Resumo: Este trabalho tem como finalidade de estudo uma análise sobre a aposentadoria especial no âmbito dos regimes próprios de previdência social, uma vez que a concessão das aposentadorias especiais encontra-se prejudicada por ausência de regulamentação para os segurados portadores de deficiência física, para os que exerçam atividade de risco, bem como para os servidores cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Pretende-se verificar qual a melhor a melhor solução jurídica para a concessão das aposentadorias especiais, dada a judicialização da matéria nos tribunais em razão da ausência de regulamentação por lei complementar específica. Dessa forma, este trabalho tem como finalidade de estudo uma análise sobre a constitucionalidade das leis que se omitem acerca das aposentadorias especiais no âmbito dos regimes próprios de previdência social. A partir de uma pesquisa bibliográfica e documental, no desenvolvimento do texto a pesquisa se estruturou fazendo primeiramente uma análise sobre as formas de aposentadorias especiais prevista na constituição. Posteriormente, foi analisada a competência concorrente dos estados, municípios e DF para legislarem sobre a matéria, sua conceituação e disposição dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Após, foi feita uma análise sobre o posicionamento dos tribunais superiores acerca da matéria, bem como uma apreciação doutrinária, constitucional e jurisprudencial. Busca-se concluir que os entes devem exercer a competência concorrente prevista no art. 24 da CF/88.
Palavras-chave: Aposentadoria Especial; Regimes Próprios de Previdência Social; RPPS; Súmula Vinculante n° 33; Servidor Público.
Sumário: Introdução. 1. Noções gerais sobre RPPS. 1.1 Princípios Constitucionais. 1.2. Aproximação entre os regimes previdenciários. 2. Das aposentadorias especiais previstas na constituição. 2.1 Competência legislativa concorrente sobre aposentadoria especial 3. Análise jurisprudencial sobre aposentadoria especial no STF e STJ. Considerações finais. Referências.
INTRODUÇÃO
As aposentadorias especiais para os segurados dos RPPS portadores de deficiência física, para os que exerçam atividade de risco, bem como para os servidores cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física encontram-se na Constituição Federal em seu art. 40 § 4° no Regime Geral de Previdência Social - RGPS o direito se encontra regulamentado pela lei 8.213/91 em seus artigos 57 e 58 que versam sobre aposentadoria especial dos trabalhadores em geral e na Lei Complementar 142/2013 para os deficientes físicos.
Ocorre que, nos RPPS que se destinam a servidores públicos titulares de cargos efetivos, vinculados a ente federativo onde exista RPPS, passadas mais de três décadas desde a promulgação da constituição o referido dispositivo ainda não apresenta nenhuma regulamentação, exceto no caso dos professores e policiais civis. Assim, a supramencionada lacuna legislativa vem desencadeando uma judicialização enorme da matéria, uma vez que os segurados dos RPPS que perfazem direito a aposentadoria especial por se enquadrarem dentro das hipóteses do art. 40 § 4° da Constituição Federal procuram o judiciário com objetivo de terem suas aposentadorias concedidas judicialmente, visto que na esfera administrativa não é possível a concessão por ausência de lei específica que trate da matéria, pois o artigo 40 § 4° da CF é norma de eficácia limitada, segundo entendimento do STF.
O Supremo Tribunal Federal, ante a mora do legislativo em tratar da matéria e a judicialização, bem como diante dos diversos Mandados de Injunções, editou em 2014 a Súmula Vinculante n° 33 dispondo da aplicação das regras do RGPS aos segurados dos RPPS na hipótese do inciso III, § 4 do artigo 40 da Constituição que trata da aposentadoria especial aos que exerçam suas atividades exposto a agentes nocivos ou sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, até edição de lei complementar específica.
Entretanto, a edição da referida súmula vinculante encontra-se bem distante de solucionar a questão, visto só tratar da hipótese dos servidores que trabalham expostos a agentes nocivos, não amparando as aposentadorias especiais dos servidores que exercem atividade de risco e deficientes. Não obstante, há diversas controvérsias envolvendo a aplicação da Súmula Vinculante n° 33 no tocante a conversão do tempo exercido em condições que prejudiquem a saúde ou integridade física em tempo comum para averbação de tempo de contribuição para fins de aposentadoria, visto que o STF ao apreciar o Mandado de Injunção 2140 decidiu que não é possível haver contagem diferenciada de tempo especial para averbação de tempo de contribuição de servidores públicos que trabalham em contato com agentes nocivos, apesar de tal hipótese ser possível no RGPS.
