RODRIGO SONCINI DE OLIVEIRA GUENA
(Orientador)
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar a influência que a mídia exerce sob o veredicto nos julgamentos do Tribunal do Júri, além de demonstrar o quanto a imprensa se contradiz com a sua própria finalidade ao disseminar informações impróprias sobre determinados fatos, em especial a influência nas convicções pessoais dos jurados, de modo equivocado, impedindo que o réu tenha um julgamento justo, eficaz e isonômico. Dessa forma, é imprescindível demonstrar no discorrer do artigo, os malefícios que o poder de persuasão que a mídia exerce podem acarretar, por meio de notícias levianas, inverídicas, capazes de induzir a sociedade, e ocasionar a violação de princípios constitucionais consagrados pela Constituição Federal, ao provocar um pré-julgamento precipitado do réu.
Palavras-Chave: Tribunal do Júri; Influência; Mídia; Jurados; Princípios.
ABSTRACT: The purpose of this article is to analyze the influence of the media under the verdict in the judges of the Jury, as well as to show how the press contradicts its own purpose by disseminating improper information about certain facts, especially the influence on the personal convictions of the jurors, in a wrong way, preventing the defendant from having a fair, effective and isonomic In this way, it is essential to demonstrate in the article the harms that the power of persuasion exercised by the media can lead, through frivolous, untrue news, capable of inducing society, and cause violation of constitutional principles enshrined in the Federal Constitution , by causing a precipitous pre-trial of the defendant.
Keywords: Jury court; Influence; Media; Jurors; Principles.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. TRIBUNAL DO JÚRI. 2.1. Composição do Tribunal do Júri. 3. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO JÚRI. 3.1. Plenitude de defesa. 3.2. Sigilo das votações. 3.3. Soberania dos veredictos. 3.4. Competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida. 4. A MÍDIA E A LIBERDADE DE IMPRENSA. 4.1. Conflito entre princípios constitucionais: princípio da presunção de Inocência versus liberdade de expressão. 5. INFLUÊNCIA DA MÍDIA NO PROCESSO PENAL. 6. A MÍDIA E O TRIBUNAL DO JÚRI. 6.1. A influência da mídia nas decisões dos jurados e seus efeitos. 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
Observando o cenário atual, torna-se cada vez mais evidente a força que a mídia e o seu poder de induzir e formar a opinião pública diante de todas as suas acepções, interferem de forma negativa ao juízo de valor nas decisões proferidas pelo Tribunal do Júri. Isto é, ultrapassam limites informativos, influenciando e manipulando fatos criminosos retratados.
Em suma, deixam de cumprir seus objetivos específicos, violando princípios assegurados dentro do Estado Democrático de Direito, principalmente quando estão relacionados aos crimes dolosos contra vida, consumados ou tentados, ou seja, aborto, homicídio doloso, induzimento, instigação ou auxílio a suicídio e infanticídio.
Logo, foi atribuída ao Tribunal do Júri a competência de julgar estes crimes, com o intuito de garantir um maior grau de democracia, de modo que o acusado é julgado por pessoas desprovidas, sem nenhum conhecimento jurídico, ou seja, leigas em conhecimento jurídico.
Tendo em vista que em determinados casos, à uma grande repercussão social, é notória a capacidade da mídia de intervir silenciosamente, com o propósito de se obter vantagem através de notícias sensacionalistas, uma vez que, o impacto causado, gera indignação e comoção diante da sociedade, assim, influenciando nas convicções pessoais, até mesmo de julgadores, podendo ocasionar um resultado desfavorável ao réu em seu julgamento no Tribunal do Júri.
Propõe-se a partir deste artigo, demonstrar a motivação da mídia ao fazer alegações sobre julgamentos criminais, persuadindo e prejudicando em aspectos determinantes, como a imparcialidade dos jurados e os julgamentos dos acusados, além de desrespeitarem princípios constitucionais imprescindíveis que este possui por direito.
Ao proferir sobre a instituição do Tribunal do Júri, percebe-se que esta é reconhecida e aplicada em quase todas as legislações do mundo. Atualmente, está prevista na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, XXXVIII, com disciplina legal contida nos artigos 406 a 497 do Código de Processo Penal, e foi alterada pela Lei 11.689/2008.
Entretanto, é importante ressaltar que para chegar até a legislação atual, foi percorrido um caminho longo, qual suas regras de julgamento, foram empregadas e aperfeiçoadas no decorrer da evolução humana.
