RESUMO: O artigo tem como objetivo tratar sobre o erro médico e ação de indenização, discorrendo sobre os legitimados para propor a ação, bem como a quem cabe o ônus da prova. Por fim, trata sobre os tipos de indenização e o seguro médico. O trabalho fundou-se em técnicas de pesquisa documental e bibliográfica, utilizando-se de diversos recursos, como: livros, revistas especializadas, legislação e jurisprudência e artigos publicados na internet, sendo utilizada a abordagem qualitativa nas quais os dados serão lidos, analisados, interpretados e descritos. O método principal a ser utilizado foi o dedutivo, pois parte de princípios e teorias gerais para se chegar ao resultado pretendido e como auxiliar o histórico e o comparativo. Já o método qualitativo foi usado, pois foram lidos diversos livros, revistas, jurisprudências e códigos e todos eles serão analisados, testados e transcritos numa hermenêutica jurídica.
Palavras-chave: responsabilidade civil, erro médico, ação, indenização, legitimados, ônus, prova, inversão, seguro.
Summary: The article aims to deal with medical error and indemnity action, discussing those legitimated to propose the action, as well as who is responsible for the burden of proof. Finally, it deals with the types of indemnity and the medical insurance. The work was based on documentary and bibliographical research techniques, using a variety of resources, such as: books, specialized journals, legislation and jurisprudence and articles published on the internet, using the qualitative approach in which the data will be read, analyzed, interpreted and described. The main method to be used was deductive, since it is based on principles and general theories to arrive at the desired result and as an aid to historical and comparative. The qualitative method was used, since several books, journals, jurisprudence and codes were read and all of them will be analyzed, tested and transcribed in a legal hermeneutics
Key words: civil liability, medical error, action, indemnification, legitimacy, liens, proof, inversion, insurance.
SUMÁRIO: 1.INTRODUÇÃO. 2.AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. 2.1 LEGITIMADOS E ÔNUS DA PROVA. 2.2 RESPONSÁVEIS PELO PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO.
2.3 REPARAÇÃO POR DANO ESTÉRICO E PELA REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. 3.SEGURO MÉDICO. 4. CONCLUSÃO. 5.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo dispõe sobre a ação de indenização decorrente do erro médico versando sobre quem são as partes legítimas e a quem pertence o ônus de provar o evento danoso. Indaga também quem são os responsáveis pelo pagamento da indenização, discorrendo, ainda sobre a reparação nos casos de dano estético e diminuição da capacidade laborativa.
2 AÇÃO DE INDENIZAÇÃO
2.1 Legitimados e Ônus da Prova
Na ação de indenização devido a um erro médico, o principal legitimado para propositura da ação é a vítima do evento danoso, ou seja, o paciente que teve sua integridade física ou moral violada devido à conduta culposa do profissional da saúde, sendo esse capaz de propor a ação. No caso de ser menor de idade ou incapaz, deverá ser assistido ou representado por seus pais, curador ou tutor responsável. Caso a vítima faça a opção de não ajuizar a demanda, ninguém mais poderá ajuizar por ela, mesmo que venha a falecer posteriormente à renúncia, pois se trata de uma ação na qual só pode impetrar o lesado imediato pelo dano. Importante ressaltar que, caso a vítima venha a falecer durante o procedimento médico, poderá ser impetrada a ação por um dos legitimados do art. 110 do CPC, quais sejam, cônjuge, ascendente, descendente ou irmão, já que o óbito da vítima durante o procedimento impediu que a mesma tomasse qualquer providência quanto ao ajuizamento da ação. Vindo a falecer a vítima após a ação ter tido início, o espólio será a parte legítima a proceder com a ação e receber a indenização caso tenha sido deferida já que se trata de natureza patrimonial e a mesma transfere-se aos sucessores. Sobre essa legitimidade, faz-se mister destacar o que afirma Nehemias Domingos Melo (2008, p. 160):
Se a própria vítima ingressar com ação de ressarcimento por danos morais em face de sequelas causadas por erro médico, ninguém mais poderá demandar o mesmo médico sob o mesmo pretexto. Seria insustentável para o lesante que, a todo tempo, estivesse sujeito a novas ações visando à indenização pelo mesmo fato que já debateu com a vítima.
