ABILIO DAS MERCES BARROSO NETO
(Orientador)
GUSTAVO LEITE CARIBÉ CHECCUCCI
(Co-orientador)
Resumo: Com a finalidade de salvaguardar os princípios, direitos e garantias fundamentais das pessoas, e em particular as pessoas com deficiência, foram estabelecidas normas visando a garantia da dignidade dessas pessoas, possibilitando a efetivação de seus direitos. O presente artigo tem o objetivo de fazer uma crítica quanto ao estabelecimento do teto para concessão da isenção do imposto ICMS para os veículos automotores destinados à pessoa com deficiência, uma vez que, quando foram estabelecidos os requisitos e parâmetros ensejadores para efetivar tal isenção, primeiramente não havia o estabelecimento de limite de valor para os veículos que seriam adquiridos. Posteriormente este valor foi estabelecido, e o mesmo não é atualizado de igual forma como os valores dos automóveis o são, estando este defasado por volta de 09 anos. Interessante ressaltar que não há limite quanto à concessão de isenção ao IPI, imposto federal que incide sobre os produtos industrializados no Brasil.
Palavras-chave: Isenção. PCD (Pessoa com Deficiência). Imposto. ICMS.
Abstract: In order to safeguard the fundamental principles, rights and guarantees of the people, and in particular the people with disabilities, norms have been established in order to guarantee the dignity of these people, enabling the realization of their rights. The purpose of this article is to criticize the establishment of the ceiling for granting exemption from the ICMS tax for motor vehicles intended for people with disabilities, once, when the requisites and parameters for establishing such exemption were established, there was no establishment of value limit for the vehicles that would be purchased. Subsequently this value was established, and the same is not updated in the same way as the values of the cars are, being this delayed around 09 years. It is interesting to note that there is no limit on the granting of exemption to IPI, a federal tax that levied on industrialized products in Brazil.
Keywords: Exemption. DP (Disabled Person). Tax. ICMS.
1 INTRODUÇÃO
Promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade quaisquer outras formas de discriminação, elencar a dignidade da pessoa humana e da cidadania, assim como estabelecer que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, todos esses, são preceitos normativos constitucionais, que explicitam os princípios, objetivos, direitos e garantias fundamentais que asseguram os cidadãos.
Entretanto, na nossa vida em sociedade, ao decorrer dos tempos e do crescimento de nossas cidades, podemos perceber que muitas dessas garantias e direitos fundamentais, preceitos normativos são desrespeitados pelo Estado, pelo meio social e pela própria sociedade, tendo em vista a percepção de comportamento dos cidadãos, e esse desrespeito é maior percebido junto aos cidadãos que têm algum tipo de deficiência.
No Brasil, tendo como base o Censo demográfico de 2010, cerca de 45,6 milhões de pessoas declararam ter pelo menos um tipo de deficiência, seja do tipo visual, auditiva, motora ou mental/intelectual, e estas pessoas não vivem em uma sociedade adaptada.
Com a finalidade de que esses direitos sociais e fundamentais das pessoas com deficiência fossem cumpridos, foram criadas leis federais a exemplo da Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989 que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – Corde; a Lei nº 10.048, de 08 de novembro de 2000 que torna prioritário o atendimento das pessoas com deficiência, idosos e outras; e mais recentemente a Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015, que instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), entre outras; bem como foram criadas leis estaduais, essas mais esparsas e regulamentadoras, a exemplo da lei do Estado de São Paulo, nº 12.907, de 15 de abril de 2008, que consolida a legislação relativa à pessoa com deficiência no Estado de São Paulo e a lei do Estado da Bahia, nº 8.268, de 04 de julho de 2002, que cria o conselho estadual dos direitos da pessoa portadora de deficiência e dá outras providências.
Uns dos preceitos normativos constitucionais mais desrespeitados para com as pessoas com deficiência é direito ao lazer, e ao transporte, ferindo fortemente o superficialmente mencionado princípio da isonomia. Falar que todos são iguais perante à lei, sem distinção de qualquer natureza é tratar o desigual na medida da sua desigualdade.
