IGOR DE ANDRADE BARBOSA[1]
RESUMO: O narcotráfico é uma atividade ilícita enraizada na sociedade brasileira que, apesar das penalizações previstas, continua a alastrar-se diariamente, vez que o comércio e uso de substâncias entorpecentes tornam-se cada vez mais comuns, incidindo sobre todas as classes sociais. Neste sentido, este artigo busca compreender essa realidade no contexto atual da Casa de Prisão Provisória da cidade de Palmas/TO, a qual vem apresentando dados de constante superlotação de presos pela atividade de traficância, bem como a figura do traficante à luz do Direito Penal do Inimigo.
Palavras-chave: Narcotráfico, Substâncias entorpecentes; Casa de Prisão Provisória; Superlotação; Direito Penal do Inimigo
ABSTRACT: The drug trafficking is na unauthorized activity rooted in brazilian society which, in spite of the penalties provided by law it continues to spread itself daily, as trade and use of narcotic substances become increasingly common, affecting all social classes. Therefore this article seeks to understand this reality in the current context of The Provisory Prison House of the city of Palmas/TO which has been presenting constant data of inmates overcrowding by drig traffic likewise intends to understand also the drug dealer figure in light of the Enemy’s of Criminal Law.
Key-words: Drug Trafficking; Narcotic Substances; Provisory Prison House; Overcrowding; Enemy Criminal Law
SÚMARIO: 1. Introdução; 2. Drogas e o Contexto Histórico da Lei nº 11.343/06; 2.1 O Procedimento Legal da Legislação Especial do Crime de Tráfico de Substâncias Entorpecentes; 3. A Política de Criminalização da Pobreza no Contexto do Ordenamento Jurídico Brasileiro Pós-modernidade; 4. O Direito Penal do Inimigo Advindo de Günther Jakobs em face da Figura do Traficante de Drogas; 5. O Narcotráfico na Conjuntura da Sociedade Atual; 5.1 O Crime de Tráfico de Drogas e a Superlotação na Casa de Prisão Provisória de Palmas/TO; 6. Conclusão; 7. Referências.
1 INTRODUÇÃO
No contexto da realidade brasileira, o crime de tráfico de drogas está inserido como sendo uma das condutas delitivas mais recorrentes daqueles que possuem envolvimento com o submundo do crime. A ação delituosa é tão corriqueira que não é estranho nos depararmos diariamente com notícias vinculadas a atividade da mercancia de substâncias ilícitas.
A necessidade de combater drasticamente o crime de tráfico de drogas resultou na elaboração da Lei nº 11.343/2006, a qual dispõe não apenas sobre penalidades para quem realiza a atividade da traficância, mas também sobre medidas para prevenção de uso indevido e reinserção social de usuários e dependentes químicos.
No entanto, apesar do caráter repressivo/social da Lei de Drogas, esta apresenta obscuridades em suas disposições, resultando em um caminho controverso quanto ao combate a comercialização de substâncias ilícitas, vez que o número de detentos presos por causa da traficância aumenta na mesma proporção de acesso que os usuários continuam a ter aos entorpecentes.
A Casa de Prisão Provisória de Palmas/TO não foge dessa realidade, posto que, no mês de abril de 2018, o presídio estava abrigando 739 detentos, apesar de a capacidade ser apenas para 260 presos, ou seja, o presídio de Palmas apresentou dados de uma superlotação de mais de 280%[2].
A realidade da Casa de Prisão Provisória de Palmas/TO pode estar intimamente ligada ao crime de mercancia de substâncias ilícitas, aparecendo no contexto social como uma das consequências do tratamento jurídico conferido pela sociedade a figura do traficante, ou seja, o que vemos é a criminalização da massa pobre.
Afim de delinear esta realidade, este artigo apresenta-se como mecanismo para compreensão dos fatos que estão enraizados acerca da população masculina encarcerada na Casa de Prisão Provisória pela prática do crime de tráfico de drogas e como a estes indivíduos vem sendo conferido tratamento semelhante ao conceito doutrinário do alemão Günther Jakobs.
2 DROGAS E O CONTEXTO HISTÓRICO DA LEI Nº 11.343/06
De maneira popular as drogas são conhecidas como substâncias ilícitas, ou seja, substâncias não regulamentadas pela nação para serem consumidas, tão pouco comercializadas, e que causam dependência física ou psíquica às pessoas que as utilizam constantemente, resultando em consequências negativas tanto para os usuários e traficantes, quanto para seus familiares, que muitas vezes veem o ente querido ter sua vida perdida para o submundo do narcotráfico ou para a realidade dos usuários de drogas.
A Portaria nº 344/98 dispõe sobre substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial, que para nosso estudo cumpre destacar os entorpecentes popularmente conhecidos como maconha, cocaína, crack, LSD, metanfetamina, ópio, entre outros. Portanto, podemos conceituar “drogas” como sendo substâncias proscritas pela Portaria nº 344/98, as quais podem ser naturais ou não e possuem a capacidade de alterar o funcionamento do organismo de quem faz seu uso, podendo inclusive causar a dependência física ou psíquica.
Anterior a legislação atual referente ao tráfico de drogas vigoravam concomitantemente duas leis que dispunham sobre o pertinente assunto: as Leis nº 6.368/76 e nº 10.409/02. A Lei nº 6.368, de 21 de outubro de 1976, se difere da legislação atual especialmente quanto a nomenclatura utilizada em seu artigo que trata do crime de tráfico de entorpecentes e suas penalidades. O artigo 12 desta lei corresponde ao artigo 33 da Lei nº 11.343/06 e as duas principais diferenças entre eles são: a expressão utilizada para denominar a atividade delitiva e a penalização.
O artigo 12, da Lei nº 6.368/76, tinha como expressão “substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica” para a caracterização das condutas previstas em seu caput. A Lei nº 11.343/06, em seu artigo 33, substituiu esta expressão pelo simples uso da palavra “drogas” e, como já vimos anteriormente, drogas são substâncias nocivas e que estão proscritas pela Portaria nº 344/98.
