RESUMO: Este artigo científico tem como enfoque a Lei 13.260 de 16 de março de 2016, que trata do antiterrorismo e da criminalização do terror, que para ser possível, contém dispositivos pertinentes para reprimir o ilícito partindo do ponto de uma lei específica, com o fim de tornar a pena dos que praticam atos tipificados na referida lei ainda mais gravosos. Inicialmente conceituar-se-á o terrorismo e demonstrar-se-á suas principais características e aspectos, montando-se uma linha do tempo, desde a origem da denominação “terrorismo” em si, passando pelas subdivisões criadas com o passar dos anos de repressão, até os dias atuais, a contar da revolução do terror, quanto ao aumento do poder de destruição dos atos terroristas. No foco principal, será apresentada o cumprimento do chamado constitucional da Lei 13.260/2016 e a correspondência do Código Penal Brasileiro. Por fim, será demonstrado a relação da criação da Lei à correspondência aos tratados internacionais de cooperação de combate ao terror.
PALAVRAS-CHAVE: Terrorismo. Criminalização. Lei 13.260/16. Brasil.
ABSTRACT: This scientific article focuses on Law 13.260 of 16 March 2016, which deals with anti-terrorism and the criminalization of terror, which, to be possible, contains relevant provisions for repressing the illicit from the point of a specific law, in order to make the punishment of those who perform acts typified in that law even moore serious. Initially, terrorismo will be conceptualized and its main features and aspects will be demonstrated, and a timeline will be drawn from the origino f the name “terrorismo” itself, through the subdivisions created over the years of repression, to the presente day, from the terror revolution, on the increase of the destructive power of terrorist acts. In the main focus, will be presented the compliance with the constitutional call of law 13.260/2016 and the correspondence of the Brazilian Penal Code. Finally, the relationship between the creation of the Law and the correspondence to international counterterrorism cooperation treaties will be demonstrated.
Keywords: Terrorism. Criminalization. Law 13.260/16 Brazil.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. ASPECTOS DO TERRORISMO. 1.1. Conceito de Terrorismo. 1.2. As Origens do Terrorismo. 2. TERRORISMO NA ATUALIDADE. 3. PREVISÃO LEGAL DA CRIMINALIZAÇÃO DO TERRORISMO. 3.1. Previsão Constitucional. 3.2. Tratados Internacionais. 4. PROCESSO LEGISLATIVO PARA A CRIAÇÃO DA LEI 13.260/16. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O presente artigo científico tem como objetivo demonstrar a criminalização do terrorismo no Brasil, através da sanção da Lei 13.260 de 16 de março de 2016, esclarecendo pontos quanto à tipificação específica dos crimes presentes na referida Lei e seu processo legislativo, partindo do ponto de vista permissivo da Constituição da República de 1988, a qual possui um mandado de criminalização no dispositivo de seu artigo 5º, inciso XVIII. Será apresentado também a posição do Brasil nos tratados internacionais, referentes ao terrorismo, em que é signatário. Explicar-se-á acerca da cooperação mundial que objetiva ações unitárias que visam o fim do terror.
Para alcançar os fins supracitados, este artigo científico, após definir e conceituar o terrorismo, partirá do ponto de vista histórico, destrinchando desde as origens da palavra “terrorismo” em si, quando surgiram os primeiros movimentos responsáveis por praticar atos considerados de terror, a partir de quando passaram a ser interpretados como atos terroristas, demonstrando exemplos de movimentos praticantes de atos nos últimos anos do século XX, até a apresentação de sua face no século XXI.
O terror tem como meio para alcançar o seu fim, a disseminação do medo, e o filósofo Aristóteles, na sua Retórica, esclarece que o medo consiste numa situação aflitiva ou numa perturbação causada pela representação de um mal iminente, ruidoso ou penoso: “... forçoso é admitir que as coisas temíveis são as que parecem ter um enorme poder de destruir ou de provocar danos que levem a grandes tristezas. [...] O perigo consiste nisso mesmo: na proximidade do que é temível” (Aristóteles, Retórica, II, 1382a)[1]
Seguindo um conceito atual, o terrorismo consiste em atos de violência cometidos por pessoas ou grupos, que tem como finalidade causar danos materiais, atentar contra integridade física de pessoas[2] e principalmente abalar os pilares mais importantes de uma sociedade, causando temor naquele território.
