RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo analisar a doutrina e a jurisprudência administrativa e judiciária relativa à sanção prevista no artigo 87, III, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, a fim de buscar a resposta se a referida reprimenda possui abrangência geral ou apenas com relação ao órgão sancionador. Nesse interim, serão destacadas as posições doutrinárias defensórias dos dois posicionamentos, além de julgamentos do Tribunal de Contas da União e do Superior Tribunal de Justiça, bem como os atos normativos exarados pelos entes públicos, em especial a União, a fim de concluir pela adoção de uma ou outra corrente no seio de cada órgão analisado.
Palavras-chave: Direito Administrativo, Licitações, Contratos Públicos
Sumário: 1. Introdução; 2. Do regime de sanções previsto na Lei de Licitações; 3. Da interpretação literal dos arts. 6º e 87 da Lei nº 8.666/93: restrição da sanção à entidade sancionadora; 4. Da abrangência nacional da sanção: o entendimento do Superior Tribunal de Justiça; 5. Considerações finais. Referências
INTRODUÇÃO
Apesar de possuírem maiores garantias que os contratos firmados no âmbito privado, haja vista a possibilidade de aplicação do poder extroverso (MELLO, 2015), os contratos administrativos não são imunes à inadimplência.
Não são raros os casos de descumprimentos contratuais das mais variadas ordens, por parte dos contratados da administração pública.
Diante de tal inarredável conjuntura, os legisladores fizeram incluir no estatuto de normas gerais sobre licitações e contratos públicos, a Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993 - gerada sob os auspícios do artigo 37, XXI da Constituição da República - regramento específico sobre o tratamento da inadimplência contratual por parte dos contratados, de modo que, após garantidos a ampla defesa e o contraditório, possibilita-se ao ente público contratante a aplicação de sanções ao particular faltoso.
Tal regime sancionatório encontra-se positivado na “Seção II” do “Capítulo IV” da supracitada lei, nos artigos 86 a 88, cabendo ao artigo 87 enumerar as punições passíveis de aplicação pelo poder público, quais sejam: advertência, multa, suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração - doravante reduzida apenas à expressão suspensão do direito de licitar e impedimento de contratar, conforme autorizada doutrina (SUNFELD, 1995) e declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública.
O presente artigo busca analisar com maior profundidade as duas últimas modalidades de gravame a ser imposto ao contratado, na tentativa de – apesar de ferrenho embate doutrinário - diferenciá-las, especialmente quanto à sua abrangência geográfica, tendo como parâmetros aqueles traçados pelo Tribunal de Contas da União e pelo Superior Tribunal de Justiça.
Inicia-se realizando uma breve digressão acerca das sanções previstas na lei de licitações, passando à análise literal da abrangência das referidas sanções defendidas por parte da doutrina e do Tribunal de Contas da União, para, por fim, registrar o entendimento, até certo ponto consolidado, do Superior Tribunal de Justiça, ao qual o autor deste trabalho se filia.
2. DO REGIME DE SANÇÕES PREVISTO NA LEI DE LICITAÇÕES
É de relativa simplicidade o regime de sanções previsto pelos arts. 86 a 88 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, dispositivos povoados de conceitos abertos, tendo o legislador deixado ao intérprete a tarefa de balizar as punições de maior relevo.
Dado o objeto do presente estudo, faz-se imprescindível trazer à baila o caput e os incisos do artigo 87 do referido diploma legal:
Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
I - advertência;
II - multa, na forma prevista no instrumento convocatório ou no contrato;
III - suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV - declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
Da mera leitura do dispositivo, depreende-se que a norma prevê uma gradação crescente entre as penalidades, ressalvada a possibilidade de cumulação, prevista no parágrafo segundo do mesmo artigo, entre a multa e as demais sanções.
É oportuno salientar que as penalidades supracitadas não são vinculadas a fatos determinados ou tipos fechados, cabendo ao Administrador Público, com cunho discricionário, estabelecer a punição dentro de uma proporcionalidade com a conduta infratora, tarefa tormentosa aos intérpretes, mormente diante da similitude entre as duas últimas modalidades repressivas.
Na tentativa de diferenciá-las, ao menos quanto aos efeitos, surgem duas correntes: a primeira, embasada na interpretação literal da Lei nº 8.666/93, seguida pelo Tribunal de Contas da União, e a segunda, concebida a partir de um esforço teleológico acerca da norma, reconhecida e pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça.
