RESUMO: O objetivo dessa artigo é demonstrar de forma simplificada como o princípio da insignificância é de suma importância para o Direito Penal, esclarecer que este princípio pode ser utilizado ainda na fase inquisitorial pelo delegado de polícia e demonstrar as consequência logicas de sua aplicação. Para comprovar as hipóteses de que é necessário aplicação do princípio da bagatela pela autoridade policial, para se ter realmente uma diminuição de processos e investigação insignificantes, foi utilizado o método dedutivo, apoiando-se em dados obtidos através de literatura, relatórios técnicos, artigos, projetos de estudo em curso entre outros existente e publicados pela imprensa brasileira e mundial sobre as questões relacionadas com o princípio da bagatela. A conclusão extraída dessa análise, é de que com a aplicação do princípio da insignificância pelo delegado não seria necessário o acionamento da estrutura estatal para fatos insignificantes que podem ser resolvidos muitas vezes por outros ramos do direito, isso tudo através de uma análise técnica e classificatória do Delegado.
RESUMEN: El propósito de este artículo es demostrar de manera simple cómo el principio de insignificancia es de suma importancia para el derecho penal, aclarar que este principio todavía puede ser utilizado en la etapa inquisitiva por el jefe de policía y demostrar las consecuencias lógicas de su aplicación. Para probar la hipótesis de que es necesario aplicar el principio insignificante por parte de la autoridad policial, a fin de reducir realmente los procesos y la investigación insignificantes, se utilizó el método deductivo, basándose en datos obtenidos de la literatura, informes técnicos, artículos, Proyectos de estudio en curso, entre otros, existentes y publicados por la prensa brasileña y mundial sobre temas relacionados con el principio de bagatela. La conclusión extraída de este análisis es que, con la aplicación del principio de insignificancia por parte del delegado, no sería necesario activar la estructura estatal para hechos insignificantes que a menudo pueden ser resueltos por otras ramas del derecho, todo a través de un análisis técnico y clasificatorio. del delegado.
PALAVRAS-CHAVES: princípio da insignificância, aplicação pela autoridade policial, consequência.
PALABRAS CLAVES: principio de insignificancia, aplicación por parte de la autoridad policial, consecuencia.
SUMARIO: Introdução 1 - Breve Relato Histórico sobre o Princípio da Insignificância 2 - Princípios que coadunam com o Princípio da Insignificância 3 - Aplicação do Princípio da Insignificância pelos Tribunais 4 - Situações nas quais o Princípio da Insignificância é aplicado 4.1 - Aplicação do Princípio da Insignificância na fase pré-processual 5 - Capacidade Jurídica da Autoridade Policial na Aplicação do Princípio da Bagatela 5.1 - O Princípio da Insignificância afasta a Tipicidade do Fato 5.2 - Considerações Finais 6 – Referencias.
1 INTRODUÇÃO
É comum vermos decisões dos tribunais aplicando o princípio da insignificância, ocorre que isso só acontece após todo o tramite da persecução penal, ou seja, todo o aparato judicial é movimentado para que ao final, após alguns anos, o processo seja extinto com base no princípio da bagatela.
Além disso, sabe-se que o início de uma investigação policial já causa constrangimento ao investigado perante a sociedade e a dúvida de sua inocência ou não permanece até o devido julgamento da ação penal, até lá o investigado fica mal visto perante sua comunidade.
Levando em consideração essa problemática o presente artigo busca analisar a aplicação do princípio da insignificância já na fase pré-processual, trazendo a visão doutrinaria e judicial sobre o tema.
Assim, como busca demostrar em quais situações pode ser aplicado e quais os princípios que coadunam com a bagatela.
E por último demonstra que a autoridade policial tem competência para aplicar o princípio da insignificância na fase pré-processual desafogando o judiciário e impedindo constrangimentos desnecessário aos investigados.