A palavra “terrorismo” teve origem no escrito “Cartas Sobre uma Paz Regicida” de Edmund Burke, quando das críticas sobre a Revolução Francesa, no período em que se acentuaram as mortes na guilhotina causando verdadeiro terror em razão do acentuado número de mortes.[3]
Parte significativa dos atos terroristas tais como conhecemos hoje, teve origem juntamente com os atos de guerrilhas irregulares, de forma que não é possível remeter à origem do terror sem que se faça referência elas, como demonstrado a seguir:
A guerrilha teve origem, tal como a conhecemos hoje, na Espanha (era chamada de guerrilha), no início do século XIX, quando a Península Ibérica foi invadida pelas tropas napoleônicas. A resistência espanhola a Napoleão fez-se de forma não sistemática, isto é, sem recursos e estratégias militares convencionais. Ao contrário, foi feita de modo irregular, incluindo emboscadas, ataques com armas improvisadas, sabotagens, sequestros etc.[4]
Esse tipo de tática seria bastante utilizado, depois, em vários outros países por grupos de diversas orientações ideológicas, desde comunistas e anarquistas até nacionalistas e separatistas. Porém, a diferença é que esses grupos passaram a incluir em suas ações atentados a vítimas inocentes, isto é, fora do campo da guerra irregular.[5]
No entanto, José Cretella Neto assevera que as primeiras manifestações terroristas conhecidas hoje remontam ao Oriente Médio, ainda no século I, com a seita Zelotes, partindo aos séculos XI e XIII, com atos praticados pelos israelitas Hashashin, ao século XIV com os cristãos taboristas da Boêmia ou os anabotistas do século XVI.[6]
Portanto, entende-se que, espelhados em movimentos com fins específicos e alvos simetricamente opostos do lado inimigo, os atos terroristas passaram a ser realizados não visando um inimigo com excelência de guerra do outro lado, mas simplesmente aspirando a uma destruição de um povo ou de uma nação com alvos compostos por pessoas inocentes, caracterizados por atos covardes.
Passado a explanação acerca das origens do terrorismo, e tendo sido exposto que fora oriunda de uma mudança nas características de seus alvos e ideais, passa-se agora à análise do terrorismo como é conhecido hoje.
Os atos de terrorismo perturbam a estrutura do mundo ocidental e chocam os cidadãos de diversos países do mundo, e os estudos para seu combate tornaram-se tão complexos que foram criadas, inclusive, subdivisões dando nome a diversos tipos a depender da forma de como se concretizam os atos contra a vida.
Existem quatro tipos de terrorismo classificados por estudiosos, quais sejam:
Terrorismo revolucionário: surgiu no século XX e seus praticantes ficaram conhecidos como guerrilheiros urbanos marxistas (maoístas, castristas, trotskistas e leninistas);
Terrorismo nacionalista: fundado por grupos que desejavam formar um novo Estado-nação dentro de um Estado já existente (separação territorial), como no caso do grupo terrorista separatista ETA na Espanha (o povo Basco não se identifica como espanhol, mas ocupa o território espanhol e é submetido ao governo da Espanha);
Terrorismo de Estado: é praticado pelos Estados nacionais e seus atos integram duas ações. A primeira seria o terrorismo praticado contra a sua própria população. Foram exemplos dessa forma de terrorismo: os Estados totalitários Fascistas e Nazistas, a ditadura militar brasileira e a ditadura de Pinochet no Chile. A segunda forma constituiu-se como a luta contra a população estrangeira (xenofobia);
Terrorismo de organizações criminosas: São atos de violência praticados por fins econômicos e religiosos, como nos casos da máfia italiana, do Cartel de Medellín, da Al-Qaeda etc.[7]
Desta forma, pode ser observado que os atos terroristas podem ser praticados não apenas por grupos terroristas autointitulados como rebeldes e separatistas ou agentes de uma nação contra a outra, mas também por um líder de uma nação contra seu próprio povo, como no caso de ditaduras, bem como por núcleos separatistas representantes de um nacionalismo exacerbado.[8] A exemplo disso, a Enciclopédia Britânica expõe o seguinte:
Uso sistemático de violência para criar um clima de medo generalizado numa população e dessa forma atingir um determinado objetivo político. O terrorismo tem sido praticado por organizações políticas tanto de direita quanto de esquerda, por nacionalistas e grupos religiosos, e por instituições do Estado como Forças Armadas e policiais. [9]
O terrorismo é a mais recente erupção de um problema social persistente: o conflito armado internacional.[10] A face do terrorismo do século XXI começou a ser mostrada e conhecida no mundo a partir dos atentados de 11 de setembro de 2001. O grupo Al-Qaeda, liderado por Osama Bin Laden foi responsável pelo maior atentado terrorista da história da humanidade, com 2.993 mortos e mais de 8.900 feridos.[11] Iniciado o século, o mundo buscou perspectivas de uma revolução que não acreditava ser aquela apresentada, com o terror como protagonista. A forma de demonstrar o poder de um grupo e sua determinação em diminuir uma nação se mostrou muito grande frente às demonstrações do que era conhecido como terrorismo no século XX.
