MYLENA DEVEZAS SOUZA[1]
(Coautora)
RESUMO: O presente trabalho visa entender como os indivíduos não humanos estão colocados no cenário jurídico brasileiro e qual a repercussão desse enquadramento na perspectiva de alcance de seus direitos fundamentais. Para tanto, buscou-se entender as principais correntes vinculadas ao direito dos animais e identificar os pontos do ordenamento jurídico brasileiro que tratam do tema a partir da perspectiva abolicionista animal, detalhando os aspectos mais relevantes da bioética. Para realizar a presente pesquisa adotamos a seguinte metodologia, primeiramente, buscou-se pesquisar notícias, coletar dados e fontes legislativas. Em seguida buscamos analisar a bibliografia sobre o tema, refletindo sobre as informações coletadas.
Palavras-chave: Direito dos Animais; Dignidade Animal; Antropocentrismo
SUMÁRIO: 1. Introdução, 2. Sujeitos de Direito, 3. Aberturas legais à visão de animais não-humanos como sujeitos de Direito, 4. Argumentos contrários à elevação dos animais a categoria de sujeitos de direito, 5. Dignidade e Direitos Fundamentais, 6. Conclusão, 7. Referências
1. INTRODUÇÃO
Muito embora se tenha observado uma progressão na questão do respeito aos animais aos longos dos últimos anos, ainda hoje a forma de pensar em relações aos indivíduos não-humanos abre espaço para uma discussão acerca da sociedade humana como antropocêntrica e especista.
Essa percepção se faz presente diretamente na classificação dada no ordenamento jurídico dos animais como objetos de direito, sendo assim ficam eles a mercê dos interesses humanos até na hora da sua proteção legal.
Buscou-se nesse trabalho fazer um levantamento acerca do conceito de sujeito de direito e demonstrar como os animais podem ser incluídos nessa categoria jurídica, sendo essa transformação fundamental para que estes seres possam gozar plenamente de uma vida digna.
Para isso, realizou-se um levantamento bibliográfico acerca do tema, buscando entender as principais vertentes do direito animal, tendo sido entendido que a mais adequada a construção jurídica da solução proposta a corrente abolicionista, assim sendo foi feita uma análise de artigos científicos e na legislação temática, que culminou na reflexão abaixo exposta.
2. SUJEITOS DE DIREITO
Afim de que se possa compreender a importância da colocação dos animais não-humanos na posição de sujeitos de direito, analisar-se-á a essência desse conceito, apresentando no que ele consiste.
De acordo com os conceitos trabalhados pelo direito, as pessoas são os titulares de poder de ação nas relações jurídicas, desse modo consistem em sujeitos destas relações. Entende-se que no direito subjetivo, tem-se uma relação jurídica estabelecida entre um sujeito ativo, titular de do direito, e um sujeito passivo, ou vários sujeitos passivos, gerando uma prerrogativa para o primeiro em face destes. [2]
Ou seja, a concepção ou não de um indivíduo como sujeito de direito implica diretamente na capacidade que este tem de adquirir direitos. O entendimento geral da doutrina civilista é de que os animais não são sujeitos de direito, seguindo esse entendimento mesmo quando eles são protegidos contra atos de crueldade, eles estão sendo objetos e o homem que de fato tem seu direito tutelado.
Nas palavras de Monteiro, no que tange a legislação protetiva animal:
Nem por isso, entretanto, se tornam sujeitos de direitos. Como dizem Ruggiero-Maroi, os animais são tomados de consideração apenas para fins sociais, pela necessidade de se elevar o sentimento humano, evitando-se o espetáculo degradante de perversa brutalidade. Nem se pode dizer igualmente que os animais tenham semidireitos ou sejam semipessoas, como quer Paul Janet.[3]
Estão evidentes os traços antropocêntricos que marcam esta teoria civilista e, muito embora essa ideia represente o senso comum dos juristas, resta patente que ela não condiz com a realidade.
