RESUMO: A evolução da responsabilidade civil do Estado passou por diversas etapas, com a adoção de variados marcos teóricos. Atualmente, a teoria adotada como regra pelo ordenamento jurídico brasileiro é a da responsabilidade objetiva, nos termos do art. 37, § 6°, da Constituição Federal. Entretanto, a doutrina controverte-se acerca da aplicação da responsabilidade objetiva aos casos de danos decorrentes da omissão estatal. O presente trabalho tem o objetivo de enfrentar tal problemática, aderindo ao entendimento que defende a necessidade de aferir, no caso concreto, a natureza da omissão. Em se tratando de omissão genérica, entende-se que a interpretação mais adequada é aquela que exige a comprovação da culpa para a caracterização do dever estatal de indenizar – teoria subjetiva; em caso de omissão específica, vinculada a uma posição de garantidor assumida pelo Poder Público, mostra-se pertinente a adoção da teoria objetiva, dispensando-se a vítima do ônus de comprovar a culpa do ente público.
PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade. Estado. Teorias. Omissão.
ABSTRACT: The evolution of state civil liability has gone through several stages, with the adoption of various theories. Currently, the theory adopted as a rule by the Brazilian legal system is that of objective liability, pursuant to art. 37, § 6°, of the Federal Constitution. However, the doctrine is controversial about the application of this theory to cases of damage resulting from state omission. This article aims to address this issue, adhering to the understanding that defends the need to assess, in the specific case, the nature of the omission. In the case of generic omission, it is understood that the most appropriate interpretation is that which requires proof of guilt to characterize the state duty to indemnify – subjective theory; in case of specific omission, linked to a position of guarantor assumed by the state, the adoption of the objective theory is pertinent, exempting the victim from the burden of proving the guilt of the public entity.
KEYWORDS: Liability. State. Theories. Omission.
SUMÁRIO: Introdução. 1. Evolução teórica acerca da responsabilidade civil extracontratual do Estado; 2. Responsabilidade civil extracontratual do Estado no ordenamento jurídico brasileiro; 2.1. Antecedentes históricos; 2.2. O art. 37, § 6°, da Constituição Federal de 1988; 2.3. Excludentes e atenuantes da responsabilidade civil do Estado; 3. Responsabilidade civil extracontratual do Estado por atos omissivos; 3.1. Teses doutrinárias acerca dos elementos de responsabilização do Estado por condutas omissivas; 3.2. Omissão genérica versus omissão específica: critério intermediário para a aferição da teoria a ser aplicada; 3.3. Precedentes do Supremo Tribunal Federal; 4. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Dentre os temas concernentes à responsabilidade civil extracontratual do Estado, a responsabilidade por atos omissivos talvez seja um dos mais polêmicos e instigantes. Doutrina e jurisprudência debatem há muito a matéria, o que resultou no desenvolvimento de variadas teses e opiniões.
O assunto reveste-se de importância ainda maior quando se constata a grande quantidade de ações judiciais a ele relacionadas. Com efeito, não é raro ao Poder Judiciário deparar-se com ações indenizatórias manejadas contra entes estatais com o objetivo de, por exemplo, obter-se reparação por danos materiais oriundos da má conservação de rodovias, ou por danos corporais advindos da falta de vigilância estatal em eventos ocorridos em presídios e em estabelecimentos públicos de ensino.
O objetivo deste artigo é apresentar as várias teses doutrinárias e jurisprudenciais que envolvem o dever de reparação decorrente da omissão estatal, e, ao final, concluir por aquela que nos afigura mais adequada.
Para tanto, discorrer-se-á, inicialmente, acerca dos marcos teóricos historicamente adotados para justificar a responsabilidade civil do Estado. Abordar-se-á desde a teoria da irresponsabilidade até a teoria do risco integral, passando-se pelas teorias civilista, do órgão, da culpa anônima e da responsabilidade objetiva.
Em seguida, será examinada especificamente a abordagem conferida ao tema pelo sistema jurídico pátrio, com a análise cronológica dos arcabouços normativos infraconstitucional e constitucional. Será enfatizado o tratamento atual da matéria pelo ordenamento, com o estudo da norma prevista no art. 37, § 6°, da Constituição Federal de 1988. A última parte deste capítulo será dedicada às causas de exclusão e atenuação da responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público.
Estabelecidas as bases conceituais e normativas necessárias, a parte final deste trabalho terá por objeto a análise da responsabilidade civil do Estado decorrente de sua omissão. Dessa forma, serão apresentadas as teses doutrinárias acerca do assunto, com enfoque inicial em duas correntes: aquela que adota a teoria objetiva, que dispensa a análise da culpa como elemento de responsabilização do Estado por condutas omissivas, e aquela que acolhe a teoria subjetiva, para a qual o elemento culposo é imprescindível[1]. Em seguida, será exposta a doutrina que distingue a omissão em genérica e específica para a aferição da teoria a ser aplicada na análise da responsabilidade do Estado por inação. Com base nesse critério, em se tratando de omissão genérica, caracterizada nas situações em que não se exigia uma atuação específica do Estado, a teoria a ser adotada será a da responsabilidade subjetiva; noutro giro, em se tratando de omissão específica, verificada nos casos em que o Poder Público assumiu uma posição de garantidor, terá aplicação a teoria objetiva. Ao fim, o capítulo apresentará precedentes do Supremo Tribunal Federal acerca da matéria.
O trabalho não tem a pretensão de esgotar a problemática do dever estatal de reparação por suas omissões, senão o desejo de contribuir para a apresentação sistemática das diversas teses – doutrinárias e jurisprudenciais – referentes ao tema. Após cotejar as várias perspectivas possíveis, será ressaltado o motivo pelo qual se entende que a proposta de solução mais adequada é aquela que, na avaliação da necessidade ou não de demonstração da culpa do ente público, diferencia, no caso concreto, a natureza da omissão.
1. EVOLUÇÃO TEÓRICA ACERCA DA RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO
A responsabilização civil extracontratual do Estado pode ser estudada em três fases: a primeira, caracterizada pela irresponsabilidade, ou seja, pela impossibilidade de se condenar o Poder Público ao pagamento de indenizações e compensações pecuniárias; a segunda, baseada na responsabilização do Estado conforme as teorias do direito civil, especialmente as que se referem aos atos de prepostos e mandatários; e, a terceira, fundada em conceitos de direito público, desatrelados das noções tradicionais civilistas, destacando-se as concepções de faute du service e de risco administrativo.
Teoria da irresponsabilidade
Até meados do século XVIII, prevaleceu a ideia de que o Estado não poderia, em nenhuma hipótese, ser civilmente responsabilizado. Não se concebia que o Poder Público viesse ser compelido a ressarcir, pecuniariamente, danos causados a particulares.