No Brasil, o Tribunal do Júri foi disciplinado em 18 de junho de 1822, limitando a competência para julgar os crimes de imprensa, sendo este composto por juízes de fato e vinte e quatro cidadãos (bons, honrados, inteligentes e patriotas), de modo que julgariam os crimes de abuso da liberdade de imprensa. Todavia, suas decisões eram examinadas exclusivamente e minuciosamente pelo Príncipe Regente.
Logo, na Constituição Imperial de 1824, foi concedido ao Tribunal como órgão competente para julgar os crimes que lesavam determinados bens jurídicos, mais especificadamente os crimes contra a vida. No entanto, a proposta em instituir na esfera cível a atuação do Tribunal do Júri, esta por sua vez não subsistiu ao seu desempenho na prática, sendo deixada a sua ideologia de lado.
De acordo com Capez (2011, p.631), “alguns anos depois, foi disciplinado pelo Código de Processo Criminal, de 29 de novembro de 1832, o qual conferiu-lhe ampla competência, só restringida em 1824, com a entrada em vigor da Lei nº 261.”.
Posteriormente, o Júri esteve integrado em todas as constituições brasileiras, com exceção em 1937, de modo que este não foi incorporado no texto constitucional. Porém, mais tarde, foi restabelecida e regulamentada a instituição do Júri através do Decreto n. 167 de 1938, com finalidade de trazer para a sua organização, a competência e composição dos jurados, bem como, a sua restrição aos crimes dolosos contra vida.
Dessa forma, através da instituição do regime democrático no Brasil, houve a reiteração do Júri no capítulo dos direitos e garantias individuais na Constituição de 1946. E, por conseguinte, foi promulgada a Constituição Democrática da República Federativa do Brasil de 1988, entendendo assim o legislador constituinte para seus efeitos, a permanência da instituição do Tribunal do Júri, regulamentado no Título II, em seus direitos fundamentais, elencado-o no artigo 5º, inciso XXXVIII (BRASIL, 1988):
(...) é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;
Contudo, o Tribunal do Júri é reconhecido como um órgão especial do Poder Judiciário brasileiro, que integra a participação da sociedade diretamente nas decisões de caráter judicial e dispõe aos acusados, a garantia ao devido processo legal. Ademais, é de suma importância conduzir o julgamento de forma coerente, a contar da denúncia até a sentença final, sem sofrer qualquer influência externa por meio da imprensa à legitimidade popular perante o caso exposto.
Quanto à composição do Tribunal do Júri, este por sua vez será formado por homens e mulheres, com notória idoneidade, idade mínima de 18 anos, dispensados os maiores de 70 anos se assim desejarem. Para cada sessão de julgamento, será composto por um juiz-presidente, mais vinte e cinco jurados, sorteados aleatoriamente dentre os alistados conforme o artigo 447 do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941), sendo sete desses incumbidos para compor o Conselho de Sentença. Todavia, é necessário no mínimo a presença de quinze dos vinte e cinco sorteados, para a realização do sorteio.
É de responsabilidade exclusiva do juiz-presidente do Tribunal do Júri, a convocação dos jurados, inclusive, a acusação e defesa poderá acompanhar o momento da seleção, além de solicitar a exclusão de pessoas não aptas para a composição do júri, no entanto não poderão interferir diretamente na decisão da escolha.
Os princípios constitucionais são imprescindíveis para a proteção de valores fundamentais assegurados, e por esta razão, são invioláveis ao serem consagrados à condição de cláusula pétrea, visto que estes integram como um todo, a base do sistema legislativo.
Ademais, o Tribunal do Júri, abrange uma composição fundamental, prevista no Código de Processo Penal, no qual foi delegado pela Constituição Federal. E, à vista disso, é necessário que os princípios regidos sejam garantidos, em virtude de deterem regras de observância obrigatória, contidas no art. 5º, XXXVIII, da Constituição Federal de 1988, sendo estes: a plenitude de defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.
Menciona-se no artigo 5º, XXXVIII, alínea “a”, da Constituição Federal de 1988, o princípio da plenitude de defesa, que visa garantir ao réu a oportunidade de se defender de uma forma completa, e não unicamente ampla, devendo ser interpretada de maneira distinta do princípio da ampla defesa e do contraditório.