A ONU desde o 11 de setembro vem editando resoluções para coibir o terrorismo[12] e os Estados Unidos, aliado a isto, também faz uso da Doutrina Bush para definir quais atos devem ser classificados como terroristas.[13]
Acerca dos alvos bem definidos, a repórter Juliana Bezerra, em matéria do site Toda Matéria, relata que “O terrorismo procura causar atos violentos espetaculares e que chamem muita atenção. Por isso, o alvo escolhido deve causar grande quantidade de vítimas ou ser num lugar que renderá horas de programas e reportagens televisivas.”
Desta forma, o uso de aviões de voos comerciais em uma investida coordenada sobre pontos não apenas muito conhecidos, mas que também são símbolos da supremacia e soberania de uma nação, promovendo a morte de quase 3 mil pessoas de uma só vez mostrou-se como uma nova forma de terror, muito diferente do visto em ano anteriores.
A exemplo de contraponto, podem ser observados os atos praticados pelo Euskadi Ta Askatasuna,[14] ou ETA, grupo terrorista de origem Basca que teve o auge de suas atividades nos anos 80. Fernando Aramburu, em sua obra literária intitulada Pátria, exemplifica a forma de atuação do grupo:
Daí a pouco divisaram um ônibus municipal. (...) Deixaram vários carros passarem, mas mandaram parar o que vinha na frente do ônibus. (...) Com a passagem bloqueada, o ônibus se viu obrigado a parar. (...) Lançaram uma bilha de aço com o estilingue. O impacto deixou marcas no para-brisa, sem chegar a atravessá-lo (...). Uma dúzia de passageiros desceu com receosa celeridade. Nesse instante explodiu no interior no ônibus a primeira garrafa incendiária. Joxe Mari dava as instruções:
-Apontar para os bancos, os bancos.
(...) A essa altura o ônibus já era uma enorme caixa de chamas. Desprendia-se dele uma fumaça espessa, roçando a fachada mais próxima. [15]
Fundado em 2004, um grupo dissidente da Al-Qaeda, o Ismamic State Of Iraq and Syria, ISIS, ou simplesmente Estado Islâmico, alcançada sua independência em 2014, passou a atuar com maior força na busca de seus objetivos.[16] Reconhecido internacionalmente como grupo terrorista, na forma da resolução 2.253 de 2015 do Conselho de Segurança da ONU,[17] foi responsável pela prática de centenas de atos terroristas de dominação em áreas do oriente médio, com o objetivo de criação de uma nova nação independente baseada nos princípios políticos e religiosos do Islã, ou seja, um califado, partindo do território que compreende o Iraque e objetivando a conquista de outros territórios tanto no oriente médio quanto na África, Ásia maior e Europa.[18]
Para atingir seus objetivos estabeleciam metas como a tomada de grandes centros urbanos, em pontos estratégicos que permitiam êxito em saques e aumento de riquezas. Quanto a este ponto, acerca do aumento de riquezas, a tomada de usinas de refinaria de petróleo e a manutenção de seu funcionamento, fazia parte de seus planos para atender a seus desígnios.[19]
Apesar de seus atos de terror não terem sido capazes de chegar à América, ou sua autoria não ter sido confirmada, onde segundo seus próprios membros, estava seu principal inimigo, o continente Europeu foi grandemente atingido, principalmente em razão de sua vulnerabilidade gerada pela abertura de suas fronteiras, consequência do grande êxodo de pessoas oriundas do oriente médio, fugindo de guerras causadas pelas tomadas de cidades por extremistas.[20]
Reconhecidamente, o Brasil não possui histórico de atentados terroristas como os vistos com relativa frequência em noticiários, quando estes se referem aos Estados Unidos, França e Oriente Médio em geral,[21] no entanto, passadas as explicações que tratam acerca da origem do terror, bem como as explicações de como o terrorismo evoluiu com o passar dos anos e como se apresenta hoje, é tempo de se refletir, com fundamento em uma visão globalista evolutiva, isto é, observando que atualmente, com posição global estratégica e uma imensurável riqueza natural, além da expressiva pluralidade de raças, cores e crenças, o Brasil poderia ser um alvo de atos de intolerância por essas razões.