3. DA INTERPRETAÇÃO LITERAL DOS ARTS. 6º E 87 DA LEI Nº 8.666/93: RESTRIÇÃO DA SANÇÃO À ENTIDADE SANCIONADORA
A Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, é conhecida por sua primazia técnica e minuciosidade procedimental, avançando, inclusive, sobre conceitos caros ao Direito Administrativo.
Exemplo de tal vertente encontra-se no art. 6º, inserido na “Seção II – das definições” do “Capítulo I” da Lei, no qual encontra-se diversas definições que o diploma, supostamente, visava utilizar para nortear a aplicação da norma.
Dentre tais conceitos, para o objeto deste trabalho, destacam-se os seguintes:
Art. 6o Para os fins desta Lei, considera-se:
(...)
XI - Administração Pública - a administração direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade jurídica de direito privado sob controle do poder público e das fundações por ele instituídas ou mantidas;
XII - Administração - órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente;
Tal “positivação de conceitos”, analisada conjuntamente com as expressões presentes nos incisos III e IV do artigo 87 do Estatuto, levou diversos autores a, defendendo a estrita literalidade legal, utilizar as definições para responder à questão do âmbito de aplicação das sanções.
Como bem explicita Marçal Justen Filho (2014, p. 1155), sem, contudo, adotar tal corrente, como doravante será demonstrado:
A distinção mais evidente entre as duas figuras envolve uma interpretação literal, fundada nas definições adotadas pelos incs. XI e XII do art. 6.º da Lei. A suspensão do direito de licitar produziria efeitos no âmbito da entidade administrativa a aplicasse, enquanto a declaração de inidoneidade alcançaria todos os órgãos da administração pública. Essa interpretação deriva da redação legislativa, pois o inc. III utiliza apenas o vocábulo “Administração”, enquanto que o incis. IV contém “Administração Pública”.
Por sua vez, Jessé Torres Pereira Junior (2009, p. 860/861) adota posicionamento consonante com a interpretação literal, de viés garantista:
A diferença do regime legal regulador dos efeitos da suspensão e da declaração de inidoneidade reside no alcance de uma e de outra penalidade. Aplicada a primeira, fica a empresa punida impedida perante as licitações e contratações da Administração; aplicada a segunda, a empresa sancionada resulta impedida perante as licitações e contratações da Administração Pública.
Na mesma toada é a tradicional lição de Hely Lopes Meirelles ao discorrer que “a suspensão provisória pode restringir-se ao órgão que a decretou ou referir-se a uma licitação ou a um tipo de contrato, conforme a extensão da falta que a ensejou” (MEIRELLES, 2010, p. 337).
Renomada guarida doutrinária conduziu diversos órgãos judicantes a adotar tal posicionamento, restringindo a sanção de suspensão de licitar e impedimento de contratar ao órgão ou entidade que aplicou a reprimenda, de modo que inexistiria óbice à participação do licitante faltoso em certame realizado por outro núcleo da administração.
Destaca-se na aplicação de tal interpretação o Tribunal de Contas da União, que por meio de seu órgão plenário já ratificou o entendimento sucessivas vezes, na esteira do excerto de acórdão abaixo colacionado:
9. Ocorre que, depois disso, o Plenário desta Corte de Contas já ratificou em várias oportunidades o entendimento contrariado nesses dois acórdãos da 1ª Câmara, reafirmando a ausência de base legal para uma interpretação da norma que amplie os efeitos punitivos do art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993 a todos os entes e órgãos da Administração Pública (Acórdãos 3.243/2012, 3.439/2012, 3.465/2012, 842/2013, 739/2013, 1.006/2013 e 1.017/2013, todos do Plenário).
10. Tem-se, em especial, o Acórdão 3.243/2012, quando restaram vencidos os votos dos Ministros Ubiratan Aguiar e Walton Alencar Rodrigues, que traziam os mesmos argumentos que haviam embasado os Acórdãos 2.218/2011 e 3.757/2011 da 1ª Câmara.
11. Desse modo, ainda que em decisões recentes o Ministro Walton Alencar Rodrigues tenha apresentado voto de ressalva demarcando sua posição, não se pode dizer que haja propriamente controvérsia tumultuosa sobre a matéria nesta Corte, motivo pelo qual, diferentemente da unidade técnica, que propõe a procedência parcial da reclamação devido à existência de "entendimento minoritário" no Tribunal no sentido de que a sanção do inciso III do art. 87 da Lei 8.666/1993 possui efeitos subjetivos amplos, penso que, nesse ponto, a representação deve ser considerada totalmente procedente.