Nesse contexto, a plenitude de defesa tem por intuito conscientizar os jurados, só podendo ser utilizada no Tribunal do Júri. Além de dispor ao acusado maiores garantias, permite ao seu defensor, a oportunidade de formular e apresentar todos os argumentos possíveis que acreditar serem convenientes para o benefício do réu, com a intenção de convencer os jurados diante do caso concreto exposto.
Diante do fato, destaca Guilherme de Souza Nucci:
O que se busca aos acusados em geral é a mais aberta possibilidade de defesa, valendo-se dos instrumentos e recursos previstos em lei e evitando-se qualquer forma de cerceamento. Aos réus, no Tribunal do Júri, quer-se a defesa perfeita, dentro, obviamente, das limitações naturais dos seres humanos. (NUCCI, 2011, p.25).
Assim, as decisões do Tribunal do Júri quanto ao mérito, não poderão ser modificadas por outros tribunais togados, pois é soberano.
Consiste como garantia constitucional o princípio do sigilo das votações, previsto no art. 5º, XXXVIII, b, da Constituição Federal (BRASIL, 1988), assegurar a livre formação da convicção dos jurados ao proferirem o seu veredicto, sem pressões.
De acordo com Julio Fabbrini Mirabete:
A natureza do júri impõe proteção aos jurados e tal proteção se materializa por meio do sigilo indispensável em suas votações e pela tranquilidade do julgador popular, que seria afetada ao proceder a votação sob vistas do público. (MIRABETE, 2006, p.494).
Desse modo, determina o Código de Processo Penal, que estes serão encaminhados a uma sala especial, longe da visão do público presente no plenário do Júri, a fim de que possam promover justiça de forma justa, sem influências externas.
No entanto, não havendo sala especial, as votações ocorreram no salão da sessão do júri, devendo o público ser retirado do local, permanecendo apenas os permitidos por lei, com o objetivo de preservar a segurança dos membros do Conselho de Sentença.
O princípio da soberania dos veredictos dispõe das decisões coletivas emanadas pelo Tribunal do Júri, regulamentado ao procedimento do tribunal popular, qual consiste na impossibilidade de modificação da decisão proferida pelos jurados. Segundo Mirabete, trata-se de “condição indiscutivelmente necessária para os julgamentos realizados no Tribunal do Júri.” (MIRABETE, 2006, p.495).
É importante observar que a abrangência dessa garantia limita-se ao mérito da causa, isto é, outro órgão judiciário não poderá proferir outra decisão de mérito, qual substituiria a proferida pelos jurados. Entretanto, havendo decisão contrária à prova dos autos, desde que provocado, o juízo de origem (ad quo) poderá propor um novo julgamento, uma vez que é importante manter a integralidade do Júri, sendo este princípio uma condição fundamental.
Dispõe o artigo 74 do Código de Processo Penal, que a regulamentação da competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri (BRASIL, 1941).
Nesse sentido, no que concerne a competência do Júri, é importante ressaltar, que esta incumbe o julgamento dos crimes dolosos contra vida, em sua modalidade, tentada ou consumada, com exceção ao se tratar de prerrogativa de função.
Além disso, sua competência poderá ser estendida à outras infrações penais, desde que os crimes estejam conexos aos delitos contra a vida. Todavia, cabe ressaltar que havendo existência de morte, não necessariamente será considerado como status de crime doloso contra vida, como por exemplo o crime de latrocínio, pois não há que se confundir, visto que é um crime contra o patrimônio e não vai a Júri, ou seja, nos termos da Súmula nº 603 do Supremo Tribunal Federal, “a competência para o processo e julgamento de latrocínio é do juiz singular e não do tribunal do júri.”
Portanto, é certo dizer, que caberá ao Tribunal do Júri julgar os crimes de homicídio, o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, infanticídio e aborto em suas diferentes formas.
A Carta Magna brasileira ao tratar sobre a liberdade de imprensa, delineia com exatidão a íntegra liberdade de manifestação do pensamento. Por sua vez, um indivíduo tem a idoneidade de generalizar e acessar notícias ou informações através de todas as acepções dos meios de comunicação em massa.
Assim, nessa concepção, dispõe a Constituição Federal assegurar a liberdade de informação no que consiste o art. 5º, e incisos IV (liberdade de manifestação de pensamento); IX (liberdade de expressão) e XIV (acesso à informação), além do art. 220, §1º (liberdade de informação propriamente dita) (BRASIL,1988).