2- BREVE RELATO HISTÓRICO SOBRE O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
A doutrina vem divergindo muito sobre a origem do princípio da insignificância, muitos afirmam que esse princípio surgiu no Direito Civil Romano derivado do brocardo minimus non curat praetor sua síntese: O pretor não cuida de coisas pequenas, conforme afirma o doutrinador Ivan Silva.
embora a formulação contemporânea do princípio da insignificância seja atribuída a Roxin, a sua origem está no direito romano.[1]
Mas para a maioria dos doutrinadores o surgimento do princípio da bagatela no Direito Penal se deu após a segunda guerra mundial pelo jurista alemão Claus Roxin, que o mencionou em sua obra “Política criminal e sistema jurídico-penal”.
O autor entendeu que o fato punível exige conduta, tipicidade, antijuridicidade, culpabilidade e punibilidade, devendo-se excluir a tipicidade da conduta em caso de danos de pouca importância
a tipicidade penal exige uma ofensa de alguma gravidade a bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto típico.[2]
Um dos doutrinadores que seguem o posicionamento de Roxin é Mauricio Lopes (2000), para ele o princípio permite na maioria dos tipos fazer-se a exclusão, desde o início, dos danos de pouca importância.[3]
Para Capez o princípio da insignificância teve início no Direito Romano, mas foi inserido no Direito Penal por Claux Roxin em 1964.
O Princípio da Insignificância é originário do Direito Romano, e de cunho civilista, tal princípio funda-se no conhecido brocardo de minimis non curat praetor. Em 1964 acabou sendo introduzido no sistema penal por Claus Roxin, tendo em vista sua utilidade na realização dos objetivos sociais traçados pela moderna política criminal.[4]
Assim, embora vários autores afirmem que o princípio da insignificância teve início no Direito Romano, a maioria da doutrina atribui a Claus Roxin a sua idealização e formulação, sendo assim, os créditos para o desenvolvimento e fortalecimento do princípio da insignificância devem ser atribuídos a Roxin, que permitiu a sua interpretação e sua efetiva aplicação.
3- PRINCÍPIOS QUE COADUNAM COM O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA
O Princípio da Legalidade está estritamente ligado ao princípio da bagatela, já que se funda em efetivar a limitação ao poder punitivo estatal, é a garantia do cidadão contra o poder absoluto do Estado, pois o art. 5º, inciso XXXIX da Constituição Federal, garante, “não haverá crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”[5], ou seja, somente lei anterior, possui força de tornar aquele fato, em crime, e somente lei, poderá estabelecer a sanção quando cometido o crime.
Sendo assim, o princípio da legalidade limita o poder de punir do estado, assim como o princípio da insignificância que limita de maneira especifica e em cada caso concreto.
Ainda, o Princípio da Intervenção mínima do Direito Penal encontra relação com o princípio da insignificância, pois aquele parte do pressuposto que a intervenção do Estado na esfera de direitos do cidadão deve ser sempre a mínima possível, para que a atuação estatal não se torne demasiadamente desproporcional e desnecessária, diante de uma conduta incapaz de gerar lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico tutelado.
Outro princípio utilizado para explicar o Direito Penal como última ratio é o da Fragmentariedade, pois conforme leciona Bitencourt (2014), nem toda a ação que ataca um bem jurídico é proibida pelo Direito Penal, e nem todo o bem jurídico é protegido por esse direito, ou seja, o Direito Penal só se ocupa de uma parte, de fragmentos.[6]
E por último o Princípio da Proporcionalidade que garante o equilíbrio entre o resultado do delito e a pena imposta, ou seja, este princípio garante a proibição do excesso na sanção imposta a um indivíduo, conforme explica José Henrique.
O fundamento do princípio da insignificância está, também na idéia de proporcionalidade que a pena deve guardar em relação à gravidade do crime nos casos de ínfima afetação ao bem jurídico o conteúdo do injusto é tão pequeno que não subsiste nenhuma razão para o pathos ético da pena de sorte que a mínima pena aplicada seria desproporcional à significação social do fato.[7]
Assim, defende-se a aplicação do princípio da insignificância antes mesmo da abertura do inquérito policial, pois o Direito Penal deve ser aplicado como exceção e não como regra, dirigindo toda a sua estrutura ao fato que realmente merece ser perseguido.
Portanto, as ações que podem ser resolvidas por outros ramos do direito não devem ser motivo para o Direito Penal se preocupar, pois o inquérito policial deve ter o mínimo de fumus comissi delicti, já que só a abertura da investigação gera um constrangimento ao investigado perante a sociedade, do mesmo jeito que o recebimento da denúncia e todo o seu tramite processual.
