Resumo: O presente artigo tem por objetivo efetuar uma análise teórica a respeito da disciplina constitucional, legal, doutrinária e jurisprudencial da responsabilidade civil das empresas públicas por danos causados a terceiros. No primeiro momento, aborda a responsabilidade civil do Estado e evolução das teorias sobre o tema, concluindo pela adoção da teoria do risco pelo ordenamento jurídico pátrio, depois, analisa o conceito e classificação das empresas públicas como prestadoras de serviços públicos e exploradoras de atividade econômica, e por fim, ocupa-se da caracterização da responsabilidade civil das espécies de empresas públicas, para se chegar à conclusão de que as empresas públicas prestadoras de serviço público possuem responsabilidade objetiva ao passo que as exploradoras de atividade econômica possuem responsabilidade subjetiva.
Palavras-chave: Responsabilidade civil. Empresa pública. Serviços públicos. Atividade econômica.
Abstract: This article aims to carry out a theoretical analysis regarding the constitutional, legal, doctrinal and jurisprudential discipline of civil liability of public companies for damages caused to third parties. In the first moment, it deals with the civil responsibility of the State and evolution of theories on the subject, concluding by the adoption of the theory of risk by the legal order of the country, afterwards, it analyzes the concept and classification of public companies as providers of public services and explorers of economic activity , and finally, it deals with the characterization of the civil responsibility of the species of public companies, in order to arrive at the conclusion that the public companies providing public service have objective responsibility, whereas the operators of economic activity have subjective responsibility.
Keywords: Civil responsability. Public company. Public services. Economic activity.
Sumário: Introdução. 1. Responsabilidade civil do Estado. 2. Empresas públicas. 3. Da responsabilidade civil das empresas públicas. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
No ordenamento jurídico pátrio, a responsabilidade civil, entendida como o dever de reparar um dano causado a outrem, via de regra, é subjetiva, isto é, pressupõe o dolo ou a culpa do agente. Nesse sentido, os pressupostos para a responsabilização do agente seriam a conduta, a culpa, o nexo de causalidade e o dano.
Entretanto, há situações específicas em que se afasta a necessidade de ocorrência do elemento culpa para a responsabilização do agente. É a aplicação da teoria do risco, da qual decorre a responsabilidade objetiva.
Um dos casos em que a legislação estabelece a aplicação da responsabilidade objetiva é quando da ocorrência de danos causados pelo Estado e, de forma mais abrangente, dos particulares que prestem serviços públicos. É o que se extrai da dicção do artigo 37, §6º da Constituição Federal, segundo o qual “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros (...)”.
Não restam dúvidas, portanto, que, além das pessoas jurídicas de direito público da Administração direta (União, Estados, Distrito Federal, Territórios e Municípios) e indireta (autarquias, inclusive associações públicas, e demais entidades de caráter público criadas por lei), as entidades de direito privado também podem ser submetidas à responsabilização de natureza objetiva, como é o caso das empresas públicas.
Apesar disto, é necessário estudar a incidência desta espécie de responsabilidade no âmbito das duas espécies de empresas públicas: as prestadoras de serviços públicos e as exploradoras de atividades econômica.
Pata tanto, é fundamental o estudo doutrinário acerca das teorias acerca da responsabilidade civil do Estado, assim como da legislação constitucional e infraconstitucional sobre ao tema, sem olvidar-se do entendimento jurisprudencial pátrio.
Esta é a proposta do presente trabalho.
1. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
A responsabilidade civil do Estado, segundo o conceito apresentado por DI PIETRO (2018) é a obrigação de reparar danos causados a terceiros em decorrência de comportamentos comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos, lícitos ou ilícitos, imputáveis aos agentes públicos.
Este tema foi tratado por diversas teorias ao longo do tempo, que vão desde a teoria da irresponsabilidade até a teoria do risco integral.
A teoria da irresponsabilidade prevê que o Estado dispõe de uma autoridade incontestável, não sendo cabível a sua responsabilização.
