ADRIANO MARTELETO GODINHO
(Orientador)
RESUMO: O presente trabalho monográfico realiza um estudo acerca do testamento vital. Este instrumento permite que o indivíduo decida, previamente, a que medidas terapêuticas deseja ou não se submeter, caso se encontre em situação de terminalidade da vida e em estado de inconsciência definitiva. A principal finalidade do estudo foi defender a validade deste instrumento no ordenamento jurídico brasileiro, mesmo diante da lacuna legislativa acerca do tema no país. Para isso, foi realizado um estudo da autonomia privada do paciente, tomando-a como fundamento básico do testamento vital. Após, foi feita uma abordagem da evolução legislativa do instituto no mundo, com o intuito de verificar suas características e como se encontram as discussões nos países em que já solidificaram a matéria. Embora não haja legislação específica no Brasil, constatou-se que o testamento vital é instrumento garantidor da autonomia do paciente, e, consequentemente, do seu direito à morte digna. Além disso, em 2012 foi editada a resolução do Conselho Federal de Medicina nº. 1995, que admite a possibilidade do paciente elaborar diretivas antecipadas de vontade, gênero da qual deriva o testamento vital. Portanto, com base nas normas constitucionais, infraconstitucionais e resolução do Conselho Federal de Medicina, conclui-se que o testamento vital é válido no Brasil. Foram propostos os requisitos e características do instituto, tais como: capacidade e discernimento, possibilidade de revogação a qualquer tempo, necessidade de inscrição do documento no prontuário do paciente, possibilidade de recusa apenas de tratamentos extraordinários ou fúteis. Por fim, ressaltou-se a necessidade de edição de lei específica, com o condão de consagrar em definitivo as especificidades do instituto no Brasil, eliminando as controvérsias que possam pairar sobre o tema, bem como garantir o respeito ao direito a autonomia do paciente em escolher a que tratamentos deseja ou não se submeter no fim da vida.
Palavras-chave: Testamento Vital. Autonomia Privada. Paciente Terminal. Morte Digna.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 AUTONOMIA PRIVADA NAS SITUAÇÕES DE TERMINALIDADE DA VIDA. 2.1 EVOLUÇÃO DA AUTONOMIA DA VONTADE PARA AUTONOMIA PRIVADA. 2.2 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. 2.3 AUTONOMIA PRIVADA EM SITUAÇÕES JURÍDICAS EXISTENCIAIS DE PACIENTES EM ESTADO TERMINAL. 2.4 MEDICINA PALIATIVA E O TRATAMENTO FÚTIL. 2.5 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À MORTE DIGNA. 3 CONSENTIMENTO INFORMADO E DIRETIVAS ANTECIPADAS COMO MANIFESTAÇÕES DA AUTONOMIA PRIVADA. 3.1 CONSENTIMENTO INFORMADO. 3.1.1 Requisitos. 3.1.2 Consentimento Informado no Código de Ética Médica. 3.2 DIRETIVAS ANTECIPADAS. 4. TESTAMENTO VITAL. 4.1 IMPORTANCIA. 5 DIREITO COMPARADO. 5.1 TESTAMENTO VITAL NA AMÉRICA DO NORTE. 5.2 TESTAMENTO VITAL NA EUROPA. 5.2.1 Espanha. 5.2.2 Portugal. 5.3 TESTAMENTO VITAL NA AMÉRICA LATINA: A EXPERIÊNCIA URUGUAIA. 6 A VALIDADE DO TESTAMENTO VITAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. 6.1 REQUISITOS. 6.1.1 Capacidade e Discernimento. 6.1.2 Forma. 6.1.3 Conteúdo. 6.1.4 Prazo de Validade. 6.1.5 O Testamento Vital sob a Ótica da Resolução n. 1995/2012 do Conselho Federal de Medicina. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
Diante do significativo avanço da medicina, surgiram uma série de medidas terapêuticas na área médica capazes de prolongar a vida humana, inclusive a de pacientes incuráveis e em estado terminal da doença.
Na formação do profissional da medicina, há um enfoque na busca da cura; estuda-se, prioritariamente, qual é a melhor medida a ser aplicada ao caso concreto para que haja a reversibilidade do quadro de que o paciente está acometido. Os médicos buscam de todas as formas salvar o paciente e, muitas vezes, quando este chega a um estágio irreversível da doença, em que as praticas terapêuticas não trarão o benefício almejado, o médico não sabe como lidar com o enfermo. Estando o paciente em estágio terminal, em que o único evento esperado é a morte, alguns profissionais se sentem frustrados, em virtude de uma suposta ligação entre a morte e a “derrota”.
Na busca incessante para se evitar a morte, muitos médicos usam técnicas terapêuticas que prolongam a vida do doente, sem, contudo, oferecer-lhe qualidade de vida ou quaisquer perspectivas de melhora do seu quadro clínico, gerando um ônus desnecessário ao paciente. O prolongamento artificial da vida, conhecido também como obstinação terapêutica, mantém o indivíduo vivo através da utilização de tratamentos extraordinários.
Este novo cenário implementado pelos avanços científicos gera um dilema: prolongar artificialmente a vida do paciente terminal, causando-lhe mais sofrimento do que alívio, condiz com a ética e com a dignidade humana?
Com o intuito de resguardar os direitos do paciente, em especial o direito do paciente terminal de morrer dignamente, o presente trabalho tratará do instituto testamento vital. Ele consiste em um documento escrito por pessoa em pleno gozo de suas faculdades mentais com o intuito de informar a que procedimentos deseja ou não ser submetido, caso venha a se encontrar em estágio terminal da doença e impossibilitado permanentemente de manifestar sua vontade. Desta forma, ele é um instrumento para resguardar o paciente terminal das consequências negativas que a evolução tecnológica pode acarretar.
No tocante aos procedimentos técnicos, este estudo utilizará a técnica bibliográfica. O seu desenvolvimento se dará com base em conteúdo publicado em livros, artigos científicos, periódicos e em matérias disponibilizados na internet. Considerando a ausência de previsão legal no Brasil acerca do tema e o desconhecimento de muitas pessoas sobre a sua existência, faremos uma análise deste instituto com base nas legislações estrangeiras e na literatura médica e jurídica nacional e estrangeira, haja vista que há países que já legislaram acerca do tema e as discussões sobre o assunto já estão bem avançadas.
Portanto, no segundo capítulo da pesquisa, será analisada a autonomia privada no nosso ordenamento jurídico, com enfoque na sua aplicabilidade nas situações jurídicas existenciais de pacientes no fim da vida. Este estudo é necessário tendo em vista que o fundamento da validade do testamento vital no Brasil baseia-se no direito à autonomia do indivíduo. Também estudaremos as condutas possíveis de virem a ser aplicadas ao paciente terminal, como os cuidados paliativos e os tratamentos extraordinários, tomando cuidado em diferenciá-las, para que fique esclarecido quais tipos podem ser objeto de aceitação ou recusa no testamento vital.
No terceiro capítulo, abordaremos o consentimento informado e as diretivas antecipadas como sendo manifestações da autonomia privada do indivíduo na relação médico-paciente, explanando as características específicas de cada um deles e trazendo as resoluções do Conselho Federal de Medicina que versam sobre o assunto.
Após, no quarto capítulo, passaremos a análise do testamento vital propriamente dito, delimitando seu conceito e características, bem como destacando a sua importância para sociedade.
Em seguida, no quinto capítulo, será feito o estudo do instrumento com base nas legislações estrangeiras. Como no Brasil ainda não há lei específica, o estudo do direito comparado possibilita uma melhor compreensão acerca das características do instituto, além de auxiliar na definição de quais seriam os atributos do testamento vital no Brasil. Para tanto, escolhemos analisar os seguintes países: Estados Unidos, para que se entenda as origens do instrumento, pois este foi o primeiro a positivar a matéria; Espanha, cujas discussões acerca do tema já estão bastante avançadas; Portugal, por ter, recentemente, editado lei específica; e Uruguai, para representar a temática do ponto de vista da América Latina.
Após um estudo detalhado do testamento vital, passaremos, no último capítulo, à defesa da validade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Basearemos, para isto, nos princípios que regem o Direito Brasileiro, dentre eles o da autonomia privada e dignidade da pessoa humana, e nas resoluções do Conselho Federal de Medicina. Com base no Direito Comparado, iremos propor os moldes do testamento vital a ser seguido no Brasil, ressaltando, contudo, a necessidade de edição de lei específica em nosso país, para dirimir eventuais controvérsias que possam pairar sobre o instituto e para difundir o conhecimento sobre a existência do mesmo para a população.
2 AUTONOMIA PRIVADA NAS SITUAÇÕES DE TERMINALIDADE DA VIDA
2.1 EVOLUÇÃO DA AUTONOMIA DA VONTADE PARA AUTONOMIA PRIVADA
A expressão autonomia, do grego auto, que significa por si mesmo, e nomos, cujo significado é lei ou norma, etimologicamente consiste na capacidade de o indivíduo de estabelecer suas próprias leis.
A autonomia da vontade se insere em um contexto no qual a interferência do Estado na esfera do indivíduo era mínima. O seu ápice se deu com a Revolução Francesa e com a fase posterior do liberalismo econômico. Isto porque, com a ascensão da classe burguesa, os contratos ganharam força, pois passaram a ser de suma importância para satisfação dos objetivos econômicos burgueses. O indivíduo era, na sociedade, essencialmente livre, podendo realizar qualquer negócio sem sofrer qualquer limitação estatal.
O liberalismo econômico desta época remete ao contrato como instrumento cujo objetivo principal é saciar os interesses puramente individuais. Dotado de força normativa própria, ele vincula as partes de forma quase absoluta. Esses aspectos influenciaram as legislações de diversos países, inclusive, o Código Civil brasileiro de 1916.
A autonomia da vontade, na visão do filósofo Kant[1], era assim definida:
Autonomia da vontade é aquela sua propriedade graças à qual ela é para si mesma a sua lei (independentemente da natureza dos objectos do querer). O princípio da autonomia é portanto: não escolher senão de modo a que as máximas da escolha estejam incluídas simultaneamente, no querer mesmo, como lei universal. Que esta regra prática seja um imperativo, quer dizer que a vontade de todo o ser racional esteja necessariamente ligada a ela como condição, é coisa que não pode demonstrar-se pela simples análise dos conceitos nela contidos, pois se trata de uma proposição sintética; teria que passar-se além do conhecimento dos objectos e entrar numa crítica do sujeito, isto é da razão prática pura; pois esta proposição sintética, que ordena apodicticamente, tem que poder reconhecer-se inteiramente a priori.
A autonomia da vontade, portanto, significa a vontade do sujeito no exercício de suas liberdades. Possui, ainda, sentido subjetivo ou psicológico, pois é a vontade íntima do indivíduo que dá causa a efeitos jurídicos[2].
Partindo-se do pressuposto da igualdade formal, garantida pela lei, o Estado não agia no sentido de proteger os indivíduos, que, a princípio, não necessitariam dessa intervenção.
Ocorre que, havia uma grande desigualdade econômica entre as classes sociais, e, consequentemente, existia uma disparidade entre as partes envolvidas nos negócios. Era necessário que a parte mais fraca fosse protegida, com o intuito de garantir uma justiça material. Assim, o liberalismo econômico, baseada no individualismo, acarretou uma crise social.
No contexto após a Primeira Guerra Mundial, surgem os direitos sociais, e passa a ser dever do Estado garantir que todos os indivíduos possuam o mínimo existencial. A atuação do Estado passa a ser pautada na formulação de sistemas jurídicos constitucionais norteados não só pela noção de que todos são iguais perante a lei, mas, além disto, na igualdade material, que consiste na efetiva igualdade entre todos.
Buscando mecanismos para efetivar a igualdade material, o Estado assume uma postura intervencionista, protecionista e reguladora na esfera privada, de maneira que estas relações passaram a ser regidas pela função social.
Neste contexto, houve uma mudança na autonomia da vontade, que passou a ser chamada de autonomia privada.
Se antes a autonomia da vontade era pautada na vontade do sujeito no exercício de sua liberdade, agora, com o surgimento da noção de autonomia privada, esta passa a ser vista como poder jurídico normativo das partes para que possam autorregulamentar as suas relações jurídicas, com a condição de obedecer aos limites impostos pela lei.
Assim, afirma Gurgel[3]:
[...] A livre manifestação da vontade permanece como regra, porém, compete ao Estado, através das funções legislativas e jurisdicionais, direcionar e intervir em relações jurídicas contrárias a interesses sociais e de ordem pública. É, sem dúvida, nesta diretriz que se enquadra o significado atual da autonomia privada no nosso sistema jurídico.
Diante de tais considerações, concluímos que as partes ao celebrarem o negócio jurídico possuem a liberdade de escolher os efeitos que pretendem produzir. Porém, a validade do ato negocial decorre da margem de liberdade concedida pela lei aos particulares para a auto-regulamentação de seus interesses e estão subordinadas aos limites legais estabelecidos.
Amaral Neto[4] afirma que a autonomia privada integra o quadro de fontes do direito, reconhecendo ao particular o poder de estabelecer normas jurídicas. Atualmente, ela é o princípio fundamental do direito privado, principalmente diante da sociedade em que vivemos na qual a biotecnologia e as conquistas da medicina criaram situações que o Direito ainda não possui resposta. Assim, a autonomia privada, como fonte do Direito, deve ser regulamentada, principalmente, quando estiver relacionada a temas associado ao avanço da medicina.
2.2 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
A autonomia é a capacidade que possui o sujeito de direito de determinar seu próprio comportamento individual, abrangendo tanto escolhas negociais quanto existenciais.
