Resumo: Busca-se, no presente trabalho, apontar a divergência quanto a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário na prática de ato doloso de improbidade administrativa, além de analisar os posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais majoritários, sobretudo no Superior Tribunal Federal. Assim, objetiva-se demonstrar sua relevância para o direito, trazendo substrato para comunidade jurídica sobre o tema.
Palavras-chave: Ressarcimento ao erário. Imprescritibilidade. Ato doloso. Improbidade Administrativa.
Abstract: In the present work, we seek to point out the divergence as to the imprescriptibility of the actions of compensation to the treasury in the practice of an intentional act of administrative improbity, in addition to analyzing the doctrinal and jurisprudential positions, mainly in the Federal Superior Court. Thus, it aims to demonstrate its relevance to the law, bringing substrate to the legal community on the subject.
Keywords: Reimbursement to the treasury. Non-prescription. A willful act. Administrative dishonesty.
SUMÁRIO: Introdução; 1. Breve histórico; 2. Da imprescritibilidade constitucional das ações de ressarcimento ao erário fundadas em suposto ato de improbidade administrativa; 3. Ponderação de valores: patrimônio público e moralidade administrativa versus segurança jurídica do agente ímprobo em face da ação ressarcitória do estado – segurança jurídica do indivíduo versus segurança jurídica da coletividade; 4. Do atual entendimento do supremo tribunal federal; Conclusão; Referências bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem o desiderato de fomentar a discussão acerca da imprescritibilidade do ressarcimento ao erário fruto de ato doloso de improbidade administrativa.
A partir de posicionamentos jurisprudenciais e doutrinários, analisasse a controvérsia desde o posicionamento inicial dos Tribunais Superiores até a fixação da tese em sede de Repercussão Geral pelo Superior Tribunal Federal.
Busca-se, explanar toda a controvérsia, diferenciando quais atos são fulminados pela prescrição à luz da Constituição Federal de 1988.
1. BREVE HISTÓRICO
Em 19 de maio de 2016 o Supremo Tribunal Federal por maioria, reputou constitucional a questão, saindo vencido o Ministro Marco Aurélio.
Tal controvérsia foi ao STF por meio de um recurso extraordinário interposto em ação de improbidade administrativa em que se pleiteava a aplicação, aos réus, das sanções previstas no art. 12, II e III, da Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa), inclusive de ressarcimento de danos. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo havia dado provimento ao recurso de apelação, reformando em parte sentença que julgara parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a ocorrência de prescrição quanto aos réus ex-servidores públicos.
2. DA IMPRESCRIBILIDADE CONSTITUCIONAL DAS AÇÕES DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO FUNDADAS EM SUPOSTO ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
O cerne da controvérsia está em analisar se é constitucional reconhecer a prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de suposto ato de improbidade administrativa.
A Constituição prescreve, no art. 37, caput, que a administração pública se curva, entre outros, aos princípios básicos da legalidade, moralidade e impessoalidade. Conectados a esses três pilares estão os §§ 4º e 5º do mesmo dispositivo, a determinarem que:
§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. § 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento. (Destaques acrescidos.)
A orientação do Supremo Tribunal Federal sobre a exegese do § 5º do art. 37 da Carta Magna sempre foi na linha do reconhecimento da imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, a exemplo do que foi decidido no: MS 26.210 (Relator Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, Plenário, DJe 10 out. 2008) e RE 606.224 (Relatora Ministra CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, DJe 16 abr. 2013), referentes ao ressarcimento ao erário por bolsistas do CNPq; ARE 648.661 (Relatora Ministra ELLEN GRACIE, DJe 9 ago. 2011) e RE 693.991 (Relatora Ministra CÁRMEN LÚCIA, DJe 28 nov. 2012), a versarem sobre acidentes de trânsito; e RE 629.241 (Relator Ministro JOAQUIM BARBOSA, DJe 9 out. 2010), relativo a execução de acórdão do TCU.
O Tribunal de Contas da União editou a Súmula 282, com o seguinte enunciado: “As ações de ressarcimento movidas pelo Estado contra os agentes causadores de danos ao erário são imprescritíveis”.
Boa parte da doutrina defende serem imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de supostos atos de improbidade administrativa. Transcrevem-se, por oportunas, as lições de José Afonso da Silva e de Celso Antônio Bandeira de Mello sobre a questão:
A prescritibilidade, como forma de perda da exigibilidade de direito, pela inércia de seu titular, é um princípio geral de direito. Não será, pois, de estranhar que ocorram prescrições administrativas sob vários aspectos, quer quanto às pretensões de interessados em face da Administração, quer quanto às desta em face de administrados. Assim, é especialmente em relação aos ilícitos administrativos. Se a Administração não toma providência à sua apuração e à responsabilização do agente, a sua inércia gera a perda de seu ius persequendi. É o princípio que consta do art. 37, § 5º, que dispõe: “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízo ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”. Vê- -se, porém, que há uma ressalva ao princípio. Nem tudo se prescreverá. Apenas a apuração e punição do ilícito, não, porém, o direito da Administração ao ressarcimento, à indenização, do prejuízo causado ao erário. É uma ressalva constitucional e, pois, inafastável, mas, por certo, destoante dos princípios jurídicos, que não socorrem quem fica inerte (dormientibus non securrit ius). Deu-se assim à Administração inerte o prêmio da imprescritibilidade na hipótese considerada. (Destaques acrescidos – SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 682-683.)