No tocante a isso, a intolerância a grupos étnicos, raciais e a sociais pode ser causa originária de um ataque terrorista, e o Brasil viveu uma ameaça ainda no ano de 2019, em razão de sua miscigenação oriunda da imigração de povos com o passar dos séculos desde sua descoberta. Em março de 2019, o terrorista ultranacionalista Brenton Tarrant, antes de executar o ato que resultou na morte de 50 muçulmanos que faziam rezas tradicionais, na Nova Zelândia, deixou um manifesto racista que citava o Brasil, criticando sua diversidade racial e destacando que era um país fadado ao fracasso em razão disso.[22]
A Lei Antiterrorismo, conforme seu preâmbulo, foi criada com o fim de regulamentar o inciso XLIII do artigo 5º da Constituição Federal no que tange ao terrorismo, disciplinando este e regulamentando questões processuais e investigatórias, como demonstrado:
Regulamenta o disposto no inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo, tratando de disposições investigatórias e processuais e reformulando o conceito de organização terrorista; e altera as Leis n º 7.960, de 21 de dezembro de 1989, e 12.850, de 2 de agosto de 2013.[23]
Neste sentido, Cláudio César Busato, no livro Lei Antiterror Anotada, vai ainda mais a fundo e expõe a ideia do mandado de criminalização formado pelo legislador constituinte, que se caracteriza como um mandamento constitucional, quando diz o que se segue: “A norma do art. 5º, XLIII, da CR/88 expressa um comando claro: legislador, edite uma lei que dificulte a situação daqueles que cometeram o crime de terrorismo”.[24]
Assim, em respeito à norma constitucional originária, foi editada a Lei 13.260/2016 em momento oportuno.
Vale dizer que obedecer a um dispositivo constitucional originário vai além de simplesmente fazer-se gerar um novo tipo específico de crime para assim fazer uma nova forma dosagem da pena, mas mais do que isso, a criminalização do terrorismo é uma forma de garantir a democracia constitucional e dar efetividade aos direitos fundamentais, previstos no artigo 5º da Constituição Federal, que finda por ser uma garantia do estado democrático de direito, como disciplina o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Melo, no julgamento da extradição número 855 de 2006:
E a razão desse entendimento[25] apoia-se na circunstância de que o terrorismo constitui um atentado às próprias instituições democráticas, o que autoriza excluí-lo da benignidade de tratamento que foi conferida, pela Constituição do Brasil, aos atos configuradores de criminalidade política. [26]
O terrorismo, após a edição da Lei 13.260/16, passou também não apenas a ser tipificado de maneira específica, mas também passou a ser considerado hediondo. A Constituição da República especifica os crimes equiparados aos hediondos, e analisado em conjunto do o artigo 2º da lei antiterror, analogicamente é entendido pela hediondez do terrorismo.[27]
A Lei de segurança nacional, criada em 14 de dezembro de 1983, à primeira vista mostrou-se como uma correspondente do mandado de criminalização da vindoura Constituição Federal, quando dispunha acerca do combate ao terrorismo. No entanto, deixou a desejar quando não esclareceu e demonstrou quais atos seriam considerados terroristas, não os caracterizou. Desta forma, abria-se margem para interpretações das mais variadas, podendo-se incluir ainda os movimentos sociais, o que não seria desejado.
