SIBELE LETÍCIA RODRIGUES DE OLIVEIRA BIAZOTTO[1]
Resumo: Este trabalho versa sobre estudo diagnóstico do sistema carcerário da Unidade Prisional Feminina em regime fechado em Palmas mediante uma reflexão sobre a realidade da instituição. Atualmente estão cumprindo pena na UPF de Palmas 56 mulheres. Para mensurar os dados encontrados, organizou-se primeiramente a revisão bibliográfica de livros, sites, jurisprudência e artigos; posteriormente, realizou-se o campo empírico com coleta de dados por meio de uma abordagem quantitativa. Os resultados apontam a necessidade de novos olhares para a legitimação do sistema prisional feminino em Palmas/TO.
Palavras-Chave: Sistema Carcerário; Prisão Feminina; UPF Palmas/TO.
Abstract: This work is about a diagnostic study of the prison system of the Prison Women's Unit in a closed regime in Palmas through a reflection on the reality of this place. Currently they are fulfilling their sentences of the UPF of Palmas 56 women. In order to measure the data found, a bibliographic review of books, websites, jurisprudence and articles was organized, and the empirical field with data collection was carried out through a quantitative approach. Finally, the results point to the need for new perspectives for the legitimization of the prison system in Palmas.
Keywords: Prison System; Women's Prison; UPF Palmas / TO.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Mulheres no Sistema Prisional Brasileiro; 3. O perfil da mulher encarcerada na UPF – Palmas/TO; 4. Considerações finais; Referências.
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho consiste em uma reflexão acerca do sistema carcerário da unidade prisional feminina em regime fechado de Palmas/TO, com o intuito de proporcionar o olhar crítico sobre essa realidade.
Quando se discute o crime, logo os olhares se direcionam ao público masculino em detrimento ao feminino, o que faz com que se deixe de levar em conta uma realidade que precisa ser estudada. Assim, importante analisar como é a vida dessas mulheres que, por algum motivo, acabaram cometendo delitos que as levaram ao sistema prisional.
Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN[2], órgão do Ministério da Justiça, a população carcerária feminina cresceu 698% no Brasil em 16 anos. Do total de mulheres presas, 60% estão encarceradas por crimes relacionados ao tráfico, principalmente no que tange ao transporte e guarda de drogas. Desse total, 77% das presas afirmam que entraram no mundo do crime por influência ou indução do marido, namorado ou companheiro.
Esses dados apresentados em nível nacional são generalizados, no entanto existe em todas as unidades federativas reflexo do crescimento dessa população feminina nos presídios.
É relevante para a sociedade e a comunidade acadêmica terem conhecimento da difícil realidade dentro das unidades prisionais, assim como o poder público deve refletir sobre as consequências da falta de investimentos na melhoria desse sistema para promover ações voltadas para a não reincidência no crime.
Diante do exposto, esta pesquisa realizou estudo diagnóstico a respeito do sistema carcerário da Unidade de Prisão Feminina em Regime Fechado de Palmas – Tocantins (UPF). A Unidade fica localizada no bairro Taquaralto, em uma casa adaptada, com dois salões nomeados de “Latão” e uma ala chamada Carandiru, para onde se destinam presas provisórias ou aquelas reeducandas que tiveram mau comportamento. A casa contém vagas para aproximadamente 22 (vinte e duas) pessoas, mas atualmente (abril/2019) encontra-se com superlotação: 56 (cinquenta e seis) mulheres.
Neste estudo, buscou-se analisar o perfil dessas mulheres encarceradas por meio de metodologia baseada na abordagem quantitativa, que viabilizou a coleta de dados para obter informações para análise e discussão dos elementos disponibilizados pelas reeducandas que deram entrada na unidade nos últimos anos. Nesse sentido, extraíram-se especificamente dados referentes ao seu perfil no que tange à faixa etária, ao nível socioeconômico, ao grau de escolaridade, aos tipos penais que as levaram ao cárcere, ao estado civil, com quem ficaram os filhos e profissão.