Apesar de atualmente o sistema público de transporte contar com um percentual de sua frota composto de veículos adaptados e com lugares reservados às pessoas com deficiência e dificuldade de locomoção, sabemos que o transporte público no Brasil é caótico, seja por numerário pequeno de veículos disponíveis, seja pelo sucateamento da frota, ou ainda pelo mal planejamento do sistema urbano de trânsito. Se o transporte público é ruim para os usuários sem deficiência, pensemos para os usuários com algum tipo de deficiência?
Com isso, algumas leis específicas foram criadas na tentativa de solucionar/minimizar o problema de transporte/locomoção das pessoas com deficiência. Essas leis específicas foram criadas tanto no âmbito federal, como no âmbito estadual. No federal, temos como exemplo da Lei que dispõe sobre a Isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas portadoras de deficiência física, a Lei nº 8.989, de 24 de fevereiro de 1995, que foi modificada pela Lei Federal n. 10.690 de 16 de junho de 2003, e a Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, entre outras.
No âmbito estadual – Bahia, o decreto nº 13.780, de março de 2012, legislação que aprova o Regulamento do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços – RICMS, e mais especificamente o seu art. 264, inciso XXXIX, que trata da isenção do ICMS nas operações de saídas de veículos destinados as pessoas com deficiência, estabelecidos também pelos convênios nº 38, de 30 de março de 2012 e nº 78, de 15 de agosto de 2014, celebrado no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ.
2 DO DIREITO
Com a Constituição Federal de 1988 foram reafirmados os vários direitos e garantias fundamentais dentre eles o da dignidade da pessoa humana, liberdade, direito ao transporte, a vida, ao lazer, ao direito de ir e vir.
A constituição estabelece esses direitos e garantias a todos, independentemente de sua situação social, raça, cor, religião, e para isso cabe invocar o princípio da isonomia, que diz que todos somos iguais perante a lei. Mas como estabelecer igualdade onde cada ser humano é único, é diferente em algum aspecto?
De acordo com Rocha (2016) e Sabbag (2017), existe dois tipos de igualdade, a igualdade formal, que é tratado no art. 5º, da CF/88, que diz que todos somos iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza; e a igualdade material, que preceitua o conceito do princípio da isonomia, quando temos uma situação onde as partes/pessoas forem iguais, devemos tratá-los de igual, e quando houverem partes/pessoas desiguais, trataremos estes de forma desiguais, ou seja, tratar os desiguais na medida das desigualdades.
De acordo com a agência de notícias do IBGE, no último censo demográfico, 45,6 milhões de pessoas declararam ter pelo menos um tipo de deficiência, seja do tipo visual, auditiva, motora ou mental/intelectual. Apesar de representarem 23,9% da população brasileira em 2010, estas pessoas não vivem em uma sociedade adaptada.
Ainda segundo a agência, de acordo com a Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) de 2014, a maioria das prefeituras não promovem políticas de acessibilidade, tais como lazer para pessoas com deficiência (78%), turismo acessível (96,4%) e geração de trabalho e renda ou inclusão no mercado de trabalho (72,6%), o que afeta de forma direta no desrespeito dos preceitos normativos constitucionais mencionados.
Com todos esses cenários, a inserção da pessoa com deficiência na sociedade torna-se uma tarefa árdua, difícil, muito porque uma parcela desse numerário, são de pessoas que dependem de outras para se locomover, para se vestir, para praticar o lazer, ir à escola, trabalhar e etc., e muitas vezes essas pessoas que ajudariam não estão despostas a transpor as barreiras da sociedade ou não conseguem.
Cabe ressaltar que a legislação brasileira estabelece através da Lei nº 13.146/2015, que instituiu a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e em seu artigo 2º diz que:
Art. 2º Considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
O Estatuto da Pessoa com Deficiência é a consolidação de uma inquietude do legislador, tendo em vista que diversas leis trazem os meios pelos quais as pessoas com deficiência têm seus direitos básicos preservados. Por isso, muitas leis que serão mencionadas, neste artigo são anteriores ao mencionado estatuto a exemplo das leis nº 10.048/2000 que estabelece a prioridade no atendimento às pessoas com deficiência, idosos entre outras; e a nº 10.098/2000 que estabelece a acessibilidade no âmbito social, em prédios, ruas, e principalmente nos veículos automotores destinados ao serviço público de transporte.