Nunes Júnior assevera que o artigo 20 da Lei de Segurança Nacional definia o crime de terrorismo, nos seguintes termos:
Devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas. Pena – reclusão, de 3 a 10 anos. Parágrafo único. Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até o dobro; se resulta morte, aumenta-se até o triplo.
Entretanto, tal artigo, em razão da interpretação doutrinária, não poderia ser aplicado, justamente pela generalidade de seu preceito primário, isto é, a definição insuficiente da conduta de praticar atos terroristas, o que violava o princípio constitucional da legalidade, sob o aspecto da taxatividade.[28]
Faz-se importante destacar que, além da necessidade de criação de uma Lei antiterror afim de preservar a integridade da sociedade nacional, é de suma importância reconhecer, para além dos pressupostos constitucionais, a existência de uma rede de cooperação global para a repressão do terror. Peter Haberle assinala que uma característica de um Estado Constitucional Cooperativo é a atividade solidária estatal, na cooperação para além dos limites fronteiriços, dentre elas, a luta contra o terrorismo.[29] Assim, entende-se que há uma espécie de concordância mundial quanto ao objetivo de por fim ao terror. No Conselho de Segurança da ONU, após os ataques nos Estados Unidos até o final de 2012, foram aprovadas 33 resoluções sobre terrorismo.[30]
Entre 1963 e 2001, por meio de sua Assembleia Geral e da Organização da Associação Civil Internacional, da Organização Marítima Internacional e da Agência Internacional de Energia Atômica, a ONU patrocinou a celebração de vários tratados contra atos de força considerados, “independentemente da justiça da causa”, ilegítimos. É o caso da tomada de reféns, do apoderamento ilícito de aeronaves, da sabotagem a equipamentos de controle do tráfego aéreo e marítimo, do incêndio de plataformas de petróleo, do manejo de explosivos plásticos, da agressão a dignitários estrangeiros ou a membros do corpo diplomático, do uso de armas químicas e do financiamento ao terrorismo.[31]
Em razão disso, o Brasil é parte de um compromisso ético-jurídico que vai além das barreiras dos princípios de proteção nacionais, correspondendo à Convenção Internacional sobre a Supressão de Atentados Terroristas com Bombas, de 1998 e à Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, de 2002, sendo signatário em ambas.[32]
Lena Azevedo acrescenta que “os que defendem a aprovação de dispositivos legais para tipificar o terrorismo argumentam que, mesmo distante de ameaças, o Brasil tem obrigação de criar legislação específica para cumprir os acordos internacionais por ele ratificados, além de ter instrumentos para coibir movimentações de pessoas ou integrantes de organizações que praticam atividades identificadas com o terror.”[33]
Afim de evitar possíveis ataques terroristas, assim que houve o anúncio da realização do Copa do Mundo de Futebol e dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, o poder executivo federal, na pessoa da então presidente da República Dilma Rousseff,[34] passou a elaborar o projeto de lei 2.016/2015, que não apenas tipificasse como atos terroristas reconhecidos mundialmente como tal, mas também a caracterizar e conceituar o que seriam atos terroristas. Importante frisar que a lei não buscou tipificar como crime atos praticados, uma vez que já seriam crimes segundo o código penal brasileiro, mas apenas dar uma punição específica, mais gravosa, pertencente a uma Lei específica.
Em adendo a este ponto, além de qualificar, dividir e explicar a partir de qual momento os atos praticados seriam considerados terroristas, é importante esclarecer que desde o início, quando ainda em projeto de Lei até os dias atuais, a Lei não foi unânime em relação ao contentamento dos brasileiros.
Existe ainda hoje a preocupação de que a Lei possa ser utilizada como forma de criminalização de atos praticados por movimentos sociais, como descreve Schreiber na reportagem da BBC News Brasil, a fala do ex-Secretário Nacional de Justiça, Pedro Abramovay, que contesta a necessidade da existência da Lei 13.260/06 e avalia que mesmo com a existência do artigo 2º, parágrafo 2º, ainda há riscos da referida Lei ser usada para criminalizar manifestações populares, enfraquecendo a democracia.[35]
O artigo 2º da Lei 13.260/06 é taxativo em expor o que segue:
Art. 2º O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública.
§ 2º O disposto neste artigo não se aplica à conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou de categoria profissional, direcionados por propósitos sociais ou reivindicatórios, visando a contestar, criticar, protestar ou apoiar, com o objetivo de defender direitos, garantias e liberdades constitucionais, sem prejuízo da tipificação penal contida em lei.
