RESUMO: O presente artigo pretende fazer uma pesquisa em relação ao tratamento dado às Agências Reguladoras pelo Direito regulatório Brasileiro e como são desempenhadas as funções das Agências em relação à fiscalização e regulação dos serviços públicos executados por empresas privadas mediante concessão ou permissão, sempre com o escopo primordial de busca pelo melhor interesse público. Para obtenção de um maior êxito, primeiramente perfilhou-se um breve histórico do direito regulatório no Brasil, passando desde o processo de desestatização até os dias atuais de modo a ter uma base de entendimento sobre como funciona o atual modelo econômico brasileiro. Posteriormente, explorou o tópico sobre direito, regulação e políticas públicas, de modo a desenvolver a narrativa sobre o assunto, explicando o que é uma agência reguladora, sua natureza jurídica e qual o seu papel na administração pública. Ainda nesse tópico, é apontada a problemática da Teoria da Captura, mostrando o que a desencadeou e qual seus reflexos na economia brasileira. Por fim, conclui-se com esta pesquisa a importância do controle das atividades de serviços públicos, tanto por parte das agências reguladoras, como por parte do Estado e do cidadão para que se tenha uma economia saudável e justa, sempre perseguindo o princípio da supremacia do interesse público.
PALAVRAS-CHAVE: Desestatização. Independência. Fiscalização. Teoria da Captura. Regulação.
1. INTRODUÇÃO
Através da nova forma econômica adotada pelo Brasil, onde o Estado resolveu aplicar a desestatização por meio da privatização, concessão e permissão de serviços públicos, mudando também a forma de oferecimento destes serviços, uma vez que ao adotar a desestatização de determinadas atividades, a administração pública foi obrigada a elaborar um novo modelo de fiscalização e regulação dessa nova forma de prestação de serviço, criando assim as Agências Reguladoras para que o Estado atenda sempre ao princípio da supremacia e prevalência do interesse público no desempenho das atividades de empresas privadas na prestação dos serviços públicos à população, além de manter uma economia saudável.
O objetivo geral deste artigo é entender o papel das Agências Reguladoras no direito regulatório brasileiro e saber quais seus impactos na fiscalização e regulação de certas atividades desenvolvidas por empresas privadas através de concessão ou permissão da administração pública. Já o objetivo específico deste artigo é identificar possíveis falhas no desempenho das atividades de regulação e fiscalização que possam comprometer a credibilidade das Agências Reguladoras frente a esse serviço tão importante para o funcionamento dos serviços públicos prestados por entidades privadas.
Como hipótese para uma possível resposta a ser obtida por esta pesquisa, adotou-se a ideia de que apesar da fiscalização e regulação desempenhadas pelas Agências Reguladoras, ainda há problemas quanto à manutenção da independência dessas agências em face da interferência privada nas decisões, provocadas por interesses de grandes grupos econômicos e que é necessário a interferência de outros meios de controle e fiscalização dessas atividades.
A justificativa para uma pesquisa científica como esta é que ela é imprescindível para o conhecimento e evolução do direito, bem como destacar o papel do Estado na função de administração pública, uma vez que busca-se a melhor aplicação do direito ao caso concreto como o escopo de atingir o interesse público, possibilitando a elaboração de novos estudos, ideias e conceitos no intuito de buscar sempre as melhores soluções para os casos que, por ventura, vierem a surgir através das transformações dos costumes e das leis que precisam acompanhar a evolução dos problemas sociais para que o Estado consiga atingir a melhor eficácia de suas atividades.
A relevância de estudos científicos como este é primordial para o desenvolvimento e aperfeiçoamento da atuação estatal pois esta pesquisa visa analisar o cumprimento das práticas adotadas pela administração pública do Estado brasileiro, evidenciando a finalidade de atender sempre à supremacia do interesse público no cumprimento de suas atividades governamentais, indagando qual a melhor forma de atuação na busca pelo melhor atendimento às necessidades de seu povo e manter um país próspero e desenvolvido.
A metodologia utilizada para a elaboração deste trabalho de artigo científico é a pesquisa bibliográfica que se caracteriza em aprofundar o contexto e a interpretação das reflexões obtidas através de leitura em livros, dados em sites governamentais e artigos científicos publicados sobre o tema. A tradição metodológica será do tipo misto (dedutivo e indutivo) pois serão analisados os dados presente em sites oficiais, como também será feita uma observação individual acerca do tema. O viés metodológico será o exploratório, sendo a pesquisa de caráter qualitativa.
