RESUMO: A desapropriação, em todas as suas modalidades, constitui instrumento colocado à disposição do Poder Público para a consecução dos seus interesses em prol da coletividade e em detrimento dos interesses particulares, revelando-se como materialização do princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, princípio basilar do Direito Administrativo. No entanto, ao lado do referido princípio situa-se o princípio da legalidade, o qual garante ao indivíduo que a Administração Pública somente agirá se e nos casos determinados legalmente. Nessa ambiência, surge como regra a necessidade de pagamento da indenização em dinheiro e previamente ao ato desapropriatório, pagamento este sujeito aos acréscimos legais, tais como a correção monetária, os juros moratórios e compensatórios e os honorários advocatícios.
Palavras-Chaves: Desapropriação. Supremacia do interesse público. Autoridade da Administração. Liberdade do indivíduo. Pagamento da indenização.
1 INTRODUÇÃO
O regime jurídico que rege toda a Administração Pública está pautado em dois princípios basilares, que informam a conhecida bipolaridade do Direito Administrativo, marcada, de um lado, pela liberdade do indivíduo e, de outro, pela autoridade da Administração. Assim, nascem os princípios da legalidade e o da supremacia do interesse público sobre o privado, respectivamente.
À luz do princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado, permite-se ao Estado, em casos necessários, restringir interesses individuais com vistas a garantir o interesse coletivo como, por exemplo, verifica-se na desapropriação. No entanto, o interesse público não impera indistintamente, de modo desarrazoado, razão pela qual a Constituição Federal prevê, como regra, a necessidade de prévia indenização ao particular.
2. A DESAPROPRIAÇÃO E SUAS MODALIDADES
Consoante afirmado alhures, o Estado dispõe de mecanismos garantidores de sua supremacia, podendo restringir e até mesmo suprimir direitos em prol da coletividade. Nessa ambiência, surge a desapropriação como forma supressiva do direito de propriedade do particular.
Consiste em uma intervenção supressiva, e não apenas restritiva, do direito de propriedade, o qual é retirado das mãos do particular e passa a ser adquirido pelo Estado de forma originária. Diz-se originária devido ao fato de que o bem chega nas mãos do Estado livre e desembaraçado, ficando qualquer direito que porventura recai sobre o bem sub-rogado no valor da indenização.
A desapropriação possui assento constitucional em seu art. 5º, XXIV, desde que seja por necessidade ou utilidade pública, ou por relevante interesse social, mediante o pagamento de indenização prévia, justa e em dinheiro. Conclui-se, portanto, que o pagamento de prévia indenização constitui-se verdadeiro direito fundamental do particular cuja propriedade lhe foi retirada pelo Estado.
Em regra, a utilidade e a necessidade pública se dão nas hipóteses em que o Estado adquire o bem para ser utilizado por ele mesmo, sendo realizada no interesse da própria Administração. De outro lado, a desapropriação por interesse social é realizada com vistas a garantir a função social da propriedade, caso em que o Estado poderá ceder o bem a terceiros ou a ele próprio.
A Constituição Federal prevê, ainda, outras modalidades de desapropriação, denominadas de especiais em razão das peculiaridades que as diferenciam da desapropriação comum, prevista em seu art. 5º, XXIV. São elas:
Analisadas as modalidades de desapropriação, conclui-se que a indenização revela-se em regra como fator fundamental para a sua execução, sendo despicienda somente na desapropriação confisco ante a prática de conduta ilícita pelo particular.
3. PAGAMENTO DA INDENIZAÇÃO NA DESAPROPRIAÇÃO COMUM
Tomando como regra a modalidade comum, insculpida no mencionado artigo 5º, XXIV, da CF/88, extrai-se que a desapropriação dar-se-á mediante justa e prévia indenização em dinheiro.
A indenização justa é a que abarca o valor comercial do imóvel somado aos danos sofridos pelo particular desapropriado e que são decorrentes diretamente do ato desapropriatório. Ademais, dar-se-á o pagamento previamente e em dinheiro, todavia, nas hipóteses em que a decisão judicial suplante o valor inicialmente avaliado e depositado pelo poder público, o montante excedente deverá respeitar a fila de precatórios. Daí se verifica que a indenização, não raras vezes, não é integralmente paga previamente.
Sobre o montante indenizatório poderão incidir correção monetária, juros compensatórios e moratórios, e, ainda, honorários advocatícios.
A correção monetária deve ser paga desde a perícia judicial, oportunidade em que o valor indenizatório é definido. Não ofende o art. 100, CF, pois o que há é uma ampliação da garantia conferida ao particular de deverá incidir sobre o montante excedente, sendo realizada com base no índice de correção da caderneta de poupança (taxa referencial - TR), que não corresponde ao real índice de inflação do mercado. Nessa toada, entende-se que o índice utilizado deverá ser o previsto no manual de cálculos da Justiça Federal, de acordo com recente entendimento jurisprudencial.
Ainda atinente à correção monetária, preconiza o enunciado da súmula 561 do STF: “em desapropriação, é devida a correção monetária até a data do efetivo pagamento da indenização, devendo proceder-se à atualização do cálculo, ainda que por mais de uma vez”.