1. NOÇÕES GERAIS SOBRE RPPS
Os Regimes Próprios de Previdência Social – RPPS são destinados aos servidores públicos titulares de cargo efetivo na União, Estados, Municípios e Distrito Federal, possuindo previsão na Constituição de 1988 em seu art. 40. Destinam-se também aos servidores que entraram no serviço público antes da constituição e encontram-se exercendo cargo público. Dias e Macêdo ensinam que a constituição proíbe a extensão de regime próprio apenas aos que ocuparem exclusivamente cargo em comissão sem vínculo efetivo com o ente público, e aos titulares de cargos temporários e empregados públicos (2012, p. 20).
Neste sentido, os servidores que foram estabilizados pelo artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT, mas não efetivados por meio de concurso público, bem como os que ingressaram no serviço público sem concurso após 05.10.1983 e antes do advento da Emenda Constitucional 20/1998 denominados pela doutrina “não estabilizados” também pertencem aos regimes próprios de seus respectivos entes, desde que estes tenham optado por instituir um regime próprio, visto não haver obrigatoriedade aos entes instituir RPPS, hipótese em que se aplica o RGPS a todos os servidores, consoante determinação do artigo 13 da lei 8212/91. Segundo Goes preleciona (2018, p. 19):
A União, o Distrito Federal e todos os estados da Federação já possuem Regime Próprio de Previdência Social. Assim, os ocupantes de cargo efetivo da União, do Distrito Federal e dos estados são amparados por regime próprio, por tanto não são segurados do RGPS. Mas há vários municípios que não possuem regime próprio de previdência. Assim, os ocupantes de cargo efetivo dos municípios podem ou não ser amparados por Regime Próprio de Previdência Social. Se o município possuir regime próprio, os seus servidores ocupantes de cargo efetivo serão amparados por este regime e, por seguinte ficam excluídos do RGPS. Mas se o município não possuir regime próprio, os seus servidores ocupantes de cargo efetivo serão segurados obrigatório do RGPS.
Cumpre destacar que os RPPS também se destinam detentores de cargos vitalícios como juízes e membros do Ministério Público, por expressa previsão constitucional contida nos artigos 93, VI e 129 § 4° CF de 1988.
Neste contexto, não existem leis que obriguem os entes a instituírem RPPS para seus servidores. Há um entendimento doutrinário de que é uma facultatividade dos entes instituírem RPPS e não uma obrigatoriedade. Assim também entende a Secretaria da Previdência do Ministério da Fazenda (2016, Brasil):
Pela resposta da pergunta anterior, podemos entender que os entes federativos não são obrigados a instituírem seus regimes próprios, sendo facultativa tal opção? R - Exatamente. No Brasil, a união tem o regime próprio para os seus servidores e Estados também. Já em relação aos municípios, existem muitos que não instituíram regimes próprios. Desta forma, os servidores titulares de cargos efetivos dos municípios que não optaram por um regime próprio, são vinculados obrigatórios do regime geral de previdência social (INSS).
Por outro lado, convém destacar o entendimento de Rosana Cólen (2016, p. 61):
O caput do artigo 40 da CF/88 garante este direito, não fazendo nenhuma ressalva, nem deixando margens para interpretações diversas. A Constituição diz que é assegurado, não que é facultado ao servidor, regime de previdência de caráter contributivo e solidário, com a observância das normas estatuídas pelo citado artigo 40. Em tomo próprio defendemos essa tese, ressaltando que o direito a um regime próprio de previdência é um verdadeiro princípio da previdência pública [destacou-se]. E quando se fala em regime próprio, deve ser entendido como o regime autossustentável, que se mantém equilibrado financeiramente e atuarialmente. O servidor público tem o direito inconteste de ter seus benefícios previdenciários garantidos pelo Poder Público, com total respeitabilidade pelo tempo em que se manteve ativo na Administração Pública. É o servidor público os músculos e os ossos da máquina administrativa. É ele quem impulsiona essa máquina, é a mola propulsora. A garantia de um regime próprio de previdência de forma com solvabilidade, liquidez e higidez dos fundos é um direito irrefreável.