Com relação à legitimidade passiva, será legítimo o profissional que tiver dado causa ao dano, assim como aqueles que estiverem obrigados por lei ou contrato a recompor o prejuízo tanto da vítima como dos que são legitimados para intentar com a ação. Existe uma espécie de escala quanto àqueles que devem ser legitimados passivos na ação de indenização: em primeiro lugar, está o médico que cometeu o erro, seguido dele está o estabelecimento hospitalar que responderá pelos danos causados por erro de médicos que são seus funcionários, havendo ainda a possibilidade de legitimar as empresas responsáveis por explorar os planos de saúde e que funcionam na condição de fornecedoras de serviços. Fazendo uma interpretação do art. 7º, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, conclui-se que não só os médicos, mas também os hospitais devem responder pelos danos que decorrem de erro na prestação de seus serviços, haja vista que há interesse econômico nas duas partes.
Antes de analisar a incumbência do ônus da prova, Suzana Lisbôa Lumertz (1997, p. 32) adverte que ao médico, na condição de profissional liberal, a responsabilidade civil será apurada mediante verificação de culpa de acordo com o art. 14, §4º do CDC. Porém, esse mesmo artigo no seu caput afirma, caso se trate de serviços médicos prestados por um hospital, sendo este fornecedor de serviços, a responsabilidade não irá depender de existência de culpa. Conclui-se, então, que se um médico trabalhar em um hospital responderá desde que comprovada sua culpa, enquanto a responsabilidade do hospital será objetiva, ou seja, sem ser necessária a verificação de culpa.
O art. 373 do CPC afirma que quando se tratar de fato constitutivo de direito o ônus da prova cabe ao autor da ação, a vítima do evento danoso, mas tratando-se de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor o ônus da prova passa a ser do réu, ou seja, o médico e/ou os responsáveis solidários. A prova, numa ação de indenização, ou em qualquer outro tipo de ação, configura-se como o meio para demonstrar a veracidade de uma informação de forma que convença os julgadores que o direito posto em apreciação tem fundamento. As provas podem ser diretas, ou seja, fornecem ao magistrado os elementos para o convencimento da ocorrência, como por exemplo, o depoimento pessoal, a confissão, os documentos, as testemunhas, a perícia e a inspeção judicial. Podem ser ainda indiretas, que são feitas através de indícios e presunções para a formação do livre convencimento motivado do juiz. Em relação ao lado técnico podem aparecer algumas dúvidas devido ao corporativismo da classe médica. É evidente que numa ação judicial de erro médico o laudo é de extrema importância já que se trata o magistrado de um leigo sobre o assunto, confiando naquilo que consta na perícia. Porém, deve a prova ser recebida com cautela devido à solidariedade profissional que vem a ser a tendência de alguns peritos que acreditam ter que isentar o colega pelo ato incriminado, pois compartilham os dois da mesma profissão.
O Código de Defesa do Consumidor traz uma das maiores inovações quanto ao ônus da prova e um importante instrumente de facilitação da defesa do consumidor em juízo que é a inversão do ônus probante. Essa inversão decorre das diversas situações em que fica extremamente difícil o consumidor fazer a prova do seu direito já que é um leigo no assunto ou porque os elementos da prova encontram-se nas mãos do fornecedor que nesse caso é o médico ou o hospital responsável, sendo eles os que têm melhores condições de produzi-la. Como a responsabilidade do fornecedor de serviço é objetiva, todas as vezes que o mesmo figurar no polo passivo e for referente a falhas na prestação dos serviços do hospital, clínica ou similares, será imposta a inversão do ônus da prova decorrente da própria lei, ou seja, não precisa ser provocada por nenhuma condição ou decisão do juiz. O fornecedor de serviço só não será responsabilizado caso prove a existência de causas excludentes de responsabilidade como quando o defeito não existir ou a culpa for exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, §3º, I e II do CDC). Em relação ao profissional liberal, não há objeção alguma a inversão do ônus da prova, mesmo tratando-se de responsabilidade subjetiva.