A penalização prevista pelo artigo 12, da Lei nº 6.368/76, também sofreu alterações com o advento da Lei nº 11.343/06, que em seu artigo 33 tornou a pena mais gravosa comparada àquela, vez que o artigo 12 da antiga legislação previa uma pena de 3 a 15 anos de reclusão e o pagamento de 50 a 360 dias-multa, enquanto a legislação atual prevê pena de 5 a 15 anos de reclusão e o pagamento de 500 a 1500 dias-multa.
Ainda dentro deste contexto, em 11 de janeiro de 2002, foi elaborada pelo Congresso Nacional a Lei nº 10.409, a qual aparecia com o fim de ser a nova Lei Antitóxicos. No entanto, como a lei teve vetado pelo Presidente da República 35 dos 59 artigos que dispunha, a mesma acabou por fracassar em seu intuito de regular toda a matéria que englobasse o consumo de substâncias ilícitas e sua comercialização, o que resultou em sua aplicabilidade ser em conjunto com a Lei nº 6.368/76.
Assim, perante esta realidade de confusão legislativa causada pela vigência concomitante das Leis nº 10.409/02 e nº 6.368/76, o legislador viu a necessidade de saná-la e, para tanto, em 23 de agosto de 2006 foi elaborado, pelo Senado Federal, o Projeto de Lei nº 115/2002, do qual originou-se a Lei nº 11.343/06, revogando expressamente ambas as legislações anteriores.
Em 8 de outubro de 2006, entrou em vigor a atual Lei de Drogas, a qual instituiu o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (SISNAD) que tem por finalidade “articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas, assim como a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas” (BRASILEIRO, 2015, p. 701). Trata-se, assim, de um sistema organizado com suas ações destinadas tanto aos infratores quanto aos usuários de substâncias proscritas.
O advento da Lei nº 11.343/06 trouxe como um dos grandes diferenciais a terminologia adotada para “substância entorpecente”, vez que nesta lei optou-se pelo uso da palavra “drogas”, diferentemente do que era utilizado na Lei nº 6.368/76. Assim, em seu artigo 1º, parágrafo único, o diploma legal dispõe que “para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União”. Ou seja, podemos concluir que ao optar pelo uso da palavra “drogas” o legislador teve a intenção de uma maior abrangência para que não ficasse restringido apenas à substância entorpecente ou causadora de dependência.
A atual Lei de Drogas possui 75 artigos que, em resumo, dispõem sobre o SISNAD; atividades de prevenção do uso indevido e reinserção social; crimes e penas; repressão a produção; e o procedimento penal. Por isso, com base nesta legislação, este trabalho objetiva compreender sua aplicabilidade e impacto no sistema carcerário masculino da cidade de Palmas/TO, vez que após a adoção da Lei nº 11.343/06 o que se observou foi um aumento na população carcerária brasileira de 77,5%, entre os anos de 2005 e 2013[3].
2.1 O PROCEDIMENTO LEGAL DA LEGISLAÇÃO ESPECIAL DO CRIME DE TRÁFICO DE SUBSTÂNCIAS ENTORPECENTES
A entrada em vigor da Lei de Drogas não tornou apenas mais severa as penas aos condenados por tráfico e estabeleceu penas alternativas aos usuários, mas também reforçou o trajeto do procedimento legal, desde o inquérito policial até a sentença condenatória ou absolutória.
Necessário se faz delinear sobre as componentes do crime, antes de adentrarmos ao passo-a-passo do processo. O crime de tráfico de drogas tem como sujeito ativo qualquer pessoa, ou seja, trata-se de um crime comum, quanto ao sujeito passivo, este é a coletividade, isto é, a sociedade em geral. Porém, no caso do artigo 38, o crime da traficância, caracteriza-se como crime próprio, pois conforme Renato Brasileiro (2015, p. 742) “apenas aquele que exerce profissão habilitada à prescrição de drogas pode configurar como sujeito ativo do delito, como, por exemplo, médicos e dentistas”. Observamos, então, que, em regra, trata-se de um crime comum.
Antes de iniciar o procedimento da ação penal, temos a fase do inquérito policial, a qual disponibiliza a lavratura dos autos, laudos periciais, entre outros documentos pertinentes para que o Ministério Público realize a denúncia. Quanto a isso, vale destacar que a ação penal nos casos do crime da traficância é Pública Incondicionada, vez que é impetrada pelo Órgão Ministerial na Justiça Comum, no entanto, quando se trata do artigo 28, é oferecido transação penal no Juizado Especial Criminal, conforme prevê a Lei nº 9.099/95.
A Lei nº 11.343/06 em seu Capítulo III dispõe sobre o procedimento penal, subdividindo-se em duas fases: a Investigação (Seção I) e a Instrução Criminal (Seção II). É através deste procedimento em que será apurado a tipicidade ou não da conduta do agente, bem como a decisão de ação impetrada. A Investigação é a fase inquisitiva do ato processual e está prevista nos artigos 50 ao 53 da legislação especial. No entanto, conforme a doutrina de Damásio de Jesus (2009, p. 247):
Não se aplicam, contudo, às infrações de menor potencial ofensivo (arts. 28, 33, § 3º, e 38 da Lei), que obedecem ao disposto na Lei n. 9.099/95 (arts. 69 e s.) com as peculiaridades referidas nos parágrafos do art. 48 desta Lei em se tratando de porte de droga para consumo pessoal (art. 28 da Lei).
A fase inquisitiva se inicia, basicamente, com a prisão em flagrante do suspeito de estar traficando substâncias proscritas, sendo que esta ocorre, em muitos casos, através de diligencia policial para apurar a procedência da informação ou denúncia anônima do crime. Ao efetuar o flagrante a autoridade de polícia judiciária deverá encaminhar o flagrado a delegacia para lavratura dos autos. O auto de prisão em flagrante, apesar de ser em razão de crime de legislação especial, segue o rito dos artigos 301 e s. do Código de Processo Penal.