O artigo 12 da lei 8.213/91 dispõe que aos servidores titulares de cargo efetivo é assegurado o direito a pertencer ao Regime Geral caso o ente ao qual é vinculado não tenha instituído regime próprio. É importante frisar que o legislador não deve impor aos entes a obrigatoriedade de instituir Regimes Próprios, pois a instituição do mesmo se submete aos dispositivos da lei 9.717/98 que regulamenta a Previdência Pública. Dias e Macêdo sustentam que não seriam todos os entes federativos que conseguiriam instituir Regimes Próprios, principalmente os municípios, uma vez que teria que ser garantido o equilíbrio financeiro e atuarial nos moldes da lei 9.717/98 (2012, p. 11).
Neste contexto, conclui-se que caso existisse uma norma obrigando a instituição de Regime Próprio visando garantir uma maior proteção aos servidores, poderia em verdade prejudicar, tendo em vista que alguns municípios não possuem receitas suficientes para instituição de um Regime Próprio.
1.1 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
Os princípios Específicos da Seguridade Social estão elencados no artigo 194, § único da CF. Sendo estes: Universalidade da Cobertura e do Atendimento, Uniformidade e Equivalência dos Benefícios, Seletividade e Distributividade, Irredutibilidade do Valor do Benefícios, Equidade na Forma de Participação no Custeio, Diversidade da Base de Financiamento e Caráter Democrático e Descentralizado da Administração, estando os regimes próprios submetidos a todos os princípios que regem a seguridade social por ser parte desta.
Entretanto, o princípio mais importante da seguridade social é o princípio da solidariedade artigo 3, inciso I, da CF, apesar de não ser específico da seguridade social, merece mais atenção, pois através dele que se permite a proteção coletiva e não isolada dos segurados. Dias e Macêdo mencionam que o princípio da solidariedade é o vetor de todo o sistema da seguridade social, funcionando como uma bússola, aplicável na interpretação das suas normas. (2012, p. 99).
A solidariedade nos regimes próprios após a Emenda Constitucional n° 41/2003 ficou ainda mais presente ao prever a contribuição dos servidores inativos e pensionistas, sendo aplicado sobre os proventos de aposentadorias e pensões que superem o teto dos beneficiários do RGPS. Deste modo, todos os sujeitos vinculados aos regimes próprios contribuem para sua manutenção. Segundo Kertzman (2015, p. 53):
Pode-se defini-lo como o espírito que deve orientar a seguridade social de forma que não haja, necessariamente, paridade entre contribuições e contraprestações securitárias. Através dele, tem-se em vista, não a proteção de indivíduos isolados, mas de toda a coletividade. Este princípio pode ser analisado sob a ótica horizontal ou vertical. Horizontalmente significa, representa redistribuição de renda entre as populações (pacto intra-geracional) e verticalmente significa que uma geração deve trabalhar para pagar os benefícios das gerações passadas (pacto inter-geracional). […] A solidariedade do sistema previdenciário obriga contribuintes a verterem parte de seu patrimônio para o sustento do regime protetivo, mesmo que nunca tenham a oportunidade de usufruir dos benefícios e serviços oferecidos. Este princípio permite que os segurados, bem como seus dependentes nos RPPS possam adquirir um benefício de caráter vitalício, ainda que as contribuições realizadas se somadas não perfaçam o valor do benefício a ser adquirido pelo próprio segurado em se tratando de uma aposentadoria por invalidez, ou pelos seus dependentes como é caso das pensões por morte aos cônjuges e descentes.
Este princípio permite que os segurados, bem como seus dependentes nos RPPS possam adquirir um benefício de caráter vitalício, ainda que as contribuições realizadas se somadas não perfaçam o valor do benefício a ser adquirido pelo próprio segurado em se tratando de uma aposentadoria por invalidez, ou pelos seus dependentes como é caso das pensões por morte aos cônjuges e descentes.