Em relação ao momento processual adequado para a inversão do ônus da prova, o Código de Processo Civil, no seu art. 357, III, afirma ser no momento do saneamento do processo, deixando de lado quaisquer dúvidas acerca do momento mais adequado.
2.2 Responsáveis pelo Pagamento da Indenização
Esclarecidas as questões referentes a quem deve figurar o polo ativo e o polo passivo nas ações judiciais por erro médico passa-se a explicar quem é responsável por pagar a indenização quando reconhecida pelo juiz. Sendo o médico profissional liberal a questão é facilmente resolvida, pois ele e a vítima do evento danoso são os únicos que aparecem como sujeitos da ação e, comprovada sua culpa, só o médico é responsável pelo pagamento da indenização. A questão se complica quando o profissional presta serviços para um hospital, clínica ou qualquer outro tipo de casa de saúde e planos de saúde.
Como já explicado anteriormente, todas as vezes que nosocômios e planos de saúde aparecerem na relação que envolve o erro médico a responsabilidade deles é objetiva, ou seja, não há que se falar em culpa, é necessário apenas que a vítima comprove o dano e o nexo de causalidade para que eles respondam tanto por aqueles que trabalham em suas instalações como por danos causados por problemas com equipamentos, medicamentos, hospedagens entre outros serviços auxiliares. De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, todas as vezes que existir um vínculo empregatício entre o profissional e o hospital ou clínica, deve-se afastar a questão da culpa, pois o erro médico será considerado uma falha na prestação de serviço. A teoria objetiva tem amparo em decisões de diversos Tribunais como o de São Paulo e Rio de Janeiro. Porém, existem posições contrárias à da maioria como a de Miguel Kfouri Neto e a do ex-Ministro Ruy Rosado de Aguiar Junior os quais afirmam que a responsabilidade do hospital por qualquer erro médico deve ser aferida mediante análise de culpa. Kfouri (1994, p. 365) defende tal posição, pois acredita que:
A responsabilidade objetiva não se coaduna com a atividade médica, dada a singularidade do serviço prestado: curar os enfermos, salvar vidas; se houver culpa do médico, nada impede que o lesado proponha a demanda em face de ambos, pessoa física e jurídica, ou de apenas um deles.
Já Ruy Rosado (1997) defende tal posição, pois acredita que o hospital, ao atender um paciente, inicia uma obrigação de meio, ou seja, ele se obriga a fazer o melhor possível e não a curá-lo de fato, enquanto os outros serviços do hospital como equipamentos ou serviço de hospedagem e hotelaria configuram uma obrigação de resultado. Sendo assim, o hospital apenas obriga-se a indenizar caso seja provada sua culpa. Importante ressaltar que a maioria dos doutrinadores como Sérgio Cavalieri Filho e Nehemias Domingos de Melo, e o próprio Código de Defesa do Consumidor, não fazem distinção alguma quanto aos serviços prestados, independentemente de quem esteja prestando tal serviço no hospital, a responsabilidade será sempre objetiva, sem diferenciar em obrigação de meio ou resultado.
Analisando a responsabilidade das casas de saúde e similares de acordo com o Código Civil chega-se a conclusão que os mesmos possuem responsabilidade objetiva de acordo com os critérios da culpa in vigilando, da culpa in eligendo e da culpa in costodiendo. Ao ocorrerem falhas na prestação de serviços o hospital responde como patrão dos funcionários que cometeram tal erro, sendo presumida a culpa. A culpa in vigilando torna possível responsabilizar o hospital, pois o mesmo deveria escolher bem os seus funcionários e se o mesmo comete um erro a culpa é do hospital que não fez uma boa escolha ao contratá-lo. Na culpa in eligendo há uma falha no controle e vigilância dos funcionários do hospital de forma que os mesmos acabam por cometer erros. Já na culpa in costodiendo o que acontece é uma falta de cuidado e atenção em relação ao paciente do hospital em que o mesmo se encontra.