Para tanto, primeiramente levantou-se o campo epistemológico de todas as referências que destacam o objeto de estudo, sendo eles: artigos, livros, sites e fontes oficiais, principalmente em pesquisas divulgadas no Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPE, Departamento Penitenciário Nacional e Mapa da Violência – DEPEN.
Seguidamente, o campo empírico é apresentado com os dados coletados por intermédio do Termo de Cooperação da Faculdade Serra do Carmo – FASEC e a Secretaria de Cidadania e Justiça – SECIJU. Com esses dados, foi possível realizar a pesquisa exploratória na Unidade de Prisão Feminina (UPF), por meio de entrevista com cada reeducanda, a fim de levantar o perfil das mulheres encarceradas.
Ressalta-se que é de grande relevância social adentrar nessas unidades prisionais para tornar público esse sistema invisível para as autoridades competentes (Estado) e para a sociedade.
A pesquisa está organizada em três seções. A primeira constitui-se nesta introdução, em que se delineiam objetivos, problemas, hipóteses, metodologia e organização do trabalho. A segunda seção traz referências da realidade das mulheres e o sistema presidiário feminino do Brasil e expõe os tipos penais que mais encarceram as mulheres e os motivos que as levaram a cometer tais crimes. A terceira, traz a análise dos dados e os resultados do foco deste trabalho, em que se levantou o perfil geral das reeducandas da UPF de Palmas/TO, com o fim de mostrar um pouco de sua realidade. Por fim, tem-se a conclusão e as referências utilizadas na pesquisa.
2 MULHERES NO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
Para falar sobre qualquer tema relacionado à mulher, faz-se necessário primeiramente compreender que há, na sociedade, relações de poder, dependência e sujeição, com base no gênero. A suposta supremacia do gênero masculino sobre o feminino sempre fez parte da cultura brasileira, que ainda é patriarcal.
Desse modo, Pinsky (2009, p.162) assevera que o gênero é automaticamente relacionado à “cultura e demonstra a construção que a sociedade faz das diferenças sexuais acerca daquilo que é masculino e daquilo que é feminino”. Diante desse aparente consenso a respeito do conceito de gênero, esse termo passou a ser empregado de diferentes maneiras pelos historiadores.
Uma simples retrospectiva histórica demonstra que a mulher na Antiguidade greco-romana era tratada como propriedade do seu senhor, não possuía direito algum, submissão reconhecida socialmente e exaltada. “Na Idade Média, continuava o pensamento de que a mulher era inferior ao homem, e mais, também poderia ser considerada como um demônio que o levava à perdição, conforme dogmas religiosos” (FRANCO JÚNIOR, 2001, p. 104).
A história apresenta uma relação entre os gêneros marcada por inúmeros discursos de legitimação, os quais exaltam a superioridade masculina e, ao mesmo tempo, fazem exclusão das mulheres da condição de titulares de direitos e de sujeitos ativos na sociedade.
O Brasil é um país democrático de direito, que, por meio da Constituição Federal de 1988, preconiza direitos fundamentais igualitários, como o direito à vida, educação, saúde, liberdade de crenças e expressão, segurança, liberdade, justiça, ao lazer, trabalho. Todos devem ser difundidos sem distinção de raça, gênero ou classe social.
Todavia essas conquistas referentes aos direitos humanos foram acontecendo na sociedade através dos tempos e, no que tange ao universo feminino, ocorreu mediante muita luta, sofrimento e desprezo por sua condição. Situação ainda comum em vários setores da sociedade, inclusive na área criminal.
Conforme França, (2014, p. 3), em relação à área criminal, a partir da década de 70, significativo estudo traz que a delinquência feminina passou a ter maior importância, “posto que o descaso com a condição de mulheres encarceradas era evidente e indicava a necessidade de mudanças no tratamento desse segmento que aumentava de forma assustadora”.
A contextualização histórica aporta que a busca incessante pela igualdade de direitos foi determinante, tanto nas esferas dos direitos fundamentais, sociais como no direito penal, não só para proteger a mulher, mas também no sentido de reconhecer suas peculiaridades e necessidades.