Noutro giro, partindo do ponto de vista literal e positivado do dispositivo legal acima citado, considerando a impossibilidade da aplicação de dispositivos da Lei antiterror nos casos de atos praticados por membros de grupos pertencentes a movimentos sociais, o especialista Leandro Piquet declara o que se segue:
O terrorismo precisa ser punido com leis mais duras que a que temos. É muito mais grave, ameaça a sociedade de uma séria de formas que os movimentos sociais violentos não fazem. Precisamos definir exatamente o que é o ato de um grupo que tem por intenção amedrontar o governo e seus representantes e limitar o espectro de escolha da sociedade. Isso é um ato terrorista.
Logo após a propositura do projeto de Lei e a sua votação posta em pauta, especialistas em crime organizado transnacional, como Leandro Piquet, consideraram como uma “necessidade real” a criação de Leis mais duras para o combate ao terrorismo no Brasil.[36] Com caráter preventivo, a lei 13.260 de 2016 foi sancionada pela então Presidente da República Dilma Rousseff no dia 16 de março de 2016, e entrou em vigor na data de sua publicação.[37]
Portanto, perante todo o exposto no presente artigo científico, pode-se entender que a criminalização do terrorismo no Brasil passou do status secundário, no que se refere a valorização da política antiterror, ao posto primário quanto ao combate ao terror.
Inicialmente motivado por questões consideradas egoísticas, uma vez que não fora aprovada anteriormente em razão da suposta ausência de necessidade, a Lei 13.260 de 13 de março de 2016 passou a ser considerada, por especialistas e estudiosos, como uma correspondente à altura do mandado de criminalização disposto na Constituição da Republica de 1988.
Com a devida ênfase à proteção e garantias das livre manifestações dos movimentos sociais, a Lei Antiterror demonstra a importância da preservação ao livre pensamento, gerando a sensação do devido combate às ameaças externas, sem que haja a supressão de nenhum direito e garantia interno, pelo contrário, fazendo com que sejam ainda mais consolidados os direitos e garantias fundamentais.
Uma vez que a Lei antiterror é reconhecidamente oriunda de um mandado de criminalização constitucional originário, questiona-se ainda acerca dos tratados internacionais ratificados pela república. Ora, como visto no artigo científico de forma transparente, todos os movimentos traçados desde a Constituição até a sanção da Lei 13.260 de 2006, tinham como caminho intermediário, as assinaturas dos tratados internacionais pelo Brasil, demonstrando que a nação faz parte, solidariamente, da cooperação mundial que tem como objetivo, promover o fim do terror através de inúmeras formas, desde a adoção de políticas para o fim do financiamento às organizações terroristas, trabalhos de desestruturação das organizações e prevenção de ataques de células independentes, com caráter intolerante.
Portanto, com a devida Lei Antiterrorismo sancionada, demonstrada a colaboração universal e irrestrita da República no combate ao terrorismo através da adoção de medidas correspondentes aos tratados internacionais assinados e garantidos os devidos direitos aos movimentos sociais, face inclusive à valorização e fortalecimento do estado democrático de direito, resta latente que a Lei 13.260 de 13 de março de 2016 cumpre seu papel como proposto desde seu projeto, elaborado ainda no ano de 2015.
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[2] BEZERRA, Juliana. Terrorismo: definição, atentados e grupos terroristas. Toda Matéria, 2018. Disponível em: <https://www.todamateria.com.br/terrorismo/>. Acesso em: 29/10/2019.
[3] FERNANDES, Cláudio. Terrorismo. História do Mundo. Disponível em:<https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/terrorismo.htm>. Acesso em: 29/10/2019.
[4] FERNANDES, Cláudio. Terrorismo. História do Mundo. Disponível em: <https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/terrorismo.htm>. Acesso em: 29/10/2019.
[5]FERNANDES, Cláudio. Terrorismo. História do Mundo. Disponível em:<https://www.historiadomundo.com.br/idade-contemporanea/terrorismo.htm>. Acesso em: 29/10/2019.