O mesmo entendimento e regras dadas aos hospitais privados devem ser transferidos aos hospitais públicos. De acordo com o art. 37, §6º da Constituição Federal:
Art. 37, §6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
O direito brasileiro adotou a teoria da responsabilidade objetiva do Estado, logo, qualquer dano injusto cometido por um de seus funcionários, cujo nexo de causalidade for comprovado, deve gerar a obrigação de reparação pelo Estado.
Em relação aos planos de saúde, estes são regidos pela Lei 9.656/98 e submetidos à regulamentação e fiscalização pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A obrigação assumida pelos planos de saúde é de resultado, ou seja, eles devem fornecer o serviço com qualidade, obrigando-se a prestar serviços médicos, reembolso de quantias pagas pelos clientes, além de fornecer exames, alimentação, internação e medicamentos. Essa é a obrigação final deles, independente de o consumidor se curar ou não. Não apenas o erro médico obriga o plano de saúde a pagar indenização ao consumidor. Ao negar a autorização para internação ou tratamento sem justificativa razoável, está o plano cometendo um ilícito nascendo, assim, a obrigação de reparação por danos morais. Outra situação que pode ensejar a obrigação de reparação está na limitação do tempo de internação em doenças cobertas pelo plano de saúde, pois trata-se a mesma de cláusula abusiva levando-se em consideração que o paciente está doente e permanecerá internado até quando houver necessidade. Tal matéria fez surgir a Súmula 302 do STJ que esclarece que “é abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado”.
Não se pode confundir os planos de saúde com o seguro de saúde. Apesar de, o plano de saúde não se configurar um vínculo de emprego entre o mesmo e o profissional, a partir do momento em que este profissional é listado como uma das suas opções de atendimento deve o plano responder por qualquer dano causado por ele. No seguro-saúde a escolha do médico cabe apenas ao segurado, sendo responsabilidade da empresa apenas reembolsar por tal despesa, independente de ter sido realizado com sucesso ou não o procedimento desejado.
Conclui-se então que, sendo o médico profissional liberal, recai sobre ele a responsabilidade subjetiva, ou seja, responde o mesmo mediante aferição de culpa mesmo se o erro ocorrer dentro de um hospital e não possuindo ele qualquer vinculo empregatício com o mesmo. No caso de o médico ser funcionário de um hospital, casa de saúde ou similar, a responsabilidade da instituição é objetiva, recaindo a responsabilidade sobre a mesma, a qual responde por seus funcionários. Nessa situação o paciente pode colocar no plano passivo o hospital e/ou o médico, sendo de sua escolha, pois se trata de litisconsórcio facultativo, porém é mais comum responsabilizar apenas o hospital e, havendo condenação do mesmo, cabe ação de regresso da instituição contra o médico, desde que demonstrada que a culpa foi do profissional. Para os hospitais públicos a regra é a mesma podendo configurar no polo passivo tanto o Município quanto o Estado ou a União, ficando a cargo da vítima do evento doloso. Em relação aos planos de saúde, os mesmos podem responder pelo dano isoladamente ou em solidariedade com o médico ou hospital, cabendo tal decisão também ao paciente prejudicado.
Essencial destacar que tanto o hospital como o plano de saúde podem isentar-se de indenizar caso seja provado que o erro decorreu de acordo com uma das excludentes de ilicitude inseridas no art. 14, § 3º do Código de Defesa do Consumidor, que são: caso fortuito ou força maior, inexistência de defeito no serviço prestado e culpa exclusiva da vítima ou de terceiro.