Como princípio jurídico, a autonomia privada pode ser entendida como “o poder que os particulares têm de regular, pelo exercício de sua própria vontade, as relações que participam, estabelecendo-lhe o conteúdo e a respectiva disciplina jurídica” [5].
O princípio norteador da Constituição Federal de 1988[6], regida pelo Estado Democrático de Direito, é o da dignidade da pessoa humana, que coloca o indivíduo como detentor de direitos fundamentais pelo simples fato de ser pessoa. O homem passou a ser o centro de todo o ordenamento jurídico, adquirindo prioridade em detrimento do seu patrimônio.
Essa mudança de paradigma constitucional acarretou a chamada constitucionalização do direito civil, na qual a Constituição Federal passou a influenciar na regulação das relações privadas, que a partir de então deveriam estar em conformidade com os ditames constitucionais.
A autonomia privada subdivide-se em patrimonial e existencial. A primeira abrange as situações patrimoniais que pressupõem valor econômico, a exemplo das relações de negócios, dos contratos e de direitos reais. Embora a autonomia privada se manifeste principalmente nestes tipos de relações contratuais, não estão resumidas a estas unicamente. Com a repersonalização do direito civil, também foram abarcadas situações existenciais, que envolvem direitos da personalidade, direito de família, autodeterminação, dentre outros.
Neste contexto, afirma Tepedino[7]:
[...] deve-se observar que direito civil assistiu ao deslocamento de seus princípios fundamentais do Código Civil para a Constituição. Tal realidade reduzida por muitos a fenômeno de técnica legislativa, ou mesmo à mera atecnia, revela profunda transformação dogmática, em que a autonomia privada passa a ser remodelada por valores não patrimoniais, de cunho existencial, inseridos na própria noção de ordem pública. Propriedade, empresa, família, relações contratuais tornam-se institutos funcionalizados à realização dos valores constitucionais, em especial da dignidade da pessoa humana, ‘não mais havendo setores imunes a tal incidência axiológica, espécies de zonas francas para a atuação da autonomia privada.
Diante dos avanços médico-tecnológicos, surgiram dilemas éticos, principalmente no que tange aos tratamentos propostos ao paciente terminal. A autonomia privada de caráter existencial passou a ser muito útil, pois trata de questões que envolvem, por exemplo, o direito do paciente terminal de recusar sua submissão a terapias extraordinárias, bem como a tomada de decisões que possam implicar no fim da vida.
O presente trabalho irá se ater ao estudo da autonomia privada no que tange a seu caráter existencial, tendo em vista ser este o princípio que fundamenta a validade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro.
2.3 AUTONOMIA PRIVADA EM SITUAÇÕES JURÍDICAS EXISTENCIAIS DE PACIENTES EM ESTADO TERMINAL
Preliminarmente, na literatura médica não há uma só definição de paciente terminal.
Kipper[8] conceituou “como sendo aquele cuja condição é irreversível, independentemente de ser tratado ou não, e que apresenta uma alta probabilidade de morrer num período relativamente curto de tempo (p. ex.: três a seis meses)”.
Piva e Carvalho[9] afirmam que:
Existe um determinado momento na evolução de uma doença que, mesmo que se disponha de todos os recursos, o paciente não é mais salvável, ou seja, está em processo de morte inevitável. Este conceito não abrange apenas a potencialidade de cura ou reversibilidade de uma função orgânica atingida, mesmo tratando-se de órgão nobre. Refere-se àquele momento em que as medidas terapêuticas não aumentam a sobrevida, mas apenas prolongam o processo lento de morrer. A terapêutica, neste caso, torna-se fútil ou pressupõe sofrimento. Neste momento, a morte não mais é vista como um inimigo a ser temido e combatido, muito pelo contrário, deve ser bem-vinda e recebida como um amigo que trará alívio aos sofrimentos.
Do conceito acima exposto, podemos destacar alguns dos requisitos para que o paciente seja considerado terminal, são eles: (1) a impossibilidade de reversibilidade do quadro clínico; (2) consequentemente, ineficácia dos tratamentos terapêuticos disponíveis; (3) e elevada probabilidade de morrer em um período curto de tempo. Quanto a esta última, verifica-se que não é necessário que o paciente morra neste curto período previsto para que seja considerado terminal. Isto porque o paciente pode ser um “ponto fora da curva”, não seguindo como a maioria dos casos.
Kovács[10] afirma que:
O conceito de paciente terminal é historicamente relacionado com o século XX, por causa da alteração das trajetórias das doenças, que em outras épocas eram fulminantes. Hoje, observa-se uma cronificação das doenças, graças ao desenvolvimento da medicina, da cirurgia e da farmacologia. Muitas doenças ainda não têm cura, como alguns tipos de câncer, AIDS e moléstias degenerativas, mas em muitos casos pacientes vivem muitos anos e necessitam de cuidados constantes. O doente passa por vários estágios desde o diagnóstico, os tratamentos, a estabilização, a recidiva e o estágio final da doença.
Antes do século XX, não existia a ideia de paciente terminal. As UTIs eram pouco utilizadas, sendo necessárias apenas em alguns casos, a exemplo de terapias pós cirúrgicas. O mais comum era que o paciente, quando próximo à morte, ficasse em casa ao lado dos seus familiares, recebendo amor e cuidados de suporte para aliviar o sofrimento. A maioria das mortes não ocorriam nos leitos dos hospitais, mas na própria casa do enfermo.
Com a mudança de paradigmas acarretados pelo avanço técnico cientifico, surgiu a noção de paciente terminal, bem como métodos de prolongar a vida ainda que artificialmente. Assim, muitos desses pacientes passaram a ocupar a UTI, ainda que toda a tecnologia presente neste leito não fosse útil para a melhora do seu quadro, vivendo os últimos dias de suas vidas longe de seus familiares e privados do mínimo de lazer, já que ficavam cercados de aparelhos e passam a maioria do tempo sós, pois as visitas em UTIs ocorrem apenas em horas marcadas.
Vale salientar que paciente terminal não tem o mesmo significado de paciente em estado vegetativo. Este será constatado quando o paciente apresentar “uma situação clínica de completa ausência de consciência de si mesmo e do ambiente circundante, com ciclos de sono-vigília e preservação completa ou parcial das funções hipotalâmicas e do tronco cerebral.”[11]
Nos pacientes em estado vegetativo, o único tratamento utilizado é o suporte de nutrição e hidratação artificial. Assim, alguns estudos afirmam que o testamento vital não se aplica a estes casos, pois envolve cuidados mínimos que, caso suprimidos, causarão fome e sede, trazendo sofrimento ao paciente. Por se tratar de cuidado básico, a ausência destes causaria a morte inevitável, caracterizando a eutanásia. No entanto, a maioria dos estudiosos entende que é possível a utilização do testamento vital nestes casos, uma vez que estes cuidados só são básicos quando capazes de melhorar o estado do paciente, no entanto, nestes casos lhe causa danos e sofrimentos.
Embora estudos afirmem que o testamento vital pode se aplicar aos pacientes em estado vegetativo, na presente pesquisa daremos enfoque aos pacientes terminais.
O paciente pode chegar na fase terminal em estado de consciência ou inconsciência. No primeiro caso, não haverá tantas dificuldades na manifestação de sua vontade, tendo em vista que o doente poderá expressá-la a qualquer momento. Já no caso de inconsciência, o paciente não apresenta capacidade para expressar uma vontade válida.
Ocorre que, embora se encontre em estágio de inconsciência, não se pode esquecer que o paciente está vivo e, enquanto estiver nesta qualidade, o artigo 1º do Código Civil[12] garante seus direitos, não podendo o paciente ter suas vontades e/ou direitos oprimidos pelo simples fato de se encontrar inconsciente. O que define se o cidadão é sujeito de direitos no nosso ordenamento jurídico é o simples fato de ser pessoa, inclusive, consta no artigo 2º do Código Civil que, a “personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida”.
Tal afirmativa pode ser corroborada pelos artigos 3º e 4º[13], que tratam, respectivamente, dos absolutamente incapazes e relativamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil, casos estes em que o incapaz será assistido ou representado. Note-se que, embora os incapazes não possuam o discernimento necessário para exercer os atos da vida civil, os seus direitos estarão resguardados e serão protegidos através da representação, no caso do absolutamente incapaz; e assistência, quando se tratar de relativamente incapaz.
Ao passo que os institutos de representação e assistência surgem para efetivar os direitos dos incapazes, o testamento vital surge como forma de resguardar os direitos dos pacientes em estado terminal, que se encontram impossibilitados de exercer a sua vontade, garantindo seu direito a autonomia e, consequentemente, atendendo ao princípio da dignidade humana, princípio basilar de todo o Direito brasileiro.
2.4 MEDICINA PALIATIVA E O TRATAMENTO FÚTIL
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), os cuidados paliativos consistem em uma abordagem para melhorar a qualidade de vida dos pacientes e seus familiares, no enfrentamento de doenças que oferecem risco de vida, através da prevenção e alívio do sofrimento. Isto significa a identificação precoce e o tratamento da dor e de outros sintomas de ordem física, psicossocial e espiritual.
Este tipo de tratamento necessita das habilidades de uma equipe multiprofissional, envolvendo médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e outros, com o intuito de ajudar o paciente e seus familiares a se adaptar as mudanças de vida causadas pela doença, buscando a promoção e reflexão necessária para o enfrentamento desta nova condição.
O que se busca com a utilização desses cuidados é, principalmente, garantir que o paciente terminal possua qualidade de vida até o último instante de sua existência, fazendo com que seja o mais digno e confortável possível.
Um dos deveres do médico é lutar a favor da cura da doença. No entanto, quando estamos diante do paciente terminal, a utilização de terapias curativas podem ter efeitos opostos: diminuir a qualidade de vida e causar sofrimento. Essas medidas acabam fazendo com que o paciente seja mantido vivo através da utilização de métodos artificiais, que acarreta sofrimento em detrimento do bem-estar. Neste momento, o dever do médico não é mais lutar pela cura, já que será ineficaz a melhora do doente, mas sim, proporcionar a melhor qualidade de vida possível, através da utilização dos cuidados paliativos.
Vale observar que os cuidados paliativos não têm a pretensão de controlar a doença nem cessar seus sintomas, haja vista que na fase terminal dificilmente isto seria possível. Assim, este tipo de tratamento não tem foco na quantidade de vida e sim na qualidade. Com o uso destas terapias, a morte ocorrerá naturalmente, no momento certo.
Por outro lado, existem os tratamentos extraordinários. Eles se caracterizam por prolongar a vida do paciente artificialmente, acarretando-lhe o ônus de se submeter a medidas que causam sofrimento, sem que qualquer benefício real seja evidenciado, já que a morte é inevitável no caso do paciente terminal.
Mister observar que a classificação do tratamento como extraordinário dependerá não da análise do tratamento em si apenas, mas sim, da sua avaliação em relação ao estado específico do paciente. Visto que determinadas medidas podem ser úteis e trazer benefícios em um caso específico, por exemplo, a ressecção de um tumor benigno no ovário de uma mulher, em que a realização da cirurgia resolveria a questão. Entretanto, se a paciente em questão possui tumor maligno com metástases disseminadas, a utilização da cirurgia será inútil e só acarretar prejuízos ao doente. Desse modo, o que definirá se o tratamento é útil ou extraordinário é a análise completa do caso individualmente.
Em 2010, o Código de Ética Médica passa a dar enfoque a terapia paliativa. Ele reforça a participação do paciente e seus familiares na tomada de decisões terapêuticas. O paciente ou seus familiares, de acordo com seus costumes, suas convicções e suas consciências, têm autonomia de aceitar ou rejeitar qualquer procedimento a ser realizado nele.
O Código dispõe, no seu capítulo 1º, inciso XXI[14], que:
No processo de tomada de decisões profissionais, de acordo com seus ditames de consciência e as previsões legais, o médico aceitará as escolhas de seus pacientes, relativas aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos por eles expressos, desde que adequadas ao caso e cientificamente reconhecidas.
Na mesma perspectiva, diante de um estado terminal, o código orienta contra a realização de condutas desnecessárias. Visto que estes pacientes não têm perspectiva de melhora ou de estabilização do quadro, terapêuticas que tragam prolongamento da vida ao custo de afastamento familiar e de sofrimento são vetadas. Neste sentido, versa, no capítulo 1º, o artigo XXII[15] que “nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados”.
A equipe médica deve ter atenção especial às peculiaridades de cada paciente. As crenças individuais e costumes familiares devem ser respeitados, de modo que o paciente se sinta o mais confortável possível. Além disso, a aplicação dos cuidados paliativos com medicações e condutas que visem reduzir o sofrimento e a angústia tem papel fundamental.
Com estas ações, busca-se a morte digna. Esta se apresenta com o fim da vida mais confortável, agradável e indolor possível, da forma que o paciente desejar e com a companhia das pessoas que lhe agrade. Medidas como a reanimação cardiopulmonar, a assistência por ventilação mecânica, o uso de drogas vasoativas, a infusão de derivados sanguíneos e outras medidas que apenas prolonguem a vida devem ser evitadas. Os efeitos colaterais destas condutas muitas vezes trazem sofrimentos desnecessários e o prolongamento da vida, neste caso, não supera esta deterioração da qualidade de vida.
Pelo exposto, depreende-se que os cuidados paliativos e os tratamentos extraordinários acarretam efeitos opostos ao paciente. Enquanto os cuidados paliativos objetivam trazer alívio e conforto ao paciente, as medidas extraordinárias causam-lhe sofrimento sem proporcionar, em contrapartida, qualquer efeito positivo ao doente. Essa diferenciação é de extrema importância para que se entenda, nos capítulos seguintes, o conteúdo do testamento vital.
2.5 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O DIREITO À MORTE DIGNA
A autonomia privada possibilita que o indivíduo busque seus interesses individuais, interesses estes que devem estar em conformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana.
