Resumo: A relevância do artigo “A boa-fé objetiva e a teoria do rompimento base objetiva do contrato na perspectiva consumerista” está em realizar um estudo sintético acerca dos principais pontos relativos à teoria da boa-fé objetiva e suas figuras parcelares, explanando seus fundamentos normativos e sociais, além da aplicação da teoria do rompimento da base objetiva dos contratos e suas diferenças em relação aos preceitos da teoria da imprevisão. A metodologia utilizada no artigo quanto à finalidade, trata-se da pesquisa aplicada; quanto à abordagem, pesquisa qualitativa; quanto ao tipo, pesquisa descritiva; quanto ao procedimento, pesquisa bibliográfica.
Palavras-Chave: Objective good faith. Disruption Theory Base Objective Contracts. Consumer law.
Abstract: The relevance of the article “Objective good faith and the objective basis theory of the contract in the consumerist perspective” lies in carrying out a synthetic study about the main points concerning the objective good faith theory and its partial figures, explaining its normative foundations and and the application of the objective basis theory of contracts and their differences from the precepts of the theory of unpredictability. The methodology used in the article regarding its purpose is applied research; as for the approach, qualitative research; as for the type, descriptive research; as for the procedure, bibliographic research.
Keywords: Objective good faith. Objective Base Break Theory of Contracts. Consumer law.
Sumário: Introdução. 1. Teoria da Boa-fé Objetiva. 1.1 Funções da Boa-fé objetiva. 1.2 Figuras parcelares da boa-fé objetiva. 2. Teoria do Rompimento da Base Objetiva dos Contratos. 2.1 Teoria da imprevisão. 2.2 Teoria do rompimento da base objetiva do contrato. Conclusão. Referências.
Introdução
Os contratos celebrados têm como função proporcionar a circulação de bens e riquezas, e no momento de sua celebração nascem direitos e obrigações entre aqueles que pactuam. A validade e a eficácia desta contratação dependem da observância de alguns princípios, tais como, boa-fé, autonomia da vontade, consensualismo, força obrigatória dos contratos, relatividade dos efeitos dos contratos. Vale lembrar que vários desses princípios são relativizados nas relações de consumo, em razão da vulnerabilidade dos consumidores.
A boa-fé objetiva envolve a exigência de conduta leal por parte dos contratantes. Portanto, eles devem observar os deveres que estão anexos à conduta de uma relação contratual. Tais deveres delimitam, por exemplo, qual deve ser o comportamento das partes: dever de cuidado em relação à outra parte negocial; dever de respeito; dever de informar a outra parte sobre o conteúdo do negócio; dever de agir conforme a confiança depositada; dever de lealdade e probidade; dever de colaboração; dever de agir com honestidade; dever de agir conforme a razoabilidade, equidade e boa razão.
A boa-fé e a função social dos contratos são ferramentas de que se dispõe o ordenamento jurídico para realizar a justiça contratual.
Nesse contexto, foram desenvolvidos diversos institutos ligados à boa-fé, dentre eles a “teoria do rompimento da base objetiva do contrato”, em que, numa perspectiva de proteção aos consumidores, em suas relações essencialmente não paritárias, visa manter o equilíbrio das relações com base no que foi inicialmente contratado.
1. Teoria da Boa-fé Objetiva
A boa fé objetiva tem por base um dos pilares do Código Civil (CC/02) que é a eticidade. A eticidade está relacionado a boa-fé e a probidade. Agora a lei fala que as partes deverão se comportar de boa-fé, sendo este um dever objetivo de conduta. Desse modo, a boa-fé passou a ser um padrão ético obrigatório de comportamento esperado por todos em sociedade, ou seja, é preciso que a conduta se exteriorize com tal padrão, não importando a real intenção do agente, mas sim como ele se comportou no caso concreto.
1.1 Funções da Boa-fé objetiva
A boa fé se manifesta em três momentos (tríplice função da boa-fé objetiva):
1.1.1 Função interpretativa (art. 113 do CC/02): no plano hermenêutico da otimização do comportamento contratual e do estrito cumprimento ao ordenamento jurídico, o art. 113 do Código Civil dispõe que os negócios jurídicos devem ser interpretados de acordo com a boa-fé. Apresenta-se assim como referencial interpretativo, pautado no paradigma da eticidade. O magistrado não apelará a uma interpretação literal do texto contratual, mas observará o sentido correspondente às convenções sociais ao analisar a relação obrigacional que lhe é submetida.