Atendo-se as palavras de Oliveira:
Vejamos. Se uma pessoa (humana) envenena o cão de outra, quem é a vítima? O cachorro, como se poderia supor, já que foi ele quem perdeu a vida? Não. Ele não tem direito à (própria) vida. A vítima é o dono, porque ele tem direito sobre a (vida da) coisa, sua propriedade. Se traficantes ilegais de aves silvestres aprisionam, matam, mutilam, inúmeros pássaros, em um comércio que movimenta milhões, quem são as vítimas? Não são as aves, vez que não possuem direito à liberdade, à integridade física e à vida. É a sociedade (humana), o Estado. Não é direito individual (de cada um destes seres), é direito (humano) difuso. [4]
Ainda no que tange aos sujeitos de direito e suas relações jurídicas é fundamental também se esclarecer que nem todos os sujeitos de direito são pessoas, entendimento esse já há muito tempo pacificado e inclusive veiculado no sistema legislativo nacional.
De acordo com Coelho:
Sujeito de direito é o centro de imputações de direitos e obrigações referido em normas jurídicas com a finalidade de orientar a superação de conflitos de interesse que envolvem, direta ou indiretamente, homens e mulheres. Nem todo sujeito de direito é pessoa e nem todas as pessoas, para o direito, são seres humanos. [5]
Desse modo, mesmo que toda pessoa natural seja sujeito de direito, nem todo sujeito de direito é pessoa. Coelho utiliza dois critérios para classificação dos sujeitos de direito: “o primeiro divide-os em personificados e despersonificados, pois os sujeitos podem ser pessoas ou não. O segundo distingue entre os sujeitos humanos e não-humanos.”[6]
Ainda utilizando as palavras do supracitado jurista:
(...) mesmo os sujeitos de direto despersonalizados são titulares de direitos e deveres. O atributo da personalização não é condição para possuir direitos ou ser obrigado a qualquer prestação. Recupere-se o conceito de sujeito de direito – centro de imputação de direitos e obrigações referidos pelas normas jurídicas. Todos os sujeitos nele se enquadram, de modo que também os despersonificados são aptos a titularizar direitos e deveres.[7]
Já, em relação ao conceito de pessoa cabe a menção de que, no ordenamento jurídico brasileiro, há dois tipos de pessoas: naturais e jurídicas. Aquelas, também chamadas de pessoas físicas, são os seres humanos. Já as jurídicas são entes formados pelo agrupamento de homens para determinados fins, como é o caso das associações, sociedades e fundações, por exemplo.
Neste diapasão, no que tange as pessoas jurídicas, Rodrigues salienta: “A personalização desses grupos é a construção metodológica designada a possibilitar e favorecer as atividades individuais ou coletivas”[8].
Seguindo esse entendimento, a noção de sujeito de direito trazida pela teoria moderna abre espaço para o desmoronamento das categorias clássicas, tendo a própria dogmática jurídica admitindo a construção de personalidades jurídicas artificiais.
Há que se ressaltar nesse ponto que ser sujeito de direito não indica que as pessoas sejam dotadas de capacidade jurídica. Em determinados casos, há que se evocar outros institutos jurídicos, para que funcionem como ferramentas onde serão expressados os direitos e obrigações desse titular. Nesse sentido, o legislador brasileiro optou pela representação, para sanar essa incapacidade em juízo ou perante terceiros.
Essa opção é veiculada no art. 120 do Código Civil, leia-se:
Art. 120. Os requisitos e os efeitos da representação legal são os estabelecidos nas normas respectivas; os da representação voluntária são os da Parte Especial deste Código.[9]
A representação, nas palavras de Gonçalves:
(...) tem o significado, pois, de atuação jurídica em nome de outrem. Constitui verdadeira legitimação para agir por conta de outrem, que nasce da lei ou do contrato. A representação legal é exercida sempre no interesse do representado, enquanto a convencional pode realiza-se no interesse do próprio representante, como sucede, por exemplo, na procuração em causa própria.
Portanto, mesmo que determinadas pessoas físicas sejam vistas como incapazes, isso não tira delas a titularidade de direitos. O mesmo entendimento pode ser estendido aos animais, que embora sejam incapazes, devem ser considerados como sujeitos de direito, haja vista que podem ser representados e ter seus direitos defendidos pelos órgãos competentes.