Torna-se necessário analisar se, o fato de o paciente manifestar previamente acerca da aceitação ou recusa de determinados tratamentos a serem aplicados futuramente, quando porventura se encontrar em estado terminal e inconsciente, sob o fundamento de ter o direito a uma morte digna, condiz com o princípio da dignidade humana.
A Constituição Federal brasileira prevê, em seu artigo 1º inciso III[16], como fundamentos da República, a dignidade humana. Esta legitima as ações estatais e direciona a interpretação das leis.
Simm[17] afirma que
[...] entende-se que o direito à morte digna origina-se da ideia de que o titular da vida deve goza-la de modo a promover sua dignidade humana. Entretanto, o conteúdo mínimo dessa dignidade se reporta, de maneira predominante, à capacidade do indivíduo em conduzir sua própria existência segundo seus valores, concepções, e outros (ou seja, autonomia).
Segundo Kant[18], dignidade significa que toda pessoa é um fim em si mesma. Assim, ninguém vive para efetivar interesses alheios ou para servir a metas coletivas da sociedade, pois o princípio da dignidade humana veda a instrumentalização dos indivíduos para obtenção de qualquer finalidade. Além disto, cada pessoa é responsável pela própria vida e pela escolha de seus valores e objetivos, não podendo as decisões de cada indivíduo ser atribuídas a uma vontade externa.
No âmbito dos direitos individuais, a dignidade humana se expressa na autonomia privada, que deriva da liberdade e igualdade.
Algumas vezes, quando se estuda o direito de morrer, encontramos situações em que o indivíduo deixa de ser um fim em si mesmo, passando para segundo plano, e os tratamentos que visam apenas prolongar artificialmente a vida é que passam a ser o fim em si mesmo. É o que ocorre com a chamada prática da distanásia.
Vale observar que as discussões acerca da morte digna envolvem institutos como a eutanásia, suicídio assistido, ortotanásia e distanásia.
A eutanásia consiste em provocar a morte de um indivíduo, movido por sentimento de piedade perante o sofrimento do enfermo. Busca-se cessar o sofrimento da pessoa com doença grave e incurável. Pode ocorrer nas modalidades ativa, quando o médico ou terceiros agem diretamente para abreviar a vida, ou passiva, que deriva de uma conduta omissiva no sentido de suspender os cuidados que oferecem o suporte indispensável à manutenção da vida. Esta conduta é vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro.
O suicídio assistido está configurado quando o próprio paciente, com o auxilio do médico ou de terceiros, provoca o evento morte.
Por sua vez, a ortotanásia consiste na não utilização de tratamentos fúteis ou desproporcionais que possam prolongar a vida artificialmente, permitindo que a morte ocorra naturalmente.
Segundo Martins[19], através da ortotanásia:
Permite-se que a vida do paciente cesse naturalmente. Admitem-se cuidados paliativos, a fim de garantir ao paciente o maior conforto possível em seu tempo restante de vida. Não ocorre a ação de interromper a vida do paciente, mas sim a omissão em forçar sua manutenção.
Verifica-se que a ortotanásia abstém apenas os tratamentos extraordinários. Os cuidados paliativos, que objetivam o alívio do sofrimento, são normalmente utilizadas.
A distanásia é o prolongamento artificial da vida através da utilização de todos os tratamentos disponíveis, que causam sofrimento em detrimento do conforto do paciente.
Ora, a primazia da quantidade do tempo de vida em face de sua qualidade, submetendo o paciente a tratamentos fúteis, e ainda contra sua vontade, viola o princípio da dignidade da pessoa humana, com claro desrespeito a liberdade de escolha, e, concomitantemente, a autonomia.
Neste sentido, Simm[20] manifesta:
A maneira como alguém morre deve respeitar a personalidade de cada indivíduo. Assim, um paciente terminal que defendeu durante toda sua vida que o significado desta estaria atrelado à qualidade, não tem seu direito à morte digna respeitado quando submetido à prática da distanásia.
Todos os indivíduos possuem o direito de escolher a que medidas deseja ou não se submeter, inclusive, rejeitar o prolongamento artificial da vida, configurada na prática da distanásia. Todavia, quando o paciente chega ao estágio de inconsciência, não é mais possível que o mesmo manifeste seus desejos, o que o torna dependente da vontade de seus familiares e/ou médicos.
Por isto, o testamento vital funciona como instrumento que possui como objetivo a preservação da dignidade da pessoa humana no fim da vida, quando os tratamentos dispostos não prolongam a vida dignamente, mas apenas retardam a morte.
No entanto, a utilização do testamento vital como instrumento hábil a registrar a decisão de não prolongar a vida, implica na necessidade de distinguir o direito à morte digna e o “direito de morrer.”[21]
Leão[22] explica que o direito à morte digna tem por objetivo evitar o prolongamento artificial da vida através de medidas que afrontem o bem-estar do paciente. Percebe-se que este direito não antecipa o momento da morte do paciente, que ocorrerá no tempo certo. Por outro lado, o “direito de morrer” seria a possibilidade de o indivíduo ceifar a própria vida, conduta que não é admitida no Brasil.
Neste sentido, conforme veremos adiante, o Conselho Federal de Medicina editou a Resolução n. 1.805/2006 que permite ao médico limitar ou suspender tratamentos que prolonguem artificialmente a vida do paciente.
3 CONSENTIMENTO INFORMADO E DIRETIVAS ANTECIPADAS COMO MANIFESTAÇÕES DA AUTONOMIA PRIVADA
Conforme exposto no capítulo anterior, a autonomia privada consiste na capacidade que o indivíduo possui de determinar seu próprio comportamento individual. Ela abrange escolhas negociais e existenciais. No âmbito médico, essa autonomia se designa através do consentimento informado, que será estudado no presente capítulo. Faremos um estudo também sobre as diretivas antecipadas de vontade, que tem o objetivo de resguardar a autonomia do paciente terminal que esteja impossibilitado de manifestar uma vontade válida.
3.1 CONSENTIMENTO INFORMADO
A ideia de consentimento informado surgiu com o código internacional de Nuremberg, em 1947, após a Segunda Guerra Mundial, em resposta as atrocidades cometidas pelos médicos pesquisadores nazistas. Isto porque os prisioneiros de guerra ficavam à disposição dos médicos alemães para que fossem realizados em si qualquer tipo de experimentação. Uma das práticas utilizadas era a imersão do prisioneiro, desnudo, em um tanque de água gelada até que fosse atingido o grau de inconsciência. Após, eram testadas formas de reanimação. Nota-se, que além de desumano, este tipo de experimento não possui qualquer embasamento científico[23].
Com a publicação do Código, foram instituídos os moldes para a realização de experimentos em seres humanos, sendo o principal deles a necessidade do consentimento voluntário do participante da pesquisa.
Tradicionalmente, na relação médico-paciente, havia a prevalência de um comportamento paternalista por parte do médico, que atuava com base no princípio da beneficência, decidindo sozinho o que seria melhor e o que seria aplicado ao paciente, sem que este participasse ativamente das tomadas de decisões. Havia uma indiferença em relação à vontade do paciente quanto ao seu tratamento ou projeto de pesquisa ao qual estava submetido[24].
Ao paciente não era informado diagnostico, prognóstico ou medidas terapêuticas, devendo este apenas atender as recomendações impostas pelo médico para que ficasse curado. O paciente não era considerado sujeito da prestação do serviço médico, mas apenas um objeto.
Entretanto, na atualidade, há uma valorização do ser humano e o reconhecimento de sua autonomia. Consequentemente, houveram mudanças na relação médico paciente, na qual este deixa de ser mero objeto e passa a ser sujeito da relação, com poder de autodeterminação. Com isto, as hipóteses diagnósticas, as opções terapêuticas e os prognósticos deverão ser apresentados ao paciente, saindo este de uma posição puramente passiva na terapêutica, passando a tomar decisões durante seu tratamento. Foi a ele dado o direito de recusar medidas terapêuticas que não julgasse necessário e/ou suportáveis, através do consentimento informado.
Assim, o reconhecimento da autonomia do paciente é materializada na forma do consentimento informado, contribuindo para o aperfeiçoamento da ética médica.
No presente trabalho, utilizou-se a expressão consentimento informado como uma das traduções do termo inglês “informed consent”, valendo ser observado que essa tradução não é consensual, pois há quem utilize o termo consentimento livre e esclarecido, consentimento consciente, consentimento pós-informado. Luciana Dadalto[25] defende a utilização da terminologia “consentimento livre e esclarecido”, diferenciando-a do “consentimento informado”.
Segundo ela[26], não é suficiente que o paciente obtenha a informação do tratamento apenas. É necessário que este entenda a informação que lhe foi transmitida por completo. O mero comunicado acerca da realização de um procedimento caracteriza o termo informado. Já quando se expõe ao paciente os riscos, os benefícios e todas as características relacionadas ao procedimento, estabelecendo-se um diálogo entre o médico e o paciente, deixando este livre e consciente para escolher o método que lhe for mais conveniente, estaremos diante do consentimento livre e esclarecido.
Embora o instituto do consentimento informado seja diverso do testamento vital, fez-se necessária sua análise porque o sujeito necessita de autonomia para constituir o testamento vital, autonomia esta que é concretizada através do consentimento informado. Além disso, ambos legitimam a aceitação ou recusa de tratamentos por parte do paciente, sendo que um será utilizado de imediato, enquanto o outro só será utilizado quando o paciente se encontrar em estágio terminal e de inconsciência.
3.1.1 Requisitos
Passaremos agora a análise dos requisitos do consentimento informado.
Clotet[27] afirma que o consentimento informado:
[...] trata-se de uma decisão voluntária, realizada por uma pessoa autônoma e capaz, tomada após um processo informativo e deliberativo, visando à aceitação de um tratamento específico ou experimentação, sabendo da natureza do mesmo, das suas consequências e dos seus riscos. (grifos nossos)
O conceito acima transcrito menciona características importantes acerca do consentimento informado.
A decisão do paciente deve ser voluntária, ou seja, espontânea, ausente de qualquer tipo de coerção.
Quando se fala que deve ser realizado por pessoa capaz, não está se pensando em capacidade civil de fato apenas. Isto porque, embora o paciente seja civilmente capaz, não implica que possuirá, obrigatoriamente, discernimento. Portanto, para ser autônomo e capaz, além de atender o requisito constante no artigo 5º do Código Civil[28], que determina que a partir dos 18 (dezoito) anos a pessoa torna-se habilitada para a prática de todos os atos da vida civil, este é apenas um requisito meramente formal do consentimento. A capacidade que se exige para que a prática do consentimento seja válida, é que haja discernimento, ou seja, aptidão para compreender a situação com sensatez e clareza. Trata-se, em verdade, de capacidade de entendimento e de autodeterminação no momento do consentimento.
Constitui um processo informativo e deliberativo, no sentido de que o paciente será informado da sua situação e do tratamento proposto, bem como ambas as partes da relação poderão discutir, ou melhor, dialogar. O médico expondo acerca patologia e tratamento proposto, passando as informações necessárias para que o paciente faça sua escolha.
O objetivo do consentimento é a aceitação do tratamento por parte do paciente. Esta, além de respeitar a autonomia do paciente, também legitima a atuação do médico. É, portanto, medida de segurança também para o profissional.
3.1.2 Consentimento Informado no Código de Ética Médica
O Código de Ética Médica consiste num instrumento que agrupa normas e princípios que orientam os médicos no exercício de sua profissão, para que sua conduta seja pautada na ética.
O Código[29] prevê, em seu artigo 22, que é vedado ao médico “deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte”.
A forma em que o consentimento foi expresso neste artigo corrobora ao que foi tratado acima, quanto a seu conceito e características. Do mencionado dispositivo podemos extrair informações importantes, primeiro quanto à obrigatoriedade do consentimento, bem como a necessidade de esclarecer ao paciente sobre o seu quadro e sobre as medidas a que será submetida, exceto quando ele estiver em risco iminente de morte, caso este em que o médico agirá por conta própria, em prol do paciente, tendo em vista que a espera do consentimento poderá gerar danos irreversíveis.
Além da previsão no Código de Ética, o consentimento informado também está previsto nas resoluções do Conselho Federal de Medicina de números 671/1975[30], 1544/1999[31], 1643/2002[32] e 1653/2002[33].
3.2 DIRETIVAS ANTECIPADAS
Agora passaremos a análise das diretivas antecipadas, da qual derivam as espécies do mandato duradouro e testamento vital. Embora muitos associem as diretivas antecipadas ao instituto do testamento vital, tratando destes como se fossem a mesma coisa, veremos adiante que constituem institutos diversos.
As diretivas antecipadas têm sua origem nos EUA, onde são conhecidas como “Advance Directives.” Inicialmente, foi regulamentada pela lei federal americana PSDA - The Patient Self-Determination Act, que está em vigor desde 1º de dezembro de 1990[34].
Esta lei admite a recusa do tratamento médico, consolidando a autonomia do paciente. As diretivas antecipadas poderão ser realizadas de três formas, através do living will (testamento vital); do durable power of attorney for health care (mandato duradouro); ou do advanced core medical directive (diretiva do centro médico avançado), que consiste na junção do testamento vital e do mandato duradouro.
Assim, as diretivas antecipadas consistem num termo no qual estão descritas as instruções da futura conduta médica, a serem aplicadas quando o paciente estiver impossibilitado de se manifestar.