Desse modo, partindo da premissa que o Direito Penal é mais severo, verificasse que o mesmo deve limitar-se a castigar ações mais graves praticadas contra bens jurídicos mais importantes e deixar que ações que recaiam sobre bens de pequena monta, ínfimos sejam regulamentados pelo princípio da insignificância.
4- APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA PELOS TRIBUNAIS
Embora o princípio da insignificância não tenha previsão legal expressa, o mesmo é reconhecido pela doutrina e pelos tribunais, tendo inclusive o Supremo Tribunal Federal traçado alguns vetores para a sua aplicação.
O Direito Penal, segundo o princípio da insignificância, só deve se preocupar com as condutas mais relevantes e não com condutas ínfimas, ou seja, aquelas condutas incapazes de causar qualquer lesão ao bem jurídico protegido por lei.
Para a sua aplicação, o princípio da insignificância deve ser analisado de acordo com cada caso, isso quer dizer que não basta que uma conduta possua pena ínfima ou de que seja de pequeno valor a coisa subtraída, mas também deve ser levado em conta a valoração dos aspectos subjetivos do autor do fato, como por exemplo, a reiteração delitiva e os antecedentes.
O Supremo Tribunal Federal desenvolveu quatro vetores para aplicação do princípio da insignificância, com o intuito de que quando o princípio for aplicado pelo magistrado este não fique adstrito somente ao prejuízo da vítima, mas que também seja analisado a conduta do agente.
São vetores estabelecidos pelo Supremo Tribunal Federal: a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento, a mínima ofensividade da conduta, e a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
O postulado da insignificância – que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada – apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público em matéria penal.[8]
Esses vetores não se distinguem entre si, eles servem como base para que se avalie a cada caso concreto os aspectos da infração cometida para que seja definido o cabimento ou não do crime de bagatela, para que a conduta torne-se atípica e assim não sofra uma possível sanção penal, pois não existirá o crime.
Nesse sentido, não só a reincidência, reiteração criminosa, habitualidade delitiva, são suficientes, por si só, para afastar a aplicação do denominado princípio da insignificância outras questões, como as condições pessoais da vítima também interferem diretamente na análise do caso concreto.
Assim, o valor sentimental e a dimensão do dano que causará ao ofendido também são relevantes, se em um caso de furto, por exemplo, o bem não tiver valor econômico significante para a sociedade, mas afetar em grandes proporções a vítima, não há o que se falar em insignificância.
Portanto, a aplicação do princípio da insignificância dependerá de cada caso concreto, afastando os excessos nas aplicações de sanções e garantindo que outros ramos do direito possam ser aplicados, visto que o Direito Penal deve ser usado como ultima ratio.
4.1 SITUAÇÕES NAS QUAIS O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA É APLICADO
Vale mencionar que a aplicação do princípio da insignificância depende de cada caso concreto, levando em consideração o objeto, autor e a vítima.
No crime de furto simples, artigo 155 caput do CP, a jurisprudência majoritária admite a incidência do Princípio da Insignificância, porém não se aplica para a hipótese do furto qualificado do artigo 155 §§ 4º, 5º e 6º CP em razão da maior ofensividade da conduta.
Ocorre que e embora essa seja a posição majoritária, a partir do julgamento do EResp 1.609.444/SP, a Terceira Seção do STJ passou a entender que o furto qualificado pelo concurso de agentes previsto no art. 155 § 4º IV CP, por si só, não afasta a incidência da insignificância, sendo assim caberia ao magistrado observar, no caso concreto, se houve critérios de maior ofensividade.
De se concluir, portanto, que o fato de o delito ter sido praticado em concurso de agentes, por si só, não impede peremptoriamente a aplicação do princípio da insignificância, devendo, nesses casos, ser valorada a efetiva maior reprovabilidade da conduta em razão do concurso, o que não se verificou no caso dos autos.[9]
Já no crime roubo a jurisprudência majoritária não aplica a insignificância, isto porque o roubo é um crime complexo atingindo mais de um bem jurídico. Além disso, nenhuma violência ou grave ameaça poderá ser considerada insignificante, conforme afirma o Ministro do STJ Napoleão Nunes Maia Filho.