2. BREVE HISTÓRICO
O Direito regulatório brasileiro emergiu após uma mudança na forma de economia adotada pelo Estado e implementado na Constituição Federal de 1988 que, posteriormente, foi materializado através do Plano Nacional de Desestatização instituído pela Lei nº 8031/90, posteriormente alterada pela Lei 9491/97. Sendo assim, o país adotou uma postura mais liberal, abrindo mão do monopólio estatal de empresas e serviços em nome de uma forma mais moderna de administração pública de países em desenvolvimento, buscando o melhoramento na prestação de serviços públicos, além de minimizar a burocracia de acordo com o princípio da eficiência.
Dessa forma, o Brasil adotou uma política de privatização, onde foram repassados determinados serviços públicos para a iniciativa privada no intuito de diminuir a participação do Estado na economia e abrir mais espaço para o capital privado investir no país. Todavia, para garantir a qualidade do serviço público prestado pela empresa privada, foram criadas as Agências Reguladoras, assim denominadas pelo legislador, que tem por escopo a fiscalização, a universalização e o melhoramento da qualidade destes serviços e de inovações tecnológicas, através de uma tarifa módica e mais justa. Nesse contexto, Marçal Justen Filho indica que são características do Estado Regulador:
Transferência para a iniciativa privada de atividades desenvolvidas pelo Estado, desde que dotadas de forte cunho de racionalidade econômica; liberalização de atividades até então monopolizadas pelo Estado a fim de propiciar a disputa pelos particulares em regime de mercado; a presença do Estado no domínio econômico privilegia a competência regulatória; a atuação regulatória do Estado se norteia não apenas para atenuar ou eliminar os defeitos do mercado, mas também para realizar certos valores de natureza política ou social; e institucionalização de mecanismos de disciplina permanente das atividades reguladas. (JUSTEN FILHO, 2009, p. 566).
Conforme depreende-se da definição supramencionada, a transferência de certos serviços públicos para a responsabilidade de empresas privadas levou à criação das Agências Reguladoras com o escopo de fiscalizar a prestação de serviços públicos por pessoas jurídicas de direito privado, bem como verificar a qualidade das atividades privadas desempenhadas.
3. DIREITO, REGULAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS
Estas Agências são entidades da Administração Pública indireta, com natureza jurídica de autarquias especiais dotadas de personalidade jurídica de direito público interno, capacidade de autoadministração, com patrimônio próprio e receita própria. Porém, não podem ter fins lucrativos e são criadas por lei para uma determinada finalidade específica. Para os doutrinadores Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo as Agências Reguladoras podem ser definidas da seguinte maneira:
[...] trata-se de entidades administrativas com alto grau de especialização técnica, integrantes da estrutura formal da Administração pública, instituída sob a forma de autarquias de regime especial, com a função de regular um setor específico de atividade econômica, ou de intervir de forma geral sobre relações jurídicas decorrentes dessas atividades, que devem atuar com a maior independência possível perante o Poder Executivo e com imparcialidade em relação às partes interessadas (Estados, setores regulados e sociedade). (ALEXANDRINO, PAULO, 2017. p. 84).
Sendo assim, o Estado brasileiro, ao criar autarquias especiais com a finalidade precípuo exclusiva de fiscalização, empreendeu a chamada descentralização, que consiste em uma nova distribuição da supervisão do serviço público, onde a Administração Direta (União, Estados, Municípios e o Distrito Federal) repassa a obrigação de fiscalizar a prestação do serviço para entidades da Administração Indireta (empresas públicas, sociedade de economia mista, autarquias e fundações), que no caso em tela são as autarquias especiais no formato de Agência Reguladora. Essa nova forma de fiscalização do serviço público está presente na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a qual foi a responsável por tratar e instituir os órgãos reguladores. Vejamos:
Art. 21. Compete à União:
[...] 60
XI - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os serviços de telecomunicações, nos termos da lei, que disporá sobre a organização dos serviços, a criação de um órgão regulador e outros aspectos institucionais; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 8, de 15/08/95:)
[...]
Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Art. 177. Constituem monopólio da União:
[...]
§ 2º A lei a que se refere o § 1º disporá sobre:
[...]
III - a estrutura e atribuições do órgão regulador do monopólio da União; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 9, de 1995).
(BRASIL, Constituição Federal, 1988, art. 21, art. 174, art. 177).
