Penal afirma que a palavra da mulher que busca os serviços de saúde afirmando ter sofrido violência, deve ter credibilidade, ética e legalmente, devendo ser recebida como presunção de veracidade. O objetivo do serviço de saúde é garantir o exercício do direito à saúde, portanto não cabe ao profissional de saúde duvidar da palavra da vítima, o que agravaria ainda mais as consequências da violência sofrida. Seus procedimentos não devem ser confundidos com os procedimentos reservados a Polícia ou Justiça. Caso revele-se, após o abortamento, que a gravidez não foi resultado de violência sexual, o Código Penal brasileiro, artigo 20, § 1º, afirma que “é isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima”. Assim, se todas as cautelas procedimentais foram cumpridas pelo serviço de saúde, no caso de verificar-se, posteriormente, a inverdade da alegação de violência sexual somente a gestante, em tal caso, responderá criminalmente pelo crime de aborto.[75]
Para além dessas hipóteses, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental número 54, declarando a inconstitucionalidade da compreensão de que a interrupção da gestação de feto anencefálico seria conduta típica, prevista nos artigos. 124, 126 e 128, I e II, todos estes do Código Penal.
Esta decisão foi de suma importância, pois outorgou a gestante autonomia em poder decidir sobre a interrupção da gestação de feto que possui má-formação. Ainda, garantiu a ela liberdade de escolha em interromper a gravidez, no caso de anencefalia, assegurando sua dignidade enquanto pessoa, não precisando ela colocar sua saúde em risco.
Esta ação foi proposta no ano de 2004, e tinha como fundamento que a interrupção da gravidez de feto anencefálico não se configurasse aborto, uma vez que não haveria expectativa de vida para o nascituro com esta má-formação cerebral. Foi julgada apenas no ano de 2012, sendo aprovada por oito votos a favor e dois votos contra.
Conforme o voto do Relator, Ministro Marco Aurélio Mello:
[...] Não se coaduna com o princípio da proporcionalidade proteger apenas um dos seres da relação, privilegiar aquele que, no caso da anencefalia, não tem sequer expectativa de vida extrauterina, aniquilando, em contrapartida, os direitos da mulher, impingindo-lhe sacrifício desarrazoado. A imposição estatal da manutenção de gravidez cujo resultado final será irremediavelmente a morte do feto vai de encontro aos princípios basilares do sistema constitucional, mais precisamente à dignidade da pessoa humana, à liberdade, à autodeterminação, à saúde, ao direito de privacidade, ao reconhecimento pleno dos direitos sexuais e reprodutivos de milhares de mulheres. O ato de obrigar a mulher a manter a gestação, colocando-a em uma espécie de cárcere privado em seu próprio corpo, desprovida do mínimo essencial de autodeterminação e liberdade, assemelha-se à tortura ou a um sacrifício que não pode ser pedido a qualquer pessoa ou dela exigido.[76]
Em outras palavras, o Relator, entendeu que, no caso de anencefalia, a interrupção da gestação engloba o princípio da dignidade da pessoa humana e da liberdade, bem como a autodeterminação, o direito à saúde e a legitimação dos direitos reprodutivos e sexuais das mulheres.
Importante frisar que a procedência dessa decisão não descriminalizou o aborto, apenas permitiu a gestante que, se assim quiser, possa interromper a gestação, desde que comprovada a anencefalia do nascituro.
3.3 DO DIREITO DO FETO
A personalidade civil inicia a partir do nascimento com vida, mas são protegidos, desde a concepção, os direitos do nascituro, conforme descrito no artigo 2º do Código Civil Brasileiro. Essa norma trouxe, para muitos doutrinadores, o pensamento de que a vida tem como ponto inicial a concepção, sendo assim um direito absoluto e, portanto, não podendo ser passível à interrupção da gestação.
A doutrina brasileira, nesta perspectiva, divide-se em duas teorias quanto ao início da personalidade civil: a teoria natalista e a concepcionista. A primeira tem como fundamento a letra fria do artigo 2º do Código Civil, ou seja, que a personalidade apenas surge com o nascimento com vida, mas coloca à salvo os direitos no feto desde sua concepção; já a segunda fundamenta que o nascituro, desde a concepção, já é considerado ser humano, podendo, inclusive, ser titular de relações jurídicas.[77]
Para Tessaro[78], o ordenamento jurídico adota a perspectiva concepcional segundo a qual, mesmo ainda não sendo conceituado como pessoa, o início da vida é tido desde a concepção, ainda, com a nidação (momento em que ocorre a implantação do zigoto no útero da mulher) e, desde este instante, nosso ordenamento jurídico já reconhece e resguarda o direito à vida, bem como à sua proteção.
No entanto, Souza Filho[79] entende que o ordenamento jurídico brasileiro adotou a denominada “teoria natalista”, segundo a qual a personalidade jurídica só ocorre após o nascimento com vida, salvaguardando-a, contudo, desde o momento em que foi gerada.
A par disso, de acordo com Fachin,[80] a Constituição, promulgada em 1988, ao alterar o sistema constitucional, prevê, através de um prisma principiológico, a dignidade da pessoa de forma instrínseca, oportunizando juízo de valor e fundamentos normativos para os direitos não patrimoniais, e, neste, caso o direito de personalidade. Ademais, a Carta Magna entende que a vida deixou de ser somente um direito fundamental tutelado, pois o ordenamento jurídico o transformou em norma basilar a outros direitos.
Também, a Constituição Federal, ao reconhecer a dignidade da pessoa humana como princípio norteador e garantidor do exercício de demais direitos, vem salvaguardando o direito à vida. No entendimento de Magalhães:
Compete ao legislador assegurar os direitos humanos, tanto de caráter individual como social, reconhecendo, preliminarmente, o primado da dignidade da pessoa humana. Portanto, esta declaração nada mais é do que o reconhecimento da necessidade de assegurar a dignidade da pessoa através do exercício de seus direitos, sendo o primeiro e basilar o direito à vida. A garantia de qualquer outro direito pressupõe a salvaguarda da vida, eis que a existência humana é pressuposto da liberdade.[81]
No que tange ao direito de personalidade, este possui abrangência em todo o ordenamento jurídico, fundando-se a partir da dignidade da pessoa humana. Ainda, busca o aperfeiçoamento do ser humano, tanto do direito público quanto do privado, possibilitando, assim, de forma ampla, o progresso do ser humano. Nesse contexto, propõe Scheibe:
[...] a tutela aos direitos de personalidade está relacionada à tutela dos direitos fundamentais, que tem como fundamento, e referência para todo o ordenamento jurídico, a dignidade da pessoa humana. Esta nova percepção provocou a afirmação de um direito geral de personalidade, que não está relacionado nem exclusivamente ao direito privado, tampouco somente ao direito público, mas que diz respeito a preocupação, em sí, com a promoção de uma forma geral do ser humano e seu desenvolvimento, adequado às novas realidades de uma sociedade complexa e globalizada.[82]
No caso da criança ainda em formação intrauterina, o sistema jurídico brasileiro assegurou a ela os direitos desde o momento de sua concepção, e não somente após seu nascimento com vida. Inclusive, proporcionando que seja representante em relações jurídicas, ainda que representada por terceiros.
Assim, consoante Lando e Corso:
Quanto ao nascituro, são concedidos pela lei direitos para o nascimento com vida, e também se verifica no sistema jurídico a existência de direitos pessoais conferidos ao nascituro enquanto está no ventre materno. Isso, porque se reconhece nele o status de pessoa, pessoa em desenvolvimento, como são as crianças e adolescentes, e da mesma forma, ao nascituro deve ser atribuída personalidade jurídica formal e poder de titularizar relações jurídicas para ter o seu direito à vida efetivamente garantido. Sabe-se que o nascituro não terá, de fato, capacidade para, sozinho, reivindicar o citado direito, mas terá o direito assegurado, inclusive de ser representado por curador nomeado para exercê-lo em seu favor.[83]
Seguindo a mesma linha de raciocínio, Andrade[84] refere que não há diferenciação entre a vida intrauterina e a extrauterina, porquanto ambos possuem garantias, como a saúde, a representação, a ser consumidor, a proteção da integridade física e moral, a sucessão, o recebimento de alimentos, entre outros que não estabelecidos explicitamente no Código Civil, permitindo, desta forma, uma ampla leitura da norma. O autor complementa igualmente que:
Ora, se o ordenamento jurídico civil concede e ao mesmo tempo protege os direitos do nascituro, assim como o faz por entender ser este novo ser, pessoa humana dotada de personalidade, não existindo razão para deixarmos de reconhecê-lo, desde a sua concepção, como pessoa humana – sujeito de todos os direitos que lhe possam ser atribuídos. Ademais, cumpre lembrar que devemos também interpretar a normal civil à luz da Constituição Federal Brasileira/1988, que em seu art. 5º, caput, garante a todos indistintamente o direito à vida.[85]
Poderia se dizer ainda que, uma vez que o requisito, para obter direitos de personalidade, é ser considerado pessoa, e, partindo do pressuposto de que a simples existência do ser humano preenche esta condição, pode o nascituro também ser qualificado assim, pois existe vida, mesmo na situação intrauterina.[86]
Nesse mesmo sentido, o artigo 7º[87] do Estatuto da Criança e do Adolescente, promulgado no ano de 1990, também garante a proteção do direito à vida e à saúde do nascituro, ao assegurar ele uma vida sadia e equilibrada, através de políticas sociais públicas.