12. Com relação à doutrina e julgados da 2ª Turma do STJ mencionados pelo Serpro, frise-se que seus argumentos foram devidamente ponderados nas decisões do TCU, não tendo sido suficientes, no entanto, para suplantar as razões que alicerçam a convicção do Plenário desta Casa, valendo assinalar que as sentenças do STJ, proferidas em 2003 e 2004, não conformam um entendimento firme e pacífico daquela Corte sobre o tema.
13. A propósito, no voto condutor do Acórdão 3.439/2012-Plenário foram apresentados, de forma resumida, os elementos nos quais se funda a posição do TCU acerca do assunto, que são os seguintes: a) as sanções do art. 87 da Lei 8.666/93 estão organizadas em ordem crescente de gravidade e, ao diferenciar aspectos como duração, abrangência e autoridade competente para aplicá-las, o legislador pretendia distinguir as penalidades dos incisos III e IV; b) em se tratando de norma que reduz o direito de eventuais licitantes, cabe interpretação restritiva; c) o art. 97 da Lei de Licitações, ao definir que é crime admitir licitação ou contratar empresa declarada inidônea, reforça a diferenciação entre as penalidades de inidoneidade e suspensão temporária/impedimento de contratar, atribuindo àquela maior gravidade.
14. No que concerne ao parecer da AGU mencionado, sabe-se que não reflete as diretrizes definidas pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão na Instrução Normativa 2/2010, cujo § 1º do art. 40 estabelece expressamente que a sanção do inciso III do art. 87 da Lei 8.666/1993 "impossibilitará o fornecedor ou interessado de participar de licitações e formalizar contratos, no âmbito do órgão ou entidade responsável pela aplicação da sanção".
15. Cabe, portanto, nos termos propostos pela unidade técnica, dar ciência ao Serpro/SP de que a sanção prevista no inciso III do art. 87 da Lei 8.666/1993 produz efeitos apenas em relação ao órgão ou entidade sancionador. (TCU, Acórdão 2.242/2013, Plenário, Rel. Min. José Múcio Monteiro, Data da sessão: 21/08/2013)
Tendo em vista a proeminência técnica da corte de contas no seio da administração pública federal, diversos órgãos e entidades permitiram a participação de licitantes punidos com esteio no artigo 87, III, da Lei nº 8.666/93 seguindo os fundamentos adotados pelo Tribunal, cizânia que culminou em demandas judiciais ajuizadas pelos licitantes preteridos em detrimento do faltoso, de modo que o Poder Judiciário foi instado acerca do questionamento da área de abrangência da respectiva sanção.
4. DA ABRANGÊNCIA NACIONAL DA SANÇÃO: O ENTENDIMENTO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Antes de tratar da solução definida pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da abrangência geográfica da reprimenda positivada no art. 87, III, da Lei nº 8.666/93, faz-se necessário analisar os argumentos doutrinários que, contrariamente aqueles apontados pelo Tribunal de Contas da União, concluem pela maior amplitude da penalidade, independentemente da diferença terminológica entre os institutos “Administração” e “Administração Pública”.
O jurista Marçal Justen Filho (2014, p. 892) apresenta uma ponderação pela maior efetividade da sanção de suspensão de licitar e impedimento de contratar, no sentido que:
(…) pode-se contrapor que a lógica excluiria o cabimento de sancionamento ao sujeito no estrito âmbito de um único e determinado sujeito administrativo. Se o agente apresenta desvio de conduta que o inabilitam para contratar com um determinado sujeito administrativo, os efeitos dessa ilicitude teriam de se estender a toda a Administração Pública. Assim se passa porque a prática do ato reprovável, que fundamento a imposição da sanção de suspensão do direito de licitar e contratar, evidencia que o infrator não é merecedor de confiança. Um exemplo prático permite compreender o raciocínio. Suponha-se que o contratado deixe de adimplir às obrigações assumidas num contrato de empreitada de obra pública. Entrega à Administração uma obra defeituosa. Sancionado com a suspensão do direito de licitar, estaria ele livre para contratar com outros entes da Administração pública? Reputa-se que a resposta negativa é a mais compatível com a ordem jurídica.
Na mesma ótica é a lição de José dos Santos Carvalho Filho (2012, p. 219):
Questão que tem sido frequentemente discutida reside nos efeitos derivados das sanções de suspensão temporária de licitar e impedimento de contratar com a Administração (art. 87, III, Estatuto) e de declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração (art. 87, IV). Há três correntes de pensamento.