Todavia, é nítida a violação de princípios essenciais, juntamente ao envolvimento das informações conduzidas pelos meios de comunicação, arrolados a liberdade de imprensa, quais podem ocasionar imensuráveis danos ao direito de defesa e à presunção de inocência, e no que concerne à pretensão punitiva estatal e às garantias fundamentais, que equivalem à dignidade do indivíduo como um todo.
Deste modo, observa-se que em virtude do crescente desenvolvimento da sociedade, a população e a imprensa passaram a pleitear de forma mais precisa o direito à liberdade de expressão. Ademais, percebe-se que a mídia através de seus veículos de informações transmissíveis, em alguns casos ultrapassam limites de responsabilidade, corrompendo a ética, atuando de forma julgadora e esquecendo direitos e valores fundamentais que estão resguardados ao acusado.
À vista disso, embora a Constituição Federal de 1988 determine o cumprimento da função social de caráter informativo e assegure garantias as informações veiculadas pela mídia, de modo que estas sejam livres de censuras ou interdições, de acordo com o direito à liberdade de expressão previsto, observa-se que nos dias atuais a função social da imprensa e suas proposições éticas, vêm sendo constantemente deixadas de lado, em razão da busca por espetacularização e a dramatização por fatos violentos, com maiores índices de audiência, e como resultado, visam a obtenção de vantagens lucrativas através da publicidade.
Portanto, é importante destacar, que a liberdade designada à imprensa, não pode ser confundida com libertinagem, e desse modo é indispensável a instituição de limites a esta liberdade, de forma que seja empregado um método adequado e conveniente à sua própria função social deliberada, respeitando os dispositivos constitucionais, quais são taxados como a intimidade, honra, imagem, valores éticos e sociais.
É certo dizer que a mídia ganhou mais espaço no decurso do seu desenvolvimento progressista, direcionado aos meios de comunicação e por conseguinte, seu poder de persuasão estendeu, sendo possível visualizar com mais clareza o induzimento e a manipulação em massa, qual busca motivar a opinião pública, e consequentemente infringe, produzindo um resultado desfavorável para o acusado. Contudo, é de suma importância ressaltar o risco que pode gerar, bem como a perda da presunção de inocência (não culpabilidade), dado que o indivíduo passa a ser julgado e sentenciado pelo povo, ou seja, é presumido culpado por mera especulação midiática. Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria leciona em sua obra:
Um homem não pode ser considerado culpado antes da sentença do juiz; e a sociedade apenas lhe pode retirar a proteção pública depois que seja decidido que ele tenha violado as normas em que tal proteção lhe foi dada. (BECCARIA, 2009, p.66).
Logo, para o Tribunal do Júri acarreta conseqüências ainda maiores, haja vista, que possivelmente a formação das convicções pessoais dos jurados perante ao caso concreto são influenciadas de maneira negativa, pois acreditam na veracidade dos fatos transmitidos pela televisão, jornais e rádio, sem ao menos buscarem por informações verídicas.
Portanto, ao tratarem dos princípios constitucionais, fica claro que a imprensa desconhece a atividade jurisdicional, e nesse sentido, acabam por distorcer tais direitos fundamentais no instante em que são concedidos pelos magistrados aos réus, confundindo em alguns casos estes direitos com regalias e benefícios, e por conseguinte, a distorção do conteúdo influência diretamente a sociedade, formando opiniões de modo equivocado sobre o fato.
De fato, há algum tempo, os meios de comunicação perderam sua peculiaridade exclusivamente informativa e passaram-se a intentar através destes meios, obter vantagens lucrativas por intermédio de notícias sensacionalistas. Deste modo, percebe-se em massa, as conseqüências que esses fatores podem trazer, visto que descartam toda a codificação penal e processual penal brasileira, como também ferem princípios fundamentais assegurados pela Constituição Federal de 1988.
Nesse sentido, revela-se na prática um jogo de interesses, visto que constantemente ocasionam ao Poder Legislativo, situações adversas, com o intuito de criarem ou modificarem leis, através de influencias e cobranças, devido a mídia disseminar informações tendenciosas para a sociedade, que compadecida com as notícias sensacionalistas divulgadas, exigem posicionamentos das autoridades, com o objetivo de que assim atitudes sejam tomadas, através da elaboração de leis mais severas, e por conseguinte, os problemas pertinentes a violência e a criminalidade sejam sanados.