Vale aqui ressaltar o enfoque trazido por Dias:
O animal como sujeito de direitos já é concebido por grande parte de doutrinadores jurídicos de todo o mundo. Um os argumentos mais comuns para a defesa desta concepção é o de que, assim como as pessoas jurídicas ou morais possuem direitos de personalidade reconhecidos desde o momento em que registram seus atos constitutivos em órgão competente, e podem comparecer em Juízo para pleitear esses direitos, também os animais tornam-se sujeitos de direitos subjetivos por força das leis que os protegem. Embora não tenham capacidade de comparecer em Juízo para pleiteá-los, o Poder Público e a coletividade receberam a incumbência constitucional de sua proteção..[10]
Ademais, é imprescindível mencionar que o conceito de pessoa: “é uma obra de personificação que exclusivamente a ordem jurídica pode perpetrar. Tanto as pessoas jurídicas quanto as pessoas naturais são construções do Direito.”[11] Neste sentido, “ser sujeito e direito ou pessoa é ser um ‘ser’ ou ‘ente’ considerado fim dele próprio pelo ordenamento jurídico”[12].
Em contexto correlato, Wilson Madeira Filho explora a própria literalidade da classificação dos animais enquanto coisas, reclamando por um “direito das coisas”:
Examinemos bem esse termo: “Direito das Coisas”. No que concerne aos preceitos normativos, esse diz respeito a uma subdivisão do Direito Civil em seu aspecto patrimonial; trata-se do direito da pessoa frente às coisas, entendidas essas como bens. Todavia, se fôssemos interpretar a o pé da letra o termo, as coisas se veriam como sujeitos de direitos, no sentido de que, afinal, os “Direitos...” são “das coisas”. Estaríamos, então, próximos à idéia do chamado Direito Natural, onde um cachorro, uma lombriga ou um homem teriam todos, indiferentemente, direito à vida; onde o direito sobrepaira, inalienável e soberano, sobre tudo e todos.[13]
Após finalizar essas considerações básicas acerca dos sujeitos de direito e do instituto da representação, cabe demonstrar quais são os ditames legais que abrem portas ao início de uma transformação em seu status quo.
3. ABERTURAS LEGAIS À VISÃO DOS ANIMAIS COMO SUJEITOS DE DIREITO
Como já mencionado, os animais ainda não são reconhecidos como sujeitos de direito no ordenamento jurídico pátrio, o que se tem é uma construção jurídica diferenciada que os torna (não em sua totalidade, como explicado anteriormente, devido as diversas classificações que são enquadrados cada grupo de espécies na legislação) bens difusos, tendo de certa forma a si garantidos também direitos difusos.
Nas palavras de Ackel: “já se pode afirmar que a norma atribui aos animais uma espécie de personificação, que os torna sujeitos de direitos os quais podem gozar e obter a tutela jurisdicional em caso de violação”[14].
Essa posição legal vanguardista foi dada pelo §3º do art. 2º do Decreto 24.645, de 1934.
Art. 2º Aquele que, em lugar público ou privado, aplicar ou fizer aplicar maus tratos aos animais, incorrerá em multa de 20$000 a 500$000 e na pena de prisão celular de 2 a 15 dias, quer o delinquêntes seja ou não o respectivo proprietário, sem prejuízo da ação civil que possa caber.
(...)
§ 3º Os animais serão assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, seus substitutos legais e pelos membros das sociedades protetoras de animais.[15]
Como se pode constatar após a leitura do referido parágrafo, é estabelecido que o Ministério Público deve agir como representante dos animais na custodia de seus interesses. Com isso, nas palavras de Rodrigues:
Ao considerar que o Ministério Público possui legitimidade para substituir as partes para as quais atua em nome próprio, na qualidade de autor ou réu, de pessoas físicas ou jurídicas a quem são atribuídas personalizações, o legislador, mediante o Decreto 24.645, não só conferiu nova função relevantíssima ao Ministério Público, mas também reconheceu que os Animais não são meramente “coisas” como se abstrai do Código Civil.[16]
Ocorre que o sistema jurídico é representativo da sociedade, sendo assim, muito embora sejam criados no ordenamento mecanismos que começam a viabilizar a mudança do papel dos animais não-humanos na sociedade, essa transformação só irá ocorrer mediante uma percepção de uma nova perspectiva axiológica pelos próprios seres humanos.