Para grande parte dos especialistas, o efeito é restritivo, vale dizer, limita-se ao ente federativo em que a sanção foi aplicada, invocando-se duas razões: (1ª) a autonomia das pessoas da federação; (2ª) a ofensa ao princípio da competitividade, previsto no art. 3º, § 1º, I, do Estatuto.
Outra corrente, no entanto, advoga o entendimento de que o efeito sancionatório é restritivo para a suspensão e extensivo para a declaração, ou seja, neste último caso, deve a sanção ser recepcionada por entidade federativa diversa. O argumento tem amparo no fato de que no art. 87, III, o Estatuto alude à Administração – definida no art. 6º, XII, como sendo o órgão, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administração Pública opera e atua concretamente -, ao passo que no art. 87, IV, refere-se à Administração Pública – definida no art. 6º, XI, como sendo a administração direta e indireta dos diversos entes federativos.
Na verdade, não conseguimos convencer-nos, data venia, de qualquer dos pensamentos que concluem no sentido restritivo dos efeitos punitivos. Parece-nos que o efeito deva ser sempre extensivo. Em primeiro lugar, não conseguimos ver diferença de conceituação naqueles incisos do art. 6º, já que o que podemos constatar é apenas uma péssima e atécnica definição de Administração Pública; com efeito, nenhuma diferença existe entre Administração e Administração Pública. Além disso, se um contratado é punido por um ente federativo com a aplicação de uma daquelas sanções, a razão só pode ter sido a inexecução total ou parcial do contrato, isto é, o inadimplemento contratual, como está afirmado na lei (art.87). Desse modo, não nos parece fácil entender por que tal infração também não acarretaria riscos para as demais entidades federativas no caso de alguma delas vir a contratar com a empresa punida. Quer dizer: a empresa é punida, por exemplo, com a suspensão do direito de licitar perante uma entidade federativa, mas poderia licitar normalmente perante outra e, como é óbvio, sujeitá-la aos riscos de novo inadimplemento. Para nós não há lógica em tal solução, porque a Administração Pública é uma só, é una, é um todo, mesmo que, em razão de sua autonomia, cada pessoa federativa tenha sua própria estrutura.
Adotando a corrente da abrangência nacional da sanção, Rafael Carvalho Rezende Oliveira (2014, p. 192) destaca que:
Em primeiro lugar é importante destacar a completa imprecisão da distinção entre os vocábulos “Administração Púbica” e “Administração”, uma vez que a doutrina considera as expressões como sinônimas, e a própria Lei 8.666/93 não se utiliza dessas expressões de forma clara (ex.: o art. 87, IV, da Lei, ao tratar da declaração de inidoneidade, adota, em verdade, as duas expressões). Em segundo lugar, não há violação ao princípio federativo na utilização dessas sanções por outros Entes com o objetivo de impedir a contratação de empresa que apresenta risco ao interesse público, não sendo razoável considerar que uma empresa penalizada coloque em risco apenas o Ente sancionador, e não os demais. Por fim, os princípios da moralidade e da eficiência, insculpidos no art. 37 da CRFB, devem pautar todas as Administrações Públicas, não importa o nível federativo, sendo certo que a contratação de risco vulneraria os citados princípios.
A lógica principal utilizada pelos doutrinadores é simples: se a empresa fora declarada suspensa de licitar, o motivo fora a inexecução total ou parcial de contratos firmados com a Administração, fato que causou um dano à mesma, de modo a tornar temerária a contratação da empresa por todo e qualquer ente, haja vista o risco de novo inadimplemento e novos danos.
Ademais, não se pode olvidar ainda que administração constitui um todo uno e indivisível, bem como que todos os entes federados, suas administrações indiretas e órgãos estão sujeitos aos ditames da Lei nº 8.666/93, que em seu art. 3º dispõe acerca da necessidade de observância dos postulados da moralidade e probidade administrativa.