Também explicando a matéria surgiram as teorias civilistas, divididas em duas fases: teoria dos atos de império e de gestão e teoria da culpa civil ou da responsabilidade subjetiva. A primeira estabelece que o Estado somente pode ser responsabilizado em decorrência dos atos de gestão, que são aqueles praticados em situação de igualdade com os particulares, ao contrário dos atos de império que decorrem da supremacia estatal e prerrogativas decorrentes. A segunda previu a responsabilização estatal, desde que demonstrada a culpa do agente.
De outra banda, as teorias publicistas passaram a aplicar princípios do direito público, entendendo que a responsabilidade do Estado deve reger-se por tais regras especiais. Decorrem daí duas teorias: a teoria da culpa do serviço público, que leva em consideração não a culpa do funcionário, mas a culpa anônima do serviço; e a teoria do risco que foi adotada pela Constituição Federal, no já citado, §6º, do art. 37, bem como pelo Código Civil, em seus arts. 43 e 927:
Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Segundo a teoria do risco, da qual decorre a responsabilidade objetiva do Estado, a noção de culpa é substituída pela de nexo de causalidade entre o funcionamento do serviço público e o dano sofrido pelo administrado.
Sobre o assunto, convém destacar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no julgamento da Ação Rescisória 1438/PR:
AÇÃO RESCISÓRIA. VENDA A "NON DOMINO". RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. VENDA DE IMÓVEL EFETUADO PELO ESTADO DO PARANÁ DE DOMÍNIO DA UNIÃO.
1. A responsabilidade civil do Estado é objetiva; vale dizer, independe da culpa, posto não ser subjetiva. Assentou-se na venda a non domino, o que implica no fenômeno objetivo da evicção, cujos conceitos são respeitados pelo direito privado. A extensão da responsabilidade não é ... pela Constituição, que aduz aos prejuízos, circunstância que depende de prova do an debeatur. In casu, à míngua de prova objetiva, também exigível em contrapartida à responsabilidade e sem indagação de culpa do Estado, não se entrevê ilegalidade na devolução do preço, juros, correção e ... . Deveras, a responsabilidade objetiva e a subjetiva não se distinguem pela extensão do dano, senão pelo elemento subjetivo, dispensável quando se trata de ilícito perpetrado pelo Estado. Por isso, a indenização pleiteada pelos autores, em razão da alienação promovida pelo Estado do Paraná de terras de domínio da União (venda a non domino), deve ser solucionada levando-se em conta a responsabilidade objetiva da Administração, prevista no art. 37, § 6º da Constituição Federal.
2. Destarte, a reparação do dano aqui pleiteada não pode ser realizada nos moldes do ilícito absoluto (art. 159 do Código Civil), posto não se tratar o objeto da indenização de um bem dominical da União, pertencente ao patrimônio disponível da Administração, mas, sim, de um bem afetado à finalidade pública específica (segurança nacional), indisponível per se.
3. Na Teoria do Risco Administrativo, adotada pelo Brasil, a culpa é inferida do fato lesivo da Administração, motivo pelo qual é suficiente que a vítima demonstre o ato administrativo injusto, o dano e nexo de causalidade existentes entre eles. Referida teoria baseia-se no risco que a atividade pública gera aos particulares e na possibilidade de acarretar dano a certos membros da comunidade.
(...)
6. Por fim, reitere-se que a diferença entre a eleição da responsabilidade objetiva do estado ou sua responsabilidade subjetiva repousa no ônus da prova, do qual se exonera o lesado, sendo-lhe mais favorável a primeira causa petendi, mercê de inalterável a indenização que, aliás, foi-lhe concedida.
(...)
9. Ação rescisória improcedente.
(STJ, 2004, online)
Grifo nosso.
A doutrina aponta, ainda, que a teoria do risco compreende duas modalidades: a do risco administrativo e a do risco integral, sendo que a primeira admite as causas excludentes e atenuantes de responsabilidade (força maior, culpa da vítima e culpa de terceiros), ao passo que a segunda não.