As transformações arquitetônicas, urbanísticas e dos meios de transporte para com as pessoas com deficiência, regulamentadas pelas leis acima mencionadas, na tentativa de amenizar e diminuir as barreiras de acessibilidade, vai de encontro à real situação dos instrumentos de cada área, a exemplo do sucateamento da frota dos veículos de transporte público, falta de preparo dos operadores desses veículos, no sentido de ajuda para os transeuntes, além da má utilização das adaptações instaladas nos móveis e imóveis pertinentes ao transporte. Trazendo para as pessoas com deficiência, um desconforto físico e emocional na utilização do transporte público. Uma lei federal muito importante foi editada no ano 1995, que juntamente com os transportes autônomo de passageiros – os taxistas, deu oportunidade às pessoas com deficiência para adquirir veículos automotores com isenção fiscal sobre o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI. Acompanhando a Lei federal acima mencionada, os Estados, a partir de convênios estabelecidos entre si, através do Regulamento de Imposto de Circulação de Mercadoria e Serviços – RICMS, propõem à isenção fiscal sobre este último imposto.
O objetivo deste artigo é fazer uma crítica quanto ao ato de conceder a isenção do ICMS, para veículos automotores destinados às pessoas com deficiência, estar condicionada a um valor limite destes automóveis no mercado, não se preocupando quanto ao tipo de veículo poder atender às reais necessidades das pessoas com deficiência, deixando de cumprir com uma comodidade, ou melhor, com uma melhor acessibilidade para com este público.
Acessibilidade, de acordo com a Lei nº 13.146/15, o Estatuto da Pessoa com deficiência, em seu artigo 3º, inciso I, é definida como:
Art. 3º Para fins de aplicação desta Lei, consideram-se:
I - Acessibilidade: possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida;
Ademais o próprio estatuto, em seu artigo 53, estabelece o conceito de acessibilidade como “direito que garante à pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida viver de forma independente e exercer seus direitos de cidadania e de participação social”.
Além dos citados conceitos, para um melhor entendimento do presente trabalho se faz necessário trazer algumas definições de termos e siglas que serão usadas ao longo do desenvolvimento deste documento.
Conforme art. 16, do Código Tributário Nacional – CTN, imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. Machado (2018), define imposto como sendo um tributo devido em virtude da prática, pelo contribuinte, de um fato que revela capacidade para contribuir, revela riqueza, mas que não tem nenhuma relação com atividades estatais específicas. E, Sabbag (2017) diz que o imposto se define como tributo não vinculado à atividade estatal, o que o torna atrelável à atividade do particular, ou seja, ao âmbito privado do contribuinte.
Fato gerador da obrigação principal, de acordo com o artigo 114 do CTN é a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência.
Imunidade está prevista de forma clara na constituição, em ser art. 150, inciso IV, alíneas “a” / “e”, e de acordo com Sabbag (2017) e Machado (2018) trata-se de um impedimento de tributar, não há o eu se falar de tributo para com as imunidades, e por ser taxativo e expresso direto na Constituição Federal.
Isenção, conforme Rocha (2016), é uma dispensa legal de um tributo devido, é uma exceção à hipótese legal de incidência de tributo, podemos dizer que seu conceito confunde um pouco com imunidade, no tocante a forma expressa ao tributo. Para Sabbag (2017), isenção indica uma dispensa legal, no campo da tributação. É uma possibilidade normativa de dispensa legalmente qualificada. Por fim, Machado (2018) esclarece que isenção é estabelecida por lei, e não pela Constituição, e, portanto, cabe ao ente tributante (União, Estado, Município...), competente para criar o tributo, que edita norma mais específica que a norma de tributação, estabelecendo exceções (as hipóteses de isenção) nas quais o tributo não será devido.
As isenções abarcadas neste artigo serão o IPI, imposto de competência da União e mais contundentemente o ICMS, imposto de competência dos Estados e do Distrito Federal.
A lei que estabelece a isenção para o IPI é a Lei nº 8.989/95, que dispõe sobre a Isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de passageiros, bem como por pessoas portadoras de deficiência física, e em seu artigo 1º, e inciso IV, traz que:
Art. 1º Ficam isentos do Imposto Sobre Produtos Industrializados – IPI os automóveis de passageiros de fabricação nacional, equipados com motor de cilindrada não superior a dois mil centímetros cúbicos, de no mínimo quatro portas inclusive a de acesso ao bagageiro, movidos a combustíveis de origem renovável ou sistema reversível de combustão, quando adquiridos por:
IV – pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal;
É importante observar que há limitações quanto à algumas características do veículo que se pretende adquirir, conforme o caput acima, e que não há nenhuma menção quanto ao limite de valores destes veículos.
