LETYCIA HELOU ALVES[1]
(Orientadora)
RESUMO: O presente trabalho tem por finalidade fazer uma reflexão sobre o dano moral um instituto que ganhou relevância nos últimos anos, notadamente após a Constituição Federal de 1988 ter dado tutela efetiva a essa modalidade de dano no artigo 5º, inciso V e X respectivamente e a legislação infraconstitucional, seguindo os preceitos constitucionais, ter regulamentado essa modalidade de dano no ordenamento pátrio. Devido à quantidade expressiva de ações que tramitam no Poder Judiciário sobre o dano moral, alguns operadores de direito começaram a questionar a possibilidade do instituto estar sendo utilizado indevidamente, inclusive da possibilidade da existência da “indústria do dano moral”. De outra parte, outros defendem a tese que as pessoas tendem a confundir o que de fato representa dano moral ou mero aborrecimento, já que isso faz diferença no julgamento das ações nos Tribunais do Brasil. Assim, buscou-se na doutrina e, sobretudo na jurisprudência, averiguar os fundamentos jurídicos para a caracterização do dano moral e de condutas consideradas como mero aborrecimento e não o dano propriamente dito. Concluiu-se com base neste levantamento, que o dano moral deve ser comprovado nos tribunais e que este está associado à existência de três pressupostos básicos: o dano, o nexo de causalidade e a conduta do agente, seja por culpa ou dolo. A metodologia utilizada na elaboração desta pesquisa foi a revisão da literatura, realizada na doutrina constitucionalista e civilista, bem como em julgados da jurisprudência.
Palavras chave: Dano moral. Mero Aborrecimento. Entendimento
ABSTRACT: The purpose of this paper is to reflect on moral damage an institute that has gained relevance in recent years, notably after the Federal Constitution of 1988 gave effective protection to this modality of damage in article 5, paragraph V and X respectively and legislation infraconstitutional, following the constitutional precepts, have regulated this modality of damage in the national order. Due to the significant number of lawsuits filed by the Judiciary regarding moral damages, some lawyers began to question the possibility of the institute being misused, including the possibility of the existence of the "moral damage industry". On the other hand, others defend the thesis that people tend to confuse what actually represents moral damage or mere annoyance, since this makes a difference in the judgment of actions in the Courts of Brazil. Thus, it was sought in doctrine and, especially in jurisprudence, to ascertain the legal grounds for the characterization of moral damage and conduct considered as mere annoyance and not harm itself. It was concluded from this survey that moral damage must be proven in court and that it is associated with three basic assumptions: damage, causality and conduct of the agent, whether through guilt or fraud. The methodology used in the elaboration of this research was the literature review, carried out in the constitutionalist and civilist doctrine, as well as in judgments of jurisprudence.
Keywords: Moral damage. Mere annoyance. Understanding
1 Introdução
O dano moral é um instituto considerado ainda recente no ordenamento jurídico brasileiro, pois antes da Constituição Federal de 1988 ter incorporado a tutela do dano moral em seu artigo 5º, incisos V e X, este era utilizado somente para em casos esporádicos e relativos a Lei da Impressa. Com a nova Carta Magna, o instituto se consolidou de forma definitiva e a reparabilidade e/ou ressarcimento do dano moral passaram a ser pacíficos pela doutrina e jurisprudência, a julgar pela quantidade de decisões dos tribunais superiores em relação ao dano moral.
Além de tutelado pela Constituição Federal como um direito individual fundamental, outras legislações cuidam do tema, como o art. 186 do Código Civil, que é explicito em relação ao fato de considerar o dano imaterial como ato ilícito, estando, portanto, sujeito a reparação, bem como o Código de Defesa do Consumidor, que faz alusão ao tema nos artigos 12 e 14, quanto aos vícios e falhas dos fornecedores em relação ao produto e/ou serviço.
A doutrina majoritária perfilha do entendimento que o instituto dano moral sem sombra de dúvidas representa um avanço para o direito brasileiro, já que representa o marco da valorização dos direitos de personalidade e os quais a humanidade lutou para conseguir ao longo dos séculos.
Mas, a despeito desta conquista não se pode fechar os olhos para a banalização do instituto ao longo do tempo, sendo este o posicionamento majoritário da doutrina, que também aponta para a existência da Indústria do Dano Moral no Brasil, até porque, muitas pessoas vítimas de algum tipo de aborrecimento, fazem confusão com o que seja de fato dano moral na legislação pátria. Ou seja, a não compreensão do significado do instituto leva a crer que condutas que causam mero aborrecimento se enquadram no instituto dano moral.
Feitas essas breves notas introdutórias, o objetivo do presente estudo é fazer uma análise crítica sobre o dano moral e o mero aborrecimento, no ponto de vista das decisões proferidas pelos tribunais do Brasil. Ou seja, buscar nessas decisões os fundamentos jurídicos para a caracterização do dano moral e do mero aborrecimento, já que em relação a esse último inexiste o direito ao ressarcimento, como ocorre com o dano moral.