Nesse ponto há certo dissenso doutrinário quanto à modalidade adotada pela Constituição Federal no tocante à responsabilidade civil do estado. TARTUCE (2018) aponta que:
(...) há forte corrente doutrinária que sustenta ter sido adotada a teoria do risco integral – a ser ainda abordada –, pela qual o Estado deve responder pela conduta comissiva do agente em qualquer hipótese, não se admitindo qualquer excludente de nexo de causalidade, uma vez que se exige apenas a prova do prejuízo ao cidadão. Nesse sentido, entre os civilistas, posiciona-se Maria Helena Diniz, citando o entendimento similar de Washington de Barros Monteiro. 8 Entre os autores de Direito Administrativo, opina Maria Sylvia Zanella Di Pietro que a maioria da doutrina não faz distinção entre a teoria do risco administrativo e a do risco integral, podendo ambas ser consideradas sinônimas. 9
Em regra, não é o que parece a este autor. A teoria do risco integral é teorema drástico, que somente pode ser aplicado em casos excepcionais. Como se verá no Capítulo 13 deste livro, a sua incidência somente se justificaria, segundo os doutrinadores ambientalistas e a jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça, quando estiverem presentes os danos ambientais, diante dos interesses difusos relativos ao Bem Ambiental. Como bem assinala Fernanda Marinela, “quanto à possibilidade de exclusão da responsabilidade objetiva, duas teorias devem ser admitidas: a teoria do risco integral, que não admite a exclusão da responsabilidade, e a teoria do risco administrativo, que admite a sua exclusão. O Brasil adota como regra a teoria do risco administrativo, em que é possível afastar a responsabilidade e a sua exclusão ocorre com a ausência de qualquer de seus elementos definidores. Estando presentes os elementos definidores da responsabilidade não há evasão possível”. 10 Como se percebe, não é pacífica a afirmação de sinonímia entre risco administrativo e risco integral.
Pelo exposto, é possível afirmar que o posicionamento que prevalece na doutrina é que se aplica à responsabilidade civil do Estado a teoria do risco, na modalidade risco administrativo.
2. EMPRESAS PÚBLICAS
As empresas públicas, conforme doutrina e legislação, pertencem à relação de entidades da Administração Pública Indireta. No âmbito federal, há previsão expressa no Decreto-Lei n.º 200, de 25 de fevereiro de 1967:
Art. 4° A Administração Federal compreende:
(...)
II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:
c) Sociedades de Economia Mista.
d) fundações públicas. (Incluído pela Lei nº 7.596, de 1987)
Parágrafo único. As entidades compreendidas na Administração Indireta vinculam-se ao Ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal atividade. (Renumerado pela Lei nº 7.596, de 1987)
Grifei.
Tal norma ainda dispõe no seu artigo 5º, inciso II sobre o conceito legal de empresas públicas:
Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se:
(…)
II - Emprêsa Pública - a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio próprio e capital exclusivo da União, criado por lei para a exploração de atividade econômica que o Govêrno seja levado a exercer por fôrça de contingência ou de conveniência administrativa podendo revestir-se de qualquer das formas admitidas em direito. (Redação dada pelo Decreto-Lei nº 900, de 1969)
Válido destacar que a doutrina afirma que empresa pública é um gênero do qual decorrem duas espécies que possuem regimes jurídicos diferenciados, quais sejam, as empresas públicas que executam atividade econômica e as empresas públicas que prestam serviço público.
As empresas públicas que executam atividade econômica são regidas pelo art.173 e parágrafos da Constituição Federal, que assim dispõe:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(...)
Grifo nosso.
Denota-se que nossa Carta Magna delineou, através da Emenda Constitucional nº 19 de 1998, uma série de diretrizes, afastando as prerrogativas e a rigidez do nosso direito administrativo, com o escopo de garantir uma verdadeira eficiência e agilidade às empresas públicas que executem atividade econômica, permitindo-as competição no mercado, em igualdade de condições com outras empresas privadas.
De outro lado, a doutrina entende que o art. 175, da Constituição traz o fundamento para a espécie de empresas públicas prestadoras de serviços públicos:
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
Grifos acrescidos.
Tal artigo prevê a hipótese do Poder Público, mediante uma lei que autorize a criação de uma empresa pública, possibilitar a criação de tal ente com o intuito de prestar determinado serviço público, se valendo da gestão privada do serviço público.