Seguindo tal vertente, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, que congrega a 1ª e 2ª Turmas do Tribunal, as quais possuem atribuição regimental para tratar do tema “licitações e contratos administrativos”, em julgamento decidido de forma unânime, consolidou o entendimento de que a abrangência da penalidade contida no art. 87, III, da Lei nº 8.666/93 é nacional, nos termos da seguinte ementa:
MANDADO DE SEGURANÇA. PENALIDADE APLICADA COM BASE NA LEI 8.666/93. DIVULGAÇÃO NO PORTAL DA TRANSPARÊNCIA GERENCIADO PELA CGU. DECADÊNCIA. LEGITIMIDADE PASSIVA. LEI EM TESE E/OU ATO CONCRETO. DANO INEXISTENTE. 1. O prazo decadencial conta-se a partir da data da ciência do ato impugnado, cabendo ao impetrado a responsabilidade processual de demonstrar a intempestividade. 2. A Controladoria Geral da União é parte legítima para figurar em mandado de segurança objetivando atacar a inclusão do nome da empresa no PORTAL DA TRANSPARÊNCIA, por ela administrado. 3. O writ impugna ato concreto, oriundo do Ministro dirigente da CGU, inexistindo violação de lei em tese. 4. Nos termos da jurisprudência desta Corte, a penalidade prevista no art. 87, III, da Lei 8.666/93, suspendendo temporariamente os direitos da empresa em participar de licitações e contratar com a administração é de âmbito nacional. 5. Segurança denegada. (STJ, MS 19657/DF, Relator: Ministra ELIANA CALMON, Data de Julgamento: 14/08/2013, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO)
Inclusive, este já era o entendimento da Corte, que sucessivas vezes já o havia reafirmado, a exemplo do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 32628/SP, relatado pelo Ministro Mauro Campbell Marques, do Recurso Especial nº 174274/SP, relatado pelo Ministro Castro Meira e o Recurso Ordinário em Mandado de Segurança 9707/PE, relatado pela Ministra Laurita Vaz.
Embasada nas reiteradas decisões proferidas pelo Superior Tribunal de Justiça, a Advocacia-Geral da União exarou o parecer nº 087/2011/DECOR/CGU/AGU, o qual foi aprovado pelo Consultor Geral da União, concluindo que:
(...) a aplicação denominada suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração por prazo não superior a 2 (dois) anos prevista no inciso III do art. 87 da Lei nº 8.666/93 determina o afastamento das empresas apenadas das licitações e contratações promovidas por toda a Administração Pública brasileira.
Vislumbra-se, portanto, que a administração pública, ao menos em nível federal, já tem adotado o entendimento esposado pelo Superior Tribunal de Justiça, em detrimento daquele apresentado pelo Tribunal de Contas da União, havendo, inclusive, a expectativa de que a Corte de Contas passe a seguir os precedentes judiciais, uniformizando a análise da temática.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Expostos os argumentos e debates concernentes ao âmbito de abrangência da sanção positivada no art. 87, III, da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, vislumbra-se que os órgãos responsáveis pela aplicação da lei têm se inclinado à adotar a validade nacional da reprimenda, como medida de proteção dos entes contratantes em face de um licitante ou contratado que demonstrou incapacidade de cumprir com avenças anteriormente firmadas com o Poder Público.
A exceção a tal entendimento reside no posicionamento do Tribunal de Contas da União, na defesa da restrição da sanção ao órgão punidor. Todavia, aguarda-se a revisão de tal entendimento, mormente diante da pacificidade do tema nos órgãos do Poder Judiciário.
REFERÊNCIAS
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23ª. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2012.
CRETELLA JR., José. Licitações e Contratos do Estado. 2a ed, Rio de Janeiro: Forense, 1999.
MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e contrato administrativo. 15º ed. São Paulo: Malheiros Editores. 2010.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 32ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2015.
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 16ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014.
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Licitações e contratos administrativos. 3ª ed. São Paulo: Editora Método, 2014.
PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Comentários à lei das licitações e contratações da administração pública. 8ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.
SUNFELD, Carlos Ari. Licitação e contrato administrativo, 2 Ed., Editora Malheiros, 1995.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Pós-graduado em Direito Administrativo pela Uniderp Anhanguera. Pós-graduando em Direito Processual pela PUC Minas. Procurador Legislativo da Câmara Municipal de Ituporanga/SC. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIBEIRO, Gabriel Pedroza Bezerra. Abrangência da sanção de suspensão do direito de licitar prevista no art. 87, III, da Lei nº 8.666/93, de 21 de junho de 1993: confronto entre o entendimento do Tribunal de Contas da União e do Superior Tribunal de Justiça Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 set 2019, 04:57. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53468/abrangncia-da-sano-de-suspenso-do-direito-de-licitar-prevista-no-art-87-iii-da-lei-n-8-666-93-de-21-de-junho-de-1993-confronto-entre-o-entendimento-do-tribunal-de-contas-da-unio-e-do-superior-tribunal-de-justia. Acesso em: 23 dez 2024.
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