No que concerne ao direito à vida, este possui ligação direta ao direito de nascer, na medida em todos os seres humanos gerados possuem o direito de vir ao mundo e, como já mencionado, sendo considerado crime pelo Código Penal a cessação à gestação, seja com ou sem a permissão da gestante.
Dando destaque ao tema, segundo Freitas[88], o direito à vida encontra-se presente nas fases intrauterina e na extrauterina, devendo ser protegido, no âmbito penal, o nascituro da mesma forma como se protege quem já nasceu. Também entende o autor que, neste passo, cabe os tipos penais de homicídio e lesões nas formas culposa em dolosa, em favor do nascituro.
Ainda, quanto ao direito à vida, o artigo 4º, 1 do Pacto de San José da Costa Rica, ratificado pelo Brasil, estabelece que deve ser preservada a vida, desde a concepção, não podendo que seja retirada de forma arbitral. Esse Tratado Internacional protege, de modo expresso, a vida do feto, vedando qualquer forma de eliminação ou privação da vida ainda em desenvolvimento. Assim segue:
Artigo 4º, 1. Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua vida. Esse direito deve ser protegido pela lei e, em geral, desde o momento da concepção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente.[89]
Nesse aspecto, como assinala Martins[90], o aborto nada mais é do que a pena de morte do nascituro, não podendo, assim, ser legalizado, em face das previsões dispostas na Constituição Federal, no Pacto San José da Costa Rica e no Código Civil. Outrossim, o autor complementa que tal tratado veda o homicídio intrauterino, sem prever exceções para tal prática.
No tocante ao assunto, corrobora com o autor acima Freitas, ao explicar que:
Contudo, deve-se frisar que o nascituro (pouco importando a fase na qual se encontra, como, v.g., a embrionária) é titular do direito fundamental à Vida, isto é, do direito de existir, que não pode ser aniquilado de forma arbitrária. Desde o momento no qual se ateste cientificamente que existe vida, podemos dizer que está presente o direito fundamental do embrião de existir, pelo que, definido pela ciência o momento da vida humana, imediatamente o Estado e o Direito devem atuar para garantir sua inviolabilidade. Este aspecto, inclusive, é consagrado pela regra Ius Cogens prevista no art. 4,§ 1º, da Convenção Americana dos Direitos Humanos – Pacto São José da Costa Rica, que impõe a proteção da Vida Humana desde o momento da concepção.[91]
Conforme ensina Matielo[92], não há que se falar em legalização do aborto, uma vez que a Constituição Federal resguarda o direito à vida, bem como o artigo 60, §4º, IV da referida lei consagra a proibição de emenda constitucional que tenha por objetivo extinguir direitos ou garantias fundamentais, tornando-se inviável a descriminalização da interrupção gestacional.
Martins Filho[93] entende que a legislação deve resguardar o direito do elo mais fraco frente ao mais forte e estaca que se trata de assassinar uma vida humana, independente de substituir o termo “aborto” por qualquer outro, como interrupção da gestação ou antecipação do parto.
Assim, possuindo o nascituro direitos indisponíveis, não poderá a mulher reivindicar a autonomia do seu corpo, pelo menos, enquanto estiver gerando outro ser, já que o Estado salvaguarda relações de cunho moral jurídico e social.[94]
Sugere Magalhães, nesse passo, que:
A autorização para matar uma criança inocente consiste na perda do próprio alicerce do estado que é a proteção do direito à vida dos cidadãos, como dever inalienável. Seria a perda do significado da própria finalidade do Estado: proteger o bem comum. Um Estado homicida é o Estado da barbárie.[95]
Dal Molin[96] assevera que o abortamento, em hipótese alguma, poderá ser considerado como um método de contracepção, primeiramente, por ser não somente tipificado como crime, mas também, por ferir direitos do nascituro, como o direito à vida.
Nogueira[97] expõe que o abortamento não pode ser entendido como um método anticoncepcional, visto que existem outros mecanismos que têm por objetivo previnir a concepção, como, por exemplo, os procedimentos cirúrgicos de vasectomia e ligadura das trompas. Ademais, o autor sustenta a necessidade do planejamento familiar, a fim de estabilizar financeiramente a família para as despesas que a vida estabelece.
Como se percebe, existe uma forte corrente doutrinária que não aceita a interrupção da gestação, porque feriria a direito à vida do feto. Essa corrente afirma que o direito à vida é o princípio mais fundamental, que alicerça todos os demais e, por isso, não pode a gestante praticar tal ato, senão nos casos previstos na legislação.
4 A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO VOLUNTÁRIO A PARTIR DE UMA LAICIZAÇÃO PENAL TARDIA
4.1 O DIREITO, A MORAL E O ABORTO
O direito e a moral sempre caminharam juntos. Contudo, as questões jurídicas distinguem-se das questões morais, não havendo entre elas ligação de juízo de valor, normas religiosas ou ainda de valores ético-políticos. Os preceitos morais se vinculam apenas nos preceitos individuais e não se findam em direito ou até mesmo em regras de cunho social ou religioso.[98]
Importante destacar que a diferenciação entre direito e moral baseia-se na liberdade dessas duas áreas. Nesta ótica, o direito e o Estado não dispõem ou exercem meios axiológicos, assim como não se assentam em meios morais que não representem ganho as pessoas, apenas sendo legitimado para garantir os direitos.[99]
Corroborando com a ideia a cima exposta, Ferrajoli assinala:
Em efeito, laicidade do direito e laicidade da moral significam, a meu entender, a recíproca autonomia das duas esferas: de uma lado, o princípio segundo o qual o direito não deve ser nunca utilizado como instrumento de mero reforçamento da (isso é, de uma determinada) moral, mas unicamente como técnica de tutela de interesses e necessidades vitais; de outro, o princípio, inverso e simétrico, pelo qual a moral, se contar com uma adesão sincera, não requer, mas exclui e rejeita o apoio heterônomo e coercitivo do direito. [tradução nossa][100]
Esta tese, constituída no começo da Idade Média, demonstra o desprendimento do direito e da moral com as questões religiosas e culturais, desconectando um ao outro, e, ainda, idealizando uma sociedade liberal. Transformaram-se, o direito e a moral, em preceitos laicos, dotados de autonomia e discernimento particular.
Assim, não poderia o Estado intervir coercitivamente na vida das pessoas com um fim que não jurídico. Ao oposto, deveria possibilitar a segurança, a igualdade, aplicando os necessários para tanto, como os direitos fundamentais, mas jamais intervindo ou interferindo na moral das pessoas, impondo normas morais, religiosas, sociais ou até mesmo culturais. Consoante Ferrajoli:
O Estado não tem portanto de se meter na vida moral dos cidadãos, defendendo ou impedindo estilos morais de vida, crenças ideológicas ou religiosas, opções ou atitudes culturais. O seu dever é apenas o de garantir a igualdade, a segurança e os mínimos vitais.[101]
Caberia, pois, ao Estado promover meios que assegurassem a aplicação dos direitos fundamentais a todos, bem como que o mesmo fosse imparcial, moralmente ou ideologicamente.[102]
O direito deveria garantir a paz e as relações civis a fim de evitar ofensas, e jamais estabelecer punições sem necessidade. Da mesma forma, não poderia ser um meio de auxílio a moral, devendo eles permanecerem separados, uma vez que não é possível proibir ou criminalizar uma conduta apenas por ser conceituada como pecado.[103]
Explica Ferrajoli[104] que o ser acaba por se sobressair ao dever ser, ou vice-versa, em razão de que o conflito está entre a normatividade das leis e na efetividade de exercício das atividades ora normatizadas, causando discussões em campos como teóricos, filosóficos e fenomenológicos.