Esta distinção entre empresas públicas exploradoras de atividade econômica e empresas públicas prestadoras de serviço público é pacífica no Supremo Tribunal Federal, conforme se nota no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.642:
“Distinção entre empresas estatais prestadoras de serviço público e empresas estatais que desenvolvem atividade econômica em sentido estrito. (...) As sociedades de economia mista e as empresas públicas que explorem atividade econômica em sentido estrito estão sujeitas, nos termos do disposto no § 1º do art. 173 da CB, ao regime jurídico próprio das empresas privadas. (...) O § 1º do art. 173 da CB não se aplica às empresas públicas, sociedades de economia mista e entidades (estatais) que prestam serviço público.(...)”
Grifo nosso.
Neste sentido, é mister que o Estado, quando atuar na exploração de atividade econômica (atuação excepcional, portanto), deve submeter-se aos ditames do Direito Privado, posto que aos entes privados deve equiparar-se, sem qualquer privilégio, em nome da livre concorrência de mercado, com fundamento no art. 173, da Constituição Federal.
Em contrapartida, os serviços públicos são de obrigação primária do Estado, que pode prestá-los diretamente ou, de forma excepcional através de particulares, sob a forma de concessão, permissão ou autorização, nos termos do artigo 175, da Constituição da República.
Assim, como já sedimentado na doutrina e jurisprudência pátrias, às empresas públicas prestadoras de serviço público não se aplica o art. 173 da Constituição Federal, que cuida especificamente da atividade de natureza privada, incidindo, portanto, o art. 175 da Carta Magna.
3. DA RESPONSABILIDADE CIVIL DAS EMPRESAS PÚBLICAS
Como já tratado anteriormente, nos termos do § 6º, do art. 37, da Constituição Federal, a responsabilidade civil do Estado é objetiva, ou seja, independe da comprovação do elemento culpa para sua incidência.
Contudo, no que diz respeito às empresas públicas, para definição da incidência de tal previsão constitucional é essencial a análise da distinção feita anteriormente, entre empresas públicas prestadoras de serviço público e empresas públicas exploradoras de atividade econômica.
Como dito, as empresas públicas prestadoras de serviço público subordinam-se aos ditames do art. 175, da Constituição Federal e, nessa condição, respondem objetivamente por danos causados a terceiros, consoante o já citado §6º, do art. 37, da CF.
Sobre o tema, MELLO (2009) afirma que a responsabilidade civil das empresas privadas prestadoras de serviço público é objetiva, vejamos:
atualmente é certo que se governa na conformidade dos mesmos critérios que se aplicam ao Estado; ou seja: os da responsabilidade objetiva, pois assim é, segundo doutrina e jurisprudência, a responsabilidade pública. Portanto, independe de dolo ou culpa, bastando o nexo causal entre seu comportamento e o agravo destarte produzido. Isto por força do precitado art. 37, § 6º, da Constituição, que estabelece para as pessoas de Direito Privado prestadoras de serviço público a mesma responsabilidade que incumbe às pessoas de Direito Público [...].
Também este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme acórdão do Recurso Especial 738026/RJ:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL ADMINISTRATIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO ESTADO. 1. As regras de Direito Administrativo e Constitucional dispõem que as empresas criadas pelo Governo respondem por danos segundo as regras da responsabilidade objetiva, e , na hipótese de exaurimento dos recursos da prestadora de serviços, o Estado responde subsidiariamente (art. 37, § 6º, da Constituição Federal). 2. É defeso atribuir o cumprimento de obrigação por ato ilícito contraída por empresa prestadora de serviços públicos a outra que não concorreu para o evento danoso, apenas porque também é prestadora dos mesmos serviços públicos executados pela verdadeira devedora. Tal atribuição não encontra amparo no instituto da responsabilidade administrativa, assentado na responsabilidade objetiva da causadora do dano e na subsidiária do Estado, diante da impotência econômica ou financeira daquela. 3. Recurso especial provido.
Nesta seara, não restam dúvidas de que as empresas públicas prestadoras de serviço público respondem objetivamente pelos danos causados por seus agentes que, nessa condição, causarem danos a terceiros.
Por outro lado, as empresas públicas exploradoras de atividade econômica submetem-se às regras de direito privado e, consequentemente, não se inserem no disposto no §6º, do art. 37, da Carta Magna, para fins de responsabilização objetiva.
Como se vê, o referido dispositivo é claro no sentido de ser aplicável somente às pessoas jurídicas de direito privado “prestadoras de serviço público”.