Esse período coincide, em sua maior parte, com o chamado absolutismo, que teve como elemento caracterizador principal o fato de o Estado confundir-se com a própria figura de seu governante. O monarca não poderia ser responsabilizado, logo, também o reinado estava imune a qualquer dever de reparação. Vigoravam, assim, os postulados “o rei não erra” (the king can do no wrong), “o Estado sou eu” (l’Etat c’est moi) e “o que agrada ao príncipe tem força de lei”.
A teoria da irresponsabilidade está calcada na concepção segundo a qual o Estado é soberano e, enquanto tal, não pode ser questionado em seus atos. Destarte, se ao Estado compete definir as leis e o direito, não poderia ser ele responsabilizado por seus atos. Haveria uma contradição dos próprios termos caso se admitisse que os súditos viessem a ser indenizados por seu soberano.
Dessa forma, em caso de dano, o particular teria, quando muito, a possibilidade de ver-se ressarcido pelo agente público que praticou o ato, mas, nunca, pelo próprio Poder Público. São elucidativas, a propósito do tema, as lições de Yussef Said Cahali:
Resguardava-se, assim, o Estado regalista, na sua prepotência de não contradição: o Estado é o órgão gerador do direito, cabendo-lhe a tutela dele; ao exercer a tutela jurídica, o Estado não atenta contra a ordem jurídica, pois, sendo ele próprio o direito, jamais praticaria injustiças.
Nesta fase histórica, portanto, inexistia a questão da responsabilidade civil do Estado: a irresponsabilidade aparece como um axioma cuja legitimidade não é posta em dúvida; a existência de uma responsabilidade pecuniária a cargo do patrimônio público é considerada como entrave perigoso à liberdade dos serviços; na ordem patrimonial, os administrados não têm à sua disposição senão a ação ressarcitória contra o agente causador do dano.[2]
Não é difícil perceber que a teoria da irresponsabilidade total e absoluta do Estado foi revista, sobretudo ante as injustiças provocadas pela impossibilidade de ressarcimento daqueles que tinham seus direitos violados pelo ente público. As críticas levaram à superação dessa teoria, de modo que, paulatinamente, passou-se a enxergar o Estado como um sujeito de direitos e obrigações, tal como os particulares.
Teoria civilista
Se o Estado propunha-se a ser o guardião dos direitos e obrigações dos indivíduos, não poderia, ele próprio, eximir-se do dever de reparar prejuízos que viesse a causar aos particulares.
Nesse sentido, a doutrina passou a adotar, analogicamente, as teorias do direito civil para justificar a responsabilização do Estado. Buscaram-se, assim, na culpa do agente público e nos princípios da responsabilidade por fato de terceiro (preposto, mandatário ou representante) os fundamentos para a responsabilidade estatal.
Sob esse enfoque, passou-se a adotar a distinção entre atos de império (jure imperii) e atos de gestão (jure gestionis). Os primeiros compreendem os atos que o Estado pratica na condição de soberano, quais sejam, atos relacionados às funções essenciais e supraindividuais do Poder Público. Por outro lado, os segundos estão vinculados a atos facultativos, praticados em condição de igualdade com os administrados.
No caso dos atos de império, por se tratar de um exercício da supremacia do Estado, de modo a manter sua própria existência e, bem assim, a ordem pública, não seria admissível a responsabilização do ente público. Entretanto, os atos de gestão estariam sujeitos à reparação civil, desde que verificada a sua culpa do agente público, que passou a ser visto, então, como preposto, mandatário ou representante do ente estatal.
Embora não se possa ignorar a importante contribuição da corrente que buscou aplicar as teorias civilistas à responsabilização estatal – pois, afinal, teve o mérito de romper com a irresponsabilidade absoluta –, é certo que a doutrina passou a questionar a classificação dicotômica dos atos públicos (atos de império versus atos de gestão).
No Brasil, a crítica pode ser bem resumida nas palavras de Washington de Barros Monteiro:
Só se pode tachar de arbitrária a distinção entre ato praticado jure imperii ou jure gestionis. Realizando um ou outro, o Estado é sempre o Estado. Mesmo quando pratica simples ato de gestão o Poder público age não como mero particular, mas para a consecução de seus fins. Portanto, não se pode dizer que o Estado é responsável quando pratica atos de gestão e não o é, quando realiza atos de império. Negar indenização neste caso é subtrair-se o Poder Público à sua função específica, qual seja, a tutela dos direitos.[3]
De outra banda, a ideia de que os agentes públicos seriam representantes, mandatários ou prepostos do Estado também veio a ser criticada, ao argumento de que falta ao ente estatal o elemento anímico. Para a doutrina de direito privado, os institutos da representação, do mandato, da preposição e seus correlatos imprescindem da manifestação de vontade das partes envolvidas.
Por essa razão, desenvolveu-se a chamada teoria do órgão, que, procurando solucionar a problemática da relação existente entre o Estado e seus agentes públicos, veio a prevalecer no âmbito das discussões jurídicas referentes à matéria.
Teoria do órgão
Tecendo feliz analogia entre o Estado e o organismo humano, o doutrinador alemão Otto Gierke desenvolveu a teoria segundo a qual os agentes públicos consubstanciam, cada um, elementos que, unidos, permitem o funcionamento de um sistema amplo e complexo: o ente estatal.
Destarte, os agentes públicos não deveriam ser vistos como agentes humanos que, per si, representam o Estado na prática de seus atos, mas, sim, como órgãos do ente estatal em atividade. A vontade de tais órgãos compreende vontades do próprio Estado, e não dos agentes.
Nesse sentido, são elucidativas as lições de Sérgio Cavalieri Filho, extraídas de seu Programa de Responsabilidade Civil:
Cedo constatou-se, todavia, que o Estado não é representado por seus agentes, mas age através deles e dos órgãos em que atuam. Como pessoa jurídica que é, o Estado não tem vontade nem ação, no sentido de manifestação psicológica e vida anímica própria. Estas, só os seres físicos as possuem. Não podendo o Estado agir diretamente, por não ser dotado de individualidade fisiopsíquica, sua vontade e sua ação são manifestadas pelos seus agentes, na medida em que se apresentem revestidos desta qualidade e atuem em seus órgãos. Pela teoria do órgão (ou organicista), idealizada por Otto Gierke, o Estado é concebido como um organismo vivo, integrado por um conjunto de órgãos que realizam as suas funções. Organismo traduz-se num conjunto de partes, às quais correspondem outras tantas funções que, combinadas, servem a manter o todo; mas a cada uma das partes, separadamente, não tem função alguma, não desempenha nenhum fim fora do organismo em que se integra.[4]
Assim, a teoria do órgão, também chamada de teoria da imputação volitiva, atribui ao Estado os atos praticados pelos agentes públicos. Aquilo que o agente quis e fez, seja de forma adequada ou não, é aquilo que o próprio ente público realizou. Isso porque o Estado é um ente uno, que não se distingue dos indivíduos responsáveis pelo seu funcionamento.
Teoria da culpa anônima
Em consonância com o movimento expresso na consagrada teoria do órgão, a teoria da culpa anônima busca ressaltar que a responsabilidade do Poder Público está condicionada a uma demonstração de culpa, não do agente – culpa individual –, mas do próprio serviço estatal – culpa anônima ou impessoal.