[6] DAVID, Décio Franco et al. Art. 2º, caput e §1º. BUSATO, Paulo César (coord). Lei antiterror anotada: Lei 13.260 / 2016. Indaiatuba, SP: Ed. Foco, 2018. p.20. apud CRETELLA NETO, José. Curso de Direito Penal. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p.620-635.
[7] CARVALHO, Leandro. Terrorismo. Brasil Escola. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/historia/terrorismo.htm>. Acesso em: 02/11/2019.
[8] CANCIAN, Renato, Terrorismo de Estado – Violência de Governos Totalitários. UOL Pesquisa Escolar Sociologia. Disponível em: <https://educacao.uol.com.br/disciplinas/sociologia/terrorismo-de-estado-violencia-de-governos-totalitarios.htm>. Acesso em: 02/11/2019.
[9] BEZERRA, Juliana. Terrorismo: definição, atentados e grupos terroristas. Toda Matéria, 2018. apud ENCYCLOAEDIA BRITANNICA, 441. Inc, Estados Unidos e Escócia. Disponível em:<https://www.todamateria.com.br/terrorismo/>. Acesso em: 29/11/2019.
[10] BUSATO, Paulo César. Lei Antiterror Anotada: Lei 13.260 / 2016. Indaiatuba, SP: Ed. Foco, p. 11, 2018. apud YOO, John; HO, James C. The Status Of Terrorists. In Virginia Journal of International Law, Agosto/2003, p. 1.
[11] REVISTA FORBES. 10 MAIORES ATENTADOS TERRORISTAS DA HISTÓRIA. Redação, 20 Setembro 2016. Disponível em:<https://forbes.com.br/listas/2016/09/10-maiores-atentados-terroristas-da-historia/#foto10>. Acesso em 03/11/2019.
[12] MAIA, Renato Augusto Pereira. Terrorismo – 13.260/16: uma análise de tipificação do terrorismo no ordenamento jurídico brasileiro. Conteúdo Jurídico, 10 de Abril 2018. Disponível em: <https://www.conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/51533/terrorismo-lei-13-260-16-uma-analise-da-tipificacao-do-terrorismo-no-ordenamento-juridico-brasileiro> Acesso em: 12/11/2019.
[13] BEZERRA, Juliana. Terrorismo: definição, atentados e grupos terroristas. Toda Matéria, 2018. Disponível em:<https://www.todamateria.com.br/terrorismo/>. Acesso em: 29/11/2019.
[14] NICOLAZZI, Fernando. Democracia, violência e sociedade: o ETA e os usos do seu passado na Espanha. Café História, 15 Julho 2019. Disponível em: < https://www.cafehistoria.com.br/grupo-terrorista-eta-usos-do-passado/. Acesso em 03/11/2019.
[15] ARAMBURU, Fernando. Pátria. Tradução Ari Roitman; Paulina Wacht. 1ª ed. Editora Intrínseca: Rio de Janeiro, 2019. p. 128-129.
[16] SANTOS, Túlio Vinícius Dias. O Estado Islâmico do Iraque e da Síria, ou ISIS: Terrorismo, sua indefinição e o Direito Internacional. Recife, 2017. p. 18.
[17] SANTOS, Túlio Vinícius Dias. O Estado Islâmico do Iraque e da Síria, ou ISIS: Terrorismo, sua indefinição e o Direito Internacional. Recife, 2017. p. 18. Apud BRASIL. Decreto nº 8.799, de 6 de julho de 2016.
[18] FERNANDINO, Carolina Cristina Cordeiro. A Expansão do Estado Islâmico no Iraque e na Síria. Belo Horizonte, v. 16, n. 31, p.7-27, 2017; apud BUNZEL, Cole. From paper state to caliphate: the ideology of the Islamic State. Washington, D.C.: Anallysis Paper, n. 19, 2015.
[19] SANTOS, Túlio Vinícius Dias. O Estado Islâmico do Iraque e da Síria, ou ISIS: Terrorismo, sua indefinição e o Direito Internacional. Recife, 2017. p. 21; Apud BLOOD MONEY, How. ISIS Makes Bank. Disponível em:<https://foreingaffairs.com/articles/iraq/2014-11-30/blood-money>. Acesso: 24/01/2017.