1.1.2 Função limitativa de condutas abusivas (art. 187 do CC/02): essa função considera abusiva a conduta que desvia ou excede às expectativas internas da outra parte. A partir dessa função, trabalha-se o conceito da Teoria dos atos próprios. Também serve de base à responsabilidade na fase pré-contratual e no caso da teoria do adimplemento substancial.
O art. 187 do CC/02 trata do abuso de direito, que é exercido conforme o padrão de comportamento da boa-fé. Através desse padrão, há um dever de colaboração obrigatório, de diligência para com os interesses do outro. Considera-se abusiva a conduta que desvia ou excede às expectativas da outra parte. Cumpre destacar que o CC/02 não aboliu a boa-fé subjetiva, apenas consagrou também a boa-fé objetiva. Em algumas circunstâncias, a boa-fé a ser investigada é a subjetiva, como por exemplo, o dolo (como vício de consentimento) no negócio jurídico (art. 145 do CC/02), o estado de perigo, a fraude contra credores e o estudo da posse.
1.1.3 Função interativa ou criadora de deveres anexos e laterais (art. 422 do CC/02): estabelece que as partes devem guardar, tanto nas negociações que antecedem o contrato como durante a execução deste, o princípio da boa-fé. Aqui prosperam os deveres de proteção e cooperação com os interesses da outra parte (deveres anexos ou laterais), o que propicia a realização positiva do fim contratual, na tutela aos bens e à pessoa da outra parte, estendendo-se às fases pré e pós contratual. Nesta função cumpre fazer menção à violação positiva do contrato. Tal conceito está relacionado ao inadimplemento do contrato em razão do descumprimento dos deveres anexos. Mesmo que a prestação em si tenha sido cumprida, com a violação de deveres anexos haverá o adimplemento insatisfatório, ofendendo deveres instrumentais diretamente vinculados à realização da prestação, sejam eles, deveres de proteção, colaboração ou informação.
1.2 Figuras parcelares da boa-fé objetiva
As figuras parcelares da boa-fé objetiva estão relacionadas a tipos específicos de atos abusivos que, embora reunidos ao derredor da cláusula geral de boa-fé objetiva, possuem características próprias, particulares. A doutrina costuma enumerar seis figuras parcelares da boa-fé objetiva. Seriam elas: supressio e surrectio, venire contra factum proprium, exceptio doli, duty to mitigate the loss e tu quoque.
1.2.1 Supressio: a supressio é a situação do direito que deixou de ser exercitado em determinada circunstância e não mais possa sê-lo por, de outra forma, contrariar a boa-fé. Seria um retardamento desleal no exercício do direito que gerou na outra parte a ilusão de que o direito não seria exercido. Tal figura se aproxima da figura do venire contra factum proprium, pois ambas atuam como fatores de preservação da confiança alheia, mas dela se diferencia porque enquanto na venire a confiança em determinado comportamento é delimitada no cotejo com a conduta antecedente, na supressio as expectativas são projetadas apenas pela injustificada inércia do titular por considerável decurso de tempo somada a indícios de que o direito não mais seria exercido. A supressio guarda semelhanças com a prescrição e decadência, mas enquanto nestas os critérios decisivos são o transcurso do tempo e a inatividade de seu titular, na supressio demanda-se confiança da contraparte, motivada pela inatividade do opoente a ponto de lhe trazer a expectativa de que nunca exercitará o direito.
Um exemplo citado pela doutrina é o art. 330 do Código Civil, que diz: “O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor relativamente ao previsto no contrato”.
1.2.2 Surrectio: na surrectio, por outro lado, o exercício continuado de uma situação jurídica ao arrepio do convencionado ou do ordenamento implica nova fonte de direito subjetivo, estabilizando-se tal situação para o futuro. O instituto da supressio e da surrectio, respectivamente, ocorre quando a ausência do exercício de um direito com o passar do tempo enseja a impossibilidade do seu exercício tardiamente, sob pena de desrespeito ao princípio da boa-fé, ao passo que, paralelamente, o exercício contínuo de determinados atos faz nascer um direito.
1.2.3 Venire contra factum proprium: corresponde a proibição de comportamento contraditório de um indivíduo na relação jurídica. Essa expressão pode ser traduzida literalmente como "agir contra fato próprio", e busca impedir a prática de um ato que contraria comportamento anterior do agente. O indivíduo pratica reiteradamente certa conduta, provocando no outro uma expectativa de que aquilo é o certo, e logo após assume comportamento contraditório ao anterior. Tem-se como base a confiança na conduta que se estabeleceu no tempo. São pressupostos: uma conduta inicial, a legítima confiança de outrem na conservação do sentido objetivo desta conduta, um comportamento contraditório com este sentido objetivo e um dano ou potencial de dano a partir da contradição. Com efeito, cuida-se de dois comportamentos, lícitos e sucessivos, porém o primeiro é contrariado pelo segundo.