Nesse linha, ainda ensina Ferrajoli[105] que os ordenamentos de uma Constituição se caracterizam por uma dupla artificialidade: o de tomar decisões não somente pelo caráter positivo das normas existentes, mas ainda por sua submissão ao direito. Também explica que, se o ser não pode derivar-se de uma natureza moral, uma vez que as normas são criadas e pensadas pelos homens, em virtude disto o dever ser tem que estar positivado por normas que disciplinem as opções que o direito pensou e projetou.
No caso do aborto, o entendimento do nosso ordenamento jurídico é fundado em normativas repletas de preceitos morais, religiosos, culturais e sociais.
A partir de uma lente garantista, não poderia, um Estado laico, adotar uma tese moral, como estabelecer que o nascituro já é uma pessoa, e impor a todos, principalmente as gestantes que não concordam com tal argumento e terão que se submeter a gestação. Nesse sentido:
[...] Mas então, se a questão de o feto (como o embrião) ser ou não uma pessoa não é uma questão científica ou de facto, sendo no plano empírico irresolúvel, mas antes uma questão moral que admite soluções diferentes e opináveis, ela não pode ser resolvida pelo direito, se se perfilhar o princípio laico e liberal da separação entre direito e moral, privilegiando uma determinada tese moral, a que considera o feto uma pessoa, impondo-a a todos e por isso obrigando também as mulheres que discordam dela a sujeitarem-se a conseqüências dramáticas.[106]
Neste caso, Ferrajoli[107] sugere, com base na lei italiana nº 194 de 22 de maio de 1978, no que tange o pluralismo moral bem como na convicção de que cada um pode adquirir seus próprios preceitos morais, que seja estabelecido o prazo de três meses para a realização do abortamento. O autor ainda destaca que tal prazo não se justifica por questões biológicas, mas sim por ser período de tempo plausível para a mulher decidir, com base em sua autodeterminação moral e sua dignidade enquanto pessoa, se pretende interromper a gestação ou não.
Tendo a mulher autonomia moral, cabe somente a ela a decisão quanto ao feto possuir ou não a natureza de “pessoa”. Assim, em outras palavras, apenas quando o nascituro for planejado e considerado como pessoa pela gestante é que este terá tutelado seus direitos.[108]
Deste modo, o Estado e o direito não podem intrometer-se no campo moral de vida das pessoas, em suas crenças, em sua vida privada ou mesmo em sua liberdade de agir, exceto quando os atos praticados prejudiquem outras pessoas.
4.2 OS PRINCÍPIOS AXIOLÓGICOS DA SEPARAÇÃO ENTRE DIREITO E MORAL
No que tange ao direito penal, a doutrina indica três princípios de juízo de valor sobre a separação entre direito e moral. O Estado e o direito não podem ter como motivação a moral, desligando-se de possíveis vantagens e apenas visando buscar meios próprios de atingir garantias e segurança.
Menciona Ferrajoli:
Entendida nesse sentido, a separação entre o direito e a moral, ou entre a legitimação interna e justificação externa, é um princípio político do liberalismo moderno – meta jurídico e meta-moral – que serve para fundamentar a autonomia recíproca das duas esferas. O direito e o Estado – sob esta opção laica e liberal – não podem nem encarnam valores como tais, nem tampouco devem ter fins morais desvinculados dos interesses das pessoas ou menos ainda ser fim em si mesmo, justificando-se só com o propósito de perseguir fins de utilidade concreta em favor dos cidadãos e principalmente de garantir seus direitos e sua segurança. [tradução nossa][109]
Temos como princípios axiológicos às concepções do delito, do processo e da pena. Nesse sentido, o emprego do delito visa apenas deter os atos nocivos a outros, e não fixar ou determinar a moral. No princípio do delito não pode existir referências que indiquem implicação moral (sem, entretanto, impor restrições quanto ao valor ético-político do bem protegido). Neste caso, é possível ter uma norma considerada como imoral e ao mesmo tempo fundamentada em argumentos morais e políticos.[110]
O princípio do delito observa que o legislador não pode criar normas que condicionam, ou até mesmo corroborem, com uma atitude moral, podendo apenas prever qual e quando o ato for praticado por terceiros de forma dolosa. Assim, para que haja a consequente penalização, é necessário que se insulte, de forma objetiva, o bem jurídico alheio protegido pelas leis penais, devendo o Estado apenas garantir a segurança e não agir de forma impor a moralidade nos cidadãos.
Ferrajoli ensina:
Para que possa proibir e punir condutas, o princípio utilitarista da separação entre o direito e a moral exige como necessário que prejudique de um modo concreto bens jurídicos alheios, cuja tutela é a única justificação das leis penais como técnicas de prevenção a lesão. O Estado, em suma, não deve intrometer-se coercitivamente na vida moral dos cidadãos e nem tampouco promover coercitivamente sua moralidade, senão para tutelar a segurança, impedindo que se prejudiquem uns aos outros. [tradução nossa][111]
Assim, não pode o Estado intrometer-se coercitivamente na vida moral das pessoas, somente podendo tutelar direitos quando ocasionar danos a outras pessoas.
No processo, leva-se em linha de conta três pressupostos, quais sejam: a lesão, a conduta praticada e a culpabilidade do agente. Essas garantias penais são necessárias para garantir o juízo, devendo ser dotadas de imparcialidade, na medida em que são regras que regulamentam a jurisdição.
O princípio do processo não pode tratar sobre a moral, ou ainda sobre a índole do acusado, devendo deter-se apenas sobre o evento a partir do qual é culpabilizado o réu. Ou seja, o acusado deve ser penalizado pelo ato que cometeu e não pelo que está intrínseco na pessoa que praticou o delito.
Desta forma, esclarece Ferrajoli:
[...] O princípio normativo da separação exige que o juízo não trate acerca da moralidade, ou do caráter, ou outros aspectos substanciais da personalidade do réu, mas apenas sobre atos penalmente proibidos que lhe são imputados e que são, por outra parte, o único que pode ser empiricamente provado pela acusação refutada pela defesa. O juiz, por conseguinte, não deve submeter-se a questionamentos da alma do imputado, nem deve emitir veredictos morais sobre sua pessoa, somente investigar seus comportamentos proibidos. Um cidadão pode ser punido somente por aquilo que fez, e não, como no juízo de moral, por aquilo que é. [tradução nossa][112]
Nessa perspectiva, o delito deve estar estabelecido na lei bem como embasado em situações comuns determinadas com o objetivo de chegar a debates jurídicos que determinem a natureza do ato praticado.[113]
No que tange a pena, esta é uma sanção que objetiva punir a pessoa que venha a cometer um delito, não podendo ser vista de forma preventiva, mas apenas como uma medida retributiva, posto que só se pode ser punido pelo que se fez e não por quem se é.
A fundamentação da pena determina que a sanção penal não pode se respaldar na moral, uma vez que não visa consagrar o caráter imoral do agente. Importante sustentar, nesta linha, que o Estado não pode impor ao réu que se ressocialize ou se modifique, pois tem o acusado o direito de manter-se como é.[114] Nas exatas palavras de Ferrajoli:
O Estado, não tem direito de forçar o cidadão a não ser mal, nem impedir que se prejudiquem entre si, tampouco tem o direito de alterar – reeducar, redimir, recuperar, ressocializar ou outras idéias semelhantes – a pessoa dos réus. O cidadão tem o dever jurídico de não cometer atos delitivos, tem o direito de ser interiormente malvado e de conseguir sendo como é. [tradução nossa][115]
Estes três princípios, conjuntamente, determinam e resguardam o direito penal e delimitam sua interferência na esfera individual, objetivando, a partir daí, o valor da liberdade de consciência, a equidade na intervenção penal e a diminuição da punição cruel.[116]
Ainda, vale mencionar que estes princípios axiológicos se fundamentam para definições de legislação, jurisdição e execução penal, uma vez que, dotados de ditames ético-políticos, são pressupostos para o reconhecimento externo ao direito penal. Nessa esteira:
E podemos identificar nos três princípios axiológicos os conteúdos éticos-políticos exigidos no direito penal como condições de justificação externa e como outros tantos limites impostos para a legislação, a justificação e a execução penal. [tradução nossa][117]
Assim, as referidas teorias embasam por inteiro as garantias, nos âmbitos penal e processual, através da legitimidade e da materialidade dos delitos, da culpabilidade, da lesividade do acontecimento, do direito de defesa, do ônus da prova e, ainda, da presunção de inocência face a falta de evidências.