Visando o alcance deste objetivo, foram discutidos os seguintes temas: a evolução legislativa do dano moral no ordenamento jurídico brasileiro; os pressupostos jurídicos para a caracterização do dano moral; a distinção entre dano moral e mero aborrecimento; e, finalmente, a visão dos tribunais sobre essa questão.
A expansão da utilização do instituto dano moral no ordenamento jurídico brasileiro trouxe à baila discussões acaloradas sobre a sua banalização, descrédito no instituto e insegurança jurídica. Desta feita, qual a diferença entre mero aborrecimento e o dano moral e o posicionamento dos tribunais relativos à essa questão?
Parte-se da hipótese que o mero aborrecimento não configura o dano moral, sendo que, para a sua caracterização é preciso que de fato tenha havido o dano, ou seja, prejuízo ao bem jurídico tutelado que são os direitos imateriais e de personalidade. Sem isso não há que se falar em dano moral.
A escolha do tema se justifica em razão de contribuição social e científica, pois é necessário chamar a atenção para as diferenças entre o mero aborrecimento e o dano moral, alertando a sociedade brasileira sobre essa questão, já que o dano moral tem pressupostos específicos para a sua caracterização e ressarcimento, sendo necessário ao operador de direito conhece-los.
A metodologia adotada para o acesso as informações foi a primeiramente a pesquisa bibliográfica que tomou como base as fontes primárias e secundárias, ou seja, levantamento, compilação e interpretação de livros, artigos, dissertações publicadas em meio eletrônico e em bibliotecas. Também e analítica, pois foi feito uma análise das decisões dos tribunais quanto às ações pleiteando dano moral. O método de abordagem utilizado foi o hipotético-dedutivo.
2 DANO MORAL: EVOLUÇAO LEGISLATIVA NO DIREITO BRASILEIRO
Entender o dano moral, o seu significado e tutela jurídica no ordenamento jurídico brasileiro requer uma volta ao passado, ainda que breve, para delimitar o tempo exato em que o direito brasileiro passou a reconhecer e amparar essa modalidade de dano. Nesse diapasão, é importante, desde já, deixar claro que somente o dano leva a responsabilidade civil e, consequentemente, ao direito de receber indenização. Pois o dano, como o próprio termo sugere, causa prejuízos, podendo este ser de natureza material ou imaterial, sendo que, no presente estudo interessa investigar o dano extrapatrimonial, também denominado como dano moral. Para tanto, torna-se necessário fazer um breve lineamento histórico sobre essa modalidade de dano, bem como seu conceito, natureza jurídica e pressupostos.
2.1 Origem e incorporação no direito brasileiro
No Brasil, até algumas décadas atrás, somente em situações excepcionais havia a possibilidade de recorrer ao Poder Judiciário e pleitear o dano moral. A resistência da doutrina e jurisprudência em aceitar a reparabilidade do dano moral deve-se ao pensamento dominante que lesão ao bem extrapatrimonial era algo extremamente difícil de mensurar em termos de valor econômico. Contudo, aceitava-se que certas condutas poderiam violar o âmago humano e resultar em desequilíbrios psicológicos, mas receber algo por isso, por meio de indenização já era algo mais difícil.
De acordo com Vasconcellos (2016), que fez uma análise sobre a evolução do dano moral no ordenamento jurídico brasileiro, o que se percebe e que até a promulgação da Constituição Federal de 1988, havia um predomínio do materialismo e individualismo, já que era o Código Civil de 1916 que regulamentava questões referentes ao dano material e moral, havendo, em relação a esse último, situações bem especificas para a sua utilização. Este Código, fortemente influenciado pelo Código de Napoleão, ao abordar algumas situações que poderiam resultar em dano moral, o fez de modo a não possibilitar ao intérprete da lei outras situações que fosse possível o uso do instituto além das previstas no Código de 1916. [2]
Assim, foi necessário um amadurecimento da doutrina e jurisprudência, bem como a evolução da sociedade para que o problema fosse enfrentado com mais seriedade e a luz dos direitos de personalidade. Na verdade, uma quebra de paradigmas para que o direito brasileiro pudesse acompanhar a evolução do direito comparado em relação a essa questão.
Essa quebra de paradigmas veio especificamente com a Constituição Federal de 1988, que no afã de promover a redemocratização do país após 20 anos de ditadura militar, buscou dar ênfase aos direitos fundamentais, tendo como norte a incorporação de diversos direitos de primeira, segunda e terceira geração em diversos de seus artigos. Dentre eles, um dos mais importantes certamente é o artigo que em dois de seus incisos deu tutela ao dano moral (VASCONCELLOS, 2016).
Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, á igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
V – é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além a indenização por dano material, moral ou à imagem;
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (BRASIL, CONSTITUIÇÃO FEDERAL).