Ou seja, a maior barreira enfrentada para que seja realizada essa reinterpretação da natureza jurídica dos animais é a própria concepção antropológica acerca do papel dos indivíduos não-humanos. Para melhor compreensão desse posicionamento passar-se-á a demonstrar as principais razões apontadas pela doutrina e pela sociedade em geral para desconsiderações os animais como detentores de direitos. Buscar-se-á, com isso, identificar onde estão as incoerências nessas argumentações.
4. ARGUMENTOS CONTRÁRIOS À ELEVAÇÃO DE ANIMAIS NÃO-HUMANOS À CATEGORIA DE SUJEITOS DE DIREITO
Oliveira apresenta uma série de argumentos que costumam ser utilizados pelos juristas para distanciar os animais do rol dos detentores de direitos[17]. O primeiro argumento trabalhado é o que consiste em que para que um determinado ser seja sujeito de direito ele também deverá ter capacidade para possuir dever. Sendo os animais incapazes de se sujeitarem a deveres, também serão de ter direitos.
Não é preciso divagar muito na seara jurídica para se contrapor esse argumento, visto que nem mesmo para os seres humanos essa relação direitos e deveres é tão direta. Um bebê, uma pessoa incapaz, ou em coma, por exemplo, não tem quaisquer deveres, contudo goza de uma infinidade de direitos.
Nas próprias palavras de Oliveira: “O fato de animais não terem compreensão ou consciência de deveres, conforme normalmente se diz, não obsta que sejam titulares de direitos. Como se costuma assinalar, não serem agentes morais não implica que não sejam pacientes morais”[18].
Ainda sobre esse ponto, cabe ressaltar que não há comprovação pacífica de que os animais não têm qualquer consciência de dever. Pelo contrário, existem inúmeros indícios de que diversas espécies possuem um alto grau de compreensão de obrigação tanto no que tange a sua própria espécie quanto no que diz respeito às demais (como é o caso, por exemplo, dos cachorros que protegem seus donos e são até mesmo treinados para guiar pessoas com deficiência visual). [19]
O segundo argumento, também elencado pelos opositores aos direitos animais, é que só tem direitos aqueles que podem reivindica-los. Existem aqui dois aspectos que precisam ser apontados. O primeiro concerne à capacidade moral de requerer seus direitos, ou seja, ao se deparar com uma situação em que precisa se manifestar para reclamar um direito o animal poderá ou não o fazer? Não resta dúvida que ele poderá e normalmente o faz.
Quando um animal está sendo maltratado ele se defende, ao sentir sede ou fome ele emite sons e consegue explicitar que algo está errado na situação, embora não tenha meios de se comunicar expressamente pela fala.
No que diz respeito à capacidade jurídica, por óbvio o animal não tem capacidade de requerer judicialmente seus direitos, bem como não o faz as pessoas humanas relativa ou completamente incapazes.
O terceiro argumento é que a titularidade de direitos depende da racionalidade, sendo que os animais irracionais ficam a margem dessa classificação. Sobre esse ponto também há, segundo Oliveira, que se considerar dois argumentos: o primeiro deles, é que o conceito de racionalidade é muito difuso, sendo os próprios homens, serem teoricamente racionais, capazes de cometer atos atrozes. Ademais, existem diversos tipos de racionalidade, muitas delas dentre as quais os animais podem ser incluídos. A racionalidade emocional é um exemplo delas, é fácil perceber que um animal apresenta reações emocionais que se encaixam racionalmente na situação em que estão vivenciando.
Além disso, é certo mencionar que existem diversos seres humanos que, por algum tipo de deficiência ou até mesmo pela sua pouca idade, tem sua racionalidade total ou parcialmente afetada e nem por isso são desconsiderados como sujeitos de direito, pelo contrário, esses indivíduos gozam de ainda mais subterfúgios para preservação de integridade.
O quarto argumento trabalhado é a questão da comunicação. Para alguns há o entendimento de que os animais não são detentores de direitos, pois eles não têm uma linguagem, não falam.