1.2 APROXIMAÇÃO ENTRE OS REGIMES PREVIDENCIÁRIOS
Como já discorrido anteriormente, a aposentadoria especial nos RPPS encontra previsão na constituição trazida pela Emenda Constitucional n° 47 que modificou o artigo 40, paragrafo IV da carta magna, onde estabelece que fica vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadorias com critérios diferenciados aos servidores públicos, exceto para os casos dos servidores portadores de deficiência, servidores que exerçam atividade de de risco e que exerçam atividade sob condições insalubres que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
No RGPS a previsão constitucional para as aposentadorias especiais aos seus segurados estão elencadas no artigo 201 da CF que dispõe:
Art. 201 – [...]
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar.
Neste sentido, vislumbra-se a tendência do legislador de unificar os regimes previdenciários para visando estabelecer o equilíbrio financeiro e atuarial, o STF na apreciação dos diversos mandados de injunções tem assim se posicionado sobre as controvérsias, uma vez que não raras vezes decide sempre pela aplicação das regras do RGPS aos segurados do RPPS acerca das controvérsias, exemplo de tal posicionamento tem-se a súmula vinculante n° 33 onde o STF decidiu que aplica-se no que couber, as regras do RGPS sobre aposentadoria especial prevista no inciso III do paragrafo 4° do artigo 40 da CF, o qual trata da aposentadoria especial dos servidores que exercem atividade sob condições que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
É importante, então, que haja harmonização entre as regras estabelecidas no RGPS e RPPS, para que seja possível a devida aproximação entre os regimes previdenciários, de forma a garantir a ambos os segurados um tratamento justo e igualitário, considerando as diferenças existentes em cada espécie de segurado, pois a aproximação deve ser equitativa para então torna-se justa.
2. DAS APOSENTADORIAS ESPECIAIS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO
As aposentadorias especiais são direitos dos trabalhadores que trabalhem em condições inadequadas, ou que possuam alguma necessidade especial em razão de alguma deficiência, concedendo aos trabalhadores redução no tempo de contribuição para que entre em inatividade mais cedo que os trabalhadores que não possuem tais necessidades, estão previstas na constituição elencadas no artigo 40 § 4° sendo estas: dos trabalhadores que sejam portadores de deficiência, que exercem atividades de risco, que trabalhem expostos a agentes nocivos que prejudiquem a saúde ou integridade física. Conforme Martinez (2016, p. 22) assevera:
A reforma previdenciária iniciada em 1995 trouxe à luz a necessidade de reexaminar-se o significado protetivo, a contingência coberta e o sentido da aposentadoria especial. De certo modo, tem-se como assente tratar-se de uma reparação social pela exposição aos agentes nocivos ou possibilidade de risco de prejuízos à saúde ou integridade física do servidor, distinguindo-a da aposentadoria por tempo de contribuição e da aposentadoria por invali- dez em razão do sinistro (que é o risco). Sua semelhança com aquela última prestação por incapacidade indica que também deva obstar a volta do traba- lho, principalmente quando na mesma área de risco.
Nota-se que o autor ao definir o conceito de aposentadoria especial, deixou de fora os portadores de deficiência, pois para o autor esta seria independente por ser ter sido inserida na constituição antes das aposentadorias especiais propriamente ditas. Porém, Kertzman (2015, p. 564) preleciona:
De acordo com o § 4°, do art. 40, da constituição federal de 1988, é vedada a adoção de critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria nos Regimes Próprios de Previdência Social, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos dos servidores: I – portadores de deficiência; II – que exerçam atividade de risco; III – cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. O texto constitucional prevê, então, três, hipóteses para a concessão de aposentadoria especial, dependendo, no entanto, de regulamentação por lei complementar [destacou-se].
Aposentadoria especial é aquela que adota requisitos e critérios diferenciados para sua concessão. Neste diapasão, a aposentadoria do deficiente físico deve ser tratada como uma das formas de aposentadoria especial, pois a constituição no artigo 40, § 4°, inciso III, desta forma a conceitua ao dar aos segurados portadores de deficiência o direito de se aposentarem mais cedo em face das condições em que se encontram no ambiente de trabalho, visando conferir aos portadores de deficiência condições justas de aposentadoria com tempo reduzido em diante dos demais servidores que possuem plena capacidade de trabalho.