Porquanto, ao dar essa redação aos incisos V a X do artigo 5º da Carta Magna, nasceu a figura do dano moral que está associado aos direitos de personalidade, pois é isso que a tutela do dano moral visa proteger, direitos esses denominados pela doutrina pátria como imateriais ou extrapatrimoniais, uma vez que abarcam os direitos relacionados à imagem, intimidade, vida privada etc., cuja importância são inegáveis e indiscutíveis na sociedade atual.
No entendimento de Macedo (2018), a Constituição Federal pôs um fim definitivo em qualquer resistência sobre a aceitação do dano moral e a sua reparação, uma vez que os incisos V e X não deixam margem de dúvidas ao interprete da lei. Ou seja, da tutela constitucional do dano moral.
Nesse diapasão, ao ser normatizado pela Constituição Federal de 1988, coube ao Código Civil, no âmbito do instituto da responsabilidade civil, regulamentar o dano moral, corrigindo, assim, as falhas do Código anterior, já que, como dito, este era bastante limitado quanto a aplicabilidade desta espécie de dano.
Desta feita, o Código Civil em vigor tutela o dano moral em alguns de seus artigos, cabendo fazer referência ao que está estabelecido no Título III deste diploma legal e que diz respeito aos atos ilícitos.
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes (BRASIL, CÓDIGO CIVIL).
Porquanto, conforme a redação dada ao artigo 186 do Código Civil é possível averiguar que comete ato ilícito o indivíduo que violar os direitos de outrem, seja por ação ou omissão voluntária, ou por negligência ou imprudência, ainda que essa violação seja no âmbito moral. Ampliando ainda mais o entendimento do que vem a se ato ilícito, o legislador ainda buscou esclarecer que, o indivíduo (agente) que excede os limites impostos pela lei, seja de cunho econômico, social, ou que atinja a boa fé e os costumes também comente ato ilícito (GAGLIANO, PAMPLONA FILHO, 2013).
Complementando a legislação, o artigo 927 do Código Civil, determina que, quem comente ato ilícito, ou seja, as condutas tipificadas no artigo 186 a 187, é obrigado a reparar o dano. O paragrafo único deste artigo vai mais além é diz que haverá obrigação de reparação, independentemente da demonstração de culpa, quando a atividade implicar em risco para outrem. Esse artigo é comumente utilizado em ações trabalhistas cujas atividades impliquem em riscos trabalhistas.
Conforme leciona Venosa (2015), o dano moral indiscutivelmente esta associado à um ato ilícito praticado por outrem. Não havendo ato ilícito e dano, não haverá, consequentemente, a responsabilização civil do agente. Isso ficará mais claro quando for discutido os pressupostos do dano moral, a seguir.
2.2 Conceito, natureza jurídica e pressupostos do dano moral
A doutrina pátria cuidou de dar uma explicação mais detalhada acerca de seu entendimento sobre o dano moral:
Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos de personalidade, como a honra, a dignidade, a intimidade, a imagem, o bom nome etc., como se infere dos artigos 1º, III e 5º, V e X, da Constituição Federal, e que acarreta ao lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação (GONÇALVES, 2008, p.437).
Pela definição apresentada acima, pode-se inferir que o dano moral é uma lesão que atinge a esfera íntima do ser humano e que a doutrina cuida de enquadrar como os direitos de personalidade (LOBO, 2003). Quando esses direitos são lesados, o individuo pode desenvolver um quadro de apatia, sofrimento, ansiedade, depressão, enfim, de tristeza e dor, sendo que o dano moral visa justamente dar amparo para essas questões íntimas e que tem um valor precioso para as pessoas, sobretudo em uma sociedade globalizada e altamente modernizada com os avanços tecnológicos alcançados nos últimos anos.
Com a evolução do entendimento e estudo do dano moral, a doutrina passou estabelecer um conceito negativo e positivo do dano moral. Em relação a esse último, convém fazer menção ao posicionamento abaixo, pelo fato de se mais atual e também de estar em harmonia com o pensamento majoritário da doutrina:
Como se vê, hoje o dano moral não mais se restringe à dor, tristeza e sofrimento, estendendo a sua tutela a todos os bens personalíssimos – os complexos de ordem ética – razão pela qual podemos defini-lo, de forma abrangente, como sendo uma agressão a um bem ou atributo da personalidade. Em razão de sua natureza imaterial, o dano moral é insusceptível de avaliação pecuniária, podendo apenas ser compensado com a obrigação pecuniária imposta ao causador do dano, sendo esta mais uma satisfação do que uma indenização (CAVALIERI FILHO, 2012, p.90)
Acompanhando o entendimento do doutrinador sobre o que vem a ser o dano moral, verifica-se, de pleito, que qualquer agressão quanto aos atributos de personalidade que gere um sentimento de sofrimento irá caracterizar o dano moral. Nesse contexto, o autor enfatiza a dificuldade de mensuração de valor pecuniário para o dano moral, inclusive, como reportado anteriormente, foi justamente isso que impediu a evolução desta espécie de dano no Brasil há mais tempo.