Diante do exposto, é necessário conhecer o perfil da mulher presidiária no Brasil para propor ações condizentes com suas demandas específicas. Isso porque, em relação à criminalidade feminina, também persiste sua invisibilidade para o sistema, visto que o sistema penal, as leis e a execução penal foram pensados para um parâmetro andrógeno.
É como se “as causas e consequências da criminalidade femininas fossem as mesmas do gênero masculino, visto que a mulher possui uma trajetória histórica de submissão aos homens no seio da sociedade” (ZANINELLI, 2015, p. 62).
Em diálogo com Zaninelli (2015), Santa Rita (2006, p. 41) aponta que há muitas interpretações para “justificar a menor participação criminal da mulher, como por exemplo, a socialização, a maior capacidade regenerativa, o menor uso de violência física”, a astúcia feminina e também o fato de a mulher estar mais inserida no mundo privado e doméstico, no qual predomina o sistema de controle informal.
Importante frisar que a mulher tem uma luta diária para ter a sua independência, e a exclusão devido à situação econômica, social, até mesmo devido à raça e nível de escolaridade acaba favorecendo que algumas mulheres entrem para a criminalidade.
Sobre isso, Pires (1985, p. 58) assevera que,
[...] embora a criminalidade não possa ser explicada pelo aumento da pobreza, é certo que amplas camadas voltadas para o crime jamais utilizariam esta forma de sobrevivência, se a sociedade fornecesse oportunidades mínimas para seu sustento.
No mesmo sentido, Salmasso (2004, p. 17) menciona que
A pobreza não é a única causa da criminalidade, apesar da forte associação entre a marginalidade e a criminalidade – facilmente derrubada mediante uma reflexão mais profunda – a criminalidade é um fenômeno que perpassa por toda a sociedade, seus segmentos, classes, faixas etárias etc.
Diante das citações dos autores, observa-se que, apesar de todos estarem expostos à criminalidade, a mulher está mais vulnerável na atualidade, pois grande parte das que se envolvem com delitos tem baixa renda, escolaridade e não conseguem se inserir no mercado de trabalho formal.
Ainda nesse diálogo epistemológico, Vergara (1998, p. 18) aponta que
A criminalidade também pode ser associada ao grau de integração social, pois a integração grupal, a estabilidade comportamental do mesmo, os controles informais à conduta, a pouca incidência de modificações estruturais violentas, bem como de seus componentes, ou ainda, a estabilidade generalizada dos membros em relação aos processos culturais e modos de ser sociais, contribuem de forma direta no cenário criminal.
Mediante esse contexto, percebe-se que a criminalidade feminina vem crescendo aceleradamente no País devido ao significativo papel que a mulher está desempenhando na sociedade, pois muitas assumem alguns papéis que antes eram realizados por homens, como o próprio sustento familiar.
A criminalidade feminina deve manter uma estreita relação com o enfoque social, ou seja, deve se observar, em primeiro plano, em qual meio social essas mulheres estão inseridas (área de trabalho, ambiente doméstico etc.); e, em um segundo plano, relevar “as condições biológicas e psicológicas que podem ou não contribuir para a incidência e o grau dessa criminalidade” (SALMASSO, 2004, p. 18).
Diante do aumento da criminalidade feminina, constata-se que ainda há pouco debate sobre o gênero feminino no sistema penal, sendo raras vezes formuladas políticas penais pensadas para as presas. Quando há, quase sempre são desenvolvidas ações destinadas às grávidas e lactantes, porém poucos são os projetos destinados a todo esse segmento como forma de atenção às suas especificidades e prevenção especial para que esse ciclo possa ser rompido.
O que mais ocorre nesses presídios femininos brasileiros são situações tristes, como exemplo que aconteceu em 2015[3] em uma unidade prisional do Rio de Janeiro: uma reeducanda com nove meses de gravidez estava isolada em uma cela e teve seu bebê no local sem assistência alguma. Assim como é comum elas darem à luz algemadas.