Nesse diapasão, o ente deve ser civilmente responsabilizado nas hipóteses em que o serviço não funcionou, funcionou mal (defeituosamente) ou funcionou tardiamente (de modo extemporâneo)[5].
Dessa forma, a culpa deixa de ser vista sob o aspecto civilista para assumir contornos próprios do direito público. Trata-se da chamada faute du service, acolhida originalmente na França e que tem por característica precípua a responsabilização estatal por uma culpa resultante da má prestação de um serviço público, independentemente da identificação de um agente causador específico.
Ressalte-se, porém, que, ao contrário do compreendido por alguns, a culpa anônima não se confunde com responsabilidade objetiva, pois, sob o enfoque da culpa anônima, a vítima terá que demonstrar, além do dano provocado e do nexo de causalidade, a falha na prestação do serviço, o que não é exigido na responsabilidade objetiva, conforme se verificará a seguir.
Teoria da responsabilidade objetiva
A fase seguinte da evolução histórica da responsabilidade civil do Estado compreende a teoria objetiva, que dispensa a demonstração do elemento culpa para a caracterização do dever de reparar.
Cuida-se de tese oriunda dos postulados da equidade e da isonomia. Deveras, se todos os indivíduos usufruem da atividade administrativa estatal, é de se considerar que essa mesma coletividade arque com os danos que o ente público eventualmente cause a alguns membros da sociedade.
Desse modo, equalizam-se os ônus advindos de violações a direitos praticadas pelo Poder Público, de forma que as pessoas lesadas não absorvam, isoladamente, os danos decorrentes de atividades realizadas no interesse geral.
Dispensam-se, assim, tanto a demonstração da culpa dos agentes públicos, quanto a comprovação da falha na prestação do serviço (faute du service). Bastam, para o dever de indenizar, o dano seu nexo de causalidade com a atividade estatal.
Os fundamentos da teoria da responsabilidade objetiva são bem sintetizados no escólio de Carlos Edison do Rêgo Monteiro Filho, que, em monografia intitulada Problemas de Responsabilidade Civil do Estado, assevera:
Essa teoria, que se contenta tão-somente com a prova do dano e do nexo de causalidade (são dois apenas os pressupostos necessários), tem como fundamento o princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais. Significa que se dividem, por todos, os prejuízos causados pelo Estado, porque, da mesma forma, por toda a população é repartido o benefício que o Estado proporciona. Esse princípio pode ser também apontado como o princípio da isonomia ou da solidariedade social. A responsabilidade objetiva é assim denominada porque prescinde de qualquer verificação de índole subjetiva, vale dizer, afasta-se a perquirição da culpa.[6]
Com vistas a justificar a responsabilidade objetiva do Estado, os juristas, capitaneados por Léon Duguit, desenvolveram a denominada teoria do risco administrativo, segundo a qual, por gerar riscos aos administrados, a atividade estatal – normal ou irregularmente exercida – gera o dever de reparar os danos causados aos particulares.
Segundo a lição de Sérgio Cavalieri Filho, a teoria do risco administrativo pode ser assim formulada:
(...) a Administração Pública gera risco para os administrados, entendendo-se como tal a possibilidade de dano que os membros da comunidade podem sofrer em decorrência da normal ou anormal atividade do Estado. Tendo em vista que essa atividade é exercida em favor de todos, seus ônus devem ser também suportados por todos, e não apenas por alguns. Consequentemente, deve o Estado, que a todos representa, suportar os ônus da sua atividade, independentemente de culpa dos seus agentes.[7]
Cumpre notar que a teoria do risco administrativo não se confunde com a teoria da responsabilidade integral, a seguir estudada. Com efeito, embora o risco administrativo implique a responsabilização do Estado independentemente da demonstração de culpa (haja vista o risco inerente à atividade administrativa), o dano deve estar relacionado, direta ou indiretamente, a um ato estatal. É dizer: o nexo causal, na teoria do risco, permanece como pressuposto para a configuração do dever de reparar, de tal forma que, uma vez rompido (o que poderá ocorrer, por exemplo, nos casos de culpa exclusiva de terceiros ou da vítima, caso fortuito e força maior), o ente público exime-se da obrigação de ressarcir.
Teoria do risco integral
O risco integral, a seu turno, caracteriza-se como a teoria segundo a qual o Estado terá o dever de indenizar mesmo nas hipóteses em que incidam excludentes de responsabilidade. Assim, ainda que se verifiquem, no caso concreto, culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito ou força maior, a Administração Pública teria o dever de reparar.
Como se nota de antemão, cuida-se de teoria extremada, que impõe às pessoas jurídicas de direito público ônus desarrazoado e injustificável, transformando-as em segurador universal, porquanto, em toda e qualquer situação, estariam compelidas a indenizar danos alegados por particulares, independentemente de decorrerem ou não da atividade administrativa.
2. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
2.1. ANTECEDENTES HISTÓRICOS
A doutrina nacional costuma acentuar que o Brasil não vivenciou o período da irresponsabilidade civil do Estado[8]. De fato, a Constituição imperial de 1824 já preceituava que os “empregados públicos” eram “estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções, e por não fazerem efetivamente responsáveis aos seus subalternos” (art. 178, nº 29).
O mesmo se deu com a Constituição republicana de 1891, que, em seu art. 82, dispôs:
Art. 82. Os funcionários públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões em que incorrerem no exercício de seus cargos, assim como pela indulgência ou negligência em não responsabilizarem efetivamente os seus subalternos.
Digna de nota, também, a regra estabelecida no art. 13 da Lei 221, de 20 de novembro de 1894, a qual dispunha que “os Juízes e Tribunais Federais processarão e julgarão as causas que se fundarem na lesão de direitos individuais por atos ou decisões das autoridades administrativas da União”.
Embora as vetustas regras prescrevessem a responsabilização pessoal dos agentes públicos, a doutrina da época[9] anota que a jurisprudência não titubeava em reconhecer a responsabilidade solidária do ente público pelos atos praticados por seus agentes.
Já no início do século seguinte, o Código Civil de 1916 previu dispositivo que efetivamente destacou a responsabilidade civil do Estado pelos danos oriundos de sua atuação. Tratou-se do art. 15, cuja redação era a seguinte:
Art. 15. As pessoas jurídicas de Direito Público são civilmente responsáveis por atos dos seus representantes que nessa qualidade causem danos a terceiros, procedendo de modo contrário ao Direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.
Apesar da redação pouco clara, compreende-se que o dispositivo estabelecia a responsabilidade civil do Estado atrelada à demonstração da culpa, na medida em que mencionava a contrariedade ao Direito ou ao dever legal. Ademais, é possível inferir a vinculação à culpa civil, porquanto o dispositivo referia-se aos atos das pessoas jurídicas praticados por seus “representantes”.