Não havendo dúvidas quanto ao conceito de dano moral, parte-se agora para a análise de sua natureza jurídica. Esse também é um dos aspectos bastante controversos na doutrina pátria, mas nos últimos anos firmou-se o entendimento que o dano moral é um dos pressupostos da responsabilidade civil contratual ou extracontratual, sendo que a indenização somente será cabível diante da existência do prejuízo. Ou seja, da existência do dano e de sua comprovação, segundo informa Diniz (2018).
Como a indenização é inerente à responsabilidade civil e ao dano moral, este último teria uma natureza creditícia, de pecúnia, pois o principal objetivo o dano moral é o de promover a reparação integral da lesão, embora se admita que isso nem sempre isso seja possível. Em outras palavras, não há como estabelecer um valor correspondente aos efeitos do dano moral sentidos pela vítima.
A responsabilidade civil e o dano material ou moral andam juntos, por isso quando se fala em um instituto é preciso fazer menção ao outro. Nesse sentido o Código Civil de 2002 cuida desta questão, pelos artigos comentados anteriormente e outros espalhados no Código.
Como regra geral, pelas várias disposições contidas no Código Civil acerca da responsabilidade civil é perceptível o quanto o seu campo é vasto. No caso aqui considerado é preciso investigar os pressupostos da responsabilidade civil, por serem aplicáveis ao instituto dano moral, quais sejam: a conduta do agente, o nexo de causalidade e o dano sofrido pela vítima (OLIVEIRA, 2008).
Oportuno esclarecer que não há concordância na doutrina acerca dos pressupostos da responsabilidade civil:
Existe divergência entre doutrinadores em relação aos pressupostos da responsabilidade civil. Sílvio de Salvo Venosa (2003, p.13), enumera quatro pressupostos para que se passe a existir o dever de indenizar, afirmando que (...) os requisitos para a configuração do dever de indenizar: ação, ou omissão voluntária, relação de causalidade ou nexo causal, dano e finalmente, culpa”. Já para Maria Helena Diniz (2003, p.32) entende que são três os pressupostos, omissão, ação, dano e a relação de causalidade. Silva Rodrigues (2002, p.16), apresenta como pressupostos da responsabilidade civil a culpa do agente, ação ou omissão, relação de causalidade e dano (OLIVEIRA, 2008, p.05)
Seguindo os entendimentos acima, considera-se para fins desta pesquisa que são três os pressupostos da responsabilidade civil: ação ou omissão, nexo de causalidade e dano. Nesse sentido, a ação ou omissão diz respeito à conduta do agente, se este agir com culpa (negligência, imprudência e imperícia) ou dolo, ou se omitiu estará caracterizada um dos pressupostos para a responsabilidade civil. O nexo de causalidade, por sua vez, trata da relação de causalidade e o liame entre o ato lesivo do agente e o dano ou prejuízo sofrido pela vítima, o que significa dizer que se o dano ocorrido não for ocasionado pela ação ou omissão do agente, ou seja, em razão de sua conduta, não há que se falar em responsabilidade civil, pois esse pressuposto é essencial para a caracterização da responsabilidade civil e, consequentemente, do dano moral. Finalmente a conduta do agente deve causar dano, prejuízo para à vitima. Caso o dano (prejuízo) não ocorra não haverá o direito à indenização, já que a razão de sua existência é a reparação do dano (CAHALI, 2014).
Outra questão que sempre foi motivo de debate na doutrina e jurisprudência diz respeito à comprovação do dano moral. Nessa linha de pensamento, é preciso mencionar que majoritariamente a tese defendida tanto na doutrina quanto na jurisprudência é de que o dano precisa ser comprovado, ou seja, é necessário estar presente os pressupostos da responsabilidade civil e esses são claros na legislação civilista, já que o doutrinador pátrio buscou ser objetivo quanto a isso, inclusive e obviamente, para evitar a banalização do instituto.
No mesmo sentido tem-se a Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça que exige a prova o dano, isto é, a presunção do prejuízo não abandona a possibilidade de sua comprovação em juízo. Como essa questão volta e meia é objeto de discussões, um julgado recente do STJ[3], versando sobre essa questão reafirma novamente a necessidade da figura dano para a “incidência das regras atinentes à responsabilidade civil” (COSTA FILHO, FLUMIGAN, 2018, p.03).
3 AS DIFERENÇAS EXISTENTES ENTRE O MERO ABORRECIMENTO E O DANO MORAL NO PODER JUDICIÁRIO
Desde que a Constituição Federal e a legislação infraconstitucional incorporaram o instituto dano moral de forma definitiva, observou-se uma expansão significativa de ações por dano moral no ordenamento jurídico brasileiro.