Logo, em decorrência da violação das garantias processuais praticadas pela mídia, acabam por sentenciar precipitadamente os envolvidos no delito, desrespeitando princípios constitucionais da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, bem como direitos à intimidade, à imagem e a honra, também consagrados constitucionalmente.
É inegável a força do sensacionalismo midiático e a presença de tal influência sob a atual sociedade contemporânea, em razão da sua capacidade de atingir fatores determinantes no âmbito criminal, através dos seus meios de comunicação, dado a sua preferência e atenção especial aos casos que estão correlacionados à crimes dolosos contra a vida, responsáveis por causarem comoção e despertarem anseio por justiça na sociedade.
Nesse ponto, observa-se que a mídia contribui através da propagação de notícias a disseminação do medo, podendo influenciar no processo de criminalização, afetando de certa forma o veredicto pleno, visto que a princípio, a sociedade entende que a “justiça” só será feita mediante condenações.
Contudo, não há como negar, a mídia possui um controle-social que incide na motivação de prejulgamentos, criando um estereotipo de criminoso, e consequentemente, a imagem do indivíduo criada ficticiamente por ela, acarreta na colisão de conflito entre a liberdade de expressão e o devido processo legal, uma vez que tal disposição não possui vínculo aos autos do processo.
Diante disso, é importante ressaltar determinado dispositivo previsto na Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LIII (BRASIL,1988), qual por sua vez assegura que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”, todavia, não é o que acontece na prática.
Em suma, temos exemplos de casos concretos que tiveram repercussão no país, como do “Goleiro Bruno Fernandes”, da “Suzane Louise Von Richthofen e os irmãos Daniel e Cristian Cravinhos de Paula e Silva”, o caso do “Alexandre Nardoni e sua esposa Ana Carolina Jatobá”, entre outros casos de competência do Tribunal do Júri, quais sendo apontados como réus, logo foram pré-condenados pela sociedade, antes mesmo de abancarem uma sessão do Tribunal do Júri, implicando assim em aspectos determinantes, relacionados a imparcialidade e decisão dos jurados, sendo estes responsáveis pela condenação ou absolvição dos réus.
Ao tratar sobre essa questão, nota-se o quanto fatores predominantes do Júri são atingidos pela força da influência negativa midiática, uma vez que o réu ainda sendo considerado suspeito, se torna “condenado” antecipadamente, como mencionado acima, e por esta razão, é possível observar a insegurança jurídica e impotência do réu, ocasionando a violação de direitos fundamentais. Fernanda Mendonça Graebin destaca:
Ocorre que, ultimamente, despir-se de preconceitos, pré-julgamentos e experiências anteriores tem sido um desafio diante dos noticiários apelativos transmitidos pela mídia sobre os crimes dolosos contra a vida. (MENDONÇA, 2013, p.377).
Fica evidente o quanto a mídia pode gerar transtornos no âmbito criminal, através da transmissão de notícias distorcidas acerca da legalidade, quais não condizem com a veracidade dos fatos, haja vista que a interferência midiática é algo difícil de se abster completamente. Nesse sentido, com a publicidade excessiva dos crimes de competência do Tribunal do Júri, isto é, os dolosos contra a vida, vemos que o comprometimento a imparcialidade dos jurados é duvidoso, uma vez que o Conselho de Sentença é composto por pessoas desprovidas e leigas de conhecimentos técnicos jurídicos, qual julgam em conformidade com o que lhe é mais conveniente, que entendem ser o certo.
Nesse sentido, é nítido que no tocante ao que diz respeito a materialidade e autoria do crime ponderado, a formação das convicções pessoais dos jurados ainda são influenciadas pela mídia, visto que possuem maior motivação em suas opiniões, do que as próprias provas produzidas do contraditório no processo. Ou seja, a retratação dos fatos de forma excessiva, publicadas amplamente pela mídia, possuem maior influência no convencimento dos respectivos membros do Conselho de Sentença, e não pelas alegações constituídas pela acusação e defesa, uma vez que, antes de estar na condição de jurado, juiz leigo, ele é um cidadão comum.