Assim, verifica-se que o regramento da responsabilidade civil do Poder Público sob a égide do Código Civil de 1916 estava fundamentada na teoria civilista, tratada no Capítulo 1 do presente artigo. Ao caracterizar os agentes públicos como representantes do Estado, a norma aludia aos institutos da preposição, do mandato e da representação, típicos do direito privado.
Por outro lado, antes mesmo que houvesse regramento legal abarcando a responsabilidade objetiva do Estado, parcela da doutrina e da jurisprudência já procurava desenvolver a tese da responsabilização baseada na teoria do risco[10]. Entretanto, foi com a Constituição Federal de 1946 que o ordenamento jurídico pátrio passou a contar com texto legal que efetivamente estabeleceu a responsabilização do ente público independentemente da existência de culpa. É o que se extrai da lição de Celso Antônio Bandeira de Mello:
A grande alteração legislativa concernente à responsabilidade do Estado ocorreu a partir da Constituição de 1946. O art. 194 daquele diploma introduziu normativamente, entre nós, a teoria da responsabilidade objetiva, isto é, a possibilidade de o Estado compor danos oriundos dos atos lesivos mesmo na ausência de qualquer procedimento irregular de funcionário ou agente seu, à margem, pois, de qualquer culpa ou falta de serviço.[11]
O art. 194 da referida Constituição dispunha que “as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causarem a terceiros”. Já seu parágrafo único trazia a seguinte redação: “caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes”.
De fato, a responsabilidade objetiva do ente público pode ser facilmente extraída de tal dispositivo a partir da seguinte ordem de ideias: o caput do artigo não previa qualquer exigência de culpa para a caracterização do dever das pessoas jurídicas de direito público em serem responsabilizadas, bastando que o dano a terceiros tivesse sido causado por seus funcionários, nessa qualidade. Por sua vez, o parágrafo único dispunha que, caso houvesse culpa do agente, caberia contra este ação regressiva por parte do Estado; ora, se o preceito estabelecia que, havendo ato culposo, o Poder Público poderia ser ressarcido pelos “funcionários causadores do dano”, certo é que, inexistindo a culpa, o dever da Administração de indenizar subsistia, embora não fosse possível, nesse caso, o manejo da ação regressiva.
É clássica a seguinte passagem da obra de Hely Lopes Meirelles, no que concerne à regra estabelecida no art. 194 da Constituição Federal de 1946:
O exame desse artigo revela que o constituinte de 1946 estabeleceu para todas as entidades estatais e seus desmembramentos autárquicos a obrigação de indenizar o dano causado a terceiros, por seus servidores, independentemente da prova de culpa no cometimento da lesão. Firmou, assim, o princípio objetivo da responsabilidade sem culpa pela atuação lesiva dos agentes públicos.[12]
Desde a inauguração da teoria da responsabilidade objetiva pela Constituição de 1946, a norma foi sucessivamente reproduzida pelas Cartas Políticas. Foi o que se deu com as Constituições de 1967 e 1969, que estabeleceram, em seus arts. 105 e 107, respectivamente (ambos com a mesma redação): “as pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que seus funcionários, nessa qualidade, causarem a terceiros. Parágrafo único: Caberá ação regressiva contra o funcionário responsável, nos casos de culpa ou dolo”.
2.2. O ART. 37, § 6°, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
A regra-matriz da responsabilidade civil do Estado no ordenamento jurídico brasileiro contemporâneo encontra-se insculpida no § 6° do art. 37 da Constituição Federal de 1988. Eis o teor do dispositivo:
Art. 37. (...)
§ 6° As pessoas jurídicas de Direito Público e as de Direito Privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
A doutrina não diverge quanto à natureza do comando previsto na Carta Cidadã: trata-se de responsabilização objetiva, para a qual o elemento culpa mostra-se insignificante na caracterização do dever de reparar.
Em função da semelhança das normas, o mesmo raciocínio desenvolvido com vistas à interpretação das Constituições anteriores pode ser aplicado para a compreensão da Carta Política atual. Com efeito, a primeira parte do dispositivo vigente não faz qualquer perquirição acerca do elemento culpa para a configuração da obrigação de reparar. Já a segunda parte do artigo esclarece que o ente público terá direito de regresso contra seus agentes na hipótese de danos causados mediante dolo ou culpa, o que significa dizer, a contrario sensu, que permanece o dever estatal de indenizar mesmo na ausência do elemento subjetivo.
Importante notar, na análise do art. 37, § 6°, da Constituição Federal de 1988, que o preceito legal não abraça a responsabilidade integral da Administração Pública[13]. Na realidade, cuida-se de adoção da teoria do risco administrativo, na medida em que a obrigação reparatória do ente público está condicionada a danos que seus agentes, nessa qualidade, hajam causado.
Dessa forma, mister que haja nexo de causalidade entre a atividade administrativa do Estado e o dano provocado a um terceiro. Caso o fato gerador do prejuízo não tenha relação com a atuação do ente público, rompe-se o liame causal e, com ele, o dever de indenizar.
Por outro lado, partindo-se da constatação de que a ordem jurídica pátria adotou a teoria do risco administrativo, necessário se faz reconhecer que a responsabilidade civil do Estado poderá ser atenuada ou mesmo afastada em determinadas situações.
2.3. EXCLUDENTES E ATENUANTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
Por força da teoria do risco administrativo, o Estado está obrigado a ressarcir os danos advindos de sua regular ou irregular atividade, sendo suficiente, para tanto, que se demonstrem o prejuízo e seu nexo de causalidade com a atuação estatal.
Nesse diapasão, poderá haver fatores de interrupção do nexo causal, com a consequente exclusão da responsabilidade civil do ente público. É o que se dá nos casos em que fatos da natureza, da própria vítima ou de terceiros figuram, exclusivamente, como causa do dano. De outra maneira, quando esses mesmos fatos concorrem, juntamente com a atividade estatal, para o prejuízo, haverá a atenuação da responsabilidade do Poder Público.
Os fatos da natureza capazes de excluir ou atenuar a responsabilidade do Estado subdividem-se em caso fortuito e força maior. Não há consenso doutrinário, tampouco jurisprudencial, acerca da distinção entre os dois institutos. Filiamo-nos à corrente segundo a qual, no caso fortuito, ocorre um evento imprevisível, estranho aos sujeitos jurídicos; já a força maior corresponde a uma situação que, embora previsível, apresenta-se inevitável.
A par dos estudos e debates acadêmicos, o Código Civil de 2002 não estabeleceu diferenciação entre os institutos, conforme se extrai de seu art. 393, parágrafo único: “o caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir”. De todo modo, importa consignar que ambos os eventos possuem o potencial de afastar – ou amenizar – a obrigação reparatória do ente público[14].
Já as outras duas causas de exclusão ou atenuação da responsabilidade estatal estão relacionadas à conduta de sujeitos alheios ao ente público: do prejudicado propriamente dito ou de terceiros. Assim é que, em caso de fato exclusivo da vítima ou de terceiro, seja culposo, seja doloso, estará afastado o dever do Estado de indenizar; se, por outro lado, a vítima ou o terceiro concorrem para o dano em conjunto com a atividade administrativa, haverá a atenuação proporcional do dever público de reparar.