No tocante aos juros compensatórios, possuem a função de compensar a perda da posse do bem antes do recebimento da indenização justa, razão pela qual incidirão desde o momento da imissão na posse e sobre o valor remanescente arbitrado judicialmente.
Neste ponto, cumpre registrar que o STF julgou o mérito da ADI 2332/DF e resolveu alterar a liminar que havia dado em 2011. Agora, em 2018, o STF decidiu que é constitucional o percentual fixo de 6% previsto no art. 15-A do DL 3365/41, que assim dispõe: “no caso de imissão provisória na posse, na desapropriação por necessidade ou utilidade pública e interesse social, inclusive para fins de reforma agrária, havendo divergência entre o preço ofertado em juízo e o valor do bem, fixado na sentença, expressos em termos reais, incidirão os juros compensatórios de até seis por cento ao ano sobre o valor da diferença eventualmente apurada, a contar da imissão na posse, vedado o cálculo de juros compostos”.
De outro lado, o STF declarou inconstitucional a expressão “até” contida no mencionado dispositivo, por não fazer sentido a taxa de juros ser variável sem qualquer justificativa lógica. Assim sendo, estão canceladas as súmulas 618, do STF, e 408, do STJ.
Ademais, conferiu-se uma interpretação conforme a CF para definir que a taxa de juros de 6% deverá incidir sobre a diferença entre o valor fixado na sentença e 80% do preço oferecido pelo Poder Público.
Por fim, doravante, o Excelso Pretório declarou a constitucionalidade dos §§1º e 2º do art. 15-A os quais condicionam a condenação do Poder Público ao pagamento dos juros compensatórios aos seguintes requisitos: i) ter ocorrido a imissão provisória na posse; ii) a comprovação pelo proprietário da perda da renda sofrida pela privação da posse; iii) o imóvel possuir graus de utilização da terra e de eficiência na exploração superiores a zero. Para o tribunal, a perda da propriedade já é compensada mediante o pagamento do valor principal, pela correção monetária e juros moratórios, limitando-se os compensatórios à compensação pela perda da renda comprovadamente auferida com a utilização do bem.
Quanto aos juros moratórios, somente incidirão sobre o excedente arbitrado judicialmente. O enunciado 17 da súmula vinculante do STF preconiza que os juros moratórios somente serão pagos se ultrapassado o prazo constitucional para pagamento do precatório, isto é, a partir de 1º de janeiro do ano seguinte ao que deveria ter sido pago, mas não o foi. No entanto, de acordo com a tese definida no RE 579.431, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, incidirão os juros da mora no período compreendido entre a data da realização dos cálculos e a da requisição ou precatório.
Os juros da mora serão cálculos com base no índice da poupança, capitalizados de forma simples, correspondentes a 0,5% ao mês, caso a taxa SELIC seja superior à 8,5%, ou a 70% da taxa SELIC, mensalizada, nos demais casos.
Por sua vez, os honorários advocatícios serão pagos especificamente sobre o valor da sucumbência, isto é, a diferença entre a oferta e a indenização, à luz do enunciado da súmula 617, do STF. Incidem no percentual que varia de 0,5% a 5% sobre o valor da sucumbência, a ser calculado pelo juízo, tendo sido declarado inconstitucional a disposição legal que limitava os honorários a R$ 151.000,00.
Derradeiramente, o enunciado 12 de súmula do STJ preconiza que são cumuláveis os juros moratórios e os compensatórios. O que o enunciado da súmula quer dizer é que é possível que, em um mesmo processo, incidam os juros moratórios e os compensatórios, além da correção e dos honorários. Não significa dizer que são admitidos os juros sobre juros (anatocismo), na medida em que incidirão em momentos diferentes.
5. CONCLUSÃO
Da análise de tudo que foi exposto, conclui-se que a supremacia do interesse públicos sobre o interesse privado não se revela como um princípio estanque, absoluto, devendo compatibilizar-se com os direitos fundamentais.
Nesse diapasão, se a Constituição Federal, de um lado, disponibiliza ao Estado mecanismos restritivos e, inclusive, supressivos de direitos, de outro, resguarda ao particular mínimas garantias que justifiquem a referida intervenção, mantendo incólume o núcleo essencial do seu direito. E é nessa ambiência que se situa a exigência, em regra, do pagamento da indenização previamente e em dinheiro como contrapartida à perda da propriedade privada pela desapropriação.
REFERÊNCIAS
________. Supremo Tribunal Federal. STF julga constitucional redução de juros compensatórios em desapropriação. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=378758>. Acesso em: 20 jun. 2018.
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado, volume único – 25ª ed. rev. e atual: Editora Método, 2017.
Graduada em Direito pela Universidade Tiradentes – UNIT/SE e pós graduada em Ciências Criminais pela Estácio de Sá em parceria com o CERS. Servidora pública do Tribunal Regional Eleitoral de Sergipe.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Alana Mendonça. Desapropriação e os aspectos gerais sobre a indenização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jan 2020, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54105/desapropriao-e-os-aspectos-gerais-sobre-a-indenizao. Acesso em: 22 dez 2024.
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