De acordo com o artigo 144, § 1º, IV, e § 4º, da Constituição Federal, as atribuições da Polícia Judiciária são da Polícia Civil e Federal, ou seja, são as responsáveis para a lavratura dos autos. No entanto, isso não quer dizer que não é possível a prisão em flagrante ser realizada pela Polícia Militar, haja vista que o artigo 301 do Código de Processo Penal não faz diferenciações entre a polícia judiciária e a polícia ostensiva.
As delegacias de polícia especializadas para a investigação dos crimes de tráfico de drogas realizam constantemente operações a fim de apurarem as condutas de quem pratica esta atividade para a posterior imputação das medidas cabíveis de penalização pelo judiciário. Após a conclusão da ação policial e da lavratura dos autos, o indiciado é encaminhado para exame de corpo de delito e para a audiência de custódia, a qual deve ocorrer em um prazo de 24 horas do flagrante. É nesta fase do instrumento processual que a autoridade judiciária irá avaliar as circunstâncias da prisão para decidir se há a necessidade de conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva.
A cidade de Palmas/TO adotou esta fase do rito processual apenas a partir do ano de 2016, vez que ainda não está inserida em todos os fóruns brasileiros e, nestes casos, o indiciado acaba tendo que aguardar meses até ter a primeira oportunidade de dar sua versão dos fatos perante autoridade judiciária. É importante delinearmos ainda quanto a instauração do inquérito policial, o qual deverá ser concluído em um prazo de 30 dias, caso se trate de réu preso, e em 90 dias, se o réu estiver preso, ressaltando que ambos os períodos são prorrogáveis, conforme estabelece o artigo 51 da Lei Especial. Assim, os autos serão remitidos ao juiz para que se dê início a fase da instrução criminal.
A instrução criminal é a fase do rito processual que desencadeará a ação penal em desfavor do réu através de denúncia oferecida pelo Ministério Público, em um prazo de 10 (dez) dias. Este rito especial vem previsto nos artigos 54 a 59 da Lei nº 11.343/06. Ao oferecer a denúncia, o Ministério Público poderá arrolar no máximo 5 (cinco) testemunhas para a acusação, sendo que para o mérito da exordial deverá valer-se do Laudo Pericial de Constatação Definitivo. De acordo o TJSP, “tal exame preliminar objetiva, única e exclusivamente, uma aferição prévia da toxicidade da substância apreendida, para se evitar casos de prisão por porte de substâncias evidentemente inócuas” (HC 116.871, RT, 674:305). Ressaltando que o laudo deve ter sido juntado nos autos do inquérito policial, preferencialmente, desde a prisão em flagrante do indiciado.
Após o oferecimento da denúncia, o indiciado deverá ser citado e intimado para a apresentação da defesa prévia, que também terá o prazo de 10 (dez) dias para oferecimento, mas se este ato restar prejudicado, deverá ser nomeado defensor público dativo pelo juiz competente. As testemunhas a serem arroladas também são no máximo 5 (cinco), por acusado, sendo que a defesa pode arrolar as mesmas testemunhas da acusação.
Ao realizar o recebimento da denúncia o juiz ordenará, então, a citação pessoal do indiciado para que seja notificado da data de audiência de instrução e julgamento. Se não for possível a citação pessoal do acusado pelo Oficial de Justiça, é totalmente cabível no rito da Lei de Drogas aplicação subsidiária do artigo 48 do Código de Processo Penal e ser realizada a citação por edital ou por hora certa.
A audiência de instrução e julgamento é a fase do rito processual em que será realizada a oitiva das testemunhas, do indiciado, bem como as alegações da acusação e da defesa. Pode acontecer de forma una ou em continuação, tendo ao final prolatada sentença absolutória ou condenatória.
3 A POLÍTICA DE CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA NO CONTEXTO DO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO PÓS-MODERNIDADE
Em um contexto histórico, a era pós-modernidade iniciou-se após a desestruturação da União Soviética, bem como da queda do Muro de Berlim em 1989. Neste sentido, o conceito para o termo “pós-modernidade” está ligado aos acontecimentos ocorridos na transição do século XX para o século XXI, relacionando-se com eles, como por exemplo o “boom” do movimento feminista e a intensificação das questões relacionadas a economia e ao meio ambiente.
Na era pós-modernismo é possível observar mudanças não apenas na área cultural, artística e industrial, mas também no cenário social. Tais mudanças são refletidas em nossa sociedade diariamente, no sentido de que estes reflexos advém ainda das raízes históricas de nosso país em que, mesmo com os progressos ocorridos, o que vemos é ainda a intensa desigualdade social, realidade presente no Brasil desde sua colonização.
Para o sociólogo polonês Zygmunt Baunt o conceito mais correto a ser utilizado para definir a era atual é na verdade a expressão “modernidade liquida”, vez que a transição de um século para o outro permitiu visualizar a mudança de uma sociedade caracterizada pela modernidade “pesada” e “sólida” para uma modernidade “leve” e “líquida”.
A sociedade que entra no século XXI não é menos “moderna” que a sociedade que entrou no século XX; o máximo que se pode dizer é que ela é moderna de um modo diferente. O que há faz tão moderna como era mais ou menos há um século é o que distingue a modernidade de todas as outras formas históricas do convívio humano: a compulsiva e obsessiva, contínua e irrefreável e sempre incompleta modernização, a opressiva e inerradicável, insaciável sede de destruição criativa (ou de criatividade destrutiva, se for o caso: de “limpar o lugar” em nome de um “novo e aperfeiçoado” projeto; de “desmantelar”, “cortar”, “defasar”, “reunir” ou “reduzir”, tudo isso em nome da maior capacidade de fazer o mesmo no futuro – em nome da produtividade ou da competividade). (BAUMAN, 2001, p. 36)
Assim, no sentido de que estamos vivendo neste contexto de “modernidade líquida” de Bauman, não acontece diferente com nosso ordenamento jurídico brasileiro, estando inserido nesta perspectiva através das relações sociais e situações diárias da vida do cidadão.