Sobre o tema, importante destacar a lição de OLIVEIRA (2018):
Por outro lado, as empresas públicas e sociedades de economia mista econômicas respondem, em regra, de maneira subjetiva, como as demais pessoas privadas, tendo em vista dois argumentos: a) inaplicabilidade do art. 37, § 6.º, da CRFB; e b) aplicação do mesmo tratamento dispensado às empresas privadas em geral, “inclusive quanto aos direitos e obrigações civis” (art. 173, § 1.º, II, da CRFB).
Por sua vez, CARVALHO FILHO (2018) assevera que
Aqui, portanto, temos que nos curvar ao exame da atividade exercida pelas citadas entidades, embora todas, em sentido lato, exerçam atividade econômica. Se o objeto da atividade for a exploração de atividade econômica em sentido estrito (tipicamente mercantil e empresarial), a norma constitucional não incidirá; em consequência, a responsabilidade será a subjetiva, regulada pela lei civil. Se, ao contrário, executarem serviços públicos típicos, tais entidades passam a ficar sob a égide da responsabilidade objetiva prevista na Constituição. Essa é que nos parece a melhor interpretação para o art. 37, § 6º, da CF, sem embargo de opiniões em contrário.
Assim, as empresas públicas exploradoras de atividade econômica subordinam-se ao regime próprio das empresas privadas, de maneira geral, ou seja, responsabilidade subjetiva, regulada pelo Código Civil.
CONCLUSÃO
As empresas públicas, apesar de dotadas de personalidade jurídica de direito privado, podem ser classificadas em duas espécies, a depender de sua finalidade: prestadoras de serviços públicos e exploradoras de atividades econômicas.
Tal classificação é fundamental para se entender como se dá a disciplina jurídica da responsabilização de tais entidades por danos causados a terceiros por seus agentes.
É que a Constituição Federal, ao adotar a teoria do risco para prever a responsabilização objetiva do Estado, restringiu sua aplicação às empresas privadas na prestação de serviços públicos.
Por tal motivo, é possível concluir-se que somente as empresas públicas prestadoras de serviços públicos estão submetidas à responsabilização objetiva, independentemente da comprovação de culpa.
Por sua vez, às empresas públicas exploradoras de atividade econômica aplica-se a responsabilização objetiva, sendo necessária a comprovação de todos os elementos exigidos pelo Código Civil para a responsabilidade civil: conduta, a culpa, o nexo de causalidade e o dano.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 06 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 02 set. 2018.
BRASIL. Decreto-Lei n.º 200, de 25 de fevereiro de 1967. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-lei/Del0200.htm>. Acesso em: 01 set. 2018.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade: ADI 1.642. Plenário. Relator: Min. Eros Grau. Data do julgamento em 03/04/2008. DJE de 19/09/2008. Disponível em <http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28ADI%24%2ESCLA%2E+E+1642%2ENUME%2E%29+OU+%28ADI%2EACMS%2E+ADJ2+1642%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/chx3dqw>. Acesso em: 03 set. 2018.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Ação Rescisória: AR 1438/PR. Primeira Seção. Relator: Ministro Luiz Fux. Data do julgamento: 14/04/2004. Disponível em < https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/inteiroteor/?num_registro=200001426982&dt_publicacao=10/05/2004>. Acesso em: 01 set. 2018.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial: REsp 738026/RJ. 2ª Turma. Relatora: Ministra Eliana Calmon. Julgamento em 26/06/2007. Disponível em <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?processo=738026&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true>. Acesso em: 04 set. 2018.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 30. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2016.
DI PIETRO. Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 31. ed. rev. atual e ampl., Rio de Janeiro: Forense, 2018.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 35. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
OLIVEIRA. Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito: 6. ed. rev., atual. e ampl., Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.
TARTUCE, Flávio. Manual de responsabilidade civil: volume único, Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2018.
Graduação em TECNOLOGIA EM GESTÃO DE RECURSOS HUMANOS pelo IFPI (2009) e em DIREITO pela UESPI (2011). Atualmente é ADVOGADO da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Rayanna Silva. A responsabilidade civil das empresas públicas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 fev 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52681/a-responsabilidade-civil-das-empresas-publicas. Acesso em: 23 dez 2024.
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