2.3 Reparação por Dano Estético e pela Redução da Capacidade Laborativa
De acordo com Teresa Ancona Lopes (2004, p. 46) o dano estético configura-se como qualquer modificação duradoura ou permanente na aparência externa de uma pessoa, modificação esta que lhe acarreta um “enfeamento” e lhe causa humilhações e desgostos, dando origem, portanto, a uma dor moral. Segundo esse conceito, no âmbito da responsabilidade civil, basta que ocorra qualquer transformação para pior na imagem da pessoa para que se concretize tal dano. É importante também que essa transformação seja permanente ou que, ao menos, tenha um efeito danoso prolongado. Se a lesão não for duradoura, ou seja, se puder ser reparada com cirurgia ou qualquer outro procedimento médico tem que se falar não em dano estético, e sim em dano material pelo custeio dos procedimentos que serão realizados a fim de que se recupere a imagem do lesionado e pode-se falar até em danos morais caso a vítima sofra alguma espécie de dor emocional por esse passageiro “enfeamento”.
Melo (2008, p. 37) salienta:
O que se busca proteger não é a beleza física, até por ser extremamente difícil traçar-se um parâmetro para beleza, mas a incolumidade física do indivíduo que se constitui em seu patrimônio subjetivo, não podendo ser agredido impunemente.
Se, para disfarçar o dano estético causado, a pessoa faz uso de peruca, perna mecânica, olho de vidro ou qualquer outro tipo de disfarce isso não significa que o causador da lesão está desobrigado de pagar os danos morais, restando apenas os danos materiais. A doutrina e jurisprudência são uniformes quanto ao entendimento que, por mais perfeitos que sejam estes disfarces, eles nunca serão capazes de substituir cem por cento a parte do corpo perdida ou transformada. Logo, ainda existe a obrigação da reparação por dano estético. Necessário destacar que essa reparação só é possível se houver uma modificação para pior entre a imagem passada e presente da vítima, portanto, se houve um dano e a vítima lucrou com o mesmo, ou seja, houve uma modificação para melhor, não se fala em dano estético e sim material para ressarcir o que teve que ser modificado. É o caso de uma pessoa que, devido a um acidente, teve que trocar seus dentes que já se encontravam demasiadamente estragados antes da lesão. Essa troca irá torná-lo mais bonito, logo não há dano estético.
Ao falarmos em dano estético por erro médico pensamos logo na pessoa que teve sua imagem desfigurada devido a uma cirurgia mal sucedida, mas não é essa a única possibilidade de tal ocorrência. Identificamos tal evento danoso em tratamentos de pele que deixam vítima com uma pele pior do que estava antes, operações curativas na qual o médico corta um nervo errado causando deficiência na boca do paciente, anestesias como a requiana-peridual resultando em lesão cerebral, em aplicações de radioterapia entre outras. Isso ocorre porque o dano estético está diretamente ligado a uma ofensa ao direito de personalidade, que vem a ser o direito que a pessoa tem sobre ela mesma e insuscetíveis de serem quantificados em dinheiro. O direito da personalidade violado em tais casos é o da integridade física, ou seja, imagem externa da pessoa, não importando se as outras pessoas não entendem ser relevante o dano causado, e sim, o paciente que sofreu o dano.
Tais erros estéticos decorrem de uma relação contratual, e a ação de indenização encontra respaldo jurídico no art. 951 do Código Civil:
Art. 951 – o dispositivo nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício da atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
Os casos de cirurgia estética, de acordo com a doutrina majoritária que conta com Sílvio Rodrigues e Aguiar Dias, trata-se de uma obrigação de resultado, pois ao procurar o cirurgião estético o paciente deseja apenas melhorar um aspecto físico seu que não o agrada, e o médico ao aceitar tal procedimento, está se comprometendo a chegar ao resultado acordado por ambos.
De acordo com Lopez (2004, p.120):
Este enquadramento da operação plástica terá como consequência a presunção de culpa do médico pela inadimplência do contrato, havendo, então, a inversão do ônus da prova, tendo a vítima apenas que provar que o resultado que deveria ter sido alcançado pelo contrato não o foi.
Existe a possibilidade de o profissional, além de não cumprir o que foi prometido, causar danos adicionais na pessoa que está sendo operada. Nesse caso, não está presente apenas a responsabilidade contratual como a extracontratual, podendo as duas serem cumuladas e tal cumulação dar-se-á até o momento em que a vítima estiver ressarcida no plano moral, material e estético. A cumulação de culpas é um assunto bastante discutido na doutrina já que uma corrente acredita não ser possível a cumulação, e sim a opção de culpas de modo que o autor da ação deve escolher qual a responsabilidade que irá trazer-lhe mais benefícios.