Apesar do ínfimo valor do bem subtraído, o caso sub judice não merece a aplicação do princípio da insignificância, eis que o delito de roubo não ofende apenas o patrimônio furtado, mas também a integridade física da vítima, que jamais pode ser considerada como um irrelevante penal. A violência aplicada à vítima torna a conduta irremediavelmente relevante, restando afastada a alegação de atipicidade pela eventual bagatela da coisa roubada.[10]
Crimes contra a administração pública, em regra a jurisprudência majoritária não aplica o princípio da insignificância, visto que o bem jurídico tutelado é a moralidade administrativa.
Ocorre que como exceção o crime de descaminho, que é um crime contra administração pública, a jurisprudência reconhece a incidência do Princípio da Insignificância, o critério utilizado baseia-se no valor sonegado do imposto e não no da mercadoria importada ou exportada.
Para o STF incide a aplicação se o valor não ultrapassar 20 (vinte) mil reais com fundamento na portaria 75/2012 do Ministério da Fazenda, já para o STJ o valor considerado para incidência do princípio é até 10 (dez) mil reais com base no artigo 20 da lei 10.522/2002, aplicando a lei pois o mesmo entende que portaria não tem força normativa para revogar uma lei, conforme informativo 551 STJ.
O valor de R$ 20 mil fixado pela Portaria MF 75/2012 - empregado como critério para o arquivamento, sem baixa na distribuição, das execuções fiscais de débitos inscritos na Dívida Ativa da União - não pode ser utilizado como parâmetro para fins de aplicação do princípio da insignificância aos crimes de descaminho.[11]
Já no crime de contrabando não há aplicabilidade do princípio da insignificância, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, pois é crime fiscal e figura no tipo penal de importação ou exportação de mercadoria proibida.
A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento de que é inaplicável o princípio da insignificância ao delito de contrabando, pois "além da lesão ao erário público, há, como elementar do tipo penal, a importação ou exportação de mercadoria proibida, razão pela qual, não se pode, a priori, aplicar o princípio da insignificância"(AgRg no AREsp 483.062/RR, Rel. Ministro Moura Ribeiro , 5T, DJe de 30/4/2014).[12]
O porte de munição, em regra não aplica o princípio da insignificância, pois se trata de crime de perigo abstrato, mas já há decisões do STF favoráveis à insignificância em casos de porte de munição, sendo a mesma utilizada como pingente em um cordão, por exemplo.
Por último, o uso e tráfico de drogas, segundo entendimento dos Tribunais Superiores, não são passiveis de aplicação do princípio da insignificância, pois ambos são crime de perigo abstrato onde o bem tutelado é a saúde pública, ou seja, é irrelevante a quantidade apreendida em posse do usuário ou traficante.
Contudo, acerca desse tema, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido da inaplicabilidade do princípio da insignificância na hipótese de importação clandestina de produtos lesivos à saúde pública, em especial a semente de maconha.[13]
Destaca-se, ainda, que a inaplicabilidade do princípio da insignificância é pacificada quanto aos crimes de roubo, violência doméstica, moeda falsa, crimes eleitorais, militares e também em relação a atos infracionais.
Percebe-se que o tema é bastante divergente nos tribunais, mas que a cada dia o princípio da insignificância vem ganhando mais força em sua aplicabilidade, o que nos indica que nada impede que futuramente nos casos descritos no parágrafo anterior seja aplicado o princípio, pois como já dito o Direito Penal deve ser aplicado como última ratio.
5- APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NA FASE PRÉ-PROCESSUAL
5.1 CAPACIDADE JURÍDICA DA AUTORIDADE POLICIAL NA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BAGATELA
Levando em conta a trajetória histórica da justiça brasileira o surgimento do princípio da bagatela ou da insignificância foi de extrema importância, pois proporcionou que pequenas atitudes fossem solucionados por outros ramos do direito, garantindo assim a inercia punitiva do Estado perante a irrelevância típica de determinados fatos.