Compreende-se que a existência de excludentes ou atenuantes da responsabilidade civil do Estado deverá ser aferida na situação concreta. Compete ao magistrado identificar, em análise do caso em julgamento, se o nexo de causalidade entre a atividade estatal e o dano foi rompido ou influenciado por fatos alheios – naturais ou humanos.
3. RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL DO ESTADO POR ATOS OMISSIVOS
Se, por um lado, apresenta-se razoavelmente uníssona, em doutrina e jurisprudência, a aplicabilidade da teoria objetiva na responsabilização do Estado por atos comissivos, o mesmo não se pode dizer quanto aos atos omissivos.
A teoria a ser adotada na aferição da responsabilidade extracontratual das pessoas jurídicas de direito público por omissão gera efeitos diretos na solução da lide. Por ser, dos três elementos, o mais complexo a ser demonstrado, a culpa do agente, quando exigida, possui o potencial de dificultar a obtenção de resultado favorável à vítima. De outra banda, a responsabilidade objetiva, por exigir apenas a comprovação do dano e do nexo causal, favorece a demonstração da responsabilidade estatal.
O tema é deveras relevante, pois não é incomum ao Poder Judiciário deparar-se com discussões referentes à existência ou não do dever estatal de reparar em casos como danos patrimoniais oriundos da má conservação de ruas e rodovias; prejuízos decorrentes de alagamentos ou de quedas de árvores em áreas públicas; danos advindos da inexistência ou da precariedade de calçamentos públicos; lesões corporais ou mortes ocorridas em estabelecimentos prisionais por carência de vigilância estatal; danos físicos a alunos de escolas públicas por falta de atuação do Poder Público, entre outros.
3.1. TESES DOUTRINÁRIAS ACERCA DOS ELEMENTOS DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO POR CONDUTAS OMISSIVAS
Para determinada corrente, a responsabilidade objetiva haveria de ser adotada tanto para condutas comissivas, quanto omissivas, na medida em que o art. 37, § 6°, da Constituição Federal não teria estabelecido distinção quanto à natureza da postura adotada.
Essa linha de pensamento parece ter sido adotada pelo civilista Gustavo Tepedino, que, ainda durante a vigência do Código Civil de 1916, defendeu a não recepção do seu art. 15 pela Constituição Federal de 1988. Confira-se a seguinte passagem do eminente professor:
(...) não é dado ao intérprete restringir onde o legislador não restringiu, sobretudo em se tratando de legislador constituinte – ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus. A Constituição Federal, ao introduzir a responsabilidade objetiva para os atos da Administração Pública, altera inteiramente a dogmática da responsabilidade neste campo, com base em outros princípios axiológicos e normativos (dos quais se destaca o da isonomia e o da justiça distributiva), perdendo imediatamente base de validade o art. 15 do Código Civil [de 1916], que se torna, assim, revogado ou, mais tecnicamente, não recepcionado pelo sistema constitucional.[15]
Os defensores da adoção irrestrita da responsabilidade objetiva fundamentam-se, também, no fato de o art. 15 do Código Civil de 1916 não ter sido reproduzido no Código Civil atual. Com efeito, enquanto o primeiro condicionava a responsabilização do ente público à perquirição da culpa, o art. 43 do Codex de 2002 estabeleceu regra bastante semelhante à prevista na Constituição de 1988. Veja-se:
Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.
Por outro lado, doutrinadores de escol defendem que, em se tratando de atos omissivos, a teoria a ser aplicada quanto à responsabilidade estatal deverá ser a subjetiva. Segundo tal corrente, nos casos de omissão da Administração Pública, não haveria ato lesivo (já que o ente público não agiu), logo, inexistiria dever de indenizar, a menos que houvesse um dever legal do Estado de agir. É dizer: a responsabilidade, no caso de posturas negativas, estaria condicionada a uma postura ilícita.
Essa tese é defendida, dentre outros, por Celso Antônio Bandeira de Mello, consoante se observa da seguinte passagem de sua obra Curso de Direito Administrativo:
Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo.
Deveras, caso o Poder Público não estivesse obrigado a impedir o acontecimento danoso, faltaria razão para impor-lhe o encargo de suportar patrimonialmente as consequências da lesão. Logo, a responsabilidade estatal por ato omissivo é sempre responsabilidade por comportamento ilícito. E, sendo responsabilidade por ilícito, é necessariamente responsabilidade subjetiva, pois não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa) ou, então, deliberado propósito de violar a norma que o constituía em dada obrigação (dolo). Culpa e dolo são justamente as modalidades de responsabilidade subjetiva.[16]
Em complemento ao seu raciocínio, o autor ressalta que a omissão do Estado pode ser caracterizada como condição para o dano, mas não como sua causa efetiva, sendo inadequado impor à Administração Pública responsabilidade por aquilo que não provocou, a menos que tivesse o dever legal de evitar o resultado. Nesse sentido:
De fato, na hipótese cogitada o Estado não é o autor do dano. Em rigor, não se pode dizer que o causou. Sua omissão ou deficiência haveria sido condição do dano, e não causa. Causa é o fator que positivamente gera um resultado. Condição é o evento que não ocorreu, mas que, se houvera ocorrido, teria impedido o resultado.
É razoável e impositivo que o Estado responda objetivamente pelos danos que causou. Mas só é razoável e impositivo que responda pelos danos que não causou quando estiver de direito obrigado a impedi-los.[17]
3.2. OMISSÃO GENÉRICA VERSUS OMISSÃO ESPECÍFICA: CRITÉRIO INTERMEDIÁRIO PARA A AFERIÇÃO DA TEORIA A SER APLICADA
Há uma terceira corrente, intermediária em relação às duas anteriormente expostas, que busca identificar a teoria a ser aplicada à responsabilidade por condutas omissivas do Estado segundo a natureza da omissão: genérica ou específica.
Nesse sentido, havendo omissão genérica, terá cabimento a adoção da teoria subjetiva, de sorte a exigir a culpa para a caracterização do dever estatal de indenizar. Por outro lado, sendo a omissão específica, a teoria a ser adotada será a objetiva, descartando-se, assim, a perquirição do elemento culposo.
A omissão genérica pode ser definida como aquela que não decorre de um dever de atuação específica do Estado. Nessa situação, a Administração Pública não está obrigada a praticar um ato, ainda que, se o houvesse praticado, tivesse condição de evitar o dano. Por essa razão, exige-se a comprovação da culpa na omissão.