Partindo desse ponto, o Senado Federal instituiu a Lei n. 13.434/2017, que legitimou no parágrafo único do art. 292: “é vedado o uso de algemas em mulheres grávidas durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto e durante o trabalho de parto, bem como em mulheres durante o período de puerpério imediato” (BRASIL, 2017).
Em seu relatório sobre o projeto, a senadora Ângela Portela[4] destacou:
As mulheres em trabalho de parto detêm o direito constitucional de não sofrer qualquer tipo de violência, garantindo, portanto, sob todos os ângulos, sua dignidade. Nesse sentido, o uso de qualquer contenção, incluindo as algemas, antes, durante ou depois do parto da mulher presa, deve ser considerado como um grave constrangimento, além de uma violência institucional de natureza arbitrária.
Essa situação de mudar a realidade atual e todo o sistema prisional do Brasil é uma questão de direitos e não pode ser ignorada pelo Estado e pela sociedade brasileira, ainda mais quando o País possui a quinta maior população feminina encarcerada do mundo, segundo dados apresentados pelo Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN (BRASIL, 2018).
Pelos índices apresentados quanto ao encarceramento feminino, pode-se constatar que continuará a aumentar, caso não sejam propostas mudanças de atendimento a esse público, pois a miséria em que essas mulheres vivem e sua exclusão social não apontam para outro caminho senão esse.
Diante desse cenário, importante destacar alguns fatores de distinção entre homens e mulheres encarcerados.
As Regras de Bangkok determinam que as especificidades de gênero precisam ser devidamente observadas pelos gestores e membros do sistema de justiça.
Eles, por sua vez, devem priorizar todas as medidas alternativas à prisão nesses casos, e entender que um passo importante nesse processo é a compreensão de quem são essas mulheres, suas especificidades de gênero, por que elas estão no sistema de justiça e de que forma o cárcere incide sobre elas (BRASIL, 2016).
Diante do exposto, Fonseca, Braga e Silva (2017, p. 7) evidenciam que
A violência, a tortura psicológica e o descaso a que essas mulheres estão submetidas dentro do sistema de justiça fere esse princípio fundamental, inerente a todos os cidadãos e cidadãs. Também sinaliza os rastros de uma sociedade classista e racista, permeada por rituais históricos de violência e humilhação dessa parcela da população.
Além disso, existem fatores que diferenciam a mulher presa do homem preso, que são as questões voltadas à sensibilidade, às emoções, assim como questões fisiológicas, de maternidade e menstruação, sendo ela mais vulnerável ao cárcere. Esse lado emocional está atrelado a sua natureza fisiológica materna, que a entristece geralmente pela a ausência dos filhos e familiares, e a distância dos filhos ocasionada pela prisão. Esse é um dos fatores que faz com que as mulheres prefiram permanecer em estabelecimentos que permitam o acesso da família.
Essa narrativa fica clara quando Queiroz (2015), na obra “Presos que menstruam”, explicita vários casos de mulheres que foram presas e que necessitam do atendimento de seus direitos. Muitas entram no universo do crime devido ao lado emocional prevalecer e por serem levadas a sanar alguma situação familiar ou amorosa.
O sistema carcerário no Brasil está longe de responder às finalidades da pena, quais sejam de retribuir, prevenir e ressocializar. Nota-se que somente há a retribuição, mas não se estabelecem políticas que trabalhem a prevenção especial e a ressocialização para que os índices de reincidência diminuam. Isso ocorre no cárcere de homens e mulheres, no entanto as mulheres estão mais vulneráveis no que se refere ao sistema prisional Brasileiro.
Para entender melhor o universo das mulheres encarceradas, conhecer as circunstâncias de suas condutas criminosas é fundamental.
O cometimento de delitos normalmente era associado ao comportamento eminentemente masculino, mas essa situação se modificou nas últimas décadas.
E, para a verificabilidade dos fatores que levaram as mulheres a se envolverem com infrações penais, faz-se necessário analisar os fatores que contribuíram para a sua entrada no mundo do crime, o ambiente que as circundavam antes de serem presas.