Bomtempo[35] afirma que
As diretivas antecipadas entram na relação médico-paciente como meio para que a autonomia privada do paciente, antes de um possível estado de incapacidade, possa ser exercida, assegurando a sua dignidade e autodeterminação. Ainda, direcionará o profissional médico e sua equipe para que seja empregado o tratamento e cuidados previamente escolhidos pelo próprio paciente. Deve-se ressaltar que as diretivas antecipadas servirão de meio hábil a resguardar o médico de eventual responsabilização ao fazer ou não fazer uso dos tratamentos e cuidados dispensados pela escolha prévia do paciente ainda capaz.
Conforme explicitado acima, as diretivas antecipadas, como meio de preservar a autonomia do paciente, acaba por resguardar a sua dignidade e autodeterminação, pois direcionará a atuação médica para que sejam empregados os cuidados previamente escolhidos pelo mesmo. Bomtempo[36] visualizou as diretivas antecipadas também como forma de proteção do médico, de eventuais responsabilizações no caso de não fazer o uso de tratamentos e cuidados que o próprio paciente dispensou, quando ainda era capaz.
Neste sentido, as diretivas antecipadas entram na relação médico-paciente como meio para que a autonomia privada do paciente, antes de um possível estado de incapacidade, possa ser exercida, assegurando a sua dignidade e autodeterminação. Ainda, direcionará o profissional médico e sua equipe para que seja empregado o tratamento e cuidados previamente escolhidos pelo próprio paciente.
Diante do exposto, conclui-se que as diretivas antecipadas vêm contribuindo em benefício da relação médico-paciente, favorecendo ambas as partes, ora o paciente, garantido sua autonomia e dignidade, ora o médico, servindo como meio de resguardar suas condutas, bem como a ambos, ao propiciar o aumento da comunicação entre os mesmos.
Tendo em vista que o objetivo principal deste trabalho, referido anteriormente, é a abordagem da diretiva antecipada na modalidade testamento vital, passaremos ao estudo deste.
4. TESTAMENTO VITAL
O testamento vital consiste em um documento de declaração de vontade, através do qual uma pessoa em gozo de suas capacidades expressa sobre o desejo de aceitar ou suspender a aplicação de certos procedimentos médico-terapêuticos, se porventura vier a se encontrar em estado irreversível ou terminal da doença, e, concomitantemente, estiver impossibilitado de manifestar sua vontade.
Betancor[37] conceitua o testamento vital como:
Instrumento jurídico no qual os indivíduos capazes para tal, em sã consciência, expressem sua vontade acerca das atenções médicas que deseja receber, ou não, no caso de padecer de uma enfermidade irreversível ou terminal que lhe haja conduzido a um estado em que seja impossível expressar-se por si mesmo.
Nesta seara, Godinho[38] afirma que o instrumento:
[...] consiste num documento, devidamente assinado, em que o interessado juridicamente capaz declara quais tipo de tratamentos médicos aceita ou rejeita, o que deve ser obedecido nos casos futuros em que se encontre em situação que o impossibilite de manifestar sua vontade, como por exemplo, o coma.
Verifica-se, então, que o testamento vital é um documento jurídico, escrito por um indivíduo que esteja em plenas faculdades mentais, com o intuito de revelar antecipadamente sua vontade de se submeter ou rejeitar tratamentos médicos em situações que não possa mais se manifestar. Em outras palavras, através deste instituto, é possível que o ser humano demonstre expressamente que não deseja ser mantido vivo em condições que não lhe ofereçam o mínimo de dignidade, ou, como bem afirmaram Amaral e Pona[39], em situações “[...] cuja qualidade da vida já não mais pode ser preservada diante da batalha travada para vencer a morte.”
As disposições do testamento vital serão aplicadas ao paciente terminal que se encontre em estado permanente de inconsciência ou ao indivíduo que esteja acometido de dano cerebral irreversível em que não seja mais possível a recuperação da capacidade de tomar decisões e expressar vontades.
Quanto à terminologia, o testamento vital é uma das traduções da expressão inglesa “living will”, embora alguns doutrinadores, como Dadalto[40], entenda que esta tradução esteja equivocada. Ela[41] afirma que:
O erro da tradução cinge-se basicamente à incompatibilidade das características da declaração prévia de vontade para o fim da vida com a característica principal do testamento, qual seja, a produção de efeitos mortis causa, pois o conceito apresentado acima deixa claro que essa declaração surtirá efeito durante a vida do paciente.
Constata-se, portanto, que o testamento vital não se confunde com o testamento propriamente dito, tal qual previsto no Código Civil. Primeiro porque, enquanto a eficácia do testamento civil fica suspensa até o momento da morte do outorgante, produzindo efeitos somente após este evento, o testamento vital produz efeitos enquanto o outorgante ainda está em vida, no entanto, incapaz de expressar sua vontade. Além disto, o objetivo do testamento vital é informar a vontade do paciente quanto a atos médicos a que pretende ou não se submeter, versando, portanto sobre questões existenciais. Enquanto que o testamento previsto no direito civil tem o condão de dividir o patrimônio do testador, versando, em regra, sobre questões patrimoniais, embora se permita que o instituto seja utilizado para fins não patrimoniais. Devido a essas diferenças entre os institutos, e visando evitar possíveis confusões, alguns doutrinadores utilizam as expressões “declaração prévia de vontade do paciente terminal”.
Contudo, optou-se neste trabalho pela utilização da expressão testamento vital, tendo em vista que os poucos materiais disponíveis na literatura brasileira sobre o tema utilizam esta mesma nomenclatura. Por ser um tema pouco difundido no Brasil, a utilização deste termo facilita e simplifica o acesso, além de unificar a nomenclatura.
Após breve explanação acerca da terminologia, é de suma importância tecer as diferenças entre o testamento vital e o mandato duradouro, para que fique ainda mais corroborado que as diretivas antecipadas não se confundem com o testamento vital, conforme já afirmado.
O mandato duradouro consiste num documento no qual o paciente nomeia um procurador, para que este decida e tome as providências quanto ao tratamento do paciente, quando se fizer necessário e quando este estiver incapaz definitivo ou provisoriamente. Para tanto, o procurador tem obrigação de fazer as escolhas com base no conhecimento e nas preferências do paciente. Ou seja, o mandatário tem que saber distinguir a sua vontade da do paciente, pois, embora entenda que é melhor que o paciente se submeta a determinado tratamento, por exemplo, uma cirurgia, caso saiba que a preferência do paciente seria pela não realização deste procedimento, sua escolha deve ser no sentido de obstar a realização da mesma.
Enquanto o mandato duradouro é apenas instrumento de nomeação do procurador, para que este decida em nome do paciente, no testamento vital as decisões acerca da aceitação ou recusa de tratamento já estão expostas, e foram previamente escolhidas pelo próprio paciente. Além disto, o mandato duradouro produz eficácia quando a incapacidade do paciente for definitiva ou temporária, ao passo que o testamento vital só será eficaz no caso de incapacidade definitiva do paciente.
Implica salientar que não há óbice para que o paciente elabore os dois instrumentos.
Agora passemos a análise das características do testamento vital propriamente dito.
O primeiro aspecto a ser considerado diz respeito à capacidade de discernimento. Para que o testamento vital seja válido, vimos anteriormente que tem que ser elaborado pelo paciente a partir de 18 (dezoito) anos, e, além da idade, o paciente tem que ter discernimento.
O documento passará a surtir efeitos apenas quando o paciente se encontrar em estado terminal, incapaz permanentemente de manifestar sua vontade.
No que tange aos tipos de tratamentos que podem ser objeto de aceitação/suspensão do testamento vital, há controvérsias doutrinárias.
Godinho[42] defende que o direito de rejeitar tratamentos médicos consiste no exercício legítimo de direitos fundamentais, sendo este o fundamento básico do prevalecimento do consentimento e interesse dos pacientes. Todavia, tal autonomia não é absoluta, razão pela qual se faz necessário verificar os seus limites.
A primeira ponderação a ser feita é que a recusa de qualquer tratamento por parte do paciente não consiste na prática da eutanásia, ativa ou passiva, ou do ainda, do suicídio assistido.
Quando se fala em autonomia do paciente, dá-se a este o direito de escolher os tratamentos que considerar mais adequados, bem como rejeitar os que julgar invasivos. Por outro lado, forçar o paciente a aceitar determinado tratamento, por ser na opinião do médico o mais correto e/ou indispensável, é retornar aos moldes paternalistas e abolir a característica dialógica da relação médico-paciente, voltando o médico a decidir sozinho que tipo de medida terapêutica será aplicada em cada caso[43].
No tocante à eutanásia e ao suicídio assistido, a intenção principal não é a supressão um tratamento médico tido pelo paciente como indevido, mas sim, a supressão deliberada da vida do paciente terminal, sem o seu sofrimento[44].
O direito que possui o paciente de rejeitar medidas que considere indevidas não tem o objetivo de antecipar sua morte, mas apenas de impedir a utilização de tratamentos não desejados. Caso a ausência deste tratamento possa acarretar o evento morte, este ocorrerá por conta da patologia que acomete o doente e não pela omissão da medida em si a causa última da morte. Já na eutanásia, há intervenção no processo natural da morte, através da utilização de condutas que a antecipem, sendo a atuação profissional a causa direta da morte. A intervenção médica, neste caso, irá reduzir a vida do paciente. Este encurtamento da vida que é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro.
Portanto, embora a recusa de determinado tratamento e a prática da eutanásia possam ter a morte como resultado, há uma diferença substancial entre elas. A primeira decorre da atuação do médico em não aplicar determinada medida, em prol da escolha do paciente, vindo este a falecer naturalmente e em virtude da doença. Já a segunda, o óbito ocorre da atuação do profissional em empregar condutas que antecipem este feito.
Tendo o paciente exercido seu direito de rejeitar tratamentos médicos, mesmo sendo esta recusa incompreensível por terceiros, ela deve ser respeitada. Caso não seja implementada, ferindo a consciência e integridade física do paciente, bem como cerceando sua liberdade, o profissional poderá ser penalizado, pelo delito de constrangimento ilegal[45], dentre outros.
Por outro lado, se o médico respeita a vontade do paciente, não restará neste caso, à omissão do socorro, uma vez que é a própria doença que enseja a morte.
A Constituição Federal da República expõe no artigo 5º[46] que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.” Assim, nenhum indivíduo está obrigado a se submeter a algum tipo de tratamento contra a sua vontade.
Pelas razões exposta, Godinho[47] entende que, se toda pessoa capaz pode rejeitar a aplicação de cuidados médicos em seu tratamento, ainda que vitais, não há óbice para que manifeste sua vontade de aceitar ou rejeitar tais tratamentos em um momento futuro, em que porventura se encontre em estado de incapacidade, através da utilização do testamento vital.
Em linhas opostas, Dadalto[48] defende que para serem válidas, as disposições do testamento vital não podem rejeitar os cuidados paliativos, pois estes tem o condão de proporcionar a dignidade da pessoa humana, bem como proporcionar a morte digna.
Além disto, só pode ser objeto de recusa do testamento vital os tratamentos extraordinários, ou seja, aqueles considerados fúteis. Conforme já explanado, considera-se tratamento fútil aquele que não traz benefícios para o doente, e isto será determinado no caso concreto, levando se em conta as características e estado do paciente. Em sendo permitida a rejeição de tratamentos ordinários, haverá risco de se cometer a eutanásia, conduta esta proibida no Brasil.
Além de garantir a autonomia do paciente terminal, o testamento vital também serve para proteger o médico, pois serve como respaldo para proteção da atuação do médico em situações conflituosas. Neste sentido, Carlos Vital[49], vice-presidente do Conselho Federal de Medicina (CFM), afirmou que:
“a declaração de vontade dará segurança jurídica aos médicos que ficam temerosos de serem responsabilizados por omissão de socorro e acabam colocando o paciente nos aparelhos, mesmo sabendo que o que está ocorrendo é um prolongamento do processo de morte e não da vida.”
No tocante aos efeitos do testamento vital, caso este possua disposições válidas no ordenamento, produzirá efeito vinculante e erga omnes. Se fosse dada ao médico a liberdade de acatar ou rejeitar a diretiva, poderia ocorrer a chamada “jurisdicionalização” do morrer, pois, sempre que o médico rejeitasse o disposto, os familiares ou interessados do paciente poderiam procurar a Justiça.[50]
Vale salientar que o cumprimento das disposições constantes no testamento vital do paciente terminal comporta certos limites, que consistem na objeção de consciência do médico, proibição de disposições contrárias ao ordenamento jurídico, e disposições que sejam contraindicadas à patologia do paciente ou tratamento que já estejam superados pelo avanço da medicina.
O atual Código de Ética Médica, no inciso IX do capítulo II, aduz que é direito do médico “recusar-se a realizar atos médicos que, embora permitidos por lei, sejam contrários aos ditames de sua consciência”[51].
A recusa da aplicação do disposto na diretiva, neste caso, deverá ser justificada expressamente pelo médico, seja ela de ordem moral, ética ou qualquer outra de foro íntimo. Após, o paciente deve ser encaminhado a outro médico, para que se cumpra o disposto.
A proibição de disposições contrárias ao ordenamento jurídico brasileiro se justifica pelo fato de impedir que um documento, no qual tem o condão de possibilitar que o paciente não se submeta a determinados tratamentos, sirva como meio, na verdade, de abreviar a vida. Conforme já explicado, a eutanásia é uma prática vedada pelo ordenamento jurídico brasileiro, não sendo razoável, portanto, a existência de um instrumento jurídico capaz de burlar as disposições deste ordenamento. É por isto que só pode ser objeto do testamento vital a suspensão de tratamentos extraordinários ou fúteis.
Também não serão consideradas válidas as disposições contraindicadas à patologia do paciente, pois não condizem com o melhor interesse do paciente e nem com a ideia de morte digna.