4.3 A DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO A PARTIR DO GARANTISMO PENAL
O garantismo penal veio a partir do crescimento de questões jurídicas, políticas e estudos de correntes críticas da criminologia, e pretende a distinção do ser e do dever ser, objetivando um exercício mais concreto do ordenamento.
A teoria do garantismo consiste em avaliar as omissões e as contradições existentes em questões jurídicas e políticas, explorando-as cientificamente e analisando-as de forma interna e externa. Esta possui forte relevância para outros ramos do direito, uma vez que possui relação direta com alguns direitos fundamentais, assim como parâmetros de justiça e legitimação.[118]
Pode-se dizer, também, que o garantismo busca reduzir a violência e potencializar a autonomia no âmbito jurídico, assegurando a efetivação dos princípios e direitos estabelecidos. Ainda, busca a divisão entre o direito e a moral, visando desvincular a justificação e a multiplicação do Estado e do direito como modelo axiológico. Assim tem-se que:
Nesse sentido, a palavra garantismo expressa uma aproximação teórica que mantem separados o ser e o dever ser no direito; e até mesmo propõe como questão teórica central, a divergência existente no ordenamentos complexos entre modelos normativos (tendencialmente garantistas) e práticas operacionais (tendencialmente antigarantistas), interpretando-a mediante a antinomia – dentro de certos limites da fisiologia e fora dos patológicos – que subsistem entre validade (e inefetividade) dos primeiros e efetividade (e invalidez) das segundas. [tradução nossa][119]
Nesse sentido, entende Ferrajoli[120] que a teoria geral do garantismo pretende a separação do direito e da moral, do ser e do dever ser, analisando, dentre alguns aspectos, a ligação dos princípios constitucionais e das leis com sua execução, e a conexão do direito com os valores ético-políticos. A teoria do garantismo deve avaliar o direito positivo frente ao reconhecimento de atos sociais legitimados, sejam internos ou externos; distinguir a justiça do direito, e ainda, a validade e a efetividade das ideologias.
Carbonell e Ugarte explicam:
[...] O garantismo penal, em uma primeira aproximação de caráter geral, representa uma alternativa com duas proteções. Pois é tanto ao direito penal auto referencial, exclusivamente de lei ordinária, cujo objetivo essencial é assegurar a incondicionada vigência de estar frente as condutas formalmente antijurídicas, hoje propagadas por Jakobs e com abundantes manifestações legislativas de origem pampenalizador e autoritário, como o abolicionismo, tanto que suposta alternativa radical não jurídica ao sistema penal. E comporta uma afirmação da forma jurídica – da pena em concreto – como meio hábil para dispensar a necessária proteção dos direitos fundamentais frente a mais grave violação e de evitar que o próprio dispositivo de garantia opere como um novo risco forte e de sofrimento para aqueles, na pessoa do imputado. [tradução nossa][121]
Referidos ideais já foram, em grande medida, introjetados no ideário jurídico brasileiro, como deixa claro o Ministro, do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, ao julgar a Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54:
Vale dizer: concepções morais religiosas, quer unânimes, quer majoritárias, quer minoritárias, não podem guiar as decisões estatais, devendo ficar circunscritas à esfera privada. A crença religiosa e espiritual – ou a ausência dela, o ateísmo – serve precipuamente para ditar a conduta e a vida privada do indivíduo que a possui ou não a possui. Paixões religiosas de toda ordem hão de ser colocadas à parte na condução do Estado. Não podem a fé e as orientações morais dela decorrentes ser impostas a quem quer que seja e por quem quer que seja. Caso contrário, de uma democracia laica com liberdade religiosa não se tratará, ante a ausência de respeito àqueles que não professem o credo inspirador da decisão oficial ou àqueles que um dia desejem rever a posição até então assumida.[122]
Fica evidente, pois, que o Supremo Tribunal Federal compartilha do entendimento que não cabe ao Estado ditar condutas de cunho moral e/ou religiosas, impondo as pessoas comportamentos que interferem na vida particular de cada um. Esta conduta vai de encontro com a laicidade democrática, desconsiderando a liberdade de cada pessoa.
Na questão da interrupção da gestação ainda persistem juízos morais quanto a ofensas ao feto, bem como um fundamento moral para a proibição no âmbito jurídico. Questões como a natureza do nascituro, com fundo religioso, ainda possuem muita influência no ordenamento jurídico atual.
Há quem entenda que a intervenção científica no caso da interrupção da gravidez é condição aceitável para a proibição deste ato, devendo ser punida pelo ordenamento jurídico a sua prática.[123] Nessa perspectiva, os grupos antiabortistas defendem que o aborto voluntário nada mais é do que a prática de homicídio, uma vez que aceitam como pessoa o embrião.[124]
A vicissitude desta afirmação é que parte da tese de vitalidade do nascituro, baseando-se na liberdade de consciência das pessoas, e em um juízo moral ao atribuir a qualidade de pessoa ao embrião. Aqui, devemos asseverar que o debate do feto ser ou não uma pessoa é uma questão empírica, e não um debate científico ou de fato, cabendo apenas a cada pessoa posicionar-se a respeito.[125]
No que concerne a este debate, pode-se aqui fazer um paralelo entre a definição da morte cerebral com o início da vida.
O Conselho Federal de Medicina, na Resolução nº 1.480/97[126], torna claro que, conforme o consenso da comunidade científica mundial, se considera morto aquele que tiver, de forma inconvertível, as funções encefálicas. Ainda, o ordenamento brasileiro é claro ao elucidar, no art. 6º do Código Civil, que a morte encefálica encerra a personalidade.[127]
Franco[128] explica ser complicado, progressivo e constante o processo de vida e morte, pois estes se prolongam no tempo. Se somando a isso, o autor ainda afirma que o desenvolvimento biológico está conectado a noção de vida e morte.
Nesse passo, seria sensato arguir que, tendo a vida seu encerramento com as funções encefálicas, o início da vida, e o da personalidade, só pode ter início com as atividades cerebrais.
Levando-se em linha de conta a separação do direito e da moral, bem como da laicização do Estado, não pode uma norma determinar uma questão moral, e sujeitar uma mulher a manter uma gestação não desejada, punindo-a caso descumpra tal norma.
Segundo Ferrajoli,[129] a essência para esta adversidade se encontra no princípio convencionalista e utilitarista da diferenciação do direito e da moral, onde somente estaria garantida a tutela do feto, enquanto pessoa, no momento em que este é almejado e planejado pela mulher. Nesse aspecto, afirma, ainda, o autor, que a natureza de pessoa do feto dependeria da autonomia moral da gestante, e não de sua natureza biológica.
Conforme se percebe, a tutela do feto depende da um ato de vontade por parte da gestante, encarando-se o embrião como pessoa e lhe oportunizando o caráter de pessoa. A qualidade de pessoa do nascituro seria determinada somente a partir da decisão da mulher ao ver-se como mãe e aceitá-lo como filho.[130]
Ao aceitar o ponto de vista moral abordado, outra discussão é necessária: a questão do aborto em vista da autodeterminação da mulher de não dar a natureza de pessoa ao feto. Para os que consagram o feto como pessoa, o abortamento é uma violação a moral, portanto um ato imoral.[131]
A penalização do aborto gera enormes sofrimentos para mulheres que não desejam manter a gestação, na medida em que elas não podem dispor de seu próprio corpo, bem como não lhes é permitido determinar qual o momento que julgam ideal para serem mães. Aqui, vale dizer que estes desafios vão desde a maternidade indesejada até ferimentos a dignidade da pessoa da mulher.[132]
Não se descarta, em momento algum, a noção que a prática do abortamento é intensa, e que em muitos casos gera traumas para as mulheres. Logo, não pode o Estado, a partir de normas dotadas de ideologias morais, religiosas e culturais impor uma conduta que acaba por ofender a liberdade de escolha.