Assim, além dos jurados decidirem de acordo com a sua íntima convicção, estes estão sujeitos a serem pressionados pela opinião pública midiática e pela comoção social, em virtude dos crimes ocasionarem uma sensação de impunidade, trazendo para a população um anseio por vingança. No entanto, ao serem integrados a posição de jurado, estes devem decidir o mérito do processo com imparcialidade e imunidade ao que é imposto pela mídia e em relação a própria sociedade, devido ao exercício da função que foram incumbidos.
Foi instituída pelos legisladores, uma solução para garantir a seriedade do julgamento, prevista no artigo 427 do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941), sendo esta denominada como Desaforamento, qual permite que o julgado ocorra em outra comarca, com o intuito de evitar motivos que acarretem dúvidas sobre a garantia de um veredicto justo, isento e imparcial, bem como assegurar a integridade do acusado.
Ademais, isto só poderá ser garantido em crimes de repercussão local, uma vez que o sentimento de repulsa se torna nacional quando são noticiados pela imprensa em todo território brasileiro, sendo considerados casos de maior repercussão. Nesse sentido, a doutrina sugere a suspensão do processo até atenuar toda a exposição pública dos fatos que estão sendo noticiados pela mídia, por determinado tempo. Todavia, está medida de suspensão do processo, não soluciona o problema, tendo em vista que quando a data do julgamento marcado se aproxima, a imprensa relembra todo o cenário e abre novamente tal discussão diante da sociedade.
Portanto, o Conselho de Sentença ao proferir sua decisão, devem se ater no momento do julgamento, à provas conclusivas que foram apresentadas pela promotoria e defesa, e não à impressões disseminadas pela mídia, quais na maioria das vezes, tem por intuito manipular a sociedade e a decisão dos jurados, dado que o seu papel não é de julgar o suspeito, e sim apresentar fatos verídicos, com o objetivo de transmitir ao público a realidade.
Diante do presente estudo, buscou-se observar diversos pontos e efeitos que a influência da mídia nas decisões do Tribunal do Júri podem ocasionar, sendo possível a constatação da violação de princípios constitucionais regulamentados por lei, considerados imprescindíveis, embora ainda se reconheça o papel de suma importância que a imprensa exerce perante a sociedade contemporânea.
O Tribunal do Júri trás consigo, aspectos determinantes para o julgamento dos crimes dolosos contra vida, haja vista que este é composto por cidadãos do povo, pessoas desprovidas de conhecimento técnico jurídico, quais são incumbidas a função de julgar de acordo com sua intima convicção.
Sobretudo, nota-se que com o avanço dos meios de comunicação ao noticiar informações tendenciosas, de forma sensacionalista, ocasiona um problema que vêem se agravando cada vez mais atualmente, aumentando a capacidade de construir e induzir a opinião pública, e por esta razão, a imprensa contradiz com sua própria finalidade, que intencionalmente manipulam a população com o objetivo de obter vantagens lucrativas através da publicidade, principalmente fatos criminosos.
Portanto, em vista dos aspectos apresentados para o efetivo cumprimento da justiça, devem ser respeitados todos princípios e as garantias constitucionais previstas, logo a liberdade de imprensa não pode ter maior relevância que as garantias individuais, e nenhum direito deve ser considerado maior que o outro. É preciso ter consciência dos efeitos maléficos que tal influência midiática pode acarretar para o Tribunal do Júri, haja vista que é necessário um maior comprometimento de responsabilidade social exercido pela mídia.
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CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 18º. ed. São Paulo: Saraiva, 2011.
MELLO, Carla Gomes de. Mídia e Crime: Liberdade de Informação Jornalística e Presunção de Inocência. Revista de Direito Público, Londrina, v. 5, n.2, p. 106-122, ago. 2010. p. 107.
MENDONÇA, Fernanda Graebin. A má influência da mídia nas decisões do Tribunal do Júri - Anais do 2º Congresso Internacional de Direito e Contemporaneidade, 2013.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 22º. ed. São Paulo: Atlas, 2006.
NUCCI, Guilherme de Souza. Tribunal do Júri. 2º. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.
NUCCI, Guilherme de Souza. Princípios Constitucionais Penais e Processuais penais. 4º. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2015.
Bacharelanda em Direito pela Universidade Brasil - Campus Fernandópolis/SP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MONTES, Andressa Bispo. A influência da mídia nas decisões do Tribunal do Júri Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 maio 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52916/a-influencia-da-midia-nas-decisoes-do-tribunal-do-juri. Acesso em: 26 dez 2024.
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