Neste condão, temos ainda a política criminal presente em nosso contexto social, em que conforme Zaffaroni e Pierangeli (2008, p. 118):
Podemos afirmar que a política criminal é a ciência ou a arte de selecionar os bens (ou direitos), que devem ser tutelados jurídica e penalmente, e escolher os caminhos para efetivar a tal tutela, o que iniludivelmente implica a crítica dos valores e caminhos já eleitos.
Vemos, então, que a política criminal é o guia utilizado pelo nosso ordenamento jurídico para fazer valer as decisões tomadas, bem como as críticas no âmbito do fenômeno criminal.
No entanto, é preciso ressaltar que a política criminal não está relacionada apenas com o poder-dever punitivo do Estado de direito, visto que é também dela que decorrem os investimentos de cunho político para uma possível ressocialização do infrator. Ou seja, o instituto aqui apresentado nada mais é do que um aglomerado de regramentos, convicções e medidas politicas utilizados pelo nosso sistema para combater, através da prevenção e da repressão, a incidência de infrações penais.
É neste contexto que o crime de tráfico de drogas está inserido em nosso ordenamento jurídico, dispondo, inclusive, de legislação própria, como já vimos anteriormente.
A atual politica criminal de drogas mantém o caráter proibicionista das legislações anteriores e de outros países ao redor do mundo. Porém, há alguns anos debates acerca da legalização de substâncias entorpecentes vem sendo inserido em nossa sociedade e ordenamento jurídico, cita-se como exemplo o recente Projeto de Lei nº 10.549/18 apresentado na Câmara de Deputados de São Paulo, o qual viabiliza às pessoas maiores de 18 anos o plantio e uso de até 40 gramas da planta cannabis (maconha), bem como o uso medicinal desta por quem for autorizado pela Anvisa.
Vislumbra-se, neste sentido, que proposta como a PL nº 10.549/18 nada mais é que medida alternativa de combate a traficância, pois conforme afirmam Guadanhin e Gomes (2017, p. 12):
A maioria dos presos por tráfico de drogas no Brasil são pequenos traficantes, sem importância na cadeia comercial de venda das substâncias ilícitas, gerando um alto custo ao Estado (dos R$ 6.785 bilhões destinados ao sistema penitenciário em 2012, R$ 1.626 bilhão foi gasto somente com presos por tráfico de drogas) e contribuindo com o superencarceramento no país, que já possui a quarta maior população carcerária de todo o mundo, ficando atrás somente dos Estados Unidos da América, da China e da Rússia.
Ao manter o modelo proibicionista de combate às drogas o Estado não obtém o retorno esperado de diminuição da incidência da conduta delituosa da traficância, pois a mesma continua a ocorrer tal qual a superlotação de encarcerados atualmente por todo o território brasileiro. É neste cenário de extremo proibicionismo e superlotação dos presídios que vemos a criminalização da pobreza se intensificar.
A criminalização da pobreza nada mais é do que o fruto de nossas raízes históricas, principalmente àquelas que remontam ao longo período de escravidão. Um país que apenas veio a abolir mais de trezentos anos de mão de obra escrava no final do século XIX muito dificilmente conseguiria ter outra realidade como consequência de seu passado. Trata-se de um fenômeno de marginalização das camadas menos favorecidas economicamente e que, muitas vezes, perpetua-se também pela discriminação racial.
Ressalta-se que este é um fato perceptível em nosso cotidiano de todas as maneiras, principalmente quando acompanhamos ao noticiário e vemos crimes como o de roubo e o de tráfico de drogas geralmente sendo praticado pelo mesmo perfil de pessoa: homem, negro, pobre e morador de favela. Tal realidade é tão somente um reflexo da enorme discrepância social entre as classes brasileiras.
Reflexos como este provavelmente não mudarão ao longo dos anos, pois apesar da tentativa do Estado em diminuir a intensa atividade do tráfico de drogas através da legislação recente de 2006, o que vemos na prática é um caminho inverso ao pretendido, visto que a criminalização das drogas aparece nitidamente no cenário da sociedade brasileira como a criminalização do pobre e negro desfavorecido pelo sistema político-econômico do Estado, e não como a redução do uso e do comércio de entorpecentes.
Ao abordamos este tema não podemos nos esquecer daqueles que, além da figura já citada, também são atingidos pela política demasiadamente repressiva: a família. Isto é, a falta de empatia da sociedade e do Estado de direito para com a família daqueles que infringiram as leis e foram penalizados, vez que a discriminação não ocorre apenas em relação ao infrator, mas a sua família também, principalmente através do preconceito social.
No contexto do crime de tráfico de drogas vemos constantemente a figura de quem é preso pela prática delituosa, como já dito. Mas tais circunstâncias talvez se tornam mais realistas em decorrência não só do grau punitivo deste crime, mas de sua subjetividade. A atual Lei de Drogas, assim como as legislações anteriores, não inovou trazendo o quantum de substância entorpecente que poderia caracterizar a prática da traficância através de um dos 38 verbos presentes no artigo 33 da respectiva lei.
Um país como o Brasil, em que a desigualdade socioeconômica continua bastante presente, ao elaborar uma legislação especial que se omite em relação a um dos principais fatores que leva à prisão do individuo permite a subjetividade tanto da autoridade que apreende quanto da que julga para que reste o crime caracterizado.
Obviamente que a autoridade judiciária para decidir o destino do acusado não leva em consideração apenas a quantidade de substância ilícita apreendida, mas também as condições econômicas, as circunstâncias em que houve a prisão e apreensão, os antecedentes criminais, entre outros fatores. No entanto, mesmo com tantos fatores a serem analisados pelo poder judiciário, o que vemos na prática é que não há tanta alteração na figura do traficante.