Conforme Ishiy (2014, p. 41), a criminalidade é um fenômeno complexo que agrega uma série de variáveis que influenciam o seu funcionamento, sendo praticamente “impossível determinar um conceito de caráter universal que englobe tanto os diferentes aspectos e perspectivas de análise do desvio, quanto as dimensões estruturais, conjunturais e subjetivas do indivíduo”.
A realidade dos presídios femininos espalhados pelo Brasil divulgada rotineiramente pelas mídias mostram que os principais motivos que levam as mulheres ao cárcere são as relações íntimas afetivas, seja para dar alguma prova de amor ao parceiro, pai, tio, ou para a sobrevivência familiar (FONSECA; BRAGA; SILVA, 2017).
No entanto o cárcere feminino é basicamente esquecido no universo prisional. Prova disso está nos dados do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, que divulgou um processo de super encarceramento entre 2010 e 2015, em torno de um aumento da população prisional feminina de 567% (BRASIL, 2018). Mas não há investimento em unidades prisionais para as mulheres na mesma velocidade de seu encarceramento em massa.
Nessa estatística criminal, Soares (2002, p. 2) aponta que:
[...] mais de 95% das mulheres encarceradas foram vítimas de violência em algumas dessas situações: na infância, por parte de seus responsáveis; na vida adulta, por parte dos maridos; e quando presas por parte de policiais civis, militares ou federais.
Não obstante Soares dialoga com Espinoza (2004, p. 42) sobre o crime de maior incidência entre as mulheres presas – tráfico de entorpecentes. De fato, isso pode ser constatado em todos estados brasileiros.
A prisão de mulheres devido ao tráfico está ligada a vários fatores, mas chama a atenção de estarem normalmente em posições subalternas ou periféricas na estrutura do tráfico, tendo poucos recursos para negociar sua liberdade quando capturadas pela polícia.
Um dos fatores de destaque é o envolvimento com traficantes como usuárias para obter drogas, o que pode resultar em relacionamento afetivo e, aos poucos, são conduzidas para o universo do tráfico.
Elas atuam como coadjuvante, enquanto os protagonistas continuam sendo os homens, tendo em vista que a maioria que recebe grandes quantias em dinheiro sempre são os homens. Para as mulheres ficam os riscos do negócio.
Esse perfil é corroborado por pesquisas que indicam a mulher encarcerada brasileira como jovem, não branca, condenação direta ou indiretamente por tráfico de drogas, que não ocupa lugar de liderança na cadeia criminosa do tráfico, conforme Relatório Final da Secretaria de Políticas Para as Mulheres do Ministério da Justiça (BRASIL, 2018).
Assim, Soares (2002, p. 3) frisa que a maioria das condenações femininas são por “ilicitudes referentes a uso, tráfico de drogas ou formação de quadrilha ficando à frente de crimes violentos como: homicídio, infanticídio, lesão corporal, roubo, latrocínio, sequestro, extorsão, entre outros”.
O perfil da mulher encarcerada em Palmas, Tocantins, não está destoante do restante do Brasil, conforme se pode observar na seção seguinte.
3 O PERFIL DA MULHER ENCARCERADA NA UPF – PALMAS/TO
De acordo com o resultado da pesquisa na Unidade Prisional Feminina de Palmas/TO, foi constatado que o perfil das mulheres que entram no mundo do crime é generalizado, como: mães, sem estudo formal ou com pouco estudo na escola elementar, pertencente à camada financeiramente hipossuficiente e que, na época do crime, encontrava-se desempregada ou subempregada.
Percebe-se que essas mulheres têm em comum falta de estrutura familiar e problemas interligados com a fome, o analfabetismo, a corrupção e a extrema desigualdade social.
Para compreender o perfil das 56 (cinquenta e seis) apenadas, foi feita uma abordagem quantitativa, mediante alguns questionamentos voltados ao estado civil, à faixa etária, à escolaridade, à renda familiar e com quem deixaram seus filhos após o encarceramento.