Cabe somente a mulher, dotada de sua plena autonomia e liberdade de escolha, decidir sobre a interrupção da gestação, na medida em que as implicações da maternidade serão suportadas por ela. Westphal afirma:
Aborto é recurso legítimo para a gravidez indesejada, um direito da mulher em decidir se quer comprometer a sua vida com uma gravidez de risco, inoportuna ou involuntária. Para muitas mulheres, este ato é invasivo, violento e traumatizante, mas é um recurso, uma alternativa a um trauma maior ainda que pode ser uma maternidade indesejada ou um futuro comprometido antes do tempo ou sem desejo. Uma vida se faz não só em cima de dogmas religiosos, ou definições discutíveis sobre quando começa a vida, mas em cima da noção de felicidade que o ser humano possa usar para construir com liberdade a sua vida.[133]
O ordenamento jurídico, ao não tratar do direito da gestante em escolher pela maternidade, ignora a premissa de que a mulher que não deseja ser mãe será forçada a se tornar uma, mesmo que não seja a sua vontade. E, ainda, impõe uma punição para ela caso utilize de meios alternativos para interromper a gestação, retirando-lhe a liberdade de tomar esta decisão.[134]
Neste caso, o direito penal estabelece não apenas uma conduta delitiva por parte da mulher, como também um estilo de vida que pode lhe acarretar um ônus irreparável, pois terá que abrir mão de sua vida para poder criar e zelar por seu filho, e até mesmo obrigando-a que limite, ou até abandone, os estudos, tudo para poder prover sua família.[135]
Conforme expõe Mendes[136], o direito a maternidade é um direito fundamental pessoal da mulher, não podendo, desse modo, um Estado laico criar uma norma embasando-se em concepções morais e religiosas, que submetam as gestantes a manter a gestação contra sua vontade.
Nesse contexto, Kottow justifica:
A posição racional não tem nenhuma intenção de negar as implicações moraes e das decisões reprodutivas. Pelo contrário: ao descrever o estabelecimento da relação mãe/filho como um processo relacional voluntariamente assumido, se está dando o mais pleno valor ético que tal decisão merece e se está reconhecendo que o aborto procurado é sempre uma decisão moral e psicológicamente opaca e dolorosa que nada se assume gratuitamente, por isso é desejável que não aconteça, apenas por motivos de força maior. O que a perspectiva racional intenta destacar é que a aceitação de gestar um novo ser humano seja o produto de desejo de uma decisão consciente e que não corra por imposição de valores que os afetados talvez não compartilhem. [tradução nossa][137]
Portanto, o crime de aborto pune uma escolha de vida: o da mulher em não querer ser mãe, removendo, de forma arbitrária, a autonomia que a mesma tem sobre seu corpo e lhe subtraindo a dignidade quanto pessoa.
Criminalizar o aborto não diminui sua prática, apenas torna sua realização clandestina. A execução deste ato, na maioria das vezes exercido de forma insegura e insalubre, acaba ocasionando perigo à saúde e, principalmente, à vida das mulheres.[138] Ainda, importante destacar que os abortamentos realizados por mulheres com nível econômico social menor tendem a ser precárias, uma vez que estas não dispõem de recursos financeiros para arcar com um procedimento clinicamente adequado.
Pedroso[139] assinala que, em quase 100% dos casos, as mulheres de baixa renda chegam à óbito, enquanto as que possuem uma renda mais abastada quase nunca vem a falecer em decorrência do aborto realizado em clínicas clandestinas.
Percebe-se a imprescindível necessidade de mudança no ornamento jurídico, posto que não pode o direito penal fixar um não fazer, nem impor a mulher algum tipo de conduta que viole a autodeterminação sobre seu corpo.
Neste caso o direito deve buscar olhar o ser, para além do dever ser, para que o aborto possa vir a ser descriminalizado, o direito carece desprender-se das ideologias morais, religiosas e culturais ainda aprisionadas, levando em consideração primeiro a vontade da mulher quanto à maternidade, sem se deixar influenciar por prerrogativas que possam interferir na realização desta vontade.
Após essa desconstrução dogmática, e ausente a imposição estatal na esfera jurídica, terá a mulher, além da garantia de exercício de sua dignidade enquanto pessoa, autonomia plena e liberdade para deliberar do seu corpo da forma que desejar.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em vista dos argumentos apresentados nesse trabalho, resta claro que merece análise a possibilidade de descriminalizar o aborto consentido, praticado por terceiro, em face à liberdade e autonomia de vontade da mulher em comandar seu corpo.
Nesse compasso, temos no âmbito internacional a evolução dos direitos reprodutivos e sexuais, garantidos pelas Conferências Mundiais, corroborando o pensamento de que a mulher é detentora de direitos iguais aos homens, sem distinção de qualquer natureza. Desta forma, demonstrando que possuem liberdade reprodutiva, na medida em que apenas elas respondem as consequências de suas vidas sexuais.
Ainda, as mulheres deixaram de ser subjugadas e dominadas pelos homens, passando a ter seus direitos garantidos de forma digna e uniforme.
Em âmbito nacional, a Constituição Federal, promulgada no ano de 1988, trouxe uma nova compreensão acerca dos direitos primordiais, até então não previstos no ordenamento jurídico, e assegurou a eficácia plena do exercício da cidadania. Ainda, previu no artigo 3º, IV, a promoção de bem à todos sem prejuízo em razão da origem, raça, sexo, cor, idade ou qualquer outra forma.
Trouxe ainda, no artigo 5º, caput e inciso I, a igualdade entre gêneros, sem qualquer tipo de discriminação, bem como à proteção ao direito à vida e a liberdade.
Em consonância com o já exposto, a Carta Magna elevou o princípio da dignidade da pessoa humana à condição de meta princípio, norteador de normas constitucionais. Tal princípio se mostrou de suma importância na medida em que visa proporcionar a concretização, a real efetivação, de todos os direitos fundamentais e, ainda, a remoção de impedimentos que empeçam sua realização.
O artigo 226, §7º, estabeleceu a importância do planejamento familiar, e que somente ao casal cabe determinar o momento e quantos filhos pretendem ter. Do mesmo modo, ainda definiu que ao Estado apenas compete disponibilizar meios educacionais e científicos para a execução desde direito.
Desta feita, não pode o Estado intrometer-se na decisão do momento mais oportuno para a procriação. Deve apenas disponibilizar meios preventivos de contracepção.
No que tange aos debates pertinentes ao direito à vida, é nítido que, apesar do ordenamento jurídico salvaguardar eventuais direitos do nascituro, este ainda não possui personalidade jurídica e, portanto, não pode ser considerado como pessoa. Afora isso, considerando que o direito não fez valoração nesse sentido, não pode a vida intrauterina possuir respaldos jurídicos mais elevados em face a vida extrauterina.
Nesse caminho, à luz do julgamento da Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54, que descaracterizou a conduta típica da prática delitiva de aborto no caso de anencefalia, possibilitando a gestante o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos, no que diz respeito a sua saúde, sua dignidade enquanto pessoa, sua autonomia e sua liberdade em interromper a gestação quando o feto possuir má-formação cerebral.
Ausente a consagração de personalidade do feto é notória a afirmação de que o direito da gestante deve prevalecer em virtude da plena execução de garantias, como a liberdade e a autodeterminação de sua vontade em deliberar quanto da contracepção ou não.
Corroborando com a tese que não pode o Estado intervir na decisão da mulher quanto à contracepção, surge a teoria do garantismo penal, sustentando a separação do direito e da moral. Desde o início, asseverando que, muito embora ambas estiveram lado a lado, não existe nenhuma forma de vinculação axiológica entre elas. A moral se prende meramente as orientações individuais, não podendo ser incorporada no direito ou em normas religiosas ou sociais.
Nesse caminho, fazendo um paralelo da interrupção voluntária da gravidez com base no garantismo penal, se verifica que no atual ordenamento jurídico, a conduta delitiva ainda possui um grande juízo de valor, tanto de cunho moral, quanto religioso. Leva-se em conta apenas o direito à vida da criança em formação, desconsiderando por completo a vontade da gestante, que pode não desejar a maternidade.
Verificamos que a natureza quanto pessoa do feto se sujeita a autonomia moral da gestante. Em outras palavras, o nascituro apenas constitui a natureza de pessoa quando sua genitora assim entende e o toma como seu filho.
Punir a prática do aborto voluntário, praticado, ou não, por terceiro, não diminui sua realização na clandestinidade. Enquanto a questão posta não for tratada com a devida atenção, novos abortos inseguros serão consumados, colocando em risco a saúde e à vida das mulheres.
O pleno exercício do princípio da dignidade da pessoa humana, bem como liberdade e a autodeterminação plena da mulher para deliberar sobre seu corpo, depende da revisão penal que estabelece como crime, nos artigos 124 e 126 do Código Penal, a prática do aborto.
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NOTAS:
[1] Monografia final apresentada à Banca Examinadora do Curso de Bacharelado em Direito da Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul - FADERGS, como requisito parcial para a aprovação no componente curricular Monografia Jurídica e obtenção do grau de Bacharel em Direito.
[2] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p.49.
[3] BORDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Tradução Maria Helena Kühner. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2 ed., 2002, p. 15. Disponível em: <https://www.sertao.ufg.br/up/16/o/BOURDIEU__Pierre._A_domina%C3%A7%C3%A3o_masculina.pdf?1332946646>. Acesso em: 18/05/2016.