Da mesma forma não serão válidas as disposições que versem sobre tratamentos já superados pela medicina. Isto porque, o testamento vital não possui efeito imediato, mas sim, futuro, quando o paciente estiver inconsciente. Tendo em vista que não há previsão de sua eficácia e que esta pode demorar anos, há a preocupação de invalidar as disposições que, a época da sua edição, eram consideradas fúteis, mas que, com os avanços da medicina, com a descoberta de novas drogas, medicamentos, tratamentos, dentre outras tecnologias, passaram a ser consideradas úteis para aquele caso.
Estudadas as principais características do testamento vital, passaremos a analisá-lo à luz do direito estrangeiro, para, com base nas leis dos países que o preveem, definir seus aspectos no Brasil.
4.1 IMPORTÂNCIA
O cenário atual da medicina dispõe de várias alternativas terapêuticas de modo que a vida humana é cada vez mais prolongada. Este é o norte da atuação de significativa parcela dos profissionais médicos. Ou seja, há a busca desenfreada pela cura independente do custo e do sofrimento causado.
Neste contexto, a utilização dos diversos recursos disponíveis sem medir os prejuízos que podem ser causados ao paciente pode configurar a prática da distanásia.
A resolução n. 1.805 do Conselho Federal de Medicina[52] veda a prática da distanásia, ao permitir que o médico limite ou suspenda procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do paciente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável.
Ocorre que, a existência deste dispositivo não impede a ocorrência da distanásia no caso concreto, tendo em vista a dificuldade de alguns profissionais em lidar com inevitabilidade da morte.
A existência de um instrumento que possibilite ao indivíduo manifestar-se previamente acerca dos cuidados que deseja ou não receber na fase terminal, quando estiver inconsciente, podendo o paciente dispor que não deseja se submeter a medidas terapêuticas inúteis, permite que o paciente, além de exercer sua autonomia, impeça a atuação médica na promoção da distanásia.
Em um estudo americano[53] realizado em 2010, viu-se que dentre os adultos de 60 anos de idade ou mais que morreram entre 2000 e 2006, 42% necessitaram de tomada de decisão sobre o tratamento nos últimos dias de vida, no entanto, 70% não possuíam capacidade para a tomada de decisão.
Nesta pesquisa, verifica-se que quase metade necessitou tomar decisões no fim da vida, e mais da metade não possuía capacidade para tal. Daí a importância da elaboração de um instrumento que possa ser utilizado nesta fase da vida para que, mesmo impossibilitado, o paciente tenha sua autonomia preservada, cabendo ao mesmo às decisões sobre sua vida e saúde.
Além disto, tendo o próprio paciente explicitado previamente a sua vontade, o poder de decisão não recairá sob seus familiares, como ocorria nos casos em que o paciente estivesse inconsciente.
Em assim sendo, a admissibilidade do testamento vital tem o condão de evitar ambiguidades, eliminando eventuais conflitos que possam existir entre os familiares na tomada de decisão ou até mesmo entre os parentes e a real intenção do paciente[54].
Por fim, o testamento vital trará mais segurança ao profissional médico, que, com medo de uma possível responsabilização por omissão de socorro, acabam utilizando de todas as medidas disponíveis, até mesmo os tratamentos fúteis, causando o prolongamento artificial da vida. Havendo um documento efetuado pelo paciente informando que não deseja se submeter a tratamento fútil, a atuação do médico estará amparada pelo direito da autonomia do paciente, que decidiu pela recusa do tratamento.
5 DIREITO COMPARADO
É de fundamental importância estudar como o testamento vital é visto em outros países, tendo em vista que no Brasil não há lei que o regulamente. Através da análise do direito comparado, é possível identificar as origens do testamento vital e entender com mais clareza as características deste instrumento, tais como conceito, requisitos, objetivos, validade, dentre outros.
Para uma melhor compreensão acerca do testamento vital, iremos nos basear nas leis estrangeiras que o prevê. Isto porque, além da ausência de previsão legal, pouco se fala sobre o tema no Brasil, e o material disponível para estudo é restrito. Por esta razão se torna necessária a sua análise sob a ótica dos países que já estão avançados neste assunto. Por meio desta comparação, é possível defender a validade deste instituto no ordenamento jurídico brasileiro e delimitar suas características básicas.
5.1 TESTAMENTO VITAL NA AMÉRICA DO NORTE
Os primeiros estudos acerca do modelo e premissas do living Will, foram propostos por Kutner[55], em 1969, através do seu artigo “Due process of Euthanasia: The Living Will, A Proposal.” Por meio deste documento, sugeriu-se que o paciente deixasse por escrito a quais tratamentos não deseja ser submetido quando se encontrar em estado vegetativo ou terminal. A partir de então, o tema passou a ser muito discutido e estudado pelo ramo da Bioética.
Em 1976, o Poder Judiciário americano deparou-se com o caso de Karen Ann Quinlan, uma jovem de 21 anos, que sofreu uma depressão respiratória ocasionada, provavelmente, por uma overdose de álcool em combinação com outras drogas depressoras do sistema nervoso central, o que a levou a ficar em estado vegetativo persistente. Os médicos do caso acreditavam que deveriam mantê-la viva, com a utilização de respiração assistida. No entanto, seus pais entendiam que este meio de prolongação artificial da vida deveria ser suprimido.
Para solucionar o caso, foi criado um Comitê de Ética com o objetivo de avaliar o quadro clínico e prognóstico de Karen Ann Quinlan que entendeu pela irreversibilidade do quadro. Diante disto, a justiça americana conferiu aos pais da paciente o direito de solicitar a equipe médica o desligamento dos aparelhos. Após, a retirada dos aparelhos, Karen ainda viveu por mais nove anos.[56]
Logo após este caso, que foi muito divulgado na época, a Califórnia editou sua lei, servindo de incentivo para que vários outros estados também regulamentasse a matéria.
Embora já existissem leis estaduais, a primeira lei federal do país a regulamentar as diretivas de vontade foi a denominada Patient Self Determination Act (PSDA), datada 1990. Esta lei, além de reconhecer o direito à autodeterminação do paciente, subdivide as diretivas antecipadas de vontade (DAV) nas espécies de testamento vital e mandato duradouro.
Não obstante a existência de lei federal nos Estados Unidos, esta serve apenas como diretriz para seus Estados. Isto porque, trata-se de um país descentralizado, onde cada estado possui autonomia legislativa. Consequentemente, cada unidade federativa tem liberdade para regulamentar o tema como achar mais conveniente, gerando assim uma série de leis que, embora versem sobre o mesmo instituto, o tratam de maneira diversa.
Caso o Brasil edite lei federal sobre o testamento vital, a matéria seria conduzida de maneira unificada em todo país.
5.2 TESTAMENTO VITAL NA EUROPA
Em 4 de abril de 1997, foi redigido, na Europa, o Convênio de Oviedo, conhecido também como Convenção de Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano em face das Aplicações da Biologia e da Medicina, em vigor desde 1º de Dezembro de 1999[57].
Segundo o Convênio, os desejos expressados pelo paciente, no tocante à intervenção médica, deverão ser levados em consideração, caso o paciente venha a ficar incapaz de manifestar sua vontade[58].
No entanto, antes mesmo da existência do Convênio, países como a Finlândia, Holanda e Hungria já haviam legislado sobre o assunto. Após a sua edição, países europeus como a Bélgica, Espanha, Inglaterra, País de Gales, Áustria, Alemanha e Portugal legislaram sobre as DAV, nesta ordem.
A França também possui legislação sobre as DAV, mas, neste país, os médicos não estão vinculados ao documento, razão pela qual não pode ser considerado que o paciente pode se autodeterminar através de uma DAV neste país.
O Convênio de Oviedo foi essencial na concretização do tema na Europa, pois a partir de sua edição, todos os países que o ratificaram tiveram que cumprir seus ditames e elaborar lei especifica para que fossem definidas as especificidades do instituto em cada um destes territórios.
Dentre os países que legislaram sobre a matéria, analisaremos a evolução do testamento vital na Espanha, pois as discussões sobre o testamento vital já estão bem avançadas neste território, e em Portugal, que editou recentemente a lei nº. 25/2012[59], que trata sobre o tema.
5.2.1 Espanha
Na Espanha, as discussões acerca do testamento vital ocorrem desde 1986, através da Associación Pro Derecho a Morir Dignamente, que redigiu o modelo do testamento vital, denominado, neste país, de instrucciones previas.
A primeira lei estatal da Espanha a tratar da matéria foi a n. 41/2002[60]. Ela definiu que, através do documento de instruções prévias, é possível que uma pessoa maior de idade, capaz e livre, manifeste antecipadamente sua vontade, com o objetivo de que esta seja cumprida no momento em situações em que não seja capaz de expressá-las pessoalmente. Este documento trataria dos cuidados e tratamentos de sua saúde ou ainda, estando próximo ao seu falecimento, sobre o destino do seu corpo e órgãos. Além disto, o outorgante pode designar um representante para que, chegado o caso, sirva como seu interlocutor com o médico e com a equipe sanitária, para que se dê o cumprimento das instruções prévias.
Mais adiante, a lei espanhola[61] fixou os limites das disposições das instruções prévias, ao mencionar que não poderão ser aplicadas as manifestações que sejam contrárias ao ordenamento jurídico e que não correspondam com o que se suponha que o interessado tivesse previsto no momento em que manifestou. Houve uma preocupação do legislador em não permitir que o instrumento permita a prática de condutas que desrespeitem a legislação, bem como em impossibilitar que manifestações errôneas da vontade, caracterizada quando a vontade expressa é divergente da vontade real, surtam efeitos.
O instrumento legal permite, ainda, a revogação das instruções prévias a qualquer tempo, por escrito, e determina a criação de um Registro nacional de instruções prévias no Ministério de Saúde, com a finalidade de proporcionar a eficácia das instruções em todo o território nacional.
Tal registro foi criado no ano de 2007, pelo decreto lei n. 124/2007[62].
Segundo o decreto[63], a inscrição no Registro Nacional de Instruções Prévias assegura a eficácia do documento e possibilita seu conhecimento em todo território nacional. Seu objetivo é constatar a existência das instruções prévias nos distintos registros autônomos únicos em que estarão armazenadas, bem como a localização e data da gravação da declaração. Assim, qualquer alteração, substituição ou revogação de seu conteúdo, seja qual for o registro autônomo em que tenha sido escrita, estará disponível para consulta em um único lugar. Desse modo, sempre que uma instrução prévia for inscrita em seu registro autônomo correspondente, caberá a este comunicar ao Registro Nacional. A existência desse registro confere uma maior unidade ao instrumento e simplifica seu acesso.
5.2.2 Portugal
Recentemente foi aprovada, em Portugal, a lei nº. 25/2012[64] regulando as diretivas antecipadas de vontade (DAV). Segundo o dispositivo legal, a DAV, designadamente sob a forma de testamento vital, consiste em um documento unilateral e livremente revogável a qualquer tempo, através do qual o indivíduo maior de idade e capaz, que não se encontre interdita ou inabilitado por anomalia psíquica, manifesta sua vontade consciente, livre e esclarecida, no tocante aos cuidados de saúde que deseja ou não receber, caso se encontre incapaz de manifestá-la.
Em seu artigo 5º[65] são descritos os limites do instituto, sendo consideradas inexistentes as diretivas antecipadas de vontade que contrariem a lei, à ordem pública ou às boas práticas, que possa implicar deliberadamente na morte não natural e evitável e que o outorgante não tenha expressado, clara e inequivocamente, a sua vontade.
A lei possibilita que qualquer pessoa nomeie um procurador de cuidados de saúde, ao qual se atribui poderes representativos para decidir pelo outorgante, quando este estiver incapaz de expressar a sua vontade, sobre os cuidados de saúde que serão ou não recebidos.
Esta lei portuguesa criou o Registro Nacional de Diretivas Antecipadas (RENTEV), que tem a finalidade de receber, registrar, organizar e manter atualizada as diretivas antecipadas e as procurações de cuidados de saúde.
O médico responsável pelos cuidados da pessoa incapaz de manifestar sua vontade deverá se assegurar da existência das diretivas antecipadas e/ou de procuração de cuidados de saúde registradas no RENTEV. Quando existentes, estes documentos deverão ser anexados ao processo clínico do paciente.
A criação desse Registro Nacional facilita a eficácia dos institutos no país, pois permite que o médico, a qualquer tempo, realize consultas para saber se seu paciente, impossibilitado de manifestar uma vontade válida, redigiu alguma diretiva antecipada ou procuração.
5.3 TESTAMENTO VITAL NA AMÉRICA LATINA: A EXPERIÊNCIA URUGUAIA
Considerando os países próximos ao Brasil que já legislaram sobre as diretivas antecipadas, vamos estudar sobre a experiência do Uruguai.
Em 2009, o Uruguai aprovou a lei nº. 18.473/2009[66], que versa sobre a voluntad anticipada. A lei permite que toda pessoa maior de idade e psiquicamente apta, de forma voluntária, consciente e livre, expresse antecipadamente sua vontade de se opor a futura aplicação de tratamentos e procedimentos médicos que prolonguem a vida, em detrimento da qualidade da mesma, caso se encontre em estado terminal, incurável e irreversível da doença. Portanto, neste país, só podem ser objeto de recusa os tratamentos fúteis.
A lei impede que a manifestação antecipada da vontade se oponha ao recebimento de cuidados paliativos. Nota-se, portanto, que há uma preocupação em vedar que as diretivas antecipadas sejam utilizadas para suspender aqueles cuidados que apenas visem promover o bem-estar do paciente. Além disso, a vontade antecipada terá plena eficácia quando a pessoa se encontrar em estado de incapacidade legal ou natural.
Quanto à forma, a diretiva deverá ser escrita, contendo a assinatura do titular e de duas testemunhas, sendo facultada à parte se manifestar perante o escrivão público, documentando-se em escritura pública ou ato notarial. Independente da forma, as disposições deverão ser incorporadas ao histórico clínico do paciente.