Para Venosa (2013, p. 398) seria exemplo dessa figura parcelar o caso do locador de um imóvel que, todo mês, aceita receber o aluguel com 5 dias de atraso. Após meses, sem se opor a tal fato, resolve o locador mudar de conduta e passa a exigir a multa moratória do período. Ora, essa mudança repentina frusta a legítima expectativa do inquilino, já que durante meses o locador não se opôs (tolerou) o pagamento do aluguel com dias de atraso.
A figura do estoppel consiste na impossibilidade de as partes envolvidas em um litígio nas instâncias internacionais de direitos humanos alegarem ou negarem um fato ou direito, estando essa negação em desacordo com uma conduta anteriormente adotada ou anuída. O princípio do estoppel funciona como espécie de preclusão e é fundado no brocardo do venire contra factum proprium. No âmbito do sistema interamericano convencionou-se que as exceções preliminares devem ser alegadas no âmbito do procedimento perante a comissão interamericana de direitos humanos, precluindo sua alegação pelos Estados quando o procedimento se encontra já em trâmite na corte interamericana.
1.2.4 Exceptio doli: trata-se da exceção de dolo, ou seja, não age com boa-fé aquele que atua no intuito não de preservar legítimos interesses, mas, sim, de prejudicar a parte contrária. Na linha da doutrina de Flávio Tartuce, exceptio doli “é conceituada como sendo a defesa do réu contra ações dolosas, contrárias a boa-fé”. Explica o professor que uma de suas aplicações é verificada por meio da exceptio non adimpleti contractus, que, como é de conhecimento, impede que se exija o cumprimento da obrigação pela parte que não conferiu cumprimento ao que pactuou. Ou seja, a boa-fé objetiva não se observa quando determinada parte de um contrato se vale de atitude dolosa com o intuito “não de preservar legítimos interesses, mas, sim, de prejudicar a parte contrária”.
1.2.5 Duty to mitigate the loss (dever de mitigar as próprias perdas): significa que o contratante credor deve adotar as medidas céleres e adequadas para que o dano do devedor não seja agravado. Se o credor adotar comportamento desidioso por acreditar que a perda econômica do devedor lhe favorece, a sua inação culminará por lhe impor injustificado desfalque. Esta negligência danosa é uma ofensa ao princípio da confiança, pois evidencia completo desprezo pelo dever anexo de cooperação. Um exemplo seria a atitude das instituições financeiras que se mantém inerte diante do inadimplemento de seus clientes e deixam o débito alcançar montante estratosférico, levando o devedor à situação de superendividamento.
1.2.6 Tu quoque: Significa que quem viola determinada norma jurídica não poderá exercer a situação jurídica que essa mesma norma lhe atribui. Quem não cumpre os seus deveres também não pode exigir os seus direitos com base na norma violada, sob pena de abuso. Para efeito de distinguir o “tu quoque” do “venire contra factum proprium”, a doutrina tem apontado, em suma, que naquele há um primeiro comportamento contrário a determinada norma jurídica, não podendo o transgressor valer-se deste ato indevido para se beneficiar na sequência da relação. Já no “venire contra factum proprium”, que também tem como fim coibir a prática de atos contraditórios, os comportamentos isoladamente considerados não são indevidos, somente se visualizando a irregularidade quando analisados em conjunto. A tu quoque age simultaneamente sobre os princípios da boa fé e da justiça contratual, pois pretende não só evitar que o contratante faltoso se beneficie de sua própria falta, como também resguardar o equilíbrio entre as prestações. Guarda semelhança com a exceptio non adimpleti contractus no âmbito das obrigações, pois ambos objetivam preservar a proporcionalidade, o sinalagma contratual, e não apenas a confiança.
Este sentido, embasado em doutrina, também foi exposto pelo STJ, conforme trecho da ementa: “Os ditames da boa-fé objetiva, especificamente, o tu quoque, encontra ressonância no artigo 565 do Código de Processo Penal, ao dispor que não cabe a arguição de nulidade pela própria parte que lhe deu causa ou que tenha concorrido para a sua existência” (RHC 63.622/SC, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 22/10/2015 (RHC 51.017/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 01/03/2016, DJe 21/03/2016).