Segundo a regra trazida no texto constitucional, é possível verificar que houve a ratificação da posição de garantidor do Estado na fiscalização em relação ao serviço prestado à população através das agências reguladoras. Porém, o Estado também sub-roga-se na função de garantidor tanto para o próprio Estado, como para o cidadão, uma vez que também possui a função garantidora em relação à aplicação das normas, proporcionando aos indivíduos segurança jurídica, conforme ensina a professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
Regulação é uma atividade de franca produção normativa tipicamente desenvolvida para um modelo econômico capitalista, no qual o Estado, como agente legitimado para exercício da função legislativa e da força coercitiva, intervém no mercado produtivo mediante instrumentos de autoridade, objetivando delinear a atividade empresarial em consonância com os interesses públicos, sociais e econômicos. (DI PIETRO, 2009 , p.27).
As Agência Reguladoras foram criadas no anos 90 pelo governo federal para atuarem cada uma em um determinado ramo da economia, conforme a sua especialização. São exemplos de Agências Reguladoras: Agência Nacional de Águas – ANA, Agência Nacional de Telecomunicações – Anatel, Agência Nacional do Petróleo – ANP, a Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel, a Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, a Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ, dentre outras.
3.1 A PROBLEMÁTICA DA TEORIA DA CAPTURA
Apesar da finalidade essencial de buscar maior eficiência e menor burocracia na prestação dos serviços públicos por empresas privadas, o sistema de regulação no Brasil passa por uma crise de credibilidade em relação ao papel das Agências Reguladoras, que a melhor doutrina denomina de “Teoria da Captura” de autoria do economista estadunidense George Stigler, onde, em linhas gerais, ocorre quando a Agência Reguladora se distância de sua finalidade primordial que é o interesse público, e passa a atuar de modo a proteger os interesses das empresas privadas, seja por intimidação das grandes empresas, seja por corrupção.
Dessa forma, a teoria da captura vai de encontro ao interesse público, que enfatiza a busca pelo bem comum nas ações dos agentes estatais, não se preocupando com interesses privados dos grandes grupos econômicos. Nesse sentido, os doutrinadores Levine e Forrence explicam que:
A teoria da captura descreve os atores no processo regulatório como tendo objetivos estreitos e autointeressados – principalmente a manutenção de cargos ou a conquista da reeleição, o recebimento de gratificações advindas do exercício do poder, ou o enriquecimento pessoal após deixar o cargo. (LEVINE; FORRENCE, 1990, p. 169)
A Teoria da Captura é algo muito preocupante em relação à independência das Agências Reguladoras, posto que põe em dúvida a credibilidade de suas ações. Tendo em vista que não há um controle efetivo das Agências, como, por analogia, o sistema de freios e contrapesos realizados pela teoria dos três poderes (Executivo, Legislativo e o Judiciário) independentes e harmônicos entre si, que fiscalizam as ações uns dos outros em nome do bom equilíbrio governamental do país, evitando excessos e desvio de poder.
Tendo em vista o grande papel das Agências Reguladoras para o equilíbrio financeiro e econômico do país, bem como para a fiscalização dos serviços públicos, torna-se imprescindível a efetivação de um novo controle das atividades, tanto por parte do próprio Estado, como também por parte do cidadão através do controle da própria população no intuito de fomentar uma maior discussão por meio de audiências públicas tratando acerca do trabalho desempenhado pelas Agências Reguladoras de modo a instigar denúncias e reclamações perante as ouvidorias das próprias agências. Assim pontua Diogo Moreira Neto:
Além da especializac?a?o, flexibilidade, independe?ncia e celeridade, estas entidades se caracterizam, sobretudo, pela proximidade e abertura social de sua ac?a?o em relac?a?o aos administrados interessados, e a possibilidade de promover negociac?o?es em procedimentos participativos e, na?o menos importante, de atuar, em certos casos, com poderes ‘parajurisdicionais’ para evitar intermina?veis conflitos entre administrado e Estado. Em teoria, o princi?pio da participac?a?o tem plena aplicac?a?o em va?rios aspectos em que o instituto pode ser analisado, mas a sua importa?ncia sobressai principalmente pela criac?a?o de uma conexa?o administrativa imediata e despolitizada, a?s vezes bastante interativa, entre a age?ncia e o administrado interessado. (MOREIRA NETO, 2000, p.79).