A omissão genérica é elucidada e exemplificada por Sérgio Cavalieri Filho nos seguintes termos:
a omissão genérica tem lugar nas hipóteses em que não se pode exigir do Estado uma atuação específica; quando a Administração tem apenas o dever legal de agir em razão, por exemplo, do seu poder de polícia (ou de fiscalização), e por sua omissão concorre para o resultado, caso em que deve prevalecer o princípio da responsabilidade subjetiva. São exemplos de omissão genérica: negligência na segurança de balneário público – mergulho em lugar perigoso, consequente tetraplegia; o infortúnio ocorreu quando a vítima, aos 14 anos, após penetrar, por meio de pagamento de ingresso, em balneário público, mergulhou de cabeça em ribeirão de águas rasas, o que lhe causou lesão medular cervical irreversível (REsp.418713-SP); queda de ciclista em bueiro há muito tempo aberto em péssimo estado de conservação, o que evidencia a culpa anônima pela falta do serviço (Ap. Civ. 4846/2008, TJRJ); estupro cometido por presidiário, fugitivo contumaz, não submetido à regressão de regime prisional como manda a lei – faute du service public caracterizada; a omissão do Estado constituiu, na espécie, o fator determinante que propiciou ao infrator a oportunidade para praticar o crime de estupro contra menor de 12 anos de idade, justamente no período em que deveria estar recolhido à prisão (REsp. 409203/RS); poste de ferro com um sinal de trânsito cai sobre idosa no calçadão de Ipanema – a base de metal que sustentava o sinal estava bastante enferrujada e acabou quebrando com o apoio da idosa (Globo, 12/07/2010). Como se vê, na omissão genérica, que faz emergir a responsabilidade subjetiva da Administração, a inação do Estado não se apresenta como causa direta e imediata da não ocorrência do dano, razão pela qual deve o lesado provar que a falta do serviço (culpa anônima) concorreu para o dano, que se houvesse uma conduta positiva praticada pelo Poder Público o dano poderia não ter ocorrido.[18]
Por outro lado, a omissão específica perfaz-se quando o Estado possui uma obrigação especial de agir ou evitar o resultado, porém, permanece inerte. Nesses casos, o ente público assume a condição de garante, ou seja, a obrigação de resguardar a integridade de determinados indivíduos.
É o que ocorre, por exemplo, quanto ao dever de guarda e proteção dos alunos da rede pública de ensino enquanto estiverem na instituição, bem como dos apenados que se encontram em centros públicos de detenção. Em ambas as hipóteses, o Estado tem o dever de zelar pela incolumidade física dos indivíduos.
Destarte, no caso de omissão específica, em virtude de a Administração Pública estar obrigada a praticar um ato, ou seja, de possuir um dever específico de agir, a teoria a ser adotada será a da responsabilidade objetiva, encontrando aplicação o art. 37, § 6°, da Constituição Federal. Bastará, pois, que a vítima comprove o dano, a omissão e o nexo de causalidade entre ambos, sendo a culpa requisito irrelevante para o dever de indenizar[19].
A propósito da omissão específica, Sérgio Cavalieri Filho leciona:
Haverá omissão específica quando o Estado estiver na condição de garante (ou de guardião) e por omissão sua cria situação propícia para a ocorrência do evento em situação em que tenha o dever de agir para impedi-lo; a omissão estatal se erige em causa adequada de não se evitar o dano. São exemplos de omissão específica: morte de detento em rebelião em presídio (Ap. Civ. 58957/2008, TJRJ); suicídio cometido por paciente internado em hospital público, tendo o médico responsável ciência da intenção suicida do paciente e nada fez para evitar (REsp. 494206/MG); paciente que dá entrada na emergência de hospital público, onde fica internada, não sendo realizados os exames determinados pelo médico, vindo a falecer no dia seguinte (Ap. Civ. 35985/2008, TJRJ); acidente com aluno nas dependências de escola pública – a pequena vítima veio a morrer afogada no horário escolar, em razão de queda em bueiro existente no pátio da escola municipal (Ap. Civ. 3611/1999, TJRJ). Em suma, a omissão específica, que faz emergir a responsabilidade objetiva da Administração Pública, pressupõe um dever específico do Estado, que o obrigue a agir para impedir o resultado danoso.[20]
A nosso juízo, a doutrina que procura distinguir a omissão estatal em genérica e específica parece ser aquela que melhor soluciona a controvérsia existente em torno da responsabilidade civil dos entes públicos por inação.
Se, por um lado, o legislador constituinte optou por acolher a teoria objetiva em matéria de responsabilidade extracontratual do Estado, sem estabelecer diferenciação entre condutas comissivas ou omissivas, por outro, a adoção irrestrita dessa teoria poderia gerar o grave – e indesejado – cenário de condenações indiscriminadas das pessoas jurídicas de direito público, já que, em última análise, grande parte dos prejuízos experimentados pelos indivíduos em sociedade poderiam ser evitados caso uma postura estatal ativa fosse adotada.
Diante desse aparente conflito, mostra-se razoável verificar, no caso concreto, se a omissão pública decorreu ou não de uma obrigação específica de agir. Se o Estado tinha o dever especial de atuar, decorrente de sua posição de garante, e quedou-se inerte, terá aplicabilidade a teoria objetiva, eximindo-se a vítima do ônus de demonstrar a culpa do ente público. Noutro giro, se o mesmo dever não for identificado, encontrará aplicabilidade a teoria subjetiva, com a imprescindível comprovação do elemento culpa.
3.3. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
O Supremo Tribunal Federal (STF) possui diversos precedentes jurisprudenciais no sentido de reconhecer a responsabilidade civil objetiva do Estado em casos de danos sofridos por indivíduos sob a sua vigilância e proteção.
Nesse contexto, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n° 109.615-2/RJ, o STF houve por bem condenar ente público municipal ao ressarcimento de danos físicos causados a aluno de escola pública, nos termos da seguinte ementa:
INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO - PRESSUPOSTOS PRIMÁRIOS DE DETERMINAÇÃO DESSA RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO CAUSADO A ALUNO POR OUTRO ALUNO IGUALMENTE MATRICULADO NA REDE PÚBLICA DE ENSINO - PERDA DO GLOBO OCULAR DIREITO - FATO OCORRIDO NO RECINTO DE ESCOLA PÚBLICA MUNICIPAL - CONFIGURAÇÃO DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO MUNICÍPIO - INDENIZAÇÃO PATRIMONIAL DEVIDA - RE NÃO CONHECIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL. - A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público. - Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417). - O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50). RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO POR DANOS CAUSADOS A ALUNOS NO RECINTO DE ESTABELECIMENTO OFICIAL DE ENSINO. - O Poder Público, ao receber o estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua integridade física, devendo empregar todos os meios necessários ao integral desempenho desse encargo jurídico, sob pena de incidir em responsabilidade civil pelos eventos lesivos ocasionados ao aluno. - A obrigação governamental de preservar a intangibilidade física dos alunos, enquanto estes se encontrarem no recinto do estabelecimento escolar, constitui encargo indissociável do dever que incumbe ao Estado de dispensar proteção efetiva a todos os estudantes que se acharem sob a guarda imediata do Poder Público nos estabelecimentos oficiais de ensino. Descumprida essa obrigação, e vulnerada a integridade corporal do aluno, emerge a responsabilidade civil do Poder Público pelos danos causados a quem, no momento do fato lesivo, se achava sob a guarda, vigilância e proteção das autoridades e dos funcionários escolares, ressalvadas as situações que descaracterizam o nexo de causalidade material entre o evento danoso e a atividade estatal imputável aos agentes públicos.