Resta patente que muitas espécies de animais possuem um desenvolvido sistema de comunicação e linguagem, inclusive alguns deles compreendidos pelos seres humanos (não são raros os casos de pessoas que tem convivem com animais se dizerem compreendidas por eles e serem capazes de perceber suas emoções e necessidades através de um meio próprio de comunicação).
O quinto argumento trazido é que os animais não são sujeitos de direito por não serem autoconscientes de suas vidas, de sua própria individualidade. Nesse ponto, para elucidar mais fielmente a questão cabe trazer expressamente a citação de Oliveira: “Ora, não saber de antemão que se vai morrer não implica que não se tenha direito à vida. Ao risco da morte é normal se agarrar a vida. Vale para o animal humano e não-humano, o que significa que ambos prezam as suas vidas, não querem perdê-la”[20].
Como sexto argumento, os opositores mencionam o fato de que se os animais possuíssem direitos seria impossibilitado ao homem mata-los, mesmo quando se tratasse de um animal transmissor de doenças, venenoso ou de alguma forma perigoso.
Esse argumento também encontra falhas, tendo em vista que ao ser permitido a um homem matar ou agredir outro humano em casos de legítima defesa o mesmo se faria em relação aos animais. E, nos casos onde a doença ou infortúnio advindo do animal não seja letal, cabe ainda se avaliar a liberdade humana em contraposição ao direito do animal, sendo importante ressaltar que isso não pode se tornar um salvo conduto para justificar qualquer atitude.
De acordo com Oliveira, mesmo que esses pontos não sejam irrelevantes para à ética animal, existem inúmeros outras situações menos extravagantes e polêmicas, que devem ser enfrentadas anteriormente, como é o caso da caça esportiva, do vestuário de pele, da experimentação científica usando animais e do consumo da carne.
Ainda nesse ponto cabe mencionar que tanto no que tange a legítima defesa quanto ao estado de necessidade, mesmo havendo a legitimidade de outrem tirar a vida de alguém ainda assim isso não significa que este não tem direito a vida.
Outro ponto que também é comumente suscitado quando se vem contrapor a defesa dos direitos dos animais é a questão de que ao defender os animais também se abre precedente para defesa de que os demais seres vivos sejam intitulados como sujeitos de direito.
Logo, ao defender os direitos dos animais indica-se que o próximo passo é defender o direito das plantas. Como já mencionado anteriormente, a Ecologia Profunda visa defender os direitos de todos os seres e ecossistemas, para tanto busca a preservação de um meio equilibrado onde sejam mantidas as condições necessárias e que sejam feitas artificialmente as menores mudanças possíveis.
Contudo, mesmo que os interesses de toda teia terrestre sejam defendidos é também óbvio que cada ser deve ter seus direitos defendidos de acordo com sua natureza, defender os interesses de todos não significar equipará-los, mas sim identificar o que faz sentido ser garantido para cada um de acordo com sua espécie.
Por último, outro ponto que costuma também ser levantado é a questão dos animais não serem capazes de compreender/usufruir de alguns direitos salvaguardados aos seres humanos, como o direito a educação, direito eleitoral e direito a sindicalização.
Resta evidente que os animais não serão titulares desses direitos, mas sim de garantias que se enquadrem a sua condição natural, de acordo com o que condiz com as características de sua espécie.
Nas palavras de Oliveira, corroboradas com o entendimento de Norberto Bobbio:
Os dois direitos fundamentais que seriam absolutos, segundo Norberto Bobbio, os animais não-humanos possuem: direito a não ser torturado e direito a não ser escravizado. E outros para além daqueles já citados, como o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, direito à vida sexual/reprodução, direito à saúde.[21]
Ou seja, pelas palavras de Bobbio pode-se verificar que a eles deverão ser resguardados os direitos que lhe cabem, em conformidade com suas necessidades específicas, para que possam usufruiu de suas vidas com plenitude e dignidade.
5. DIGNIDADE E DIREITOS FUNDAMENTAIS
Conforme se verificou ao longo desse estudo, a legislação construída acerca dos direitos dos animais no Brasil ainda é bastante incipiente, além disso, seus traços são fortemente marcados por uma visão bem-estarista animal.