Porém, para se chegar nesse grau de participação da população no controle, é necessário a implementação de políticas públicas voltadas ao esclarecimento da população em relação ao trabalho desempenhado pelas Agências, de modo a explicar o papel e a finalidade de cada Agência Reguladora e a sua importância na fiscalização da atividade privada, evitando o abuso de poder econômico e estipulando tarifas módicas e justas para a população.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Estado brasileiro mudou a forma de prestação de serviços públicos de determinados ramos em nome de uma economia mais saudável e de um estado menos burocrático e eficaz. Para isso, ao adotar essa nova forma econômica, que transformou o jeito como são desempenhadas determinadas atividades econômicas no país, foi realizada a desestatização através de privatização, concessão e permissão de serviços públicos. A administração pública então precisou desenvolver uma nova forma de fiscalizar e regular os serviços prestados por empresas privadas, criando um novo modelo de fiscalização e regulação para que o Estado mantenha sempre o princípio da supremacia e prevalência do interesse público no desempenho das empresas privadas, mantendo uma economia saudável.
O objetivo geral deste artigo foi entender o papel das Agências Reguladoras no direito regulatório brasileiro e compreender quais seus impactos na fiscalização e regulação de certas atividades desenvolvidas por empresas privadas através de concessão ou permissão da administração pública. Já o objetivo específico deste artigo foi identificar possíveis falhas no desempenho das atividades de regulação e fiscalização das Agências Reguladoras que possam comprometer a sua credibilidade frente a esse serviço tão importante para o funcionamento dos serviços públicos prestados por entidades privadas.
Uma possível hipótese de resposta a ser obtida por esta pesquisa, foi a ideia de que apesar da fiscalização e regulação desempenhadas pelas Agências Reguladoras, há problemas quanto à manutenção da independência dessas agências provocadas por interesses de grandes grupos econômicos e que é necessário a interferência de outros meios de fiscalização das atividades.
A metodologia utilizada para a elaboração deste trabalho de artigo científico foi a pesquisa bibliográfica que se caracteriza em aprofundar o contexto e a interpretação das reflexões obtidas através de leitura em livros, dados em sites governamentais e artigos científicos publicados sobre o tema. A tradição metodológica será do tipo misto (dedutivo e indutivo) pois serão analisados os dados presente em sites oficiais, como também será feita uma observação individual acerca do tema. O viés metodológico será o exploratório, sendo a pesquisa de caráter qualitativa.
Para atender aos objetivos desta pesquisa, inicialmente, foi abordado um breve histórico do direito regulatório no Brasil, passando desde o processo de desestatização até os dias atuais de modo a ter uma base de entendimento sobre como funciona o atual modelo econômico brasileiro. Posteriormente, explorou o tópico sobre direito, regulação e políticas públicas, de modo a desenvolver a narrativa sobre o assunto, explicando o que é uma agência reguladora, sua natureza jurídica e qual o seu papel na administração pública. Ainda nesse tópico, é apontado a problemática da Teoria da Captura, mostrando o que a desencadeou e qual seus reflexos na economia brasileira.
Esta pesquisa foi conclusiva no sentindo de que resta claro que há alguns problemas quanto à credibilidade da regulação das Agências Regulatórias, pois é necessário garantir a independência dessas autarquias de direito público no exercício de suas competências no intuito de não permitir que grandes grupos econômicos influenciem o cumprimento de suas ações, evitando assim possíveis casos de Teoria da Captura, mantendo a credibilidade e o bom funcionamento dos serviços públicos, além de preserva uma economia saudável.
Portanto, dada a grande importância do direito regulatório no Brasil advindo após a desestatização da economia brasileira, é fundamental que as Agências Reguladoras atuem de maneira independente, visando sempre a finalidade do interesse público na fiscalização dos serviços públicos desempenhados por empresas privadas para que seja mantido um serviço público de qualidade, sustentando a competitividade entre as empresas de modo que o sistema econômico do país se mantenha equilibrado e mais justo.
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Advogada formada em Direito pelo Centro Universitário UNIEURO, Especialista em Direito Civil e Direito Administrativo pela Faculdade Cidade Verde. Geógrafa formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.<br><br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARNEIRO, Luciana Vieira. O Direito Regulatório brasileiro: A problemática da (in)dependência das agências reguladoras Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 jan 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52556/o-direito-regulatorio-brasileiro-a-problematica-da-in-dependencia-das-agencias-reguladoras. Acesso em: 23 dez 2024.
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