Atualmente para a concessão das aposentadorias aos servidores públicos deficientes o STF vem decidindo nos mandados de injunções que aplica-se as regras contidas na lei complementar 142/2013 que regulamenta a aposentadoria do deficiente no Regime Geral de Previdência Social até edição de lei regulamentadora específica.
Pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, tais conceitos foram trazidos pela Convenção de Nova York que encontra-se incorporada no nosso ordenamento jurídico com força de Emenda Constitucional, considerando que trata-se de convenção sobre direitos humanos, sendo este conceito utilizado pela lei 142/2013 para definir quem são os deficientes físicos que possuem direito a aposentadoria especial.
No tocante ao direito de aposentadoria especial aos trabalhadores que exercem atividade de risco com previsão no artigo 40, § 4, inciso III, sendo consideradas atividades de risco aquelas cujo execício representarem perigo para a vida do agente público, como é caso da atividade policial. Recentemente no julgamento dos mandados de injunções 6770, 6773, 6780 e 6874, o STF vem permitindo a aplicação da Lei Complementar 51/1985 que regulamenta a aposentadoria especial dos policiais civis, aos guardas municipais por considerar tal atividade como atividade de risco. Kertzman (2015, p. 565) concorda com o posicionamento:
Já para o caso de exercício de atividade de risco, entendemos que a melhor solução seria a aplicação da norma relativa à aposentadoria voluntária do policial, prevista na Lei Complementar 51/85, quando os riscos forem semelhantes. De acordo com esta norma, o policial pode aposentar-se voluntariamente, com proveitos integrais, após 30 anos de serviço, desde que conte com pelo menos 20 anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial. Com isso, as idades de 60 anos, homens e de 55 anos, mulheres não seriam aplicáveis no caso de atividade de risco, bastando possuir o tempo exigido.
Mostra-se, assim, que as lacunas legislativas estão sendo supridas pelo judiciário ante a mora do legislativo, tendo como consequência uma enorme judicialização da matéria. Diante da falta de regulamentação não se tem um conceito específico do que seriam as atividades de risco, ficando a critério do julgador analisar cada caso em separado para a concessão ou não dos critérios diferenciados nas aposentadorias dos servidores que exercem atividade de risco. Foi assim que o STF ao julgar os mandados de injunções 833 e 844 ajuizados por servidores federais e membros do ministério público, indeferiu entendendo que tais atividades não são de risco.
A aposentadoria especial dos servidores que são exposto a agentes nocivos que prejudiquem a saúde ou integridade física é concedida aos servidores que laboraram durante 25 anos de trabalho permanente, profissionais como médicos, dentistas, enfermeiros e outros servidores que venham a exercer suas atividades nas condições supracitadas pelo inciso III do parágrafo 4 do artigo 40 da CF.
Nesta modalidade o entendimento já encontra-se consolidado, uma vez que a edição da Súmula Vinculante n° 33 pacificou o direito a concessão desta modalidade, exceto, no que diz respeito a contagem do tempo e conversão do tempo especial em comum, direitos esses existentes no Regime Geral, onde o funcionário que exerce atividades em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, que trabalhe durante 20 anos nas referidas condições e trabalhe mais 8 anos sob condições comuns, não possui direito no sentido de seu tempo de trabalho em caráter especial seja contado de forma diferenciada, tendo em vista que o STF entende que é indevida a contagem de tempo fictícia para concessão de aposentadoria especial de servidores expostos a gentes nocivos. É importante frisar que a comprovação do exercício de trabalho em condições especiais para que sejam levadas em consideração na concessão da aposentadoria especial deve ser dar de forma específica com apresentações de uma série de documentos. Como Leitão (2015, p. 833) bem pontua:
Ora, se, para suprir a inércia legislativa a respeito da aposentadoria especial do servidor público, o STF determinou a incidência da lei n° 8213/91 no regime próprio (MI 721–7 e 758-6), impõe-se a aplicação integral dessa disciplina normativa arts. 57 e 58 da Lei n. 8.213/91). Caso contrário, está-se a criar um subsistema híbrido de aposentadoria especial. Também não merece prosperar o argumento de que o art. 40, § 4°, III, da CF/88 limita-se a consagrar o direito subjetivo à aposentadoria especial (e não o direito à conversão de tempo especial). Primeiro porque a CF/88 não dispõe expressamente sobre a “aposentadoria especial” e, sim sobre a possibilidade excepcional de “adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão da aposentadoria”, o que é plenamente compatível com o direito a contagem diferenciada. Ademais, a redação do art. 201, § 1° da CF/88, fundamento constitucional da aposentadoria especial do RGPS, também não prevê expressamente a conversão de tempo especial em comum. […] Não há razoabilidade na tese que garante um tratamento jurídico díspar a situações fáticas idênticas.