(RE 109615, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 28/05/1996, DJ 02-08-1996 PP-25785 EMENT VOL-01835-01 PP-00081).
Conforme ressaltou o relator do feito, Ministro Celso de Mello, o Poder Público tem o dever de preservar a intangibilidade física dos estudantes matriculados em estabelecimentos oficiais de ensino. Nesse sentido, responde objetivamente pelos danos físicos – no caso concreto, perda do globo ocular – causados por outro estudante igualmente matriculado na instituição. Ademais, o voto condutor do acórdão deixou claro que a culpa dos agentes públicos e a falta do serviço mostravam-se irrelevantes para o deslinde da controvérsia:
De outro lado, ainda que ausente qualquer parcela de responsabilidade da servidora municipal (professora da escola pública) na eclosão do evento de que resultou a cegueira parcial da aluna de sua própria classe, tal circunstância, só por si, não teria o condão de exonerar o Município do Rio de Janeiro/RJ da responsabilidade civil – que é objetiva – decorrente do fato danoso em questão.
É que a responsabilidade objetiva do Poder Público não deriva, necessariamente, da conduta eventualmente culposa dos agentes estatais.
No julgamento do Recurso Extraordinário n° 272.839-0/MS, o STF manteve condenação de Estado-membro por danos materiais e morais decorrentes da morte de detento por colegas de carceragem. Eis o teor da ementa do julgado:
Recurso extraordinário. 2. Morte de detento por colegas de carceragem. Indenização por danos morais e materiais. 3. Detento sob a custódia do Estado. Responsabilidade objetiva. 4. Teoria do Risco Administrativo. Configuração do nexo de causalidade em função do dever constitucional de guarda (art. 5º, XLX). Responsabilidade de reparar o dano que prevalece ainda que demonstrada a ausência de culpa dos agentes públicos. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento.
(RE 272839, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 01/02/2005, DJ 08-04-2005 PP-00038 EMENT VOL-02186-03 PP-00417 RTJ VOL-00194-01 PP-00337 LEXSTF v. 27, n. 317, 2005, p. 236-257 RT v. 94, n. 837, 2005, 129-138).
Também nesse caso, o Pretório Excelso reconheceu a responsabilidade objetiva em virtude da posição de guarda ostentada pelo Poder Público, conforme destacou o seguinte trecho do voto proferido pelo relator, Ministro Gilmar Mendes:
Na espécie, o detento estava em cumprimento de pena privativa de liberdade, portanto, sob a custódia do Estado.
Trata-se, portanto, da hipótese em que o nexo de causalidade que imputa a responsabilidade do Poder Público advém do dever constitucional de guarda, consagrado no art. 5°, XLIX (“é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”). Neste caso, ainda que demonstrada a ausência de culpa dos agentes públicos, prevalece a responsabilidade do Estado pela reparação do dano.
A propósito, as condenações do Poder Público ao ressarcimento de danos materiais e morais sofridos por detentos têm-se mostrado emblemáticas da jurisprudência do STF no que se refere à adoção da responsabilidade objetiva do Estado pelo descumprimento de deveres específicos de agir. Com efeito, no julgamento do Recurso Extraordinário n° 841.526/RS, de relatoria do Ministro Luiz Fux, restou assentada a seguinte tese para fins de repercussão geral:
Em caso de inobservância do seu dever específico de proteção previsto no artigo 5º, inciso XLIX, da Constituição Federal, o Estado é responsável pela morte do detento.
No mesmo sentido, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário n° 580.252/MS, de relatoria para acórdão do Ministro Gilmar Mendes, fixou-se tese em repercussão geral nos seguintes termos:
Considerando que é dever do Estado, imposto pelo sistema normativo, manter em seus presídios os padrões mínimos de humanidade previstos no ordenamento jurídico, é de sua responsabilidade, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição, a obrigação de ressarcir os danos, inclusive morais, comprovadamente causados aos detentos em decorrência da falta ou insuficiência das condições legais de encarceramento.
Por outro lado, é possível encontrar, perante a mesma Corte Suprema, decisões que, ao examinarem a responsabilidade civil do Estado, afirmam ser aplicável a teoria objetiva por atos comissivos e omissivos, indistintamente. É o que se observa, a título exemplificativo, dos seguintes julgados:
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 279 DO STF. 1. A responsabilidade objetiva se aplica às pessoas jurídicas de direito público pelos atos comissivos e omissivos, a teor do art. 37, § 6º, do Texto Constitucional. Precedentes. 2. O Tribunal de origem assentou a responsabilidade do Recorrente a partir da análise do contexto probatório dos autos e, para se chegar à conclusão diversa daquela a que chegou o juízo a quo, seria necessário o seu reexame, o que encontra óbice na Súmula 279 do STF. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(ARE 956285 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Primeira Turma, julgado em 09/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 24-08-2016 PUBLIC 25-08-2016).
AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR CONDUTA OMISSIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. EXAME DE MATÉRIA JURÍDICA. DESNECESSIDADE DO REEXAME DE FATOS E PROVAS. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 279/STF. 1. Nos termos da jurisprudência deste Supremo Tribunal, a responsabilidade civil – ou extracontratual – pelas condutas estatais omissivas e comissivas é objetiva, com base na teoria do risco administrativo. Precedentes. 2. Agravo interno a que se nega provimento.
(RE 499432 AgR, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 21/08/2017, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-197 DIVULG 31-08-2017 PUBLIC 01-09-2017)
A nosso juízo, tais precedentes comportam crítica, na medida em que é imprescindível, na linha do entendimento há muito sufragado pelo próprio STF, avaliar a natureza da omissão incorrida pelo Poder Público. Apenas nas hipóteses em que o Estado tinha o dever específico de agir, decorrente de sua posição de garante, poderá ser aplicada a responsabilidade objetiva pela omissão – e não na generalidade dos casos.
A evolução da responsabilidade civil do Estado passou por diversas etapas. Durante o período absolutista, entendia-se que o ente público não poderia responder por danos causados aos particulares, pois isso ofenderia a sua própria soberania, que estava atrelada à ideia de que o Estado não cometia erros.
Entretanto, tal pensamento ia de encontro ao senso comum de justiça, segundo o qual aquele que causou um dano a terceiro deve repará-lo. Com isso, surgiram teorias para justificar a responsabilidade do Estado, a começar pelas teorias civilistas, que, distinguido os atos do Poder Público em atos de império e atos de gestão, passaram a admitir a responsabilização pela prática dos últimos, nas hipóteses em que comprovada a conduta culposa do agente público.