Em quase todas as áreas do direito, inclusive o Direito de Família, o Direito do Trabalho, o Direito do Consumidor etc, tem sido constatado um número grande de ações versando sobre o dano moral. Alguns operadores de direito acreditam que essa expansão deve-se a maior conscientização da população brasileira sobre os seus direitos, ao passo que outros sustentam a tese de ter se formando em torno do instituto a indústria do dano moral, que tem favorecido o enriquecimento ilícito. Também existe o argumento de muitas pessoas confundirem o termo mero aborrecimento com o dano moral. [4]
Em relação a essa última hipótese, ou seja, das pessoas incorporarem mero aborrecimento como dano moral, na prática judiciária o argumento sobre dano moral não prospera, pois os Magistrados têm uma forte tendência em serem criteriosos na caracterização dos fatos narrados nas ações como dano moral.
Nesse sentido, Pocosso (2015), ao analisar essa questão chama a atenção, primeiramente, para a grande dificuldade em estabelecer diferenças entre o mero aborrecimento e o dano moral. Para o autor, a ciência jurídica enfrenta, neste aspecto, um grande desafio. Por esse motivo é necessário estar atento aos efeitos do dano moral na vítima, ou seja, se de fato o dano sofrido se insere no âmbito do dano moral.
3.1 Efeitos jurídicos do dano moral
No direito, a pretensão indenizatória é um dos efeitos mais notórios do dano moral, já que essa é a única forma de buscar uma reparação para os prejuízos emocionais advindos do dano moral. Um dos aspectos que também é largamente discutido pelos operadores de direito diz respeito à valoração do dano moral. Nesse sentido, a tendência observada nos Tribunais é a utilização de Princípios como a razoabilidade e proporcionalidade, bem como o bom senso na estipulação do dano moral. Também é feito uma análise das condições sócio econômicas do réu para que possa ser proferida uma sentença justa. No entanto, é a extensão do dano que dará a palavra final na valoração do dano moral.
Colabora para esse entendimento a seguinte afirmação:
Para o Juiz mensurar o dano moral, necessário se faz a comprovação da extensão do dano moral sofridos, esmiuçando detalhadamente, para que o mesmo seja comovido, e compreenda a gravidade do dano, e consequentemente profira sentença justa com valores compatíveis, sem que haja o enriquecimento sem causa, bem como para o agressor seja uma punição no sentido de inibi-lo, em novas condutas lesivas, ou ínfima se tornando estimulador. Para evitar novas transgressões a direitos alheios, deverá a punição ser substancial, atingindo o agressor de forma a desestimulá-lo a continuar obtendo lucros exorbitantes, o qual superam em muito as condenações a eles impostas, sobretudo aos que persistem em não modificar esse tipo de conduta (SOUZA, 2014 p.12).
Pela afirmação acima que encontra respaldo em outros estudos referentes ao dano moral, dentre os quais o de Diniz (2013) que também é citada no trabalho de Souza (2014), é possível deduzir que primeiramente o Magistrado se atém a gravidade do dano ocasionado na vítima e após isso, a situação econômica do agente que provocou o dano, sempre levando em consideração a razoabilidade e proporcionalidade, para que isso não resulte em enriquecimento sem causa, que é vedado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Isso porque o objetivo da indenização é o de reparação e não promover o enriquecimento da vítima. Ademais, o valor estabelecido deve ser suficiente para evitar, no futuro, que a pessoa volte a pratica este ilícito.
Ainda, considerando o que foi dito por Souza (2014), não é errado afirmar que a indenização tem um cunho pedagógico já que além de ser uma forma de punição, também tem cunho de prevenção, pois com a popularização do instituto dano moral nos últimos anos, a sociedade brasileira em boa medida tem pleno conhecimento de que o dano moral pode resultar em ações junto ao Poder Judiciário e, consequentemente, no dever de indenizar, se constatados os pressupostos que balizam o dano moral. Tanto é verdade que:
Em todo tipo de interação social, seja nas relações entre vizinhos, entre fornecedor e consumidor, no âmbito do trabalho ou em qualquer outro espaço de convívio social, podem ocorrer situações em que alguém se sinta desrespeitado em seus direitos, tanto de ordem material quanto no aspecto psicológico. Hipóteses em que eventualmente pode surgir um dano de natureza moral. Especificamente no contexto de prestação de serviço ou da comercialização de produtos, há possibilidade de um conflito de interesses resultar numa situação de violação de direitos da personalidade, quando uma das partes não atentar para o dever de tratar a outra com urbanidade e respeito, porque, afinal de contas, isso está dentro do conceito de dignidade da pessoa humana, valor maior que norteia todo o ordenamento jurídico (NASCIMENTO, 2017, p.01).
Com efeito, os argumentos da autora estão corretos e deixa evidente que o dano moral se aplica à todas as áreas do direito. Inclusive, a própria pessoa jurídica também pode ser vítima de dano moral, como recentemente pacificou a Reforma Trabalhista. Não por acaso, o dano moral tronou-se uma das principais possibilidades de provocação do Poder Judiciário.