É neste contexto social que vemos a intensa aglomeração de detentos pelos estados brasileiros, decorrente da política altamente punitiva do Estado, em que afeta, na maioria das vezes, apenas as camadas mais desfavorecidas economicamente e de pele negra, sendo um retrato real de uma sociedade que visa mais criminalizar a pobreza do que alterar seu contexto social para que haja uma evolução social, econômica e educacional destes.
4 O DIREITO PENAL DO INIMIGO ADVINDO DE GÜNTHER JAKOBS EM FACE DA FIGURA DO TRAFICANTE DE DROGAS
A concepção de Günther Jakobs[4] sobre Direito Penal do Inimigo foi introduzida no ordenamento jurídico penal no ano de 1985 e, desde então, vem se disseminando ao mesmo tempo em que ganha inúmeros críticos. Ao elaborar o conceito de “inimigo”, Jakobs baseia-se em alguns filósofos, tais como Hobbes e Kant, baseando sua doutrina também segundo os pensamentos de Niklas Luhmann, importante sociólogo alemão, o qual afirmava ser o direito o mecanismo de orientação da sociedade, sendo as expectativas generalizadas através das normas.
Em sua obra, Sánchez traz um pouco do que seria o Direito Penal do Inimigo pela concepção de seu mais famoso pensador, Jakobs.
Se nos restringirmos à definição desse autor, o inimigo é um individuo que, mediante seu comportamento, sua ocupação profissional ou, principalmente, mediante sua vinculação a uma organização, abandonou o Direito de modo supostamente duradouro e não somente de maneira incidental. Em todo caso, é alguém que não garante mínima segurança cognitiva de seu comportamento pessoal e manifesta esse déficit por meio de sua conduta. As características de Direito penal de inimigos seriam então, sempre segundo Jakobs, a ampla antecipação da proteção penal, isto é, a mudança de perspectiva do fato passado a um porvir; a ausência de uma redução de pena correspondente a tal antecipação; a transposição da legislação jurídico-penal à legislação de combate; e o solapamento de garantias processuais. (SÁNCHEZ, 2002, p. 149)
Depreende-se da concepção de Jakobs sobre Direito Penal do Inimigo que este nada mais é que uma espécie destinada a combater os “inimigos” da sociedade, pessoas que por agirem contrário as normas estabelecidas não merecem serem resguardadas de seus direitos, ou seja, para estas pessoas há a permissão do uso de qualquer meio para que sejam punidas.
É diante deste contexto que o autor aborda em sua obra os três vetores do direito penal.
Uma primeira velocidade, representada pelo Direito Penal “da prisão”, na qual haver-se-iam de manter os princípios político-criminais clássicos, as regras de imputação e os princípios processuais; e uma segunda velocidade, para os casos em que, por não tratar-se já de prisão, senão de penas de privação de direitos ou pecuniárias, aqueles princípios e regras que poderiam experimentar uma flexibilização proporcional a menor intensidade da sanção [...] (SÁNCHEZ, 2002, p. 148).
Ou seja, enquanto um vetor representa a sanção imposta através das penas privativas de liberdade, o outro diz respeito as penas alternativas, como as penas pecuniárias e de privação de direitos, destaca-se ainda que, de acordo com o autor, os crimes da seara do segundo vetor não podem cominar com as penas privativas de liberdade.
Ao expor em sua obra tais classificações, questiona a existência de um terceiro vetor em nosso ordenamento, sendo este destinado ao Direito Penal do Inimigo, uma vez que este “utiliza-se da pena privativa de liberdade (como o faz o Direito Penal de primeira velocidade), mas permite a flexibilização de garantias materiais e processuais (o que ocorre no âmbito do Direito Penal de segunda velocidade)” (SANTOS, 2011, s/p). Assim sendo, a terceira velocidade do ordenamento jurídico penal nada mais é que uma mescla das demais, com a sanção punitiva não mais baseada no ato em si, mas na figura do autor.
Apesar dos esforços políticos, sociais, judiciais e policiais para o combate a atividade ilícita do tráfico de drogas, o que observamos é um constante aumento desta prática tanto em território nacional quanto internacional. Ou seja, toda a proibição acerca de determinadas substâncias ilícitas acaba por gerar lucros para seus agentes na mesma medida em que seus combatentes tentam impedi-los.
O primeiro grande traficante brasileiro era conhecido pela alcunha de “Coronel Sabino” e viveu nos anos 1950, este tinha o costume de carregar até quatro malas abarrotadas de drogas, o que o fez ficar conhecido também como “O Rei da Maconha”, o qual não reinou durante muitos anos, pois no início da década de 1960 teve suas plantações incineradas pela Força Aérea Brasileira (FAB).
O relatório, do ano de 2018, do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões[5] trouxe o seguinte perfil das pessoas privadas de liberdade no Brasil: 30,42% possuíam a faixa etária de 18 a 24 anos; 43,62% da raça parda; 78,07% tendo o estado civil de solteiro; e em relação a escolaridade, 52,27% possuindo o ensino fundamental completo[6].
Deste modo, observamos que a maioria dos presos pelo crime de tráfico de drogas se enquadram no perfil citado, compondo, ainda, a massa pobre da sociedade, enquanto os economicamente favorecidos e que também, em alguns casos estão por trás desta atividade, agindo, muitas vezes, através do financiamento, acabam ficando impunes, nem sequer sendo descobertos ou investigados.
Há ainda aqueles que atuam na prática da traficância como “mula”, sendo esta nada mais que a denominação dada a pessoa que serve como transporte para as substâncias ilícitas de uma localidade para outra, caracterizando-se assim o tráfico interestadual e internacional de drogas. No entanto, apreender a droga e a pessoa que está portando-a não é medida suficiente se realmente há a pretensão de combater o crime.