Atualmente, o vocabulário mais adequado para referir-se a tal assunto seria o “concurso de responsabilidades”, ou seja, quando na relação processual estão presentes não apenas relações contratuais, os direitos de personalidade, como as relações extracontratuais já que o médico não está autorizado a cometer erros no paciente.
O dispositivo referente ao caso de o médico cometer um erro que inabilite ou diminua a capacidade laborativa do seu paciente está demonstrado no caput do art. 950 do Código Civil, que apesar de não se referir especificadamente ao médico, faz-se a relação quando se lê o art. 951 do referido Código. Sendo assim, afirma o art. 950:
Art. 950 – Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofre.
Tal ofensa pode ser verificada quando o médico realiza um procedimento de maneira errada no rosto de uma atriz que acaba por paralisar um lado da sua boca fazendo com que a mesma perca inúmeros trabalhos. Ou quando o profissional aplica uma anestesia raquiana que acaba por deixar o paciente, que trabalha como carteiro, paraplégico. No primeiro caso, há uma diminuição da capacidade laborativa já que a atriz precisará se esforçar mais para conseguir um trabalho. Já no segundo caso, há inabilitação para a capacidade laborativa, pois um carteiro não pode trabalhar caso não consiga andar.
A indenização referente a esse dano deve incluir além das despesas com tratamento e lucros cessantes, uma pensão equivalente a renda necessária para a subsistência da vítima que não poderá mais exercer seu ofício ou exercerá com certa dificuldade.
Questão controversa sobre tal indenização é a possibilidade de cumulação da indenização por dano estético com a indenização por diminuição da capacidade laborativa. Posicionamentos mais antigos acreditam não ser possível tal cumulação já que a reparação referente ao dano material já compreende e absorve qualquer outro tipo de dano, mas o posicionamento atual é diverso. Doutrinas e jurisprudências mais modernas admitem essa possibilidade já que pensam que o ressarcimento dos prejuízos sofridos pela vítima deve ser o mais perfeito possível, logo, se a mesma for indenizada por uma parte dos danos, não será justa a solução encontrada pelo legislador.
3 SEGURO MÉDICO
Diferentemente de países como Estados Unidos, Holanda, Alemanha, entre tantos outros da Europa em que é comum o médico possuir seguro de responsabilidade civil caso ocorra alguma eventualidade com um paciente, no Brasil essa ideia é pouco difundida e não são muitas as empresas que oferecem esse tipo de serviço e médicos e hospitais que as contratam, apesar de o instituto do seguro estar difundido no Código Civil através do art. 787 que dispõe que o segurador garante o pagamento das perdas e danos devidos pelo segurado a terceiro.
Por causa de relações cada vez mais impessoais entre médico e pacientes, serviços menos qualificados dos profissionais e cidadãos mais conscientizados dos seus direitos, há um aumento na busca do Poder Judiciário a fim de se reparar danos decorrentes de erro médico. Porém, como os médicos brasileiros, em sua maioria, ainda não possuem seguro as reparações podem demorar um longo tempo para serem pagas já que, geralmente, são de alto valor e não poderão ser pagas sem sacrifício do patrimônio e sustento do profissional e de todos aqueles que dependem dele, ou podem até jamais serem pagas, pois o médico não possui condições tornando-se o paciente vítima de uma fatalidade na qual ele deverá se conformar, o que é um absurdo levando-se em consideração que o mesmo já foi lesionado injustamente e precisar ser indenizado.
Citando Melo (2008, p. 212):
Nessas circunstâncias, a única saída para uma verdadeira e efetiva reparação do dano advindo de erro médico somente será concretizado com a adoção de seguro de responsabilidade civil, como de resto já acontece em diversos outros países do mundo.