Esse fato faz com que haja necessidade de se clamar por direitos fora da legislação, para que assim sejam atendidos os interesses dos indivíduos não-humanos[22]. Busca-se, portanto, com apoio nas construções doutrinárias e filosóficas demonstrar a legitimidade de tais interesses.
Objetivando elucidar as razões que tornam os animais indivíduos plenamente dotados de direitos fundamentais, far-se-á uma breve compilação constitucional acerca dos direitos fundamentais, focando o estudo no princípio da dignidade da pessoa humana, tendo em vista que este é o basilar de todos os direitos.
Nas palavras de Luis Roberto Barroso:
Como um valor fundamental que é também um princípio constitucional, a dignidade humana funciona tanto como justificação moral quanto como fundamento jurídico-normativo dos direitos fundamentais.
(...)
A dignidade humana é parte do núcleo essencial dos direitos fundamentais, como a igualdade, a liberdade ou o direto ao voto (o qual, a propósito não está expresso no texto na Constituição dos Estados Unidos). Sendo assim, ela vai necessariamente informar a interpretação de tais direitos constitucionais, ajudando a definir o seu sentido nos casos concretos. [23]
O conceito de dignidade possui seu núcleo vinculado à ideia de respeito aos seres que dela são dotados. Um indivíduo que merece dignidade deve ter seus direitos fundamentais, sua vida e sua liberdade resguardadas. Sem essa concepção é enfraquecida a ideia de preservação de direitos.
Corroborando essa visão Ingo Sarlet conceitua a dignidade da pessoa humana como:
(...) a qualidade intrínseca reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do estado e da comunidade, implicando, nesse sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos demais seres que integram a rede da vida.[24]
Ambos os autores admitem a existência de dignidade para além da vida humana, embora compactuem do entendimento que há uma diferença entre os conceitos de dignidade da vida humana e das demais formas de vida.
Segundo Sarlet:
[s]e com isso se está a admitir uma dignidade da vida para além da humana, tal reconhecimento não necessariamente conflita (...) com a noção de dignidade própria e diferenciada – não necessariamente superior e muito menos excludente de outras dignidades – da pessoa humana, que, à evidência, somente e necessariamente é da pessoa humana.[25]
Já, nas palavras de Barroso: “[h]á uma percepção crescente (...) de que a posição especial da humanidade não autoriza arrogância e in- diferença frente à natureza em geral, incluindo os animais não- racionais, que têm seu próprio tipo de dignidade”[26].
Essa necessidade de diferenciação que ambos os autores vêm nas espécies de dignidade se baseia na percepção que ambos têm de que a dignidade está intimamente vinculada a autonomia da vontade, o que para Sarlet decorre da racionalidade e para Barroso da inteligência, sensibilidade e capacidade de se comunicar[27].
Essa concepção acaba sendo frágil, tendo em vista que ela alcança somente os seres humanos de maneira global, tendo em vista a existência de muitos homens que tem sua capacidade de racionalidade, inteligência e comunicação afetadas devido a inúmeras doenças e condições neuropsicológicas.
Nesse mesmo sentido, existem muitos animais que possuem capacidade de raciocínio, inteligência e comunicação superior a alguns seres humanos deficientes, bem como a bebês recém-nascidos, sendo assim seriam eles passíveis de adequação no conceito de dignidade humana.
Percebe-se, portanto, que de fato a única justificativa para não enquadrar os animais como detentores de dignidade da mesma forma que os humanos é o especismo. A visão de que os homens possuem um status superior simplesmente por serem homo sapiens. E, como já se defendeu ao longo de todo esse trabalho, esse argumento representativo do preconceito não justifica a subjugação animal.
Nas palavras de Oliveira:
O fato de não pertencerem à espécie humana em nada prejudica as suas condições de sujeitos de direitos. Seres vivos que são, possuem direito à (própria) vida; sendo corpóreos, têm direito à integridade física. Possuem direito à liberdade, a não serem incomodados, a não serem violentados. Têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, a uma vida gregária se for da sua natureza. Enfim, para não alongar as ilustrações, têm direito a procurar a boa vida consonante a sua especificidade.[28]
Para resolver esse impasse doutrinário acerca das diferentes formas de dignidade e das proposições que as baseiam evocar-se-á o conceito do valor inerente trazido por Tom Regan.