A vontade antecipada deverá conter o nome de uma pessoa denominada representante, maior de idade, para que vele sobre o cumprimento desta vontade, caso o paciente se encontre incapaz de tomar decisões sobre si mesmo. O documento poderá, também, ser revogado a qualquer tempo, de forma verbal ou escrita.
Em sendo o caso de suspensão de algum tratamento, o médico deverá comunicar a Comissão de Bioética da instituição hospitalar, caso esta exista, para que, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas do recebimento da comunicação pela Comissão, esta decida pela realização ou não do pedido. Caso não haja pronunciamento dentro do prazo de 48 (quarenta e oito) horas, considera-se tacitamente aprovada a suspensão do tratamento.
Por fim, as instituições públicas e privadas de prestação de serviços de saúdes devem garantir o cumprimento da vontade antecipada do paciente, bem como promover programas educativos para funcionários e usuários sobre os direitos do paciente quanto ao constante na lei 18.473/2009[67]. O Ministério de Saúde Pública deverá promover uma ampla difusão acerca do assunto. É interessante observar, portanto, que este dispositivo legal não se preocupa apenas em delimitar os requisitos da diretiva, mas também em possibilitar seu cumprimento e sua ampla difusão, para que um número cada vez maior de pessoas tomem ciência da existência do instrumento e passem a utilizá-lo.
6 A VALIDADE DO TESTAMENTO VITAL NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Embora não exista norma jurídica regulamentando o testamento vital no Brasil, isto não é suficiente para impedir a sua validade neste território.
Analisando o instrumento à luz de princípios e normas constitucionais e infraconstitucionais, encontraremos o substrato da aceitação do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro.
A Constituição Federal[68] prevê, em seu artigo 1º, inciso III, o princípio da dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito. Já foi visto anteriormente que o exercício da autonomia do indivíduo é uma das formas de garantir a sua dignidade.
Amaral e Pona[69] afirmam que:
Este documento, enquanto testamento, resulta da vontade do individuo, apenas e tão somente, e aqui se manifesta a autonomia da vontade. Enquanto capaz de estabelecer normas jurídicas a serem observadas pelos demais indivíduos, reveste-se da autonomia privada, fonte do direito, apta a produzir efeitos jurídicos. E enquanto princípio bioético, representa o respeito ao paciente, o respeito à pessoa humana.
Nota-se que a autonomia é o principal fundamento de validade do testamento vital, não apenas no sentindo cível, mas também como princípio bioético, garantindo o respeito ao paciente.
Com base na autonomia, não há óbice para que o indivíduo livremente decida acerca dos tratamentos que deseja ou não receber caso venha a se encontrar em estado terminal e inconsciente. Com este ato, visa-se não submeter o ser humano a tratamentos extraordinários, indo de encontro ao disposto no artigo 5º, inciso III da Constituição Federal[70], que proíbe a sujeição do ser humano ao tratamento desumano.
Acerca disto, Luciana Dadalto[71] discorre que:
[...] o direito de decidir sobre os tratamentos a que deseja ser submetido caso se torne um paciente terminal, preserva a sua vontade e evita que ele seja submetido ao esforço terapêutico – prática médica que visa manter a vida mesmo que não haja condição de reversibilidade da doença – que é considerado pela presente pesquisa um tratamento desumano, já que está comprovado que este esforço não causará nenhuma vantagem objetiva ao paciente, vez que não impedirá a morte deste. (grifos nossos)
Dando continuidade as disposições constitucionais que permitem uma interpretação no sentido da aceitação do testamento vital, temos o 5º, inciso II, que trata do princípio da liberdade ao estabelecer que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer coisa senão em virtude de lei”[72].
Ora, não há lei que obrigue o paciente terminal a se submeter a qualquer tratamento e é razoável que não exista. Se o paciente terminal consciente pode expressar sua vontade no sentido de aceitar ou rejeitar práticas médicas, não é aceitável cercear este direito só porque o paciente passou a estar inconsciente, principalmente se o mesmo já havia manifestado anteriormente sua vontade quanto ao assunto.
Sob a ótica do Código Civil[73], o artigo 15 preceitua que “ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a tratamento médico ou intervenção cirúrgica”.
A leitura deste dispositivo pode passar a ideia de que ninguém pode ser obrigado a submeter-se a tratamento médico ou intervenção cirúrgica apenas quando houver risco de vida. Ocorre que esta interpretação restritiva do artigo acaba criando uma noção errônea acerca do seu alcance. Isto porque cabe ao paciente manifestar seu consentimento para qualquer intervenção médica, sua importância é ainda maior quando houver risco de vida. O artigo citado representa expressão da autonomia do paciente em relação aos tratamentos que lhe são fornecidos, devendo o profissional da área de saúde respeitar a vontade dele.
Analisados os embasamentos legais que permitem a aceitação do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro, passaremos ao estudo das resoluções do Conselho Federal de Medicina que corroboram ainda mais esta validade.
Outro elemento importante no tocante a autonomia do paciente diz a necessidade do consentimento livre e informado, estabelecido pelo Código de Ética Médica. Se antes o médico direcionava sua conduta amparada pelo paternalismo, que permitia que as decisões fossem tomadas exclusamente por eles, atualmente faz-se necessário a prévia consulta ao paciente, que fará suas decisões com base na sua autonomia. Versa o artigo 22[74] deste código que é vedado ao médico “deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado”.
No ano de 2006, o Conselho Federal de Medicina (CFM) editou a Resolução n. 1.805/2006[75], que regulamenta a prática da ortotanásia no âmbito da atuação dos profissionais da área médica, conceituando-a e estabelecendo todos os procedimentos para que ela seja aplicada na relação médico-paciente.
O preâmbulo desta resolução informa que “na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal”.
Esta conceituação, ao permitir que o médico limite ou suspenda procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente visa efetivar as garantias da dignidade da pessoa humana e assegurar que ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante, conforme já explicitado.
O artigo 1º[76] preceitua que “é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal.” Por sua vez, dispõe o § 1º[77] que “o médico tem a obrigação de esclarecer ao doente ou a seu representante legal as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação”.
Assim, depreende-se que o paciente tem direito a autonomia, estando assegurado o direito a informação prévia do seu estado de saúde e suas perspectivas ou não de cura. Com esses dados, o paciente poderá decidir livremente se deseja suspender tratamentos que prolonguem a vida, vindo esta a findar-se naturalmente, ou mesmo se deseja prolongá-la, devendo, em quaisquer dos casos, ser respeitada a sua vontade.
Além desta, o CFM editou a resolução n. 1.995/2012[78], que dispõe acerca das diretivas antecipadas de vontade no Brasil, tendo em vista que não existe regulamentação sobre o assunto na ética médica brasileira, que é necessário disciplinar a conduta médica neste sentido, que este assunto é relevante no contexto da relação médico-paciente, que o profissional médico pode se encontrar com situações de ordem ética até então não previstos nos dispositivos éticos nacionais, que os modernos meios tecnológicos oferecem meios desproporcionais de prolongar a vida do paciente em estado terminal sem oferecer benefícios e a custa do prolongamento do sofrimento e que estas medidas poderiam ter sido rejeitadas pelo mesmo anteriormente.
Esta resolução definiu as diretivas antecipadas de vontade como sendo o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, acerca dos cuidados e tratamentos que deseja ou não receber quando estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade, bem como determinou que o médico deverá levar em consideração estas diretivas antecipadas.
Vale salientar que esta resolução não tem força de lei, razão pela qual ainda se faz necessária a elaboração de uma legislação para que se possa delimitar com clareza uma série de questões acerca do instituto, a exemplo do discernimento, aos tipos de tratamentos podem ser recusados, condições de validade, necessidade de registro do documento, dentre outros.
Pelo exposto, com base nos princípios e normas analisados, bem como nas resoluções do CFM, o testamento vital é instituto válido no Brasil, bem como está legitimado pelos princípios constitucionais.
Entendendo ser possível a validade do testamento vital no Brasil, faz-se necessário estabelecer algumas das suas condições. As características a seguir propostas foram determinadas de acordo com as disposições do ordenamento brasileiro, bem como através das características atinentes a estes institutos nas legislações estrangeiras, o que não impede que, vindo a ser editada lei sobre a matéria, as condições aqui propostas sejam alteradas.
6.1 REQUISITOS
Tendo em vista no Brasil que não existe legislação específica sobre o testamento vital, não há como delimitar com exatidão quais seriam seus requisitos. No entanto, é necessário analisar suas possíveis características, ainda que a edição de lei regendo a matéria as modifique.
O atual Código Civil[79], artigo 107, aduz que “a validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir.” Verifica-se que, em regra, os atos jurídicos possuem forma livre. Caso necessite de alguma solenidade para a sua validade, esta deve estar prevista em lei.
Conclui-se que, não existindo lei que imponha formalidades a validade do testamento vital, sua forma é livre. No entanto, para conferir mais segurança ao ato, é recomendável que o interessado realize registro em cartório. Vale observar que não há óbice, caso a lei do testamento vital venha a ser criada, para que o registro do testamento vital em cartório torne-se obrigatório. É necessário apenas que tal formalidade esteja prevista na lei.
Contudo, com intuito de evitar a sua invalidação, tomaremos como base, por analogia, algumas características do testamento particular, e outras decorrentes do estudo do direito comparado, em especial da lei n.º 25/2012 de Portugal[80].
6.1.1 Capacidade e Discernimento
Para que o testamento vital seja considerado válido, deverá ser realizado pelo interessado plenamente capaz que, segundo nosso Código Civil, ocorre a partir dos 18 (dezoito) anos.
Além da capacidade de fato, o indivíduo tem que ter discernimento, requisito essencial para validade do ato.
Dadalto[81] defende que os limites objetivos de fixação de idade utilizados pelo atual Código Civil devem ser flexibilizados, pois estes critérios podem impossibilitar o incapaz de exercer direitos de personalidade e de desenvolver sua dignidade.
Assim, caso o indivíduo considerado incapaz pela lei deseje firmar um testamento vital, deverá acionar o Judiciário, que só poderá negar a autorização se constatado que o requerente não possui discernimento. Em não havendo esse requerimento, o testamento deverá ser ratificado pelo próprio outorgante, quando este adquirir a maioridade civil.
O que a autora defende é que o discernimento não está atrelado a idade e que a autodeterminação do individuo não pode ser prefixada sem uma análise mais profunda. Razão pela qual, se um indivíduo com menos de 18 (dezoito anos) queira redigir o documento, cabe ao juiz analisar, no caso concreto, se o sujeito tem discernimento para manifestar sua vontade acerca dos cuidados que deseja ou não receber, quando em estado terminal e inconsciente.
Assim, é necessário que o indivíduo seja capaz, segundo os critérios apontados pelo código civil, ou seja, a partir dos 18 (dezoito) anos, e não enquadre em situações de incapacidade a posteriori. No entanto, não há óbice para que um menor de 18 anos faça um testamento vital, desde que obtenha a devida autorização judicial no que tange ao seu discernimento.
Na lei de Portugal, no artigo 2º[82], foi fixado que, para outorgar diretivas antecipadas de vontade, os indivíduos devem, cumulativamente, ser maiores de idade, não se encontrarem interditados ou inabilitados devido a anomalias psíquicas e estarem capazes de conceder o seu consentimento consciente, livre e esclarecido.
6.1.2 Forma
Se houvesse lei no Brasil dispondo sobre o testamento vital, certamente ela indicaria os pressupostos formais deste instituto. No entanto, como não há, faz-se necessário utilizar medidas que demonstrem a autenticidade do ato e a higidez mental do outorgante.
Na Espanha, o testamento vital pode ser público ou privado. Em sendo público, o documento é registrado em cartório através de escritura pública e não necessita, neste caso, da presença de testemunhas. Já se for privado, é necessária a presença de testemunhas.
Segundo o Conselho Federal de Medicina[83], a diretiva antecipada deve ser registrada no prontuário do paciente, desde que expressamente autorizado pelo mesmo. Não se exige testemunhas, pois a profissão do médico é dotada de fé pública e, consequentemente, seus atos possuem efeitos legais e jurídicos.
Se o paciente tiver interesse, poderá registrar sua diretiva antecipada também no cartório. No entanto, não será exigido esse procedimento para que a vontade seja cumprida, pois a anotação no prontuário já é suficiente[84]. Essa informalidade do documento no Brasil decorre da ausência de previsão legal, não podendo, portanto, ser exigida nenhuma solenidade para a prática do ato.
Em Portugal, a lei determina que as diretivas antecipadas sejam formalizadas por meio de documento escrito, assinado presencialmente perante funcionário devidamente habilitado do Registro Nacional do Testamento Vital (RENTEV) ou notário.
O RENTEV tem a finalidade de registrar, organizar e manter atualizada as disposições do testamento vital, centralizando, deste modo, todas as informações referentes à matéria. Além disto, possibilita a eficácia do instrumento em todo o país e garante a segurança jurídica.
Nos termos do artigo 17 da lei portuguesa[85], temos que:
Artigo 17.º
Consulta do RENTEV
1 — O médico responsável pela prestação de cuidados de saúde a pessoa incapaz de expressar de forma livre e autónoma a sua vontade, assegura da existência de documento de diretivas antecipadas de vontade e ou procuração de cuidados de saúde registados no RENTEV.
2 — Caso se verifique a sua existência, o documento de diretivas antecipadas de vontade, e ou procuração de cuidados de saúde, são anexados ao processo clínico do outorgante.
3 — O outorgante do documento de diretivas antecipadas de vontade e ou procuração de cuidados de saúde, ou o seu procurador, podem solicitar ao RENTEV, a qualquer momento, a consulta ou a entrega de cópia da DAV do outorgante.