[20] A migração na Europa em números. Estado de Minas Internacional, 20 Maio 2019. Disponível em https://www.em.com.br/app/noticia/internacional/2019/05/20/interna_internacional,1055100/a-migracao-na-europa-em-numeros.shtml>. Acesso em: 29/10/2019.
[21] SCHREIBER, Mariana. O Brasil precisa de uma lei antiterrorismo? Não é bem assim. BBC Brasil. Brasília, 2015; apud ABRAMOVAY, Pedro. 2015.
[22] Manifesto de Atirador da Nova Zelândia Faz Menção ao Brasil. Made for minds, 15 Março 2019. Disponível em:< https://www.dw.com/pt-br/manifesto-de-atirador-da-nova-zel%C3%A2ndia-faz-men%C3%A7%C3%A3o-ao-brasil/a-47941320>. Acesso em 03/11/2019.
[23] Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13260.htm>. Acesso em 01/11/2019.
[24] BUSATO, Paulo César. Lei Antiterror Anotada: Lei 13.260 / 2016. Indaiatuba, São Paulo. Ed. Foco, 2018, p.10.
[25] MELO, Celso. Extradição 855-2. República do Chile. Tribunal pleno do STF. Brasília, 2004. p. 24.
[26] MELO, Celso. Extradição 855-2. República do Chile. Tribunal pleno do STF. Brasília, 2004. p. 24.
[27] MAIA, Renato Augusto Pereira. Terrorismo – 13.260/16: uma análise de tipificação do terrorismo no ordenamento jurídico brasileiro. Conteúdo Jurídico, 10 Abril 2018.
[28] CAMBI, Eduardo Augusto Salomão; AMBRÓSIO, Felipe Augusto Rodrigues. Lei Antiterror Brasileira (L. 13.260/16) Ameaça à Democracia e aos Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro, 2017, p.12; Apud NUNES, Júnior et al. Leis Penais Especiais. 4ª ed. São Paulo, 2016.
[29] BUSATO, Paulo César, Lei Antiterror Anotada: Lei 13.260 / 2016. Indaiatuba, São Paulo: Foco, 2018, p. 11; apud HABERLE, Peter. Estado constitucional cooperativo. Trad. Marcos Augusto Maliska e Elisete Antoniuk. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p 70-71.
[30] AZEVEDO, Lena. Legislação Antiterror divide especialista. Desafios do Desenvolvimento, ano 12, ed. 83, 2015. apud MELLO, André. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=3151&catid=28&Itemid=39>. Acesso em 07/11/2019.
[31] BRASIL. MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, Secretaria de Cooperação Internacional. Raquel Elias Ferreira Dodge. Tratados Sobre Terrorismo, p. 9 Brasília, MPF, 2018.
[32] BUSATO, Paulo César, Lei Antiterror Anotada: Lei 13.260 / 2016. Indaiatuba, São Paulo: Foco, 2018. p.12.
[33] AZEVEDO, Lena. Legislação Antiterror Divide Especialistas. Desafios do Desenvolvimento, ano 12, ed. 83, 2015. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=3151&catid=28&Itemid=39>. Acesso em 07/11/2019.
[34] CAMBI, Eduardo Augusto Salomão; AMBRÓSIO, Felipe Augusto Rodrigues. Lei Antiterror Brasileira (L. 13.260/16) Ameaça à Democracia e aos Direitos Fundamentais. Rio de Janeiro, 2017. p. 06.
[35] SCHREIBER, Mariana. O Brasil precisa de uma lei antiterrorismo? Não é bem assim. BBC Brasil. Brasília, 2015. Disponível em:<https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151020_lei_terrorismo_ms_cc>. Acesso em: 07/11/2019.
[36] SCHREIBER, Mariana. O Brasil precisa de uma lei antiterrorismo? Brasil está vulnerável. BBC Brasil. Brasília 2015. Disponível em: <https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/10/151020_lei_terrorismo_ms_cc>. Acesso em: 07/11/2019.
[37] Lei nº 13.260, de 16 de março de 2016. Em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13260.htm
Graduando(a) do Curso de Direito do CENTRO UNIVERSITÁRIO FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Camila Anselmo de. A criminalização do terrorismo no âmbito da Lei 13.260/2016 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 nov 2019, 04:53. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53823/a-criminalizao-do-terrorismo-no-mbito-da-lei-13-260-2016. Acesso em: 23 dez 2024.
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