[4] BORDIEU, Pierre. A Dominação Masculina. Tradução Maria Helena Kühner. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2 ed., 2002, p. 15. Disponível em: <https://www.sertao.ufg.br/up/16/o/BOURDIEU__Pierre._A_domina%C3%A7%C3%A3o_masculina.pdf?1332946646>. Acesso em: 18/05/2016.
[5] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p.51.
[6] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 204.
[7] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p.53.
[8] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (1979). Disponível em: <http://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10233.htm> acesso em 09/05/2016.
[9] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p.56.
[10] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p.61.
[11] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Segunda Conferência sobre Direitos Humanos (Viena, 1993). Disponível em: <https://www.oas.org/dil/port/1993%20Declara%C3%A7%C3%A3o%20e%20Programa%20de%20Ac%C3%A7%C3%A3o%20adoptado%20pela%20Confer%C3%AAncia%20Mundial%20de%20Viena%20sobre%20Direitos%20Humanos%20em%20junho%20de%201993.pdf>. Acesso em: 09/05/2016.
[12] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p.65.
[13] GONÇALVES, Tamara Amoroso; CHAMBOULEURON, Ingrid Cyfer. Direitos Humanos das Mulheres: Não Discriminação, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos. In Direitos Humanos na Ordem Contemporânea: Proteção Nacional, Regional e Global. Curitiba: Juruá, 2010, p. 310.
[14] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p. 68.
[15] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Plataforma de Ação da IV Conferência sobre a Mulher (Pequim, 1995). Disponível em: <http://www.unfpa.org.br/Arquivos/declaracao_beijing.pdf> acesso em 09/05/2016.
[16] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Plataforma de Ação da IV Conferência sobre a Mulher (Pequim, 1995). Disponível em: <http://www.unfpa.org.br/Arquivos/declaracao_beijing.pdf> acesso em 09/05/2016.
[17] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p. 57.
[18] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p. 50.
[19] A expressão “vontades externas” entende-se por vontades externas o poder masculino exercido em face das decisões femininas e, ainda, as determinações impostas pela sociedade, que restringe sua liberdade, autodeterminação e limitam usa independência.
[20] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p. 70.
[21] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais: Uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. 12ª. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015, p. 64.
[22] PINHO, Rodrigo César Rebello. Teoria Geral da Constituição e Direitos Fundamentais. 3ª ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 72.
[23] PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o princípio da dignidade da pessoa humana. In Dos princípios constitucionais: considerações em torno das normas principiológicas da Constituição. 2ª ed. São Paulo: Método, 2008, p. 150.
[24] COGAN, Luiz Alexandre Cirylo Pinheiro Machado. Abortamento – breves considerações à luz da dignidade da pessoa humana. In Revista Imes Direito. nº 15, v. 9, 2008, p. 09.
[25] NASCIMENTO FILHO, João Batista do. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina. Curitiba: Juruá, 2013, p. 72.
[26] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 211.
[27] NASCIMENTO FILHO, João Batista. A Dignidade da Pessoa Humana e a Condição Feminina: um olhar sobre a descriminalização do aborto. Curitiba: Juruá, 2013, p. 75.
[28] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 217.
[29] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 217.
[30] MAGALHÃES, Leslei Lester dos Anjos. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e o Direito à Vida. São Paulo: Saraiva. 2012, p. 154.
[31] FREITAS, André Guilherme Tavares de. Tutela Penal do Direito à Vida. Rio de Janeiro: Lumem Iuris, 2009, p. 33.
[32] COGAN, Luiz Alexandre Cirylo Pinheiro Machado. Abortamento – breves considerações à luz da dignidade da pessoa humana. In Revista Imes Direito. nº 15, v. 9, 2008, p. 10.
[33] PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 11ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 28.
[34] COGAN, Luiz Alexandre Cirylo Pinheiro Machado. Abortamento – breves considerações à luz da dignidade da pessoa humana. In Revista Imes Direito. nº 15, v. 9, 2008, p. 12.
[35] PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro: parte geral: arts. 1º a 120. 8ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 134.
[36] FACHIN, Luiz Edson. Análise crítica construtiva e de índole constitucional da disciplina da personalidade no Código Civil Brasileiro: fundamentos, limites e transmissibilidade. In Revista Jurídica. Porto Alegre, v. 362, dez/2007, p. 49.
[37] PRADO, Luiz Régis. Curso de Direito Penal Brasileiro: parte geral: arts. 1º a 120. 8ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 135.
[38] DIAS, Maria Berenice. Direito Fundamental ao Aborto. In Revista Magister de Direito Penal e Processo Penal. Porto Alegre, v. 2, nº 11, 2006, p. 21.
[39] DIAS, Maria Berenice. Direito Fundamental ao Aborto. In Revista Magister de Direito Penal e Processo Penal. Porto Alegre, v. 2, nº 11, 2006, p. 21.
[40] LOBO, Ana Maria; ZAPATER, Maira. Direitos Humanos das Mulheres: O Livre Exercício dos Direitos Reprodutivos: Vinculação ao exercício regular(izado) dos direitos sexuais? Uma reflexão. In Direitos Humanos na Ordem Contemporânea: Proteção Nacional, Regional e Global. Curitiba: Juruá, 2010, p. 336.
[41] Conforme disposto no artigo 2º do Código Civil o feto não possui ainda personalidade jurídica, contudo o ordenamento jurídico põe a salvo seus direitos desde a concepção. No que tange a ordem constitucional, a doutrina entende que está garantido, desde a fase intrauterina, o direito à vida, considerado princípio fundamental e norteador de todos os demais, bem como ainda assegura o direito à saúde do mesmo, garantindo assim que este se desenvolva de forma saudável.
[42] ANDRES, Mari Oni da Silva. Descriminalização do aborto no Brasil: a sociedade está preparada? In Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, nº 59, set./2006/ago/2007, p. 123.
[43] REDE FEMINISTA DE SAÚDE. Dossiê Aborto Inseguro. Disponível em: <http://redesaude.org.br/home/conteudo/biblioteca/biblioteca/dossies-da-rede-feminista/010.pdf>. Acesso em: 03/05/2016.
[44] BRASIL. Senado Federal. Estatística do Aborto. Brasília: Comissão de Direitos Humanos, 2015. Disponível em: <http://www19.senado.gov.br/sdleg-getter/public/getDocument?docverid=cb60d9e7-b40d-4395-b03e-18623fe770e9;1.0>. Acesso em: 24/05/2016.
[45] TESSARO, Anelise. O debate sobre a descriminalização do aborto: aspectos penais e constitucionais. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, v. 16, nº 74, 2008, p. 49.
[46] LIMA, Carolina Alves de Souza. Aborto e Anencefalia: Direito fundamentais em colisão. 2ª Ed.Curitiba: Juruá, 2015, p. 41.
[47] TESSARO, Anelise. O debate sobre a descriminalização do aborto: aspectos penais e constitucionais. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, v. 16, nº 74, 2008, p. 49.
[48] PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi de Almeida. O Programa Nacional de Direitos Humanos e a Possibilidade da Descriminalização do Aborto. In Revista Magister de Direito Penal e Processo Penal. Porto Alegre: Magister, v. 7, nº 38, 2010, p. 48.
[49] Sobre o tema de conflitos entre princípios, ver ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 11ª ed. São Paulo: Malheiros, 2010, pp.51 e segs.
[50] BARROSO, Luís Roberto. A Dignidade da Pessoa Humana no Direito Constitucional Contemporâneo. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 100.
[51] TESSARO, Anelise. O debate sobre a descriminalização do aborto: aspectos penais e constitucionais. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, v. 16, nº 74, 2008, p. 45.
[52] DWORKIN, Ronald. Domínio da Vida: Aborto Eutanásia e Liberdades Individuais. Tradução: Jefferson Luiz Camargo; Revisão da Tradução: Silvia Vieira. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 143
[53] MENDES, Soraia da Rosa. Os direitos fundamentais das mulheres à autodeterminação e à proteção como limites ao poder punitivo: reflexões sobre a criminalização do aborto no projeto do novo Código Penal e sobre a proibição de proteção deficiente no Supremo Tribunal Federal. In Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, v. 7, nº 25, jan/abr, 2013, p.216.
[54] MENDES, Soraia da Rosa. Os direitos fundamentais das mulheres à autodeterminação e à proteção como limites ao poder punitivo: reflexões sobre a criminalização do aborto no projeto do novo Código Penal e sobre a proibição de proteção deficiente no Supremo Tribunal Federal. In Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, v. 7, nº 25, jan/abr, 2013, p.218.