Grande número de pessoas no Brasil ainda é contra o seguro de responsabilidade civil utilizando-se de uma desculpa sem qualquer lógica para defender tal posição. Eles acreditam que com o seguro será fomentada a “indústria do erro médico” no qual os valores de indenização serão altíssimos apenas porque os médicos são segurados. Essas pessoas usam como referência o exemplo americano no qual os valores das reparações alcançam patamares absurdos, porém no Brasil a situação é diferente. Nos Estados Unidos o nível de renda da população é maior, os médicos possuem boa remuneração e os hospitais recebem muitas doações e incentivos, logo podem pagar altas apólices de seguro, podendo o paciente ter uma alta indenização. No Brasil, infelizmente, a situação não é a mesma. Grande parte da população tem uma renda baixa e os médicos, principalmente aqueles que trabalham em hospitais públicos, são, muitas vezes, mal remunerados. Sendo assim, o seguro servirá apenas para garantir que o paciente receba uma indenização integral e o profissional não precise desfazer-se de todo seu patrimônio para pagá-la.
É evidente que existem vantagens e desvantagens sobre esse tema. Começando pelas desvantagens temos, entre outras, a estimulação de processos contra os médicos já que agora eles terão como pagar, elevação dos custos dos serviços médicos e o fato que esse seguro cobre apenas o dano material e não o moral. Porém, as vantagens são bem mais atrativas: há uma melhor liquidação do dano, melhor forma de justiça social, livra o médico e paciente de processos penosos e demorados e não depende da situação econômica do causador do dano para determinar o valor da indenização. Entidades representativas da classe médica são contra à adoção desse seguro pois afirmam que o médico não tem seu patrimônio totalmente protegido já que ela se limita apenas ao dano material, deixando de fora o dano moral. Existem argumentos defendendo que com o seguro o médico será menos diligente na sua profissão, pois possui uma garantia caso venha a cometer algum erro. Tais argumentos são fracos já que, em relação ao dano moral, o encargo sobre o médico será menor, pois possui cobertura no dano material. Quanto ao médico ser menos diligente é um absurdo, pois, quando contratamos um seguro para o nosso carro não desejamos que ele seja roubado, então por que um médico contrataria um seguro para seus atos e seria menos diligente? Contratar o seguro significa apenas que o médico erra como todos os outros profissionais e que quando, ou se ele errar, terá um mínimo de proteção para reparar as despesas do dano.
4 CONCLUSÃO
A justiça brasileira, atualmente, encontra-se inundada de processos tendo como causa o erro médico, ou pelo menos assim alegam as partes. Os legitimados são as próprias vítimas do erro, ou, quando estes vêm a óbito, os legitimados do art. 110 do CPC, cônjuge, ascendente, descendente e irmãos.
Já está consolidado que nos casos de erro médico, a inversão do ônus da prova é regra, vez que se mostra mais fácil o médico, ou o hospital, trazer aos autos as provas necessárias, usando-se o juiz também do laudo pericial, vez que é leigo neste assunto.
A vítima, ao adentrar com uma ação e obter resultado procedente, poderá ser indenizada pelos danos materiais, morais ou estéticos, não sendo esses danos excludentes, ou seja, podem vir a receber indenização pelas três formas de danos.
Por fim, vimos que em países da América do Norte e da Europa o seguro médico é uma ideia bastante difundida, tendo como objetivo proteger os profissionais financeiramente, caso venham a cometer um erro e sofrerem ação de indenização. Contudo, no Brasil esta é uma ideia que, ainda, não possui grande aceitação na área médica, com a justificativa de que este seguro poderia vir a deixar os médicos mais relapsos em sua atividade profissional por terem a garantia que o seguro cobriria indenizações que viessem a ocorrer.
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Bacharel em Direito pela Universidade Tiradentes, pós-graduação lato sensu em Direito Civil e Processo Civil pela Faculdade Guanambi. Técnica Judiciária do Tribunal de Justiça de Sergipe.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOARES, Mila Alves de Oliveira. O erro médico e a ação de indenização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 jan 2019, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52618/o-erro-medico-e-a-acao-de-indenizacao. Acesso em: 23 dez 2024.
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