Na análise da problemática da banalização do dano moral, Nascimento (2017), esclarece em sua pesquisa que de fato ocorreu nos últimos anos um aumento substancial deste tipo de ação, até porque, também foi observada uma expansão significativa do consumo. Em seu entendimento, alguns fatores explicam o incremento desse tipo de ação, como a intenção de obter ganho financeiro fácil (enriquecimento ilícito) e a própria forma como muitos Magistrados valoram o dano moral, possibilitando o pagamento de quantias significativas e que vão muito além do que é considerado proporcional e razoável ao caso concreto. Mas, a autora critica veementemente em ter sido concebida uma indústria do dano moral no Brasil. Isso será discutido e maiores detalhes, na seção a seguir.
3.2 A indústria do dano moral
O termo “indústria do dano moral” tem sido utilizado para fazer referência ao grande número de ações que hodiernamente o Poder Judiciário julga todos os dias nos Tribunais do país. Segundo explica Nascimento (2017), embora essa denominação seja pejorativa, muitos operadores de direito acreditam não estar distante da realidade do que acontece no Brasil.
Ou seja, há de fato um excessivo uso desta prerrogativa legal, que tem sido alimentada pela forma como alguns Magistrados julgam essa questão, ao estabelecer indenizações exorbitantes.
É preciso averiguar a possibilidade de que do desenvolvimento de uma indústria do dano moral pode acabar prejudicando a aplicabilidade do instituto, descaracterizando a sua importância. Nesse sentido, o lado perverso desta questão é que as vítimas do dano moral podem não ter direito ao ressarcimento, pelo fato dos Magistrados em alguns casos, entender o dano moral como mero aborrecimento, ou vice-versa. Inclusive, um olhar sobre a atuação da jurisprudência nos últimos tempos é preocupante, segundo informa Nascimento (2017).
Hoje o que se vê é, na prática, o oposto, pois tem crescido a insatisfação com decisões judiciais em que insistem em não vislumbrar ofensa moral em diversas situações claramente abusivas. O grito de socorro dos pequenos precisa ecoar no coração de quem tem o poder final de calar o opressor, de impor um desassossego no grande que age com injustiça e prepotência sobre o hipossuficiente. Ademais, a meu ver, é extremamente precipitado falar que mero aborrecimento não possui relevância jurídica, e que por isso não comporta indenização por eventual dano moral, como forma de barrar uma possível “fábrica do dano moral”. Qualquer abuso do direito é pernicioso, tanto quanto qualquer tentativa de fazer prevalecer um determinado entendimento a priori, sem análise sensata caso a caso (NASCIMENTO, 2017, p.07).
Nem todos perfilham da opinião de Nascimento (2017), que tece uma crítica sobre a possível criação de uma indústria do dano moral no Brasil. Nesse sentido, em diversos estudos publicados em sites de revistas eletrônicas e que trazem uma visão mais atual sobre o tema, a premissa é de que os Tribunais estão abarrotados de ações sobre dano moral, não havendo como negar a banalização do instituto nos últimos anos. Qualquer acontecimento desagradável e corriqueiro passou a ser considerado como causa justificável para a propositura de ação por dano moral (FERACIM, 2010; FRANK, OLIVIERA, CÔRREA, 2013).
Todavia, existe um esforço perceptível nos Tribunais, de não alimentar a “indústria do dano moral”, sendo certo que o mero aborrecimento, dissabores e qualquer outro sentimento do gênero estão longe de configurar o dano moral. Assim, é de suma importância que o ato sofrido pela vítima tenha sido capaz de irradiar-se para a esfera da dignidade da pessoa humana, e que a ofensa tenha sido relevante.
4 ENTENDIMENTO DOS TRIBUNAIS DO MERO ABORRECIMENTO FACE AO DANO MORAL
Tendo em vista que toda a pesquisa foi realizada no sentido de demostrar que existe diferenças entre o dano moral e o mero aborrecimento e que a tendência dos tribunais é de não acolher a tese do dano moral, se constando o mero aborrecimento, abaixo são apresentadas algumas decisões do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, considerado um dos mais conservadores pela doutrina pátria.
Assim, na sentença abaixo, proferida pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, os magistrados assim entenderam:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. SERVIÇO DE TELEFONIA. ENVIO DE FATURAS DE COBRANÇA EM VALORES SUPERIORES AO CONTRATADO. INEXISTÊNCIA DE INSCRIÇÃO EM CADASTRO RESTRITIVO. DANO MORAL AFASTADO. MERO ABORRECIMENTO CARACTERIZADO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO. A dor moral, que decorre da ofensa dos direitos de personalidade, apesar de deveras subjetiva, deve ser diferenciada do mero aborrecimento, a qual todos estamos sujeitos de acarretar, no máximo, a reparação dos danos materiais, sob pena de ampliarmos excessivamente o dano moral, a ponto de desmerecermos o instituo do valor e da atenção devidos. O simples fato da empresa enviar faturas com cobranças acima dos valores contratados, não pode ensejar dano moral passível de indenização, estando caracterizado o mero aborrecimento, sobretudo quando o nome do último não é inserido em cadastro dos devedores (PROCESSO AC 0826865-26.2012.08.13.0145.MG. Julgamento 21 de maio de 2014, Relator: Domingues Coelho).