Com o surgimento da teoria do órgão, que considera a conduta dos agentes como atos praticados pelo próprio ente público, ganhou respaldo a teoria da culpa anônima, que defendia o dever estatal de reparar nos casos em que o serviço público não funcionou, funcionou mal ou funcionou tardiamente (falta do serviço).
A teoria da culpa anônima foi superada pela da responsabilidade objetiva, que, com fundamento na igualdade dos ônus e encargos sociais, passou a dispensar o elemento subjetivo (culpa em sentido amplo) para a caracterização do dever estatal de indenizar.
Desde a Constituição Federal de 1946, a responsabilidade objetiva é expressamente adotada no ordenamento jurídico brasileiro, estando presente no art. 37, § 6°, da Carta Política atual. Embora haja, modernamente, certo consenso acerca da adoção dessa teoria na responsabilização do Estado por atos comissivos, o mesmo não se verifica com relação à responsabilidade decorrente de omissão. Em doutrina, há aqueles que advogam a aplicação da responsabilidade objetiva indistintamente, ao fundamento de que o legislador constituinte não estabeleceu diferenciação entre atos omissivos e comissivos. Para outros, no caso de inação, o Poder Público deveria ser responsabilizado de forma subjetiva, pois não causou, efetivamente, o dano.
Diante da tormentosa tarefa de identificar a necessidade ou não da demonstração de culpa para a condenação do Estado por posturas inertes, o critério que classifica a omissão em genérica ou específica mostra-se producente. Nesse sentido, em se tratando de conduta omissiva genérica, caracterizada como aquela que não decorre de um dever de atuação específica do Estado, parece adequado perquirir-se acerca da culpa do Poder Público. De outra banda, em se tratando de omissão específica, em que o Estado assume verdadeira posição de garante com relação a certos indivíduos, mostra-se razoável aplicar a teoria objetiva.
REFERÊNCIAS
CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2012.
________. A Responsabilidade Civil Objetiva e Subjetiva do Estado. In: Revista da EMERJ. Rio de Janeiro, v. 14, n. 55, jul.-set. 2011, p. 10-20.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2002.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 15ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rêgo. Problemas de Responsabilidade Civil do Estado. In: Responsabilidade Civil do Estado. Org.: Juarez Freitas. São Paulo: Malheiros, 2006.
TEPEDINO, Gustavo. “A evolução da responsabilidade civil no direito brasileiro e suas controvérsias”. In: Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.
UNGARO, Gustavo Gonçalves. Responsabilidade do Estado e direitos humanos. São Paulo: Saraiva, 2012.
[1] Ao longo deste artigo, a referência à culpa como elemento caracterizador da responsabilidade subjetiva possui sentido amplo, a englobar o dolo e a culpa stricto sensu (negligência, imprudência e imperícia).
[2] CAHALI, Yussef Said. Responsabilidade civil do Estado. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 19.
[3] MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. Parte geral. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 105,
[4] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2012, p. 254.
[5] Essas três condições para a caracterização da culpa anônima encontram-se presentes em praticamente todos os manuais de direito administrativo brasileiros e, segundo Hely Lopes Meirelles, parece ter origem na obra de Paul Duez, intitulada La Responsabilité de a Puissance Publique, de 1927 (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p 649).
[6] MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rêgo. Problemas de Responsabilidade Civil do Estado. In: Responsabilidade Civil do Estado. Org.: Juarez Freitas. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 46.
[7] CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2012, p. 257.
[8] Nesse sentido, assevera Celso Antônio Bandeira de Mello: “o certo é que jamais se pôs em dúvida, entre nós a tese da responsabilidade do Estado, sempre aceita como princípio amplo, mesmo à falta de disposição específica” (MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 981).
[9] Vide, por todas, a obra de Amaro Cavalcanti, intitulada “Responsabilidade Civil do Estado”, lançada em 1905 e republicada em sucessivas edições.
[10] Nesse contexto, leciona Sérgio Cavalieri Filho: “É preciso que se diga, entretanto, que, ainda na vigência do art. 15 do Código Civil de 1916, alguns autores, valendo-se da já mencionada ambiguidade da sua redação, começaram a sustentar a tese da responsabilidade objetiva do Estado, inspirados nas ideias que prevaleciam na França e em outros países europeus. Destacam-se, nesse período, os nomes de Rui Barbosa, Pedro Lessa, Amaro Cavalcanti e outros. Em luminosos votos, proferidos no Supremo Tribunal Federal, os Mins. Orozimbo Nonato e Filadelfo Azevedo esboçaram nitidamente o alcance da teoria do risco administrativo. De onde se conclui que, também entre nós, a responsabilidade objetiva do Estado chegou primeiro à jurisprudência, para depois se transformar em texto legal” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2012, p. 259).
[11] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 983.
[12] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 2ª ed., p. 534.
[13] Registre-se que, embora não seja a regra no ordenamento jurídico brasileiro, a adoção do risco integral é defendida por parcela da doutrina e da jurisprudência em casos de responsabilidade civil decorrente de acidentes nucleares e de danos provocados ao meio ambiente.
[14] Parcela da doutrina, entretanto, adotando critérios de definição diferentes, defende que o caso fortuito, ao contrário da força maior, não possui o condão de afastar a responsabilidade estatal. Nesse sentido:
Força maior é acontecimento imprevisível, inevitável e estranho à vontade das partes, como uma tempestade, um terremoto, um raio. Não sendo imputável à Administração, não pode incidir a responsabilidade do Estado; não há nexo de causalidade entre o dano e o comportamento da Administração.
Já na hipótese de caso fortuito, em que o dano seja decorrente de ato humano, de falha da Administração, não ocorre a mesma exclusão; quando se rompe, por exemplo, uma adutora ou um cabo elétrico, causando dano a terceiros, não se pode falar em força maior. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 2002, p. 530).
[15] TEPEDINO, Gustavo. “A evolução da responsabilidade civil no direito brasileiro e suas controvérsias”. In: Temas de Direito Civil. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 191.
[16] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 966 e 967.
[17] MELLO, Celso Antônio Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 21ª ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 968.
[18] CAVALIERI FILHO, Sérgio. A Responsabilidade Civil Objetiva e Subjetiva do Estado. In: Revista da EMERJ. Rio de Janeiro, v. 14, n. 55, jul.-set. 2011, p. 18.
[19] Registre-se que, por estar a responsabilidade objetiva calcada na teoria do risco administrativo, e não do risco integral, é possível ao Estado invocar causas excludentes ou atenuantes de responsabilidade.
[20] CAVALIERI FILHO, Sérgio. A Responsabilidade Civil Objetiva e Subjetiva do Estado. In: Revista da EMERJ. Rio de Janeiro, v. 14, n. 55, jul.-set. 2011, p. 17.
Graduado em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Pós-graduado em Direito e Jurisdição pela Escola da Magistratura do Distrito Federal. Pós-graduado em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RAMOS, Murilo Santos. Considerações acerca da responsabilidade civil extracontratual do estado por omissão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2019, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53859/consideraes-acerca-da-responsabilidade-civil-extracontratual-do-estado-por-omisso. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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