No que tange ao estado civil, as respostas evidenciaram que, das presas que estão cumprindo suas penas em regime fechado na UPF de Palmas, 30 (trinta) são solteiras, 10 (dez) são casadas, 10 (dez) têm união estável, 5 (cinco) disseram outros e 1 (uma) é viúva. A grande maioria declarou ser solteira, o que representa 51% da população carcerária.
Sobre a faixa etária, 20 (vinte) tem entre 18 a 22 anos, 14 (quatorze) de 22 a 30 anos, 13 (treze) de 31 a 40 anos, 4 (quatro) de 40 a 50 anos e 5 (cinco) de 52 a 60 anos. Diante dos dados, observa-se que a idade apresenta um quadro jovial de presas com idade entre 18 a 22, representando 36%.
Além do estado civil e da faixa etária, fez-se necessário analisar a escolaridade das presas para saber o nível educacional. Assim, teve-se como resposta a esse quesito que2 (duas) têm o Ensino Superior Completo, 13 (treze) o Ensino Médio Completo,24 (vinte e quatro) têm Ensino Médio Incompleto, 14 (quatorze) Ensino Fundamental Completo do 6º ao 9º ano, 2 (duas) têm Ensino Fundamental do 1º ao 5º ano e 1 (uma) é analfabeta. No quesito escolar, 43% das encanceradas afirmam ter o Ensino Médio incompleto.
Ao averiguar-se existe alguma renda na família, observou-se que 25 (vinte e cinco) possuem uma renda de R$ 1.000.00 a R$ 2.000.00, 16 (dezesseis) de R$ 500,00 a R$1.000,00 e 15 (quinze) até R$ 500,00. Quanto à renda, 45% enfatizaram o valor de R$ 1.000,00 a R$ 2.000,00. Percebe-se que, apesar de estarem reclusas, a família sobrevive com as rendas mencionadas por elas.
Outro ponto importante para ser analisado consistiu em saber se as presas têm filhos. 100 % das presas declararam que sim. Dessas, os filhos estão com idades entre 1 a 45 anos de idade, conforme as afirmativas: 20 (vinte) têm de 1 a 6 anos, 4 (quatro) de 7 a 12 anos, 15 (quinze) de 13a 18 anos, 6 (seis) de 19 a 25 anos, 9 (nove) de 26 a 35 anos e 2 (duas) de 36 a 45 anos. As presas que correspondem a 42% têm os filhos na faixa etária de 1 a 6 anos.
Assim, contextualizou-se que muitas dessas mulheres são mães, e depois da privação da liberdade ocorreu a necessidade de deixarem os filhos sob a responsabilidade de outra pessoa.
Nesse sentido perguntou-se a quem elas tinham delegado a responsabilidade de cuidar dos filhos, e as respostas foram: 29 (vinte e nove) deixaram os filhos com as avós, 8 (oito) com amigos, 9 (nove) com os pais, 10 (onze) com os tios. As avós geralmente são os parentes mais próximos que ficam com a responsabilidade dos cuidados dos netos na fase em que as mães estão presas, ficando perceptível quando 52% expuseram essa resposta.
Houve também necessidade de se analisar o tipo penal que determinou a privação da liberdade das mulheres da UPF de Palmas. As informações demonstraram que o índice de maior de crimes efetivados pelas mulheres são: 41 (quarenta e um) por tráfico, 9 (nove) por homicídios, 3 (três) por roubo e 3 (três) por furto. O tráfico foi o crime com maior porcentagem entre as reeducandas, o que corresponde a 66%.
Assim como os homens, as mulheres também praticam inúmeros crimes, entretanto os dados apontam uma grande prevalência relacionada ao tráfico de drogas.
Diante dos dados analisados do perfil das presas que cumprem suas condenações na UPF de Palmas/TO, conclui-se que são mulheres jovens, solteiras, que têm uma escolaridade com o Ensino Médio Incompleto, com renda familiar entre R$ 1.000,00 a R$ 2.000.00, no qual os filhos estão com as avós.