Com base nos fundamentos acima, percebe-se, de pleito, que a conduta da empresa não ensejou a caracterização dos pressupostos que balizam o dano moral. Ou seja, o entendimento é que houve, na verdade, um aborrecimento não estando este sedimentado no instituto dano moral, que representa a ofensa aos direitos de personalidade. Sem isso não há que se falar em dano moral. Ademais, nota-se a preocupação dos magistrados em resguardar o instituto da banalização.
Em outra decisão deste mesmo Tribunal, também não foi deferido o pedido de dano moral, pelas razões expostas a seguir:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. TRANSPORTE DE PASSAGEIRO. VIOLAÇÃO DA BAGAGEM. SERVIÇO DEFEITUOSO PRESTADO PELA EMPRESA AÉREA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MATERIAL CONFIGURADO. INEXISTÊNCIA DE EXTRAVIO DE QUALQUER PERTENCE. DANO MORAL AFASTADO. MERO ABORRECIMENTO CARACTERIZADO. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. O comprovado estrago da bagagem do consumidor, ocasionado pela companhia aérea caracteriza um serviço defeituoso, realizado de maneira ineficiente, ensejando, pois, a reparação dos danos morais demostrados. A dor moral, que decorre da ofensa dos direitos de personalidade, apesar de deveras subjetiva, deve ser diferenciada do mero aborrecimento, a qual todos estamos sujeitos de acarretar, no máximo, a reparação dos danos materiais, sob pena de ampliarmos excessivamente o dano moral, a ponto de desmerecermos o instituto do valor e da atenção devidos. O fato de um passageiro ter a sua bagagem violada, não pode, por si só, ensejar dano moral passível de indenização, sobretudo quando não há perda de qualquer pertence. Negar provimento ao recurso (AC 0151137-422010-8-13.0518-MG, julgamento 16 de julho de 2014, relator Domingos Coelho).
Em relação ao caso concreto, isto é, estrago de bagagem, o entendimento do Tribunal foi que ocorreu apenas o dano material, e como não ocorreu a perda de qualquer pertence, não há parâmetros para a caracterização do dano moral, que se alia especificamente a ofensa aos direitos de personalidade.
Já em outra decisão proferida pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Rondônia, a decisão também foi pelo não deferimento do dano moral, pelas seguintes razões:
APELAÇÃO CIVIL. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. MERO ABORRECIMENTO. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. Ao consumidor incube o ônus de provar a ocorrência do dano passível de indenização, de modo que, ausente a sua demonstração, caracteriza-se o mero aborrecimento, o que não configurada a responsabilidade civil do fornecedor de serviço (APL 0182630-57.2008.882.001.RO., 1º Câmara Cível, publicação 24/06/2010, Relator Osny Claro de Oliveira Júnior).
A análise do teor da sentença proferida acima, verifica-se, novamente, não ter sido caracterizado o dano moral, posto que o autor da ação não conseguiu comprovar os pressupostos para a responsabilização civil e, consequentemente, o direito ao dano moral.
Posicionamento semelhante foi o do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em relação à cobrança de pecúlio:
APELAÇÃO CIVIL. AÇÃO DE COBRANÇA. PECÚLIO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. MERO ABORRECIMENTO. A falta de pagamento de pecúlio decorrente da morte de marido e pai das autoras não enseja direito à reparação por dano moral, não havendo demonstração de ocorrência de situação extraordinária, ou mais grave que atente à dignidade da parte. Art. 157 do CPC. Negativa de seguimento de recurso. (APL 0031911-81.2007.8.19.001, Julgamento, 03/04/2009, Marco Aurélio dos Santos Froes).
Porquanto, por todos os exemplos aqui citados é possível concluir que no julgamento de ações versando sobre o dano moral, boa parte dos casos concretos são considerados como mero aborrecimento e isso não caracteriza a responsabilidade civil, tampouco o dano moral, que depende desta última para ser configurado.
Essa é a tendência observada nos Tribunais do país, mas é interessante esclarecer que, recentemente foi cancelada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que, por unanimidade, aceitou o pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para cancelar a Súmula 75, cujo enunciado é “O simples descumprimento de dever legal ou contratual, por caracterizar mero aborrecimento, em princípio não configura dano moral, salvo se a infração advém de circunstância que atenta contra a dignidade da parte”. (RODAS, 2018).