De acordo com o filósofo, cada indivíduo tem um valor próprio que independe de suas qualidades, características ou méritos, esse valor é por ele chamado de valor inerente e nele devem se basear a origem de todos os direitos. Essa definição vai além da utilidade de cada indivíduo fazendo ter direitos simplesmente por ser, existir.
Como Freire menciona:
De início, Regan concentra sua argumentação tendo em mente apenas os agentes morais, no entanto, o filósofo assevera que restringir o valor inerente apenas aos agentes morais seria arbitrário. Alguns dos danos causados a pacientes morais são do mesmo tipo que os danos causados a agentes morais, não se pode dizer que agentes e pacientes morais nunca podem sofrer danos de formas relevantemente similares. Portanto, proteger somente os primeiros de danos que podem suceder aos dois é tratar casos iguais de maneira diversa.[29]
Para Regan[30] definir se um indivíduo possui valor inerente ele usa como critério o fato de serem ou não sujeitos-de-uma-vida, sendo esse: “aquele ser que está no mundo, que é consciente do mundo, para quem o que lhe acontece é importante para ele, independentemente da consideração de outros indivíduos”.[31]
Desse modo, fica claro que a visão de Regan busca fazer uma aproximação entre os animais e os seres humanos, demonstrando que esses por serem dotados de vida e terem um complexo sistema emocional e social não podem ser excluídos do rol de detentores de direitos fundamentais.
Aos animais devem ser garantidos os direitos a vida, à liberdade e a dignidade, bem como a saúde e a um meio ambiente equilibrado. Os direitos a eles estendidos só devem cessar no limite de suas características individuais, não cabendo, por óbvio, oferecer-lhes direito à voto ou à educação, mas sendo indispensável que se preserve as condições para que eles possam viver com dignidade de acordo com suas especificidades.
Ao falar em direitos dos animais é indispensável se ter em mente o conceito de igualdade, onde se percebe que tratar de maneira igual é oferecer a cada um o que lhe é necessário de acordo com suas próprias necessidades, tratando os iguais como iguais e os desiguais como desiguais, mas mantendo o respeito por todas as formas de vida.
O ponto nodal está fielmente expresso nos dizeres de Regan:
O respeito é o tema principal, porque tratar um ao outro com respeito é exatamente tratar um ao outro de modo a respeitar os nossos direitos. Nosso direito mais fundamental, então, o direito que unifica todos os nossos outros direitos, é o nosso direito de sermos tratados com respeito. [32]
Existe, pois, diversas formas de se entender, tratar e relacionar com os animais. Cada ser, seja humano ou não, preserva suas próprias características e vivencia experiências únicas. Porém, é imprescindível se valorar todos os indivíduos, dando a todos o respeito que lhes é merecido.
O campo do Direito dos Animais vem aos poucos ganhando maior repercussão dentro da seara jurídica, são vistos mais debates acerca do tema e percebe-se uma expressiva melhoria no que concerne ao conteúdo das discussões trabalhadas.
Contudo, resta demonstrado que o tema está bem aquém de receber a valorização que merece. Isso se dá basicamente pela dificuldade que se encontra na própria sociedade de se reinterpretar as relações interespécies, desenvolvendo uma convivência mais harmônica, equilibrada e menos exploratória.
A ruptura com o pensamento tradicional de que os animais, bem como os demais componentes da Terra, foram aqui colocados para servir ao homem é imprescindível, contudo ela perpassa por uma reconfiguração de hábitos já há milênios enraizados.
Os animais acabam sendo ainda mais torturados, maltratados e negligenciados pelo simples fato de serem visto todos os dias como produtos e subprodutos de uma indústria que movimenta grande parte da riqueza do país. Agrega-se a essa visão os padrões de consumo desenfreados cada vez mais valorizados pela sociedade e acaba-se dramatizando a situação, posto que além de vidas serem descartadas como meros objetos de lucro, o desperdício acaba sendo enorme.