Com a edição da Súmula Vinculante n° 33 o STF reconheceu a judicialização da matéria, porém, como já foi mencionado a questão das aposentadorias especiais dos servidores amparados ainda não foi pacificada, pois carece de lei regulamentadora, lei esta que nunca foi sancionada.
2.1 COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE SOBRE APOSENTADORIA ESPECIAL
Apesar de conter expressamente no artigo 24, inciso XII a possibilidade dos entes legislarem sobre aposentadoria especial, tendo em vista a sua competência concorrente, a lei 9717/1998 em seu artigo 5° § único dispõe que fica vedada a concessão de aposentadoria especial, até que lei federal regulamente a matéria. Dias e Macêdo (2012, p.17) apud Cavalcanti (1999, p.54) mencionam:
A constituição Federal não atribui competência legislativa à União Federal para estabelecer normas gerais acerca dos Regimes Próprios de Previdência Social dos outros entes políticos da Federação: “não pode a união federal estabelecer regras gerais do sistema de seguridade social dos servidores de outros entes Políticos da Federação pois a Constituição não lhe atribui essa competência. Os limites para gastos com pessoal inativo dos outros entes da federação é que dependem de Lei Complementar […] A única subordinação dos outros entes políticos, no caso, é do regramento constitucional” Cumpre observar que tal entendimento não parece correto, se a competência para legislar sobre Regime Geral de Previdência Social é exclusiva da União (é matéria de lei nacional), a previdência social a que se refere o art. 24, XII, da Constituição Federal só pode ser, por exclusão, a concernente aos Regimes Próprios de Previdência Social[destacou-se].
Portanto, pode-se afirmar que não faz sentido a proibição trazida pela lei 9.717/1998 que em seu artigo 5, § único proíbe que os estados, municípios e DF exerçam a competência concorrente para legislar sobre aposentadoria especial de seus servidores, uma vez que a união apenas editou normas gerais, cabendo aos entes regulamentarem por meio de lei própria, podendo ainda ser possível afirmar que o artigo 5, § único da Lei Complementar 9.117/98 é inconstitucional por violar autonomia dos entes, autonomia esta considerada como cláusula pétrea na Constituição Federal.
3. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL SOBRE APOSENTADORIA ESPECIAL NO STJ E STF
Como já visto anteriormente, os tribunais superiores STF e STJ tem se posicionado adotando as regras do RGPS aos segurados do RPPS antes mesmo da edição da súmula vinculante n° 33 nos diversos mandados de injunções impetrados.