Essa lei ainda estabelece um conceito e classificação do que seriam essas deficiências elencadas no inciso IV, em seus parágrafos seguintes:
§1º Para a concessão do benefício previsto no art. 1º é considerada também pessoa portadora de deficiência física aquela que apresenta alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções.
§2º Para a concessão do benefício previsto no art. 1º é considerada pessoa portadora de deficiência visual aquela que apresenta acuidade visual igual ou menor que 20/200 (tabela de Snellen) no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20°, ou ocorrência simultânea de ambas as situações.
§4º A Secretaria Especial dos Diretos Humanos da Presidência da República, nos termos da legislação em vigor e o Ministério da Saúde definirão em ato conjunto os conceitos de pessoas portadoras de deficiência mental severa ou profunda, ou autistas, e estabelecerão as normas e requisitos para emissão dos laudos de avaliação delas.
A aplicabilidade da lei acima mencionada é estabelecida a partir de Instruções Normativas da Receita Federal, e nelas, também não se percebe limite de valor com a finalidade de aquisição dos veículos automotores destinados à pessoa com deficiência.
Em se tratando do imposto estadual, qual seja, ICMS, primeiramente cabe informar que conforme a CF/88 em seu art. 155, inciso IV dispõe que os entes federativos estabelecerão questões de isenção através de norma complementar. Ainda na constituição e também pelo código tributário nacional, estabelece-se que norma complementar pode advir tanto de lei complementar, como também resolução ou ainda convênios, cujo objetivo é regular a aplicação de seus preceitos entre os entes federativos, contribuindo para que não haja uma guerra fiscal e ainda facilitar as transições comerciais entres estes Estados.
Os convênios estabelecidos entres os estados, junto ao CONFAZ – Conselho Nacional de política Fazendária, de acordo com Rocha (2016), é um ato normativo executivo infralegal, que expressa, em matéria tributária, ajuste de vontade entre os entes federativos. Conforme Sabbag (2017), trata-se de ajustes ou convênios de cooperação (ou de colaboração) entre duas ou mais pessoas de Direito público para a prática ou omissão de determinados atos, visando ao aprimoramento da arrecadação e fiscalização tributária.
Atualmente, conforme o convênio nº 38/2012, estipulou-se um limite ao valor do veículo que será adquirido por pessoa com deficiência, não podendo ultrapassar a importância de R$ 70.000,00 (setenta mil reais), valor este, de mercado incluindo-se os tributos, como traz a redação do § 2º do referido convênio:
Cláusula primeira. Ficam isentas do ICMS as saídas internas e interestaduais de veículo automotor novo quando adquirido por pessoas portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas, diretamente ou por intermédio de seu representante legal.
§ 2º O benefício previsto nesta cláusula somente se aplica a veículo automotor novo cujo preço de venda ao consumidor sugerido pelo fabricante, incluídos os tributos incidentes, não seja superior a R$ 70.000,00 (setenta mil reais).
3 A REANÁLISE
Se voltarmos um pouco, e analisarmos o RICMS que primeiro figurou no arcabouço jurídico tributário, vemos que assim como no IPI, não havia limite para tal concessão da isenção de ICMS, uma vez que no RICMS/96, do Estado da Bahia em seu art. 24, inciso III traz que:
Art. 24. São isentas do ICMS as operações com bens para uso ou atendimento de deficientes físicos:
III - de 19/7/95 até 30/4/97, nas saídas de veículos automotores que se destinem a uso exclusivo do adquirente, sendo este paraplégico ou portador de deficiência física impossibilitado de utilizar os modelos comuns, observadas as seguintes disposições (Convs. ICMS 40/91, 80/91, 44/92, 148/92, 43/94, 83/94, 16/95, 46/95 e 121/95):
Podemos observar que quando estabelecido pela primeira vez, no regulamento não foi estipulado o de valor para aquisição do veículo destinado à pessoa com deficiência, e ainda, as deficiências abarcadas eram, ser paraplégico ou portador de deficiência física que impossibilitava a utilização de veículos comuns.