Fato é que ao referir-se ao traficante de drogas a maior parte da sociedade não o vê apenas como um infrator, mas como um real inimigo em todo contexto social, pois sua atividade delitiva, além de atingir outras pessoas, também muitas vezes envolve outros crimes, como porte ilegal de arma de fogo.
É neste sentido que o traficante é visto como exemplo de figura do direito penal do inimigo, conforme afirma Vivian Von Hertwig Fernandes de Oliveira (2014, p. 115)
Os sujeitos imputados pela prática do crime de tráfico de drogas no Brasil se encontram submetidos a um tratamento jurídico (penal, processual penal e penitenciário) extremamente rigoroso, caracterizado pela antecipação da punição, cominação de penas bastante elevadas e redução ou supressão de garantias materiais e processuais, aplicado de forma seletiva e com objetivo de neutralização, o qual, aliado à gestão militarizada da segurança pública, conforma a política beligerante de repressão às drogas atualmente em vigor no Brasil.
Ou seja, apesar das garantias previstas, em especial as constitucionais, muitas vezes estas restam prejudicadas quando se trata da figura do traficante de drogas, pois este já é firmado na sociedade como seu inimigo. No entanto, será ele o real inimigo da sociedade ou será a sociedade a inimiga deste?
Se levarmos em conta a filosofia de Jakobs o traficante será visto constantemente como um dos melhores exemplos da figura de inimigo da sociedade, ainda mais pelo fato de a doutrina e jurisprudência equiparar este crime ao hediondo, talvez devido aos efeitos que são causados em um contexto social.
No entanto, é este mesmo contexto social que não é proporciona condições semelhantes aos cidadãos para que possam ter uma vida sem precisar corromper-se neste atividade delitiva e que também, na maioria dos casos, são estes que acabam por povoar os presídios brasileiros, enquanto os verdadeiros traficantes, aqueles de maior porte e que lucram demasiadamente acabam, muitas vezes, por passarem impunes, pois não possuem o perfil estabelecido pela sociedade da figura do traficante.
A possibilidade desta realidade se alterar é tão remota quanto a de reduzir o uso de substâncias ilícitas e de lucratividade gerada pela atividade da traficância, visto que enquanto houver quem compra, haverá quem vende, bem como enquanto não houver maiores investimentos do Estado para a ressocialização, vez que apenas a punição rigorosa já mostrou não ser o meio eficaz de combate às drogas.
5 O NARCOTRÁFICO NA CONJUNTURA DA SOCIEDADE ATUAL
Em contexto mundial, foi entre as décadas de 1970 e 1980 que o tráfico de entorpecentes começou a se propagar e teve seu auge, respectivamente. Ressaltando-se que esta realidade se relacionava a crise econômica mundial daquela época, vez que desde os tempos passados até chegarmos aos dias atuais a atividade de comercialização de substâncias ilícitas é destinada a um lucro fácil e rápido, inclusive movendo economia.
O narcotráfico, do ponto de vista econômico, representa um dos negócios mais lucrativos do mundo, segundo dados da Organização das Nações Unidas. Esses dados revelam que essa atividade ilícita movimenta mais de US$ 500 bilhões por ano, o dobro do faturamento da indústria farmacêutica mundial e o equivalente a dez vezes mais do que é gasto por ano em políticas públicas de desenvolvimento econômico no mundo. (HUGO, 2010, s/p).
Assim, resta claro que o fluxo econômico e lucrativo oriundo do tráfico de substâncias ilícitas é um dos fatores percursores para que a cada dia mais pessoas se envolvam com a atividade delituosa.
No Brasil, a realidade acerca da comercialização de entorpecentes não é diferente do cenário mundial, vez que como é possível percebermos constantemente são vinculadas notícias jornalísticas sobre diligencias policiais que resultaram na apreensão de drogas e na prisão de inúmeros traficantes.
O consumo de entorpecentes começou a se alastrar no Estado brasileiro a partir da década de 1960, época em que época que perdurava no Brasil um dos sistemas políticos mais rígidos e autoritários já imposto, a Ditadura Militar. Mas disto, o sistema ditatorial não foi óbice para a propagação do uso de substancias ilícitas, o que ocorreu, principalmente, devido aos movimentos artísticos-culturais, como o movimento “hippie”, assim, ocorrendo também uma mudança no perfil dos usuários da substância popularmente conhecida como maconha, pois o consumo deixou de ser apenas por aqueles vítimas do sistema da desigualdade social e tornou-se também dos favorecidos da classe média.
Assim, conforme preceitua Alan Geraldo Myleô (2010, s/p):
Num contexto histórico mundial de guerras, violências, ditaduras e censuras ideológicas que permeiam o séc. XX, a utilização de drogas, como maconha, LSD, cocaína e outros, traz as pessoas um sentido de libertação. Protesto. De busca e transformação no sentido das coisas.
Perante este contexto, o Brasil adotou o modelo internacional de combate às drogas, desenvolvendo medidas preventivas e repressivas a fim de pôr freios ao constante avanço da atividade do narcotráfico. A Lei nº 11.343/06 traz em seu artigo 33 o crime de tráfico de drogas, delineando as condutas e a pena a ser imposta, conforme vejamos:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Pena – reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1500 (mil e quinhentos) dia-multa.
Há ainda outros dispositivos que preveem penalizações as condutas inseridas na do crime de tráfico de drogas, quais sejam os previstos nos artigos 34 à 39 do diploma legal. Os respectivos artigos citados trazem vários verbos para a caracterização do crime, conforme podemos destacar os seguintes: fabricar; adquirir; financiar; associarem-se; colaborar como informante; prescrever substância proscrita; entre outros. Porém, consta destacar que estes crimes não são hediondos, vez que não estão inclusos no rol taxativo da Lei nº 8.072/90, porém são equiparados à eles e, por isso, insuscetíveis de graça, anistia e indulto, condição reafirmada pelo artigo 44 da Lei de Drogas.