Como restou demonstrado, os animais têm faculdade de usufruírem de direitos fundamentais e principalmente de terem todos os seus direitos preservados pelo homem, gerando neles a obrigação de não agir em desconformidades com esses.
Conclui-se, também, após toda pesquisa e desenvolvimento do trabalho, que apesar de haver ainda um longo caminho a ser percorrido já começa a se perceber uma mudança na sociedade no que tange ao papel que eles veem desempenhar os animais.
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[2] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, volume 1: Parte Geral. 8ª edição. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 97
[3] MONTEIRO, Washington de Barros. apud. GONÇALVES. op. cit. p. 98
[4] OLIVEIRA. Fábio Côrrea Souza de. Direitos humanos e direitos não-humanos. Direito Público e Evolução Social, 3ª Série. Organizado por: Nilton César Flores e Renata Braga Klevenhusen. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p.66. Disponível em: < http://portal.estacio.br/media/4024361/livro%20eletronico%20-%20direito%20publico%20e%20evolu%C3%A7%C3%A3o%20social.pdf> Acesso em: 17 de novembro de 2013.
[5] COELHO, Fábio Ulhoa. apud. RODRIGUES, Danielle Tetü. op. cit. p. 185
[6] LOURENÇO. op. cit. p. 499
[7] COELHO. apud. LOURENÇO. op. cit. p, 499-500
[8] RODRIGUES. op. cit. p. 186
[9] BRASIL. Lei 10.406/02, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil
[10] DIAS, Edna. apud. RODRIGUES. op. cit. 187
[11] RODRIGUES. op. cit. 188
[12] Idem. p. 189
[13] MADEIRA FILHO, Wilson. Do direito das coisas. In: Revista Consulex, ano III, Volume I, n. 27. Brasília: Consulex, 31 de março de 1999, p. 31.
[14] ACKEL FILHO, Diomar. apud. RODRIGUES. op. cit. p. 124
[15] BRASIL. Decreto 24.645, de 10 de julho de 1934. Estabelece medidas de proteção aos animais. Diário Oficial da União. Rio de Janeiro, 10 de julho de 1934. Disponível em: < http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.action?id=39567 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L7889.htm> Acesso em: 5 jul.2013
[16] RODRIGUES. op. cit. p. 125
[17] OLIVEIRA. Direitos humanos e direitos não-humanos. op. cit. p.72
[18] OLIVEIRA. Direitos humanos e direitos não-humanos. op. cit. p.73
[19] Idem. loc. cit.
[20] OLIVEIRA. Direitos humanos e direitos não-humanos. op. cit. p. 79
[21] Idem. p. 87
[22] OLIVEIRA. Direitos humanos e direitos não-humanos. op. cit. p. 108
[23] BARROSO, Luís Roberto. A dignidade da pessoa humana no direito constitucional contemporâneo a construção de um conceito jurídico à luz da jurisprudência mundial. Tradução: Humberto Laport de Mello. 2. Reimpr. Belo Horizonte: Fórum, 2013.
[24] SARLET apud FREIRE, Pedro Henrique de Souza Gomes. Dignidade Humana e Dignidade Animal. Revista Brasileira de Direito dos Animais. Ano 7 (2012). Volume 11. p. 61. Disponível em: <http://www.portalseer.ufba.br/index.php/RBDA/article/viewFile/8416/6030> Acesso em: 17 de novembro de 2013.
[25] SARLET apud FREIRE op. cit. p. 65
[26] BARROSO apud FREIRE loc. cit.
[27] FREIRE. loc. cit.
[28] OLIVEIRA. Direitos humanos e direitos não-humanos. op. cit. p. 108
[29] FREIRE. op. cit. p. 72
[30] REGAN apud FREIRE. op. cit. p. 72
[31] Idem loc. cit.
[32] REGAN apud RODRIGUES op. cit. p. 206
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Direito da Universidade Federal Fluminense. Bacharel em Direito pela Universidade Federal Fluminense.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAVES, Luiza Alves. Animais não-humanos como sujeitos de direito: uma transformação fundamental à obtenção da dignidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jan 2019, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52575/animais-nao-humanos-como-sujeitos-de-direito-uma-transformacao-fundamental-a-obtencao-da-dignidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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