[55] LIMA, Carolina Alves de Souza. Aborto e Anencefalia: Direito fundamentais em colisão. 2ª Ed. Curitiba: Juruá,2015, p. 59.
[56] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 11.
[57] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 11.
[58] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 12.
[59] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 12.
[60] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 13.
[61] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 13.
[62] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 14.
[63] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 14.
[64] MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p. 15.
[65] FERNANDES, Paulo Sérgio Leite. Aborto e Infanticídio. São Paulo: Sugestões Literárias s/a, 1972, p. 79.
[66] BRASIL. Código Criminal (1830). Código Criminal de 1830: promulgado em 16 de dezembro de 1830.
[67] BRASIL. Código Criminal (1890). Código Criminal de 1890: promulgado em 11 de outubro de 1890.
[68] BRASIL. Código Criminal (1890). Código Criminal de 1890: promulgado em 11 de outubro de 1890.
[69] BRASIL. Código Criminal (1890). Código Criminal de 1890: promulgado em 11 de outubro de 1890.
[70] FERNANDES, Paulo Sérgio Leite. Aborto e Infanticídio. São Paulo: Sugestões Literárias s/a, 1972, p. 80.
[71] BRASIL. Código Penal (1940). Código Penal Brasileiro de 1940: promulgado em 07 de dezembro de 1940.
[72] BRASIL. Código Penal (1940). Código Penal Brasileiro de 1940: promulgado em 07 de dezembro de 1940.
[73] BRASIL. Código Penal (1940). Código Penal Brasileiro de 1940: promulgado em 07 de dezembro de 1940.
[74] BRASIL, Código Penal (1940). Código Penal Brasileiro de 1940: promulgado em 07 de dezembro de 1940.
[75] BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas Prevenção e tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes : norma técnica / Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – 3. ed. atual. e ampl., 1. reimpr. – Brasília: Ministério da Saúde, 2012. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/prevencao_agravo_violencia_sexual_mulheres_3ed.pdf> acesso em: 11/05/2016
[76] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54/DF – Distrito Federal. Relator: Ministro Marco Aurélio. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/adpf54.pdf> acesso em 03/05/2016.
[77] FRANCO, Luiz Henrique Sapia. Notas sobre os direitos de personalidade e o direito à vida digna (direito a não nascer e a nascer saudável). In Revista Fórum de Direito Civil – RFDC, Belo Horizonte, ano 3, n. 7, set/dez. 2014, p. 75.
[78] TESSARO, Anelise. O debate sobre a descriminalização do aborto: aspectos penais e constitucionais. In Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, v. 16, nº 74, 2008, p. 38.
[79] SOUZA FILHO, Gelson Amaro de. A Situação Jurídica do Aborto no Brasil. In Revista de Científicas Jurídicas e Sociais da UNIPAR, v. 11, nº 2, jul/dez, 2008, p. 374.
[80] FACHIN, Luiz Edson. Análise crítica construtiva e de índole constitucional da disciplina da personalidade no Código Civil Brasileiro: fundamentos, limites e transmissibilidade. In Revista Jurídica. Porto Alegre, v. 362, dez/2007, p. 45.
[81] MAGALHÃES, Leslei Lester dos Anjos. O direito de nascer no regime constitucional brasileiro. Fórum Administrativo – Direito Público – FA Belo Horizonte, ano 8, n. 90, ago. 2008. Disponível em: <http://www.bidforum.com.br/PDIexibepdf.aspx?tipoConteudo=Normal&vw=S&pdiCntd=54486&idPublicacao=1>. Acesso em: 17 mar. 2016.
[82] SCHEIBE, Elisa. Direitos de Personalidade e Transexualidade: a promoção da dignidade da pessoa humana em uma perspectiva plural. 2008, 193 f, Tese (Mestrado em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Porto Alegre, 2008, p. 122.
[83] LANDO, Gioge Andre; Corso, Rita de Cássia Leite. Direitos de Personalidade: A classificação dos direitos do nascituro. Revista Jurídica (0103-3506). 4.41. 224-253, p. 234. Disponível em:<http://eds.b.ebscohost.com/eds/pdfviewer/pdfviewer?sid=9c35d0eb-a160-46e0-b0af-90f323356d0f%40sessionmgr120&vid=0&hid=117> acesso em: 12/05/2016.
[84] ANDRADE, Márcio Accioly de. Nascituro – Pessoa Humana, Sujeito de Direitos. In Dignidade da Pessoa Humana: Fundamentos e Critérios Interpretativos. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 144.
[85] ANDRADE, Márcio Accioly de. Nascituro – Pessoa Humana, Sujeito de Direitos. InDignidade da Pessoa Humana: Fundamentos e Critérios Interpretativos. São Paulo: Malheiros, 2010, p. 145.
[86] LANDO, Giorge Andre; CORSO, Rita de Cássia Leite. Direitos de Personalidade: A classificação dos direitos do nascituro. Revista Jurídica (0103-3506). 4.41. 224-253. p. 235. Disponível em: <http://revista.unicuritiba.edu.br/index.php/RevJur/article/view/1045/732> acesso em: 12/05/2016.
[87] BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Estatuto da Criança e do Adolescente: promulgado em 13 de julho de 1990.
[88] FREITAS, André Guilherme Tavares de. Tutela Penal do Direito à Vida. Rio de Janeiro: Lumem Iuris, 2009, p.75.
[89] ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção Americana de Direitos Humanos (1969). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/anexo/and678-92.pdf>. Acesso em: 28/05/2016.
[90] MARTINS, Ives Gandra da Silva; MARTINS, Roberto Vidal da Silva; MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. A Questão do Aborto: Aspectos Jurídicos Fundamentais. São Paulo: QuartierLatin, 2008, p. 106.
[91]FREITAS, André Guilherme Tavares de. Tutela Penal do Direito à Vida. Rio de Janeiro: Lumem Iuris, 2009, p.73.
[92]MATIELO, Fabrício Zamprogna, Aborto e Direito Penal. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzatto, 1994, p.71.
[93] MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva; MARTINS, Roberto Vidal da Silva; MARTINS, Ives Gandra da Silva. A Questão do Aborto: Aspectos Jurídicos Fundamentais. São Paulo: QuartierLatin, 2008, p. 121.
[94] DAL MOLIN, Aquiles. Nascituricídio: Aspectos jurídicos e éticos do aborto e do corpo da mulher. Porto Alegre. 1988, p. 33.
[95] MAGALHÃES, Leslei Lester dos Anjos. A Proteção ao Direito à Vida e o Projeto de Código Penal In Revista do Instituto de Direito Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Ano 3 (2014), nº 2, p. 1286. Disponível em: <http://cidp.pt/publicacoes/revistas/ridb/2014/02/2014_02_01281_01287.pdf> acesso em: 13/05/2016.
[96] DAL MOLIN, Aquiles. Nascituricídio: Aspectos jurídicos e éticos do aborto e do corpo da mulher. Porto Alegre. 1988, p. 73.
[97] NOGUEIRA, Paulo Lúcio, Em Defesa da Vida: aborto, eutanásia, pena de morte, suicídio, violência/linchamento. São Paulo: Saraiva. 1995, p. 36.
[98] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 218.
[99] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 219.
[100] “En efecto, <<laicidad del derecho>> y <<laicidad de la moral>> significan, a mi entender, la recíproca autonomia de las dos esferas: por un lado, el principio en virtud del cual el derecho no debe ser nunca utilizado como instrumento de mero reforzamiento de la (esto es, de una determinada) moral, sino únicamente como técnica de tutela de intereses y necesidades vitales; por otro, el principio, inverso y simétrico, por el cual la moral, si cuenta con una adhesíon sincera, no requiere, sino que más bien excluye y rechaza, el soporte heterónomo y coercitivo del derecho”. FERRAJOLI, Luigi. Garantismo: uma discusíon sobre derecho y democracia. Tradução de Andrea Greppi. Madrid: Trotta, 2006, p.17.
[101] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.12.
[102] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.12.
[103] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.11.
[104] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 220.
[105] FERRAJOLI, Luigi. Derechos y garantias: La ley del más débil. Tradução de Andrés Ibanéz e Andrea Greppi. Madrid: Trotta, 1999, p. 19.
[106] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.14.
[107] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.15.
[108] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.15.