As afirmações atinentes nessa coleta de dados nos apresentam mulheres com um perfil de vulnerabilidade socioeconômica, o que pode ter sido determinante para que elas entrassem no mundo do crime e fossem reclusas na Unidade Prisional de Palmas.
Ademais, essa hipótese se encontra pautada na relação existencial do capitalismo com a sobrevivência na sociedade, pois existe preconceito e discriminação com mulheres de baixo nível de escolaridade em comparação com aquelas que tiveram educação e acesso à cultura. Esses fatores acabam se tornando molas propulsoras para a entrada no mundo da criminalidade e efetivação de delitos relacionados com o tráfico de drogas.
Diante desse cenário, faz-se necessária nova configuração do sistema de justiça criminal, com olhar voltado ao universo prisional feminino, em que sejam garantidos seus direitos e observadas suas peculiaridades. Para tanto, precisa haver uma modernização nas políticas públicas para os presídios femininos. Trata-se de um desafio para a proteção dos direitos humanos dessas mulheres que estão no atual cenário penitenciário penal.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante da realidade mostrada pela parte epistemológica deste trabalho, podemos concluir que o sistema prisional feminino no Brasil infelizmente é falho.
A realidade demonstra que as mulheres nesse universo prisional voltado somente para o gênero masculino não têm o atendimento mínimo de suas necessidades singulares, ou seja, o sistema esquece de que as presas precisam de itens essenciais para a própria dignidade do gênero.
O quadro prisional da UPF – Palmas/TO apresenta mulheres jovens, que são mães, solteiras em sua maioria, e foram condenadas por envolvimento com tráfico de drogas (ou entorpecentes). Devido à privação de liberdade, deixaram seus filhos com avós, e que, apesar do estado em que se encontram, algumas deram continuidade nos estudos ofertados pela própria unidade prisional, visto que, os dados da coleta apontaram que ainda existem mulheres com ensino médio incompleto, ensino fundamental do 6º ao 9º ano, ensino fundamental de 1º ao 5º ano e analfabeta.
Para receber essas mulheres privadas de liberdade, existe a sua espera um sistema encarcerador punitivo e mesclado por uma série de problemas operacionais, legais e extralegais para efetivação do processo de aprisionamento. Muitas vezes ocorre violação processual, que se soma às violações físicas, legais e morais constantes do sistema prisional, em que a violência e o descaso parecem ser inerentes à estrutura ou à ação dos seus operadores. Além das consequências físicas e psicológicas do encarceramento, as consequências extramuros da prisão dessas mulheres são catastróficas.
Apesar de estarem privadas de liberdade, são pessoas que necessitam ver seus direitos preconizados nas leis efetivados, principalmente os que levariam ao cumprimento das finalidades de pena de prevenção especial e ressocialização, como estudo e trabalho.
Assim, conclui-se que ainda há muito a ser feito pelo Estado nesse segmento social para que haja a reinserção das mulheres aprisionadas após o cumprimento de sua pena, e mais ainda para que não adentrem no sistema carcerário e diminua a reincidência.
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[1] Professora de Direito Penal, advogada criminalista. Orientadora do Trabalho de Conclusão do Curso da Faculdade Serra do Carmo. E-mail: [email protected]
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[3]Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/10/presa-que-teve-filha-em-cela-surtou-por-nao-tomar-remedio-diz-familia.html>. Acesso em: 4 maio2019.
[4] Disponível em: <https://camilavazvaz.jusbrasil.com.br/noticias/344268350/ccj-aprova-proibicao-de-algemas-nas-presas-em-trabalho-de-parto>. Acesso em: 4 maio2019.
Graduanda do Curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Samara de Jesus Bispo. Estudo diagnóstico do Sistema Carcerário da Unidade Prisional Feminina em regime fechado de Palmas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jun 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52999/estudo-diagnostico-do-sistema-carcerario-da-unidade-prisional-feminina-em-regime-fechado-de-palmas. Acesso em: 23 dez 2024.
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