A Lei de Drogas, também em seu artigo 44, declara o crime da traficância como inafiançável e veda a concessão da liberdade provisória. No entanto, o STF vem posicionando-se contrário a este dispositivo há alguns anos, conforme o informativo nº 665 de 10 de maio de 2012.
Tráfico de drogas e liberdade provisória – 1
O Plenário, por maioria, deferiu parcialmente habeas corpus — afetado pela 2ª Turma — impetrado em favor de condenado pela prática do crime descrito no art. 33, caput, c/c o art. 40, III, ambos da Lei 11.343/2006, e determinou que sejam apreciados os requisitos previstos no art. 312 do CPP para que, se for o caso, seja mantida a segregação cautelar do paciente. Incidentalmente, também por votação majoritária, declarou a inconstitucionalidade da expressão “e liberdade provisória”, constante do art. 44, caput, da Lei 11.343/2006 (“Os crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos”). A defesa sustentava, além da inconstitucionalidade da vedação abstrata da concessão de liberdade provisória, o excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal no juízo de origem. HC 104339/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.5.2012. (HC-104339).
Assim, mesmo que insuscetível de anistia, graça, indulto e ser inafiançável, é totalmente possível a concessão da liberdade provisória ao preso por tráfico de drogas.
Apesar da possibilidade de ser concedida liberdade provisória ao preso pelo crime de tráfico de substâncias ilícitas a realidade do Estado brasileiro é de superlotação dos presídios ao longo dos anos, principalmente desde o início da vigência da atual Lei de Drogas, conforme já visto.
É neste ponto que as políticas públicas deveriam trabalhar para a efetiva eficiência não só na punição, mas também nas medidas cautelares alternativas da prisão preventivas, pois estas não demonstram.
5.1 O CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS E A SUPERLOTAÇÃO NA CASA DE PRISÃO PROVISÓRIA DE PALMAS/TO
Como já visto, o crime de tráfico de drogas está presente, praticamente, na maior parte do mundo, vez que se trata de uma das atividades mais lucrativas. O Estado brasileiro está inserido neste contexto, pois, além do forte proibicionismo gerado pelo “Guerra às Drogas”, nosso país possui divisões limítrofes com outras nações que também detém uma alta comercialização de substâncias ilícitas que, consequentemente, nos atingem.
O Estado do Tocantins está no centro do Brasil e faz divisão com Estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Apesar de ser o Estado mais jovem da nação, o Tocantins não está isolado da realidade da traficância, pois constantemente são vinculadas matérias sobre operações que resultaram na apreensão de entorpecentes e objetos comumente utilizados para o desempenho da atividade ilícita, bem como na prisão de seus agentes.
De acordo com o mais recente Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança de Segurança Pública[7], referente as estatísticas do ano de 2016, o Brasil apresentou uma população carcerária de 729.551 detentos[8], com o Estado do Tocantins totalizando uma quantidade de 6.437 detentos, destacando-se o fato de que para cada 3,2 detentos havia 1 vaga no sistema carcerário[9]. Até o mês de maio de 2018 os presídios do Estado do Tocantins, em seu total, tinham uma população de mais de 3500 detentos, sendo que destes 3777 eram do sexo masculino[10].
Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça[11], a Casa de Prisão Provisória da cidade de Palmas com capacidade para abrigar 260 presos apresentou no mês de março de 2019 uma lotação atual de 774 detentos, com 375 perfazendo a quantidade de presos provisórios. Em relação ao crime de tráfico de drogas, no mês de abril de 2019, foi averiguado um total de 63 presos provisórios[12] neste mesmo presídio.
O crime de tráfico de drogas é o segundo mais recorrente imputado às pessoas privadas de liberdade, a nível nacional, com uma porcentagem de 24,74%, perdendo apenas para a incidência do crime de roubo, o qual apresenta uma porcentagem de 27,58%[13]. Ou seja, atualmente, o crime de tráfico de substâncias entorpecentes aparece, no contexto do sistema prisional brasileiro, como uma das maiores causas para a superlotação dos presídios.
Por este contexto, vemos, então, claramente a interligação entre a repressão ao crime de tráfico de drogas com a superlotação do presídio masculino de Palmas/TO, sendo que esta realidade não será cessada ou diminuída rapidamente, muito pelo contrário, vez que apesar do papel punitivo do Estado, ações criminosas em geral continuam fazendo parte de nossa sociedade.
6 CONCLUSÃO
Ao abordar um tema que continua a ser tão polêmico observamos o quanto este ainda precisa ser debatido, visto que o sistema adotado por nossa sociedade para o combate do tráfico de drogas pode estar diariamente seguindo o caminho contrário do almejado.
Apesar da previsão legal de concessão de liberdade provisória ao indiciado pelo crime de tráfico de drogas, em muitos dos casos, esta não é concedida, mesmo havendo disposição de outras medidas a serem adotadas. Não conceder a liberdade provisória acaba por ocasionar o intenso aumento de detentos nos presídios.
O combate ao crime de tráfico de drogas tem gerado, na verdade, apenas o aumento demasiado da população carcerária e não uma redução na comercialização dos entorpecentes, pois em muitos casos aquele que fora preso pela prática da traficância sofre o preconceito social pelo seu passado de ex-presidiário e, assim, não encontrando outra forma para continuar tendo recursos econômicos que não seja retornar ao mundo do crime.
Percebe-se uma intensa criminalização do comércio de substâncias ilícitas por parte do Estado, mas não é observado que ao criminalizar está criminalizando também a pobreza, na proporção em que há uma árdua repressão, enquanto há uma nítida carência de medidas sociais para a ressocialização daquele que transgrediu a conduta imposta.
Por conseguinte, depreende-se que o Estado deveria trabalhar na possibilidade de inovar nas formas de combate, como por exemplo através da eficácia em aplicar as medidas de ressocialização previstas ou então uma possível descriminalização de determinadas substâncias entorpecentes, como já há a proposta referente ao uso da cannabis, conforme abordado anteriormente.