Havia, entretanto, uma maior preocupação em a pessoa com deficiência adquirente do veículo, comprovar capacidade contributiva/financeira para tal, tendo em vista que para requerer isenção dos dois impostos, até hoje, se faz necessária a comprovação de renda ou a declaração de capacidade financeira.
A capacidade contributiva é trazida no art. 145, §1º da CF, que diz que:
Art. 145. §1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte.
Segundo Rocha (2016), apesar da constituição dizer capacidade econômica significa que cada contribuinte deve contribuir na proporção de suas rendas e haveres, independentemente de sua eventual disponibilidade financeira.
Apenas em 2007, através do convênio nº 03/2007, o CONFAZ, estipulou o valor limite para aquisição de veículos destinados à pessoa com deficiência, que inicialmente era R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), e posteriormente em 2009, através do convênio nº 52/2009, o valor foi reajustado para R$ 70.000,00 (setenta mil reais), conforme transcrito abaixo:
Cláusula primeira. Ficam isentas do ICMS as saídas internas e interestaduais de veículo automotor novo com características específicas para ser dirigido por motorista portador de deficiência física, desde que as respectivas operações de saída sejam amparadas por isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, nos termos da legislação federal vigente.
Nova redação dada ao § 2º da cláusula primeira pelo Conv. ICMS 52/09, efeitos a partir de 28.07.09.
§ 2º O benefício previsto nesta cláusula somente se aplica a veículo automotor novo cujo preço de venda ao consumidor sugerido pelo fabricante, incluídos os tributos incidentes, não seja superior a R$ 70.000,00 (setenta mil reais).
Redação original, efeitos até 27.07.09.
§ 2º O benefício previsto nesta cláusula somente se aplica a veículo automotor novo cujo preço de venda ao consumidor sugerido pelo fabricante, incluídos os tributos incidentes, não seja superior a R$ 60.000,00 (sessenta mil reais).
Cabe aqui um momento de reflexão na real intenção de estabelecer um limite de valor para adquirir esses veículos. Seria uma atitude intencional do governo, uma vez que deixaria de arrecadar valores significativos nos veículos automotores que custassem além do limite? E, quanto a oportunizar as pessoas com deficiência uma maior acessibilidade, uma maior portabilidade e transitividade?
Todavia, cabe elucidar que desde 2009 o valor limite para aquisição de veículo automotor para pessoas com deficiência não sofre um reajuste. Fato este que vai de encontro com a atualização e reajustes do preço de mercado dos veículos, tendo em mente à tabela de automóveis, onde claramente, através da inflação e da regulação de mercado, esses produtos sofrem correções.
De acordo com a revista especializada Auto Esporte (2018), de acordo com a Associação Brasileira da Indústria, Comércio e Serviços de Tecnologia Assistida – ABRIDEF, no ano de 2014 foram comercializadas 84 mil unidades de carros adaptados ou adquiridos com isenção de impostos. Em 2017, esse número saltou para 187,5 mil unidades.
Por ser uma quantidade significativa de possíveis clientes, as montadoras e fábricas de automóveis, na tentativa de ofertar uma quantidade maior de opções de veículos para o público com deficiência, acabam retirando itens de série, acessórios, com a finalidade de enquadrar esses veículos ao valor limite, sem que elas assumam custos “adicionais”, diminuindo seus “prejuízos” e consequentemente aumentando seus lucros.
Entretanto, ao retirar esses itens, o que se tem, é uma diferenciação do produto para com os consumidores, desrespeitando os preceitos da igualdade e da isonomia, além de não oportunizar uma melhor acessibilidade ao público alvo, ocasionando um desconforto deste.
Não fosse o bastante, o mercado automotivo cada vez mais requer por um design mais atraente, e no momento de alteração dos modelos, não é levada em consideração as dimensões necessárias para atender às necessidades da pessoa com deficiência. Como exemplo podemos citar, uma pessoa que faça uso de cadeira de rodas, necessita de um bom espaço do bagageiro/porta-malas para transportar a sua cadeira de forma eficaz, entretanto com as modificações de design, as alterações feitas podem atingir e influenciar as medidas do compartimento mencionado, impossibilitando o uso de forma satisfatória.