Assim, em sendo criada lei específica acerca do testamento vital no Brasil, é interessante que seja criado um Registro Nacional. Ele teria o objetivo de possibilitar uma maior efetividade no cumprimento do instrumento, pois o médico, ao consultar o registro, irá verificar a existência da diretiva e deverá anexá-la processo clínico, que no Brasil, é conhecido como prontuário.
O prontuário médico consiste em:
[...] um documento que caracteriza o conjunto de informações escritas, relativas à determinada pessoa em seu curso de internação e evolução médica. O prontuário do paciente, embora geralmente denominado “prontuário médico”, é o conjunto de documentos e informações referente a um paciente e sua doença. Nesse contexto, deve ser considerado como a espinha dorsal da linha temporal dentro da evolução de cada paciente.[86]
No sistema de saúde brasileiro, ele é o principal documento de registro dos dados referentes ao paciente, como a evolução clínica, os exames realizados, os procedimentos aos quais foi submetido e qualquer outra informação acerca deste individuo. Deste modo, registrar o testamento vital nele é a melhor forma de se armazenar o desejo do paciente com a segurança que ele será seguido pela equipe que o assiste.
6.1.3 Conteúdo
O conteúdo do testamento vital diz respeito a toda matéria que é permitida dispor com a sua utilização. Preliminarmente, observa-se que a recusa do paciente aos tratamentos não pode versar sobre os cuidados paliativos, pois estes visam aliviar o seu sofrimento e possibilitar que o fim de sua vida se dê com qualidade, proporcionando-lhe uma morte digna.
O tratamento objeto da recusa deve ser os considerados extraordinários ou fúteis. Isto porque, em sendo admitida a rejeição de tratamentos ordinários, correrá o risco de que o documento disponha sobre a rejeição de tratamentos que possam ocasionar a eutanásia.
A eutanásia, conforme já explicado, é uma prática vedada pelo nosso ordenamento jurídico, não sendo admissível que este instrumento jurídico seja capaz de burlar as disposições do nosso ordenamento.
Nesse sentido, a lei portuguesa 25/2012, artigo 2º[87], aponta que podem constar no testamento vital a rejeição do paciente a submissão de tratamento de suporte artificial das funções vitais, a tratamentos fúteis, inúteis ou desproporcionais de acordo com seu quadro clínico e com as boas práticas profissionais, especificamente no tocante às medidas de suporte básico de vida e às medidas de alimentação e de hidratação artificiais que objetivem apenas retardar o processo natural da morte do doente e a tratamentos que estejam em fase experimental. Além disso, podem dispor sobre a aceitação dos cuidados paliativos adequados, incluindo terapia sintomática, e autorizar ou recusar sua participação em pesquisas científicas.
Vale ressaltar que não é consenso na literatura que a hidratação e a nutrição podem ser recusadas. Uma parcela dos autores argumenta que eles são procedimentos vitais, ou seja, ao suspendê-los, acelera-se o processo de morte. Isto, portanto, caracterizaria a eutanásia, que não é objetivo do testamento vital.
Verificamos que as disposições da lei portuguesa são coerentes às necessidades da sociedade brasileira. Desse modo, defendemos a criação de uma legislação com características semelhantes a ela no Brasil.
Em relação ao aspecto da permissão ou não de recusar a suspensão da hidratação e da nutrição, fica a cargo do legislador decidir se são passíveis de rejeição. Em sendo possível, caberá ao médico, na análise do caso concreto, averiguar se a hidratação e nutrição configuram um tratamento ordinário ou fútil. Isto porque, como já visto, o enquadramento da medida terapêutica em ordinária ou extraordinária dependerá da situação em que se encontra o paciente, sendo portanto, variável.
6.1.4 Prazo de Validade
Há doutrinadores que entendem ser necessária a fixação de um prazo de validade para o testamento vital, sob o argumento de que o instrumento só será utilizado em um futuro incerto, podendo passar muitos anos entre a data de sua elaboração e a data de sua eficácia. Com isto, no decorrer deste período, a medicina continuará avançando, podendo surgir novas técnicas e tratamentos, e, em decorrência disto, uma doença incurável pode se tornar curável, bem como uma medida antes vista como extraordinária pode passar a ser útil para aquele caso.
Ocorre que, se houver avanços na medicina que passem a considerar a doença curável ou o tratamento útil, o testamento não mais será válido. Isto porque, já foi estudado que existem limites à aplicação do testamento vital, dentre eles estão às disposições contraindicadas a patologia do paciente ou as que dispõem de tratamentos superados pela medicina, que, neste caso, serão consideradas inválidas.
A lei portuguesa nº. 25/2012, no artigo 7º[88], fixa um prazo de cinco anos de eficácia, a contar da data da sua assinatura. Para que seja renovado, é necessário que o indivíduo faça uma declaração de confirmação do disposto no testamento vital. Faz parte dos serviços do RENTEV o dever de informar ao outorgante, por escrito, sobre a data de caducidade do documento, até 60 (sessenta) dias antes.
No entanto, entendo ser desnecessária a fixação do prazo de validade. Primeiro porque, conforme abordado neste trabalho, o testamento vital pode ser revogado a qualquer tempo pelo interessado. Enquanto ele não manifestar a intenção de revogá-lo, presume-se sua aceitação.
Segundo, esta medida é pouco prática, pois periodicamente o indivíduo terá que se dispor a renová-lo. Em contrapartida, sem a fixação de um prazo limite, se o outorgante apresentar interesse na revogação seria necessário apenas uma única visita ao estabelecimento oficial para revogar o documento. Com a fixação do prazo, se porventura a pessoa não comparecer no período, o documento não será mais eficaz, partindo-se da presunção de que o indivíduo não quis renová-lo, mesmo sem que haja nada expresso quanto a isto. Em não havendo prazo de validade, o interessado, tendo que manifestar seu desejo pela revogação o documento, não deixará dúvidas quanto ao seu real interesse.
6.1.5 O Testamento Vital sob a Ótica da Resolução n. 1995/2012 do Conselho Federal de Medicina
No ano de 2012, levando-se em conta a necessidade e inexistência de regulamentação acerca das diretivas antecipadas de vontade do paciente, bem como a relevância da autonomia deste na relação médico-paciente e sua interface com as diretivas antecipadas de vontade, o Conselho Federal de Medicina publicou a Resolução n. 1995/2012[89].
Segundo a norma[90], as diretivas antecipadas de vontade são conceituadas como “o conjunto de desejos, prévia e expressamente manifestados pelo paciente, sobre cuidados e tratamentos que quer, ou não, receber no momento em que estiver incapacitado de expressar, livre e autonomamente, sua vontade”.
A resolução também dispõe que, estando o doente incapaz de expressar sua vontade, o médico terá que levar em consideração suas diretivas antecipadas de vontade. Ou seja, não é permitido ao profissional decidir se quer ou não aplicar a diretiva. Isto porque o objeto de ação deste documento não é de competência do médico e, sim, do paciente. Neste sentido, cabe a este decidir a que procedimentos o seu corpo será submetido ou não, respeitando sempre as proibições legais, como o suicídio e a eutanásia.
O profissional de saúde deixará de levar em consideração o disposto no instrumento caso entenda que estão em desacordo com o Código de Ética Médica[91]. Assim como o ordenamento jurídico, este código regulamenta e direciona a atuação médica. Deste modo, mesmo que seja desejo do paciente, ele estando consciente ou não, se determinada conduta for de encontro com Código de Ética Médica, esta ação não deverá ser realizada.
Ainda segundo a resolução 1995/2012, caberá ao médico assistente registrar no prontuário do paciente as diretivas antecipadas de vontade que lhes forem diretamente comunicadas. O prontuário, como anteriormente explicado, é o principal documento de registro dos dados clínicos dos pacientes no Brasil, sendo constantemente consultado e atualizado por toda a equipe de saúde assistente, seja médico, enfermeiro, fisioterapeuta, nutricionista, entre outros. Portanto, o local mais indicado para que o desejo do paciente seja anotado é nele, visto que rapidamente se difundirá entre os profissionais assistentes e, assim, mais facilmente poderá ser respeitada sua vontade e sua autonomia preservada.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A diversidade de medidas terapêuticas atualmente disponíveis em conjunto com a dificuldade de parte dos profissionais da área de saúde em lidar com a morte submete o paciente a tratamentos que lhe causam o ônus de prolongar sua vida artificialmente. Ou seja, retarda-se a morte natural sem que, com isto, haja qualquer benefício ou conforto ao paciente.
Por outro lado, há uma preocupação com a autonomia do paciente, que tem o direito de decidir a que medidas terapêuticas ele deseja ou não ser submetido. Com a utilização do testamento vital, garante-se este preceito legal, mesmo quando o indivíduo se encontre em estado terminal e impossibilitado de manifestar sua vontade.
Fala-se, assim, em direito à morte digna. Ela ocorre a partir da “reivindicação por vários direitos, como a dignidade da pessoa, a liberdade, a autonomia, a consciência, refere-se ao desejo de se ter uma morte humana, sem o prolongamento da agonia por parte de um tratamento inútil”[92]. Ou seja, há o respeito a sua liberdade de escolha com o mínimo de sofrimento ao paciente.
O direto à morte digna não se confunde com o “direito de morrer.” A primeira tem relação com o bem-estar do paciente e a morte acontecerá naturalmente. A última, por sua vez, se caracteriza pela possibilidade do indivíduo tirar a própria vida, antecipando a sua morte. O testamento vital busca resguardar tão somente à morte digna, vez que a legislação brasileira não permite a abreviação da vida.
Entre os benefícios do testamento vital, destaca-se seu caráter de orientação para o médico, que terá sua conduta respaldada pelo disposto. Ao permitir que o indivíduo tenha seu desejo respeitado até o fim da vida, mesmo inconsciente, este instrumento afasta dos familiares e dos profissionais assistentes a responsabilidade por decidir as condutas a serem tomadas. Desse modo, há a preservação da segurança do profissional e a todos os envolvidos no caso, haja vista que o deseja fora expresso pelo paciente anteriormente.
No Brasil não há lei específica sobre o tema, no entanto, com base nos princípios do nosso ordenamento jurídico e nas resoluções do Conselho Federal de Medicina, constata-se que o testamento vital é válido. Ele constitui uma das formas de expressão da autonomia do paciente, que tem o direito de participar ativamente das decisões sobre seu tratamento de acordo com suas crenças e valores e escolher de que forma deseja passar nos últimos dias de sua vida.
Embora seja possível definir as possíveis características do testamento vital no Brasil, constata-se a necessidade de que seja editada lei específica sobre o tema. Assim, os requisitos formais e especificidades do instituto serão determinados em definitivo, sem deixar margem de dúvidas. Isto também possibilitará uma maior disseminação do tema, tendo em vista que se trata de um assunto pouco difundido no país.
Enquanto essa lei não é editada, foi proposto, com base nas resoluções do Conselho Federal de Medicina, Código Civil e Direito comparado, as condições de elaboração do instituto. É necessário que o interessado obedeça ao critério de capacidade previsto no Código Civil, ou seja, tem que ser maior de 18 (dezoito) anos e não se enquadrar em nenhum critério de incapacidade elencado pelo Código Civil.
Quanto à forma, é importante utilizar medidas que demonstrem a autenticidade do ato e a higidez mental do outorgante. Assim, embora a Resolução 1995/2002, informe que basta que o médico anote no prontuário do paciente as diretivas antecipadas por este diretamente exposta, seria interessante que o paciente registrasse sua diretiva antecipada também em cartório. No entanto, este procedimento não é obrigatório para que a vontade seja cumprida, pois não pode se exigir nenhuma solenidade para a prática do ato. A solenidade do ato depende de lei que a defina. Basta, portanto a anotação no prontuário, sendo o registro em cartório apenas um meio, opcional, para conferir uma maior segurança ao ato.
No tocante ao conteúdo, foi observado que o testamento vital não pode ter como objeto a recusa dos cuidados paliativos, posto que estes garantem a dignidade da pessoa humana. Só poderão ser objeto de recusa as disposições que recusem a aplicação de tratamentos fúteis, que não tragam benefícios ao doente.
Por fim, verifica-se se o testamento vital necessita de respaldo legal para que se consagre, em definitivo, o direito a autonomia do paciente, no sentido de escolher, previamente, a que medidas terapêuticas deseja ou não se submeter. Desta forma, garante-se que sua vontade será respeitada mesmo se ele estiver inconsciente, resguardando-o das condutas que promovam a distanásia e possibilitando-o um fim de vida digno.
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[1] KANT, 1997 apud RODRIGUES JUNIOR, Otavio Luiz. Autonomia da vontade, autonomia privada e autodeterminação: Notas sobre a evolução de um conceito na Modernidade e na Pós-modernidade. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 41, n. 163, p.117, jul./set. 2004. Disponível em: < http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/982/R163-08.pdf?sequence=4>. Acesso em: 12 de nov. 2013.
[2] FERRI, Luigi. La autonomía privada. Granada: Gomares, 2001.
[3] GURGEL, Fernanda Pessanha do Amaral. Autonomia da vontade, autonomia privada e livre iniciativa: uma visão sob a ótica do código civil de 2002. Revista da Faculdade de Direito Padre Anchieta, Jundiaí, v. 5, n. 9, p.48, nov. 2004. Disponível em: . Acesso em: 12 nov. 2013.
[4] AMARAL NETO, Francisco dos Santos. Autonomia privada. Revista Cej, Brasília, v. 3, n. 9, p.25, dez. 1999. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[5] AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, p. 347-8, 2003.
[6] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[7] TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil. Tomo III. Rio de Janeiro: Renovar, p. 32, 2009.