Porém, a matéria ainda carece de controvérsias, que continuam gerando a judicialização, uma vez que a edição da súmula vinculante n° 33 não se aplica a todos os casos de aposentadorias especiais. O STJ vem mantendo o entendimento firmado pelo STJ de que na ausência de lei que trate sobre aposentadoria especial, aplica-se as regras do RGPS. Se não, vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 472 E 485, II E V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, E 5º, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.717. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 STJ. SERVIDOR PÚBLICO. MANDADO DE INJUNÇÃO. ACÓRDÃO A QUO COM FUNDAMENTAÇÃOCONSTITUCIONAL.REEXAME.IMPOSSIBILIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. AUSÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI 8.213/1991.1. A alegação de afronta aos arts. 472 e 485, II e V, do CPC, e 5º, parágrafo único, da Lei 9.7117/1998, a despeito da oposição de Embargos Declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo. Incide a Súmula 211⁄STJ porque é indispensável também a emissão de juízo de valor sobre a matéria.2. A controvérsia acerca da eficácia e aplicabilidade do art. 57 da Lei 8.213/91, antes do advento da Lei Complementar prevista no art. 40, inciso III, § 4º, da Constituição Federal, bem como o suprimento da omissão legislativa por meio de Mandado de Injunção, possui status constitucional, cuja apreciação compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, do permissivo constitucional.3. O STJ já se pronunciou acerca da controvérsia e, com entendimento alinhado com a Suprema Corte, entende que, enquanto não editada a Lei Complementar a que se refere o art. 40, § 4º, da Constituição, a concessão de aposentadoria especial aos servidores públicos é regulada pela Lei 8.213⁄1991.4. Recurso Especial não conhecido.(RESP1667767 SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,SEGUNDA TURMA, julgado em 13/06/2017, DJe 29/06/2017)
Ademais, o STF ao julgar diversos mandados de injunções, vem entendendo que a aplicação da súmula vinculante não se limita as hipóteses do § 4 do artigo 40 da CF/88, sendo possível sua aplicação por analogia as demais hipóteses de aposentadorias especiais previstas no artigo 40 da CF/88, assim decidiu no julgamento do MI 3.332:
Ainda que se possa afastar o reconhecimento da prejudicialidade, em razão da falta de pertinência do que se contém na Súmula Vinculante 33/STF, considerado o contexto ora em exame (pessoa portadora de deficiência), o fato irrecusável é que, com a superveniência da LC 142/2013, esta Corte — ao estender à situação de servidores portadores de deficiência (ou de necessidades especiais), por analogia legis, referido diploma legislativo— tem rejeitado pretensões recursais que buscam reformar decisões, como a proferida nesta causa, que reconheceu, em favor de agentes públicos nas condições do art. 40, § 4º, I, da CF/1988, o direito à aposentadoria especial. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de ser aplicável, por analogia, à aposentadoria especial do servidor público portador de deficiência, a da LC 142/2013, editada para disciplinar a aposentação de pessoa com deficiência (ou com necessidades especiais) segurada do Regime Geral de Previdência Social.”[MI3.322AgR-segundo-ED-EDAgR, voto do rel. min. Celso de Mello, P, j. 1º-8-2014, DJE 213 de 30-10-2014.]
Diante da análise desse julgado, é possível concluir que o STF vem tentando preencher as lacunas deixadas pelo legislador aplicando por analogia a súmula vinculante n° 33 as demais hipóteses de aposentadorias especiais, buscando suprimir a enorme judicialização da matéria que ocorre não somente nos tribunais regionais, mas também no STF por meio dos mandados de injunções.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, conclui-se que deve ser reconhecida a concorrência legislativa concorrente para legislar sobre a matéria, tendo em vista que a omissão legislativa gera sérios danos aos servidores que exercem atividade em condições de risco, aos que são expostos a agentes nocivos e deficientes físicos, sendo tal tratamento desigual, pois para os segurados do Regime Geral a matéria encontra-se regulamentada.
A aposentadoria é um direito fundamental dos segurados e deve ser tratado como tal, o STF recebeu e continua recebendo vários mandados de injunções acerca da matéria, isso gera um enorme desgasto aos trabalhadores sujeitos aos regimes próprios de previdência e ao erário que movimenta os processos e gasta cada vez mais com seus servidores para tentar conceder um direito que o próprio legislador dificultou com a edição do artigo 5, § único da lei 9.717/98.
REFERÊNCIAS
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Acesso em 15 out. 2018.
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MORENO, Rosana Colén. Manual de Gestão dos Regimes Próprios de Previdência Social: foco na prevenção e combate à corrupção. São Paulo: LTr, 2016.
Graduando em Direito pelo Centro Universitário 7 de Setembro - UNI7.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALAN KHRYSTIAN DE OLIVEIRA CâMARA, . Aposentadoria especial nos regimes próprios de previdência social - RPPS Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 jun 2019, 23:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53117/aposentadoria-especial-nos-regimes-proprios-de-previdencia-social-rpps. Acesso em: 23 dez 2024.
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