Ao fazermos uma breve pesquisa dos automóveis disponíveis para atender às reais necessidades das pessoas com deficiência e de forma satisfatória, estes veículos superam em muito o teto estipulado, impossibilitando a isenção do ICMS e sendo possível apenas requerer a isenção do IPI, uma vez que não há limite para adquirir a isenção deste último imposto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebe-se claramente que quando proposta no RICMS/96, a isenção de ICMS para os veículos automotores destinados a pessoa com deficiência, não se estipulou o limite do valor do automóvel, portanto, apenas considerava a capacidade de compra, a capacidade financeira do adquirente.
A provável diminuição na arrecadação dos Estados, na aquisição de veículos para pessoas com deficiência, de forma abstrata, pode ter sido o fundamento para justificar a estipulação do limite no valor desses veículos, o que ocorreu apenas em 2007, 11 anos após a regulamentação da isenção.
Atualmente, por ser uma parcela de mercado favorável às montadoras e fabricas automobilísticas, estas tentam enquadra veículos que atendam às necessidades desse público, as pessoas com deficiência. Porém, não observam as condições da rotina destes, quanto ao tamanho do bagageiro/porta malas, abertura de portas para um acesso mais facilitado, altura em relação ao solo, regulagem de banco de motorista e/ou passageiros, direção leve para aqueles que têm dificuldade, adaptações a serem instaladas.
Enfim, as montadoras pouco observam as reais necessidades de acessibilidade aos veículos, e ao enquadrar seus melhores carros que poderiam atender esse público de uma forma mais cômoda, mais confortável e independente, as montadoras tem de retirar determinados itens para que o veículo automotor se encaixe no valor limite.
Ao diferenciar esses produtos, na justificativa de enquadrar dentro do valor limite, a montadora não prezaria pela “isonomia” do produto, uma vez que o torna diferente de um veículo adquirido por um consumidor comum, apesar de este obter o produto com valor reduzido, tendo em vista a isenção do IPI e do ICMS.
Se não existisse o valor limite dos veículos automotores destinados as pessoas com deficiência, para fins de requerer isenção do ICMS, não seria necessário, as fábricas, alterarem as características dos veículos, oportunizando ao público alvo, um veículo exatamente igual ao que um consumidor comum poderia adquirir.
Ainda assim, podendo oportunizar uma melhor pesquisa de mercado para um melhor conforto e real acessibilidade dessas pessoas, tendo em vista que por um melhor design, as montadoras esquecem da necessidade de melhores espaçamentos e capacidade dos compartimentos, para atender às pessoas com deficiência.
Todo e qualquer veículo de fabricação brasileira, atendendo aos requisitos trazidos na legislação vigente, desde que não fosse exigido o valor limite para aquisição do carro com isenção fiscal de ICMS, seria uma conquista para às pessoas com deficiência, de forma a se sentirem realmente inseridas, e oportunizar que as montadoras e fábricas ofereçam veículos que atendam às reais necessidades de acessibilidade, conforto de cada adquirente/contribuinte, tendo em vista que cada pessoa com deficiência é única.
REFERÊNCIAS
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MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Manual de Direito Tributário. 10ª. ed. São Paulo: Atlas, 2018.
ROCHA, Roberval. Direito Tributário – Sinopses para concurso – vol. 28. 3ª. ed. Salvador: JusPODIVM, 2016.
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SASSATELLI, Caroline. Venda de Carros para Pessoas com Deficiência (PCD) Aumenta 35% em 2017. Revista Auto Esporte. Disponível em: <https://revistaautoesporte.globo.com/Noticias/noticia/2018/02/venda-de-carros-para-pessoa-com-deficienia-pcd-aumenta-35-em-2017.html>. Acesso em: 10 de dezembro de 2018.
BACHAREL EM DIREITO, TECNÓLOGO EM ANÁLISE E DESENVOLVIMENTO DE SISTEMAS E TÉCNICO JUDICIÁRIO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA;
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, LUCAS CARDOSO. Aquisição de veículo automotor com isenção fiscal para pessoas com deficiência: Crítica ao valor limite para requerer isenção ICMS Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 out 2019, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53644/aquisio-de-veculo-automotor-com-iseno-fiscal-para-pessoas-com-deficincia-crtica-ao-valor-limite-para-requerer-iseno-icms. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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