[8] KIPPER, Délio José. O problema das decisões médicas envolvendo o fim da vida e propostas para nossa realidade. Revista Bioética, Brasília, v. 7, n. 1, p. 1-5, 1999. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[9] PIVA, Jefferson Pedro; CARVALHO, Paulo R. Antonacci. Considerações Éticas nos Cuidados Médicos do Paciente Terminal. Revista Bioética, Brasília, v. 1, n. 2, p. 1-8, 2009. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[10] KOVÁCS, Maria Júlia. Autonomia e o Direito de Morrer com Dignidade. Revista Bioética, Brasília, v. 6, n. 1, p.1-8, 2009. Disponível em . Acesso em: 13 nov. 2013.
[11] CARNEIRO, António Vaz; CARNEIRO, António Vaz; FREITAS, António Falcão de. Relatório sobre o estado vegetativo persistente. [S. l.]: Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida, p. 3, 2005.
[12] BRASIL. Código Civil (2002). Código civil brasileiro e legislação correlata. 2. ed. Brasília:Senado Federal, Subsecretária de Edições Técnicas, p. 143, 2008. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2013.
[13] Idem.
[14] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1931, de 17 de setembro de 2009. Aprova o Código de Ética Médica. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 20, 24 set. 2009. 2009. Disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2013
[15] Idem, p.21.
[16] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. Disponível em: . Acesso em: 20 nov. 2013.
[17] SIMM, Camila Beatriz. Direito a uma morte digna e pacientes terminais. Jus Navigandi, Teresina, v. 17, n. 3335, 18 ago. 2012. Disponível em . Acesso em: 20 nov. 2013.
[18] QUEIROZ, Victor Santos. A dignidade da pessoa humana no pensamento de Kant: Da fundamentação da metafísica dos costumes à doutrina do direito. Uma reflexão crítica para os dias atuais. Jus Navigandi, Teresina, v. 10, n. 757, 31 jul. 2005. Disponível em: . Acesso em: 20 nov. 2013.
[19] MARTINS, Carlos Eduardo. Ordenamento jurídico brasileiro aceita ortotanásia. [S.l.: s.n.], 2013. Disponível em: . Acesso em: 21 nov. 2013.
[20] SIMM, Camila Beatriz. Direito a uma morte digna e pacientes terminais. Jus Navigandi, Teresina, v. 17, n. 3335, 18 ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 nov. 2013.
[21] LEÃO, Thales Prestrêio Valadares. Da (im)possibilidade do testamento vital no ordenamento jurídico brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, v. 3625, n. 18, 5 jun. 2013. Disponível em: . Acesso em: 21 nov. 2013.
[22] Idem.
[23] HIPOCRÁTICOS Hipócritas. [São Paulo]:Veja, 1943. [Artigo eletrônico]. Disponível em: . Acesso em: 25 nov. 2013.
[24] CONSENTIMENTO livre e esclarecido: uma leitura histórica desde o paternalismo médico até a autonomia do paciente. Nigre Advocacia, Rio de Janeiro, p. 11-14, [Artigo eletrônico]. Disponível em: . Acesso em: 25 nov. 2014.
[25] DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 64-5, 2013.
[26] Idem.
[27] CLOTET, Joaquím. O Consentimento Informado nos Comitês de Ética em Pesquisa e na Prática Médica: Conceituação, Origens e Atualidade. Revista Bioética, Brasília, v. 3, n. 1, p.1-7, 2009. Disponível em: . Acesso em: 28 nov. 2013.
[28] BRASIL. Código Civil (2002). Código civil brasileiro e legislação correlata. 2. ed. Brasília:Senado Federal, Subsecretária de Edições Técnicas, p. 143, 2008. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2013.
[29] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1931, de 17 de setembro de 2009. Aprova o Código de Ética Médica. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 27, 24 set. 2009. Disponível em: . Acesso em: 30 nov. 2013.
[30] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 671, de 18 de julho de 1975. "Considera a Declaração de Helsinque" adotada pela Associação Médica Mundial como guia a ser seguido pela classe médica em matéria referente a pesquisa clínica e dá outras providências. Brasília: D.O.U., Seção 1, Parte 2, 01 set. 1975. Disponível em: . Acesso em: 30 nov. 2013.
[31] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1544, de 9 de abril de 1999. A obtenção de amostras de sangue de cordão umbilical e placenta será de natureza gratuita e voluntária, mediante esclarecimento da finalidade, da técnica e demais itens dispostos nesta Resolução, sendo vedada a comercialização com fins lucrativos. Brasília: D.O.U., Seção 1, n. 76, p. 139, 23 abr. 1999. Disponível em: . Acesso em: 30 nov. 2013.
[32] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1643, de 7 de agosto de 2002. Define e disciplina a prestação de serviços através da Telemedicina. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 205, 26 ago. 2002. Disponível em: . Acesso em: 30 nov. 2013.
[33] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1653, de 6 de novembro de 2002. Dispõe sobre demonstrações de Cirurgias ao Vivo. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 81, 2 dez. 2002. Disponível em: . Acesso em: 30 nov. 2013.
[34] MULHOLLAND, Kelly C. Protecting the right to die: the patient self-determination act of 1990. Harvard Journal on Legislation, 1991, p. 618. Disponível em: . Acesso em: 6 de fev. 2012.
[35] BOMTEMPO, Tiago Vieira. Diretivas antecipadas: instrumento que assegura a vontade de morrer dignamente. 2012. [Artigo eletrônico]. Disponível em: . Acesso em: 2 dez. 2013.
[36] Idem.
[37] BETANCOR, Juana Teresa. El testamento vital. Cuaderno del Instituto Vasco de Criminología, San Sebastián, n. 9, p. 97-112, dez. 1995. Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2013.
[38] GODINHO, Adriano Marteleto. Diretivas antecipadas de vontade: testamento vital, mandato duradouro e sua admissibilidade no ordenamento brasileiro. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, n. 2. Lisboa, p. 956, 2012.
[39] AMARAL, Ana Claudia Correa Zuin Mattos do; PONA, Everton Willian. Autonomia da Vontade Privada e Testamento Vital: A possibilidade de inclusão no ordenamento jurídico brasileiro. Revista do Direito Privado, Londrina-pr, v. 3, n. 1, p.1-29, set./dez. 2008. Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2013.
[40] DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 90, 2013.
[41] Idem.
[42] GODINHO, Adriano Marteleto. Diretivas antecipadas de vontade: testamento vital, mandato duradouro e sua admissibilidade no ordenamento brasileiro. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, n. 2. Lisboa, p. 945-78, 2012.
[43] GODINHO, Adriano Marteleto. Limitações voluntárias dos direitos de personalidade no ordenamento jurídico brasileiro: em especial, os direitos à vida e à integridade física. 2014. 933 f. Tese (Doutorado) - Curso de Direito, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2014.
[44] Idem.
[45] BRASIL. Código Penal (1940). Código Penal brasileiro. Brasília: Senado, p. 27, 1940. Disponível em: . Acesso em: 10 dez. 2013.
[46] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[47] GODINHO, Adriano Marteleto. Limitações voluntárias dos direitos de personalidade no ordenamento jurídico brasileiro: em especial, os direitos à vida e à integridade física. 2014. 933 f. Tese (Doutorado) - Curso de Direito, Universidade de Lisboa, Lisboa, 2014.
[48] DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 148-9, 2013.
[49] TERMINALIDADE da Vida: Olhos que não querem mais abrir. Brasília:Correio Brasíliense, 2 fev. 2012. [artigo eletrônico]. Disponível em: . Acesso em: 12 dez. 2013.
[50] Stefano, 2007 apud DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 92, 2013.
[51] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1931, de 17 de setembro de 2009. Aprova o Código de Ética Médica. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 23, 24 set. 2009. Disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2013.
[52] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1805, de 9 de novembro de 2006. Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 169, 28 nov. 2006. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2013.
[53] EMANUEL, Ezekiel J. Cuidados Paliativo e Terminal. In: LONGO, Dan L et al (Org.). Medicina interna de Harrison. 18. ed. Porto Alegre: AMGH, Cap. 9, p. 70, 2013.
[54] GODINHO, Adriano Marteleto. Diretivas antecipadas de vontade: testamento vital, mandato duradouro e sua admissibilidade no ordenamento brasileiro. Revista do Instituto do Direito Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, n. 2. Lisboa, p. 961, 2012.
[55] KUTNER, Luis. Due Process of Euthanasia: The Living Will, A Proposal. Indiana Law Journal, Indiana, EUA, v. 44, n. 4, p. 539-54, 1969. Disponível em: . Acesso em: 16 dez. 2013.
[56] DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 98, 2013.
[57] CONSELHO DA EUROPA. Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e da Dignidade do Ser Humano face às Aplicações da Biologia e da Medicina, de 4 de Abril de 1997. Oviedo:Conselho da Europa, 1997. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[58] O artigo 9º da Convenção de Oviedo prevê que “a vontade anteriormente manifestada no tocante a uma intervenção médica por um paciente que, no momento da intervenção, não se encontre em condições de expressar a sua vontade, será tomada em conta”.
[59] PORTUGAL. Lei n. 25, de 1º de junho de 2012. Diário da República, 1ª Série, n. 136, p. 3728-30, 16 jul. 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[60] ESPANHA. Lei n. 41, de 14 de junho de 2012. Boletín Oficial Del Estado, n. 274, p. 1-12, 15 nov. 2002. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[61] Idem.
[62] ESPANHA. Decreto n. 124, de 2 de fevereiro de 2007. Boletín Oficial Del Estado, n. 40, p. 6591-3, 15 fev. 2007. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[63] Idem.
[64] PORTUGAL. Lei n. 25, de 1 de junho de 2012. Diário da República, 1ª Série, n. 136, p. 3728-30, 16 jul. 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[65] Idem, p. 3728.
[66] URUGUAI. Lei n. 18473, de 3 de abr de 2009. Diário Oficial, n. 27714, 21 abr. 2009. Disponível em: . Acesso em: 24 dez. 2013.
[67] Idem.
[68] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[69] AMARAL, Ana Cláudia Corrêa Zuin Mattos do; PONA, Éverton Willian. Autonomia da Vontade Privada e Testamento Vital: A possibilidade de inclusão no ordenamento jurídico brasileiro. Revista do Direito Privado, Londrina, v. 3, n. 1, p. 1-29, set./dez. 2008. Disponível em: . Acesso em: 3 dez. 2013.
[70] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[71] DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 146, 2013.
[72] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988. Disponível em: . Acesso em: 13 nov. 2013.
[73] BRASIL. Código Civil (2002). Código civil brasileiro e legislação correlata. 2. ed. Brasília:Senado Federal, Subsecretária de Edições Técnicas, p. 145, 2008. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2013.
[74] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1931, de 17 de setembro de 2009. Aprova o Código de Ética Médica. Brasília: D.O.U., Seção 27, p. 90, 24 set. 2009. Disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2014.
[75] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1805, de 9 de novembro de 2006. Na fase terminal de enfermidades graves e incuráveis é permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente, garantindo-lhe os cuidados necessários para aliviar os sintomas que levam ao sofrimento, na perspectiva de uma assistência integral, respeitada a vontade do paciente ou de seu representante legal. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 169, 28 nov. 2006. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2013.
[76] Idem.
[77] Idem.
[78] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1995, de 9 de agosto de 2012. Dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 269-70, 31 ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 2 jan. 2014.
[79] BRASIL. Código Civil (2002). Código civil brasileiro e legislação correlata. 2. ed. Brasília:Senado Federal, Subsecretária de Edições Técnicas, p. 157, 2008. Disponível em: . Acesso em: 15 dez. 2013.
[80] PORTUGAL. Lei n. 25, de 1º de junho de 2012. Diário da República, 1ª Série, n. 136, p. 3728-30, 16 jul. 2012.
[81] DADALTO, Luciana. Testatamento Vital. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, p. 154, 2013.
[82] PORTUGAL. Lei n. 25, de 1º de junho de 2012. Diário da República, 1ª Série, n. 136, p. 3728, 16 jul. 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[83] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Pacientes poderão registrar em prontuário a quais procedimentos querem ser submetidos no fim da vida. Brasília:[s.n.], 30 ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 4 jan. 2014.
[84] Idem.
[85] PORTUGAL. Lei n. 25, de 1º de junho de 2012. Diário da República, 1ª Série, n. 136, p. 3730, 16 jul. 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[86] GOMES, Cassia Borges. Prontuário Médico e sua importância: uma questão de organização e método. [S.l.: s.n.], [?]. [Artigo eletrônico]. Disponível em: . Acesso em: 7 jan. 2014.
[87] PORTUGAL. Lei n. 25, de 1º de junho de 2012. Diário da República, 1ª Série, n. 136, p. 3728, 16jul. 2012. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013.
[88] Idem, p. 3729.
[89] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1995, de 9 de agosto de 2012. Dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 269-70, 31 ago. 2012. Disponível em: . Acesso em: 2 jan. 2014.
[90] Idem.
[91] CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Resolução n. 1931, de 17 de setembro de 2009. Aprova o Código de Ética Médica. Brasília: D.O.U., Seção 1, p. 90, 24 set. 2009. Disponível em: . Acesso em: 18 nov. 2014.
[92] BORGES, Roxana Cardoso Brasileiro Borges. Direito de morrer de morrer dignamente: eutanásia, ortotanásia, consentimento informado, testamento vital, análise constitucional e penal e direito comparado. In: SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito: ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2001, p. 283-305.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal da Paraíba - UFPB. Servidora Pública do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NOGUEIRA, Ana Gabriela Tolentino de Melo. Validade do testamento vital: a realidade brasileira Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jan 2019, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52552/validade-do-testamento-vital-a-realidade-brasileira. Acesso em: 23 dez 2024.
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