[109] “Entendida en este sentido, la separacíon entre el derecho y la moral, o entre legitimacíon interna y justificacíon externa, es um principio político del liberalismo moderno - meta jurídico y meta-moral – que sirve para fundamentar la autonomia recíproca de lãs dos esferas. El derecho y el estado – com arreglo a esta opcíon laica y liberal – no sólo no poseen ni encarnan valores meramente em tanto que tales, sino que tampoco deben tener fines morales desvinculados del interés de las personas u menos aún ser fines en sí mismos, justificándose sólo por el cometido de perseguir fines de utilidad concreta em favor de los cuidanos y principalmente de garantizar sus derechos y su seguridad.” FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 222.
[110] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 222.
[111] “Para que puedan prohibirse y castigarse conductas, el princípio utilitarista de la separacíon emtre el derecho y la moral exige además como necesario que dañen de um modo concreto bienes jurídicos ajenos, cuya tutela es la única justificacíon de las leyes penales como técnicas de prevencíon de su lesíon. El estado, em suma, no debe inmiscuirse coercitivamente em la vida moral de los ciudadanos ni tampoco promover coercitivmente su moralidad, si sólo tutelar su seguridad impidiendo que se dañen unos a otros.” FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 223.
[112] [...] El principio normativo de la separacíon exige que el juicio no verse acerca de la moralidad, o el carácter, u otros aspectos substanciales de la personalidad del reo, sino sólo acerca de hechos penalmente prohibidos que le son imputados y que son, por outra parte, lo único que puede ser empíricamente probado por la acusacíon refutado por la defensa. El juez, por conseguiente, no debe someter a indagacíon el alma del imputado, ni debe emitir veredictos morales sobre su persona sino sólo investigar sus comportamientos prohibidos. Y um ciudadano puede se juzgado, antes de ser castigado, sólo por aquello que há hecho, y no, como em el juicio moral, también por aquello que es.” FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 223.
[113] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 223.
[114] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 223.
[115] “El estado, que no tiene derecho a forzar a los cuidadanos a no ser malvados, sino sólo s impedir que se dañen entre si, tampoco tiene derecho a alterar – reeducar, redimir, recuperar, resocializar u otras ideas semejantes – la personalidade de los reos. Y el ciudadano, si bien tiene el deber jurídico de no cometer hechos delictivos, tiene el derecho de ser interiormente malvado y de seguir siendo lo que es.” FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 223.
[116] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 224.
[117] “Y podemos identificar en los três princípios axiológicos los contenidos ético-políticos exigidos al derecho penal como condiciones de justificacíon externa y como otros tantos limites impuestos a la lesgislacíon, a la jurisdicíon y a la ejecucíon penal.” FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 224.
[118] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 854.
[119] “En este sentido, la palabra garantismo expresa una aproximacíon teórica que mantiene separados el <<ser>> y el <<deber ser>> en el derecho; e incluso propone, como cuestíon teórica central, la divergencia existente em los ordenamientos complejos entre modelos normativos (tedencialmente garantistas) y práticas operativas (tedenciamente antigarantistas), interpretándola mediante la antinomia – dentro de ciertos límites fisiológica y fuera de ellos patológica – que subsiste entre validez (e inefectividad) de los primeros e efectividad (e invalidez) de las segundas.” FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 852.
[120] FERRAJOLI, Luigi. Derecho y Razón: Teoría del garantismo penal. Tradução de Andrés Ibañez, Afonso Ruiz Miguel, Juan Carlos Bayón Mohino, Juan Terradillos Basoco, Rocio Cantareo Bandrés. Madrid: Trotta, 2000, p. 855.
[121] “[...] el garantismo pena, en uma primera aproximacíon de carácter general, representa una alternativa com dos proyecciones. Pues lo es tanto al derecho penal autoreferencial, exclusivamente de ley ordinária, cuyo objetivo esencial es asegurar la incondicionada vigencia de ésta frente a las conductas formalmente antijurídicas, hoy propugnado por Jakobs y con abundantes manifestaciones legislativas de signo pampenalizador y autoritário, como al abolicionismo en tanto que supuesta alternativa radical no-jurídica al sistema penal. Y comporta una afirmacíon de la forma jurídica – de la penal en concreto – como médio hábil para dispensar la necesaria proteccíon a los derechos fundamentales frente a las más graves violaciones y de evitar que el propio dispositivo de garantia opere a su vez como uma nueva fuerte de riesgo y de padecimientos para aquéllos , em la persona del imputado.” CARBONELL, Miguel; UGARTE, Pedro Salazar. Garantismo: Estudios sobre el pensamiento jurídico de Luigi Ferrajoli. Madrid: Trotta, 2005, p. 62.
[122] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54/DF – Distrito Federal. Relator: Ministro Marco Aurélio, p. 44. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticianoticiastf/anexo/adpf54.pdf> acesso em 17/05/2016.
[123] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.10.
[124] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.14.
[125] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p. 14.
[126] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1480, de 08 de agosto de 1997. Disponível em: < http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/1997/1480_1997.htm > Acesso em: 18/05/2016.
[127] FRANCO, Luiz Henrique Sapia. Notas sobre os direitos de personalidade e o direito à vida digna (direito a não nascer e a nascer saudável). In Revista Fórum de Direito Civil – RFDC, Belo Horizonte, ano 3, n. 7, set/dez. 2014, p. 76.
[128] FRANCO, Alberto Silva. Anencefalia – breves considerações médicas, bioéticas, jurídicas e jurídico-penais. In Revista dos Tribunais, 2005, p. 4. Disponível em: < http://www.fema.com.br/~direito/debora/hermeneutica/argumentum/anencefalia_silvafranco.pdf> acesso em: 18/05/2016.
[129] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.15
[130] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p.16
[131] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p. 14.
[132] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p. 21.
[133] WESTPHAL, Fernanda Prince Sotero. A questão da legalização do aborto no Brasil: a dicotomia entre Estado laico e a função religiosa. In Amicus Curiae. V.5, N.5, 2011, p. 08. Disponível em: < http://periodicos.unesc.net/amicus/article/view/512/506>. Acesso em: 18/05.2016.
[134] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p. 21.
[135] FERRAJOLI, Luigi. A questão do embrião entre direito e moral. Tradução de Eduardo Maia Costa. In Revista do Ministério Público de Lisboa. v. 24, nº 94, abr/jun. 2003, p. 21.
[136] MENDES, Soraia da Rosa. Os direitos fundamentais das mulheres à autodeterminação e à proteção como limites ao poder punitivo: reflexões sobre a criminalização do aborto no projeto do novo Código Penal e sobre a proibição de proteção deficiente no Supremo Tribunal Federal. In Revista Brasileira de Estudos Constitucionais, v. 7, nº 25, jan/abr, 2013, p.217.
[137] “La postura racional no tiene la menor intercíon de negar las implicaciones Morales de las decisiones reproductivas. Todo lo contrario: Al describir el estabelecimiento de la díada madre/hijo como um proceso relacional voluntariamente asumido, se le está dando el más pleno valor ético que tal decisíon merece y se está reconociendo que el aborto procurado es siempre uma decisíon moral y psicológicamente opaca y dolorosa que nadie asume gratuitamente, por lo que es de desear que no ocurra sino por motivos de peso. Lo que la perspectiva racional intenta rescatar es que la aceptacíon de gestar um nuevo ser humano sea producto del deseo y de uma decisíon consciente y no ocurra por imposicíon de valores que los afectados tal vez no comparten.” KOTTOW, Michael. Bioética Del comienzo de la vida: ¿ Cúantas veces comienza la vida humana?. In Revista Bioética. v. 9, n. 2, p. 35. Disponível em: <http://revistabioetica.cfm.org.br/index.php/revista_bioetica/article/view/243/243>. Acesso em: 17/05/2016.
[138] GALLI, Maria Beatriz; MELLO, Maria Elvira Vieira de. A descriminalização do aborto como um questão de igualdade de gênero e justiça social. In Jornal Juízes para a Democracia. Ano 12, nº 44, dez.2007/fev.2008. p. 8.
[139] PEDROSO, Fernando Gentil Gizzi de Almeida. O Programa Nacional de Direitos Humanos e a Possibilidade da Descriminalização do Aborto. In Revista Magister de Direito Penal e Processo Penal. Porto Alegre: Magister, v. 7, nº 38, out/nov, 2010, p. 49.
Bacharela em Direito da Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul - FADERGS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VICENTE, Roberta Worm. A descriminalização do aborto e a autodeterminação da mulher ao próprio corpo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 dez 2018, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52508/a-descriminalizacao-do-aborto-e-a-autodeterminacao-da-mulher-ao-proprio-corpo. Acesso em: 23 dez 2024.
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