2. Teoria do Rompimento da Base Objetiva dos Contratos
Antes de adentrarmos na temática da “Teoria do Rompimento da Base Objetiva dos Contratos”, trataremos de forma preliminar acerca da “Teoria da Imprevisão”, prevalente nas relações civil paritárias.
2.1 Teoria da imprevisão
O Código de 1916 consagrou o princípio do pacta sunt servanda. No ápice daquela noção, não se falava em equilíbrio dos contratos, pois se dizia que o contrato fazia lei entre as partes. Dizia-se: “morra, mas cumpra”. Era um período influenciado pelo valor da palavra e da honra, ou seja, independentemente do que ocorresse, a parte deveria cumprir a pactuação.
Em 1918, na França, foi editada a primeira norma permitindo a revisão ou a resolução dos contratos (a chamada “Lei Faillot”). A norma resgatou do direito romano a cláusula rebus sic stantibus e com ela consagrou a teoria da imprevisão. Esta Lei Francesa surgiu no pós-guerra, com a finalidade de rever contratos celebrados antes dela.
O CC/02 tratou do tema, de forma diferente do Código anterior, dispondo em seus arts. 478 e 317 sobre a teoria da imprevisão:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.
Nesse contexto, os requisitos para aplicação da teoria da imprevisão são: contrato deve ser de trato sucessivo, ou seja, de prestação continuada, não instantâneo; deve haver desequilíbrio entre a prestação e contraprestação, chamado de onerosidade excessiva; deve estar presente a álea extraordinária, consubstanciada no evento imprevisível e extraordinário que gerou o desequilíbrio; e inexistência de culpa da parte.
Diante dos requisitos exigidos pelo Código para a aplicação da teoria, pode-se dizer que o Código acolheu a teoria da imprevisão qualificada (adjetivada), porque, além dos clássicos requisitos, acrescentou mais um, que não estava presente quando da construção da teoria: a correspondência entre o prejuízo sofrido por uma parte e a vantagem excessiva obtida pela outra.
Em prol dessa relativização do pacta sunt servanda, o Código do Consumidor traz como princípio fundamental, embora implícito, a função social dos contratos, conceito básico para a própria concepção do negócio de consumo. O objetivo principal da função social dos contratos é tentar equilibrar uma situação que sempre foi díspar, em que o consumidor sempre foi vítima das abusividades da outra parte da relação de consumo.
O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor é prova evidente de que não se pode aceitar o contrato da maneira como antes era consagrado, regido pelo modelo estanque da autonomia da vontade e de sua consequente força obrigatória (sunt servanda). A sociedade mudou, eis que vivemos sob o domínio do capital, e com isso deve-se modificar o modo de se ver e se analisar os pactos, sobretudo os contratos de consumo. Como já pronunciado em sede de recurso ao Superior Tribunal de Justiça, o Código Consumerista representa forte mitigação dessa obrigatoriedade da convenção, mormente nas hipóteses em que o negócio jurídico celebrado encerra uma situação de injustiça (STJ – AgRg no REsp 767.771/RS – Quarta Turma – Rel. Min. Jorge Scartezzini – j. 05.09.2006 – DJ 20.11.2006, p. 325).
2.2 Teoria do rompimento da base objetiva do contrato
Trata-se de teoria prevista no art. 6o, V, do CDC: Art. 6o São direitos básicos do consumidor: V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.
Observa-se, portanto, que as cláusulas desproporcionais e as excessivamente onerosas podem ser modificadas e revisadas, a fim de que o contrato de consumo seja preservado. Além da previsão do artigo acima, o art. 51, §2o, do CDC deixa evidente a intenção de preservação do contrato de consumo: Art. 51. (...). § 2° A nulidade de uma cláusula contratual abusiva não invalida o contrato, exceto quando de sua ausência, apesar dos esforços de integração, decorrer ônus excessivo a qualquer das partes.
O art. 6o, V, do CDC fala da revisão das cláusulas desproporcionais em razão de fato superveniente que as torne excessivamente onerosas. Ressalta-se que esses fatos supervenientes não precisariam ser imprevisíveis, pois o CDC não consagrou a teoria da imprevisão, mas sim a teoria do rompimento da base objetiva do contrato. Logo, a questão é analisada apenas sob seu aspecto objetivo, ou seja, a previsibilidade das causas supervenientes não é discutida.
Destaca-se, ainda, que o art. 6o, V, do CDC exige apenas fato superveniente que torne a obrigação excessivamente onerosa para o consumidor, não sendo necessário que o fornecedor tenha extrema vantagem com isso.