No entanto, não basta apenas o Estado trabalhar em suas condutas para trazer novas alternativas de combate, é necessário que isso ocorra em conjunto com a sociedade. Discriminar alguém pelo seu passado e lhe negar a oportunidade de lutar por uma nova perspectiva de vida é fator determinante para que este continue a ter a mesma conduta, vez que não lhe foi proporcionado uma efetiva possibilidade de mudança decorrente do preconceito social.
Neste sentido, percebe-se ser possível combater a comercialização de substâncias ilícitas, mas para tanto é preciso que haja uma alteração no atual sistema adotado, tendo em vista que este já demonstrou a sua ineficiência no combate, exemplo disto é a Casa de Prisão Provisória de Palmas/TO, que apresenta índices de constante superlotação. Mas para que haja este real combate tanto o sistema político quanto social precisam alterar suas condutas possibilitando uma possível descriminalização de determinadas substâncias ilícitas e a não mais negativa de ressocialização do indivíduo perante a sociedade.
7 REFERÊNCIAS
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BIANCHINI, Alice. Política criminal, direito de punir do estado e finalidades do direito penal. Jus Brasil, 2013. Disponível em: < https://professoraalice.jusbrasil.com.br/artigos/121814432/politica-criminal-direito-de-punir-do-estado-e-finalidades-do-direito-penal>. Acesso em: 04 de abril de 2019.
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BRASIL. Lei nº 10.409, de 11 de janeiro de 2002. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 14 de janeiro de 2002. Seção 1, p. 1. Disponível em: < http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2002/lei-10409-11-janeiro-2002-433359-publicacaooriginal-1-pl.html>. Acesso em: 10 de outubro de 2018.
BRASIL. Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006. Diário Oficial da União. Brasília, DF, 24 de agosto de 2006. Seção 1, p. 2. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2006/lei-11343-23-agosto-2006-545399-publicacaooriginal-57861-pl.html>. Acesso em: 26 de setembro de 2018.
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ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro v.1. Parte Geral. 7ª ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
[1] Defensor Público Federal de 1ª Categoria na Defensoria Pública da União no Estado do Tocantins. Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pelo Programa de Mestrado em Direito da Universidade Candido Mendes - UCAM. Especialista em Direito nas Relações de Consumo pela Universidade Candido Mendes - UCAM. Especialista em Direito da Concorrência e Propriedade Industrial pela Universidade Candido Mendes - UCAM. Diretor e Membro do Conselho Editorial da Revista Tribuna da Advocacia da Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil do Tocantins. Membro da Comissão de Revalidação de Diplomas de Mestrado Obtidos em Universidades Estrangeiras da Pró-Reitoria de Cooperação e Convênios Internacionais da Universidade Candido Mendes - UCAM (licenciado).) Aprovado no 1º Concurso para Provimento na 3ª Classe de Cargos de Procurador do Município de Nova Iguaçu, Estado do Rio de Janeiro. Professor e orientador da graduação (bacharelado) do curso de Direito da Universidade Candido Mendes - Ipanema (licenciado). Professor da graduação e da pós-graduação do curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins - UBEC. Autor de artigos jurídicos com diversas participações em seminários e palestras.
[2] Informação fornecida pelo Portal G1 Tocantins, em matéria da data de 07 de abril de 2018, abordando sobre o quantum de presos no sistema prisional do Estado do Tocantins.
[3] Informação fornecida pelo Portal Uol Notícias, em matéria da data de 14 de dezembro de 2015, abordando acerca do sistema prisional brasileiro.
[4] Günther Jakobs é um importante jurista alemão, filósofo e professor de Direito Penal e Filosofia do Direito. Nascido em 26 de julho de 1937, em Mönchengladbach, Alemanha, é também autor de diversos livros, tendo se tornado mais conhecido através de seus conceitos sobre o funcionalismo sistêmico e o direito penal do inimigo.
[5] O Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP) é uma ferramenta criada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que permite o monitoramento das ordens de prisão expedidas pelo Judiciário, o controle do cumprimento das ordens de prisão e soltura em âmbito nacional e em tempo real, permitindo a criação de um Cadastro Nacional de Presos.
[6] Informação fornecida pelo Cadastro Nacional de Presos do BNMP, de agosto de 2018, acerca das características do perfil do preso brasileiro, p. 51 a 54.
[7] O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) é uma organização sem fins lucrativos que tem por missão atuar como um espaço permanente e inovador de debate, articulação e cooperação técnica para a segurança pública no Brasil.
[8] Informação fornecida através do infográfico da Segurança Pública em número 2018, p. 1.
[9] Informação fornecida através do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, p. 143.
[10] Informação fornecida pelo Portal Conexão Tocantins, em matéria jornalística do repórter Adenauer Cunha, na data de 11 de maio de 2018, relacionada a população carcerária do Estado do Tocantins
[11] O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é uma instituição pública que visa aperfeiçoar o trabalho do sistema judiciário brasileiro, principalmente no que diz respeito ao controle e à transparência administrativa e processual.
[12] Dados fornecidos pela 4ª Vara Criminal e de Execuções Penais da cidade de Palmas/TO.
[13] Informação fornecida pelo Cadastro Nacional de Presos do BNMP, de agosto de 2018, sobre os tipos penais mais recorrentes imputados às pessoas privadas de liberdade, p. 47.
Acadêmica do Curso de Direito da Faculdade Católica do Tocantins
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAVALCANTE, Liana Araújo Ribeiro. A superlotação na Casa de Prisão Provisória de Palmas/TO e o crime de tráfico de drogas: um reflexo da política de criminalização da pobreza à luz do direito penal do inimigo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 abr 2019, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52839/a-superlotacao-na-casa-de-prisao-provisoria-de-palmas-to-e-o-crime-de-trafico-de-drogas-um-reflexo-da-politica-de-criminalizacao-da-pobreza-a-luz-do-direito-penal-do-inimigo. Acesso em: 23 dez 2024.
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