Abaixo é apresentada a decisão que cancelou a Súmula:
Processo administrativo instaurado a requerimento do centro de estudos e debates do tribunal de justiça do estado do rio de janeiro – cedes, mediante provocação da ordem dos advogados do Brasil – Seção Judiciária do Rio de Janeiro (oab/rj). Proposição de cancelamento do verbete sumular nº 75, deste Tribunal de Justiça, tendo em vista a existência de julgados desta corte, e também do STJ, no sentido de que o inadimplemento contratual é, sim, capaz de gerar dano moral, desde que haja lesão a algum dos direitos inerentes à personalidade, adotando-se a teoria objetiva, em detrimento da teoria subjetiva a que alude o enunciado de Súmula, quando faz. Referência ao mero aborrecimento, expressão demasiadamente ampla e capaz de gerar as mais diversas e variadas interpretações, por parte de cada magistrado, diante de casos concretos fundados em um mesmo fato danoso, com violação, assim, dos princípios da isonomia e da segurança jurídica. Julgados desta corte de justiça que, desde os idos de 2009, trazem dentre os direitos da personalidade o tempo do contratante, que não pode ser desperdiçado inutilmente, tomando por base a moderna teoria do desvio produtivo do consumidor. Súmula que não mais se coaduna com o entendimento adotado por este sodalício, e, que acaba por servir de amparo para que grandes empresas, em franca violação ao princípio da boa-fé objetiva, continuem a lesar os direitos dos contratantes, sob o amparo de que o inadimplemento contratual não é capaz de gerar mais do que mero aborrecimento. Acolhimento da proposta de cancelamento do enunciado nº 75, da Súmula de jurisprudência predominante deste tribunal de justiça. Acordamos os Desembargadores que compõem o Órgão especial do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em acolher a proposta de cancelamento do Enunciado nº 75 da Súmula de Jurisprudência Predominante do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, nos termos do voto do Desembargador Relator (Poder Judiciário do Rio de Janeiro, Processo Administrativo nº 0056716-18.2018.8.19.0000).
A decisão acima busca, em nosso entendimento, resguardar os direitos de personalidade, pois se de um lado existe a preocupação fundada de não banalizar o dano moral, de outro, é preciso considerar que a Súmula acabava fornecendo elementos para que as empresas agissem de má fé com os contratantes. Essa decisão é recente, posto que foi publicada em 17 de Dezembro de 2018, porquanto, não ainda é difícil analisar os seus impacto sobre o entendimento dos Tribunais nesse sentido. Contudo, tudo leva a crer que o dano moral somente será deferido se houver provas robustas de lesão aos direitos de personalidade.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Através deste estudo de revisão bibliográfica e documental (jurisprudência), foi possível constatar que existem diferenças entre o mero aborrecimento e o dano moral, sendo que, no primeiro caso, o Poder Judiciário, bem como a doutrina coaduna do entendimento que condutas que ocasionam apenas o mero aborrecimento não se enquadram nos pressupostos do dano moral, ou seja, o dano (prejuízo), o nexo de causalidade e a conduta do agente, que são os mesmos pressupostos para a responsabilização civil, do qual o dano moral é decorrente.
Esse entendimento de não acolher pedidos de dano moral, quando restada às evidências (provas) de mero aborrecimento deve-se ao esforço do Poder Judiciário em proteger o instituto dano moral da banalização, bem como da crença que existe no Brasil a “indústria do dano moral”.
Com efeito, esse posicionamento está correto, pois em se tratando de um instituto tão importante é preciso tomar os cuidados necessários para a não banalização do mesmo. De outra parte, também é necessário se ater em cada caso concreto para a veracidade das alegações de quem pleiteia o dano moral, já que cada situação é um caso, e dano moral não pode ser encarado como mero aborrecimento, sob pena de aviltar o instituto e violar os direitos da vítima do dano moral. Nessa perspectiva tem-se a recente decisão do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro que, por unanimidade, aceitou o pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), para cancelar a Súmula 75 conhecida como a Súmula do Mero Aborrecimento em 2018.
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil Interpretado. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2015.
[1] Orientadora e docente do Curso de Direito da Faculdade Una: e-mail. [email protected]
[2] De acordo com esse Código, as hipóteses de dano moral eram as seguintes: lesão corporal que acarreta aleijão ou deformidade (art.1538), ou quando atinge mulher viúva ou solteira capaz de casar, hipóteses previstas em relação a calúnia, difamação ou injúria (1547), e a ofensa a liberdade pessoal (art. 1500).
[3] O julgado diz respeito a saques indevidos depositados em conta corrente, o STJ entendeu que não havia sido caracterizado os pressupostos do dano moral, motivo pelo qual foi indeferido o pedido de dano moral.
[4] O Magistrado Marcelo Gomes Feracim, no texto intitulado “O dano moral como uma das causas do excesso de demanda judicial”, deixa claro o seu posicionamento que existe no poder judiciário uma enorme demanda de feitos versando sobre dano moral, sendo que a maioria em desfavor de empresas concessionárias de serviços públicos, como a telefonia e as instituições financeiras. De acordo com seus dados, em 2014, dos 5.172 processos a serem julgados pela Comarca de Altônia, do Estado do Paraná, aproximadamente 3.000 versam sobre dano moral.
discente do 10º do curso de Direito da Faculdade Uma, Uberlândia-MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEMES, Fábio Benicios. O dano moral e o mero aborrecimento: o posicionamento dos Tribunais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jul 2019, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53154/o-dano-moral-e-o-mero-aborrecimento-o-posicionamento-dos-tribunais. Acesso em: 23 dez 2024.
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