2.2.1 Diferença entre onerosidade excessiva e lesão
Ambas são causas que desequilibram o negócio jurídico. No entanto, lesão é uma causa concomitante à assinatura do contrato. O contrato já nasce desequilibrado. Já na onerosidade excessiva, o contrato se torna desequilibrado.
O CDC, no art. 6o, V, segunda parte, trabalha com a teoria da quebra da base objetiva do negócio jurídico, de origem alemã. A doutrina majoritária entende que o CDC não adotou a teoria da imprevisão (de origem francesa), que fora adotada pelo Código Civil no art. 478 do CC. Assim, entende-se que o art. 6o, V, do CDC adotou, em sua primeira parte, a teoria da lesão, e, em sua segunda parte, a teoria da quebra da base objetiva do negócio jurídico. Já o Código Civil, no art. 478, adotou a teoria da imprevisão. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
2.2.2 Diferença entre a teoria da quebra da base objetiva e a teoria da imprevisão
Ambas as teorias se referem a contratos que se prolongam no tempo. Esses contratos contêm, implicitamente, a cláusula rebus sic stantibus, ou seja, esses contratos devem ser cumpridos desde que a situação permaneça a mesma.
A teoria da imprevisão, do art. 478 do CC/02, fala em "fato extraordinário" e "fato imprevisível". A teoria da quebra da base objetiva do contrato, do CDC, fala em "fato superveniente que acarrete onerosidade excessiva". Além disso, o CC exige a extrema vantagem para a outra parte, enquanto o CDC não exige, bastando a onerosidade excessiva. O CC/02 fala em "resolução". As partes irão retornar ao seu status quo ante. No CDC, fala-se em revisão.
Logo, para que o contrato seja revisto, na teoria da imprevisão, exige-se que haja um fato novo extraordinário e imprevisível que acarrete uma onerosidade excessiva no negócio. Já na teoria da quebra da base objetiva, basta que haja um fato superveniente que onere o contrato, seja ele previsível ou imprevisível. Na teoria da imprevisão, será cabível a extinção do contrato ou a revisão judicial, onde se preserva o contrato, com a modificação das cláusulas pelo juiz. Já na teoria da quebra da base objetiva, o consumidor deverá pedir a revisão.
Conclusão.
A boa fé objetiva tem por base um dos pilares do Código Civil (CC/02) que é a eticidade. A eticidade está relacionado a boa-fé e a probidade. A boa-fé passou a ser um padrão ético obrigatório de comportamento esperado por todos em sociedade, ou seja, é preciso que a conduta se exteriorize com tal padrão, não importando a real intenção do agente, mas sim como ele se comportou no caso concreto. Dentre as suas funções encontra-se a interativa ou criadora de deveres anexos e laterais, que estabelece às partes dever de guardar, tanto nas negociações que antecedem o contrato como durante a execução deste, o princípio da boa-fé. Aqui prosperam os deveres de proteção e cooperação com os interesses da outra parte (deveres anexos ou laterais), o que propicia a realização positiva do fim contratual, na tutela aos bens e à pessoa da outra parte, estendendo-se às fases pré e pós contratual.
Nesse sentido, desenvolve-se a teoria do rompimento da base objetiva do contrato que prevê a possibilidade da revisão ou resolução do contrato, mas em razão da vulnerabilidade do consumidor, cria requisitos menos rígidos que aqueles previstos na “teoria da imprevisão”, pretendendo dar maior proteção ao consumidor e função social ao contrato.
Referências.
MARQUES, Claudia Lima; Leonardo Roscoe Bessa; Antonio Herman V. Benjamim. Manual de Direito do Consumidor. 8 ed., São Paulo: Editora RT, 2017.
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil - Volume Único. 9 ed., São Paulo: Editora Método, 2019.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil - Volume I - Parte Geral. 13 ed., São Paulo: Editora Atlas, 2013.
VITORELLI, Edson. Manual de Direitos Difusos. 2 ed., Salvador: Editora Juspodivm, 2019.
bacharela em Direito pela Universidade de Fortaleza - UNIFOR, advogada, aprovada no Concurso para Promotor de Justiça do Estado de Rondônia e para Promotor de Justiça do Estado do Piauí.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ANDRADE, Lissa Aguiar. A boa-fé objetiva e a teoria do rompimento da base objetiva dos contratos na perspectiva consumerista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 12 ago 2019, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53278/a-boa-f-objetiva-e-a-teoria-do-rompimento-da-base-objetiva-dos-contratos-na-perspectiva-consumerista. Acesso em: 23 dez 2024.
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