3. PONDERAÇÃO DE VALORES: PATRIMÔNIO PÚBLICO E MORALIDADE ADMINISTRATIVA VERSUS SEGURANÇA JURÍDICA DO AGENTE ÍMPROBO EM FACE DA AÇÃO RESSARCITÓRIA DO ESTADO – SEGURANÇA JURÍDICA DO INDIVÍDUO VERSUS SEGURANÇA JURÍDICA DA COLETIVIDADE
A segurança jurídica, sob a perspectiva do indivíduo, foi indubitavelmente prestigiada com a determinação de se estabelecerem, por meio de lei, prazos prescricionais para as sanções em sentido estrito decorrentes da prática de ato de improbidade; enquanto o patrimônio e a moralidade foram prestigiados quando se afirmou que, no atinente ao ressarcimento, as ações em face do agente ímprobo não prescreveriam.
Os defensores da tese da imprescritibilidade sustentam que o conflito é meramente aparente, porquanto o Constituinte, ao excepcionar a imprescritibilidade do ressarcimento de danos causados ao patrimônio público econômico, “perpetuando o dever de restituir a quem violou a moralidade administrativa e a ética pública”, não deixou de homenagear a segurança jurídica; titularizada, contudo, pela sociedade, não pelo particular. Fez, assim, prevalecer o interesse público em face do interesse particular do agente ímprobo.
Assim, para adeptos dessa corrente da não prescrição, na ponderação entre a segurança jurídica do indivíduo, que teria, depois do escoamento de prazo prescricional, de devolver o que não lhe pertence ao Estado, e a segurança jurídica da coletividade, de poder, a todo momento, recuperar o que lhe foi subtraído de maneira indevida pelo agente ímprobo, o Poder Constituinte fez prevalecer a segunda.
4. DO ATUAL ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O STF fixou em 8 de agosto de 2018 a seguinte tese para fins de repercussão geral:
São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa. STF. Plenário. RE 852475/SP, Rel. orig. Min. Alexandre de Moraes, Rel. para acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 08/08/2018.
O STF entendeu, portanto, que as ações de ressarcimento ao erário envolvendo atos de improbidade administrativa são imprescritíveis. No entanto, o Tribunal fez uma “exigência” a mais que não está explícita no art. 37, § 5º da CF/88.
O Supremo afirmou que somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento envolvendo atos de improbidade administrativa praticados DOLOSAMENTE.
A prescritibilidade é a regra no Direito brasileiro, ou seja, em regra, as pretensões indenizatórias estão sujeitas a prazos de prescrição. Para que uma pretensão seja imprescritível, é indispensável que haja previsão expressa neste sentido.
O § 5º do art. 37 da CF/88 deve ser lido em conjunto com o § 4º, de forma que ele, em princípio, se refere apenas aos casos de improbidade administrativa. Se fosse realizada uma interpretação ampla da ressalva final contida no § 5º, isso faria com que toda e qualquer ação de ressarcimento movida pela Fazenda Pública fosse imprescritível, o que seria desproporcional.
A prescrição é um instituto importante para se garantir a segurança e estabilidade das relações jurídicas e da convivência social. É uma forma de se assegurar a ordem e a paz na sociedade.
Desse modo, a ressalva contida na parte final do § 5º do art. 37 da CF/88 deve ser interpretada de forma estrita e não se aplica para danos causados ao Poder Público por força de ilícitos civis.
O conceito de ilícito civil deve ser buscado pelo método de exclusão: não se consideram ilícitos civis aqueles que decorram de infrações ao direito público, como os de natureza penal, os decorrentes de atos DOLOSOS de improbidade e assim por diante.
CONCLUSÃO
O reconhecimento quanto a prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de suposto ato de improbidade administrativa é fruto de ampla discussão na doutrina pátria, sendo a jurisprudência vacilante para ambos os lados.
A interpretação que mais se coaduna com a Constituição Federal de 1988 é a imprescritibilidade apenas dos atos dolosos de improbidade administrativa.
Tratar ilícitos civis como imprescritíveis sem dúvidas não é a melhor opção frente a segurança jurídica.
Dessa forma, acertada a decisão do Superior Tribunal Federal que fixou em tese de Repercussão Geral a imprescritibilidade do ressarcimento apenas fruto de atos dolosos de improbidade administrativa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARVALHO FILHO, Jose dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 20 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12. Ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Lei de introdução e parte geral. 5. ed. São Paulo: Método, 2009.
BARROS, Guilherme Freire de Melo Barros. Poder Público em Juízo para concursos. Ed. Jus Podivm,2011.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. ed. Ver. Ampl. E atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
Advogado, aprovado para Juiz de Direito Substituto no Tribunal de Justiça do Piauí e Tribunal de Justiça do Amazonas.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORAES, Danny Rodrigues. Da imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário na prática de ato doloso de improbidade administrativa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 mar 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52703/da-imprescritibilidade-das-acoes-de-ressarcimento-ao-erario-na-pratica-de-ato-doloso-de-improbidade-administrativa. Acesso em: 23 dez 2024.
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