Mesmo com o surgimento do princípio da insignificância a máquina estatal é movimentada, ou seja, o poder judiciário é acionado e depois de analisar o fato, no final da ação, acaba aplicando o princípio da bagatela o que gera a extinção da tipicidade.
O que se busca demonstrar que tal princípio pode ser aplicada ainda na fase pré-processual, como se fosse um filtro, onde apenas processos com relevância merecem a movimentação de todo o aparato estatal.
Esse filtro seria aplicado pelo Delegado de Polícia, agente graduado em direito e concursado, ou seja, possui formação adequada para aplicar o princípio da bagatela, pois como sabemos a Autoridade Policial assim como o Magistrado tem o dever de seguir as leis sendo imparciais e buscando a verdade real.
Afinal a função de Delegado de Polícia não é meramente administrativa e sim pré-processual, pois busca reunir elementos mínimos de autoria e materialidade com a finalidade de indiciar o acusado. Esse indiciamento é ato privativo do delegado no qual deve fundamentar, mediante análise técnico-jurídica, a indicação de autoria e materialidade, conforme preceitua a Lei de Investigação Criminal conduzida pelo delegado de polícia, nº 12.830/2013.
Art 2º § 6º O indiciamento, privativo do delegado de polícia, dar-se-á por ato fundamentado, mediante análise técnico-jurídica do fato, que deverá indicar a autoria, materialidade e suas circunstâncias.[14]
Portanto, como o delegado é o primeiro a fazer a análise técnico-jurídica do caso concreto e também sendo responsável por resguardar os direitos e garantias individuais do cidadão, pode sim aplicar o princípio da insignificância, até porque o mesmo é responsável por fazer um juízo de valor, em qualquer caso, quando recebe a denúncia e verifica a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade do agente.
o Delegado de Polícia pode, mediante decisão fundamentada, deixar de lavrar o auto de prisão em flagrante, justificando o afastamento da tipicidade material com base no princípio da insignificância, sem prejuízo de eventual controle externo.[15]
Sendo assim, a aplicação do princípio da insignificância antes mesmo da abertura do inquérito policial, garantiria que tanto os Delegados de Polícia quanto o Judiciário se preocupassem com os delitos de grandes proporções, gerando uma investigação mais adequada e também um julgamento mais justo
5.2 O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA AFASTA A TIPICIDADE DO FATO
Como se sabe o princípio da insignificância é utilizado pelo Poder Judiciário nos casos de menor relevância, com isso o Superior Tribunal de Justiça já declarou que o Delgado de Polícia deve cumprir seu dever legal realizando os procedimentos policiais necessários, pois cabe somente ao Poder Judiciário a aplicação do princípio da insignificância, de acordo com o caso concreto.
Ocorre que alguns doutrinadores são contrários a essa ideia do Poder Judiciário, um defensor do dever do delegado em aplicar o princípio da insignificância é Kalhed Jr. que afirma:
Não só os Delegados podem como devem analisar os casos de acordo com o princípio da insignificância. Merecem aplauso e incentivo os Delegados que agem dessa forma, pois estão cientes do papel que lhes cabe na investigação preliminar, atuando como filtros de contenção da irracionalidade potencial do sistema penal. [16]
Além disso, a aplicação do princípio da insignificância descaracteriza o aspecto material do tipo penal, a conduta passa a ser atípica, o que impõe a absolvição do réu, não lhe restando consequência penal alguma.
Portanto, o crime sendo atípico, excluiria tanto a atuação do judiciário quanto da autoridade policial, pois é desnecessário perseguir um fato que não é crime, como encima Masson.
o princípio da insignificância afasta a tipicidade do fato. Logo, se o fato é atípico para a autoridade judiciária, também apresenta igual natureza para a autoridade policial.[17]
Assim, não havendo tipicidade o fato é atípico, não existindo fundadas razões para instauração do inquérito policial quem dirá de uma ação penal, como bem menciona Aury Lopes “a função de evitar acusações infundadas é o principal fundamento da investigação preliminar”[18]
Por isso, a aplicação do princípio da insignificância pelo delegado de polícia é de suma importância, pois como se sabe o Direito Penal é utilizado como última ratio. Levando em conta as inúmeras investigações diárias que surgem para a autoridade policial se faz necessário uma seleção do que seria interessante ao Direito Penal.
6- CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se concluir, que o Delegado de Polícia tem capacidade técnica de aplicar o princípio da insignificância, pois como já dito a autoridade policial é o primeiro a analisar o fato, garantir os direitos fundamentais do indivíduo e indicia-lo ou não pelo fato, sempre fundamentando e justificando sua decisão.
Além disso, todo e qualquer crime movimenta o aparato judicial e se for um delito ínfimo, onde não há tipicidade, no final de todo um processo o acusado será inocentado, portanto a aplicação do princípio já no início da investigação é de extrema importância, pois assim não haverá um desdobramento em cima daquela questão insignificante o que gera economia financeira, celeridade na persecução penal e maior qualidade nas investigações e no processo.
Portanto, a aplicação do princípio da insignificância na fase pré-processual garante que a persecução penal irá se preocupar com casos mais relevantes, tornando a mais célere, mas adequada e provavelmente com menos erros, tanto do judiciário quanto da fase inquisitorial.
7- REFERENCIAS
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[1]SILVA, Ivan Luiz. Princípio da Insignificância no Direito Penal. Curitiba: Ed Juruá, 2004.
[2]ROXIN apud BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. 14ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 6.
[3] LOPES, Maurício Antônio Ribeiro. Princípio da Insignificância no direito penal: análise à luz da lei 9.099/95: juizados especiais criminais, lei 9.503/97, código de trânsito brasileiro e da jurisprudência atual. 2. ed. Ver., atual. E ampl. – São Paulo: editora Revista dos tribunais, 2000.
[4] CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. Saraiva, 2009.
[5]BRASIL. Constituição Da República Federativa Do Brasil De 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acessado em 10 de novembro de 2019.
[6] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. 20. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2014.
[7]REBÊLO, José Henrique Guaracy. Princípio da insignificância: interpretação jurisprudencial. Belo Horizonte: Del Rey, 2000
[8]BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 145.406. Minas Gerais. Furto. Caixas de Bombom avaliadas em R$ 96,00. Princípio da insignificância. Incidência. Causa supralegal de exclusão da tipicidade material. Observância, na espécie, dos vetores que caracterizam o fato insignificante. Impetrante: Defensoria Pública da União. Coator: Superior Tribunal de Justiça. Relator: Min. Celso de Mello, 31 de agosto de 2017. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC145406.pdf> Acessado em 10 de novembro de 2019.
[9] BRASIL. Supremo Tribunal De Justiça. Embargos de Divergência em Recurso Especial Nº 1.609.444. São Paulo. Tentativa de Furto de Produtos De Higiene Pessoal (Desodorantes e Óleos Corporais). Restituição dos Bens a Vítima. Concurso de Pessoas X Aplicação do Princípio da Insignificância. Necessidade de se Verificar as Condições Pessoais do Agente no Caso Concreto. Ausência De Periculosidade Significativa da Conduta do Réu. Atipicidade Material da Conduta. Excepcionalidade. Embargos de Divergência Rejeitados. Embargante: Ministério Publico Federal. Embargado: Carlos josé da Silva Vincentini. Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 26 de outubro de 2016. Disponível em: < https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/404890975/embargos-de-divergencia-em-recurso-especial-eresp-1609444-sp-2016-0168119-4/inteiro-teor-404890982> Acessado em 10 de novembro de 2019.
[10] BRASIL. Supremo Tribunal De Justiça. Habeas Corpus Nº 149.87. Minas Gerais. HABEAS CORPUS. Roubo Circunstanciado. Pena Aplicada: 5 Anos e 4 Meses de Reclusão, em Regime Inicial Semiaberto. Impossibilidade de Aplicação do Princípio da Insignificância. Delito Complexo. Pluralidade de Bens Jurídicos Ofendidos. Integridade Física da Vítima que Jamais Pode ser Considerada como um Irrelevante Penal. Precedentes do STJ. Crime Consumado. Dispensabilidade da Posse Tranqüila da Res Furtiva. Parecer do MPF Pelo Conhecimento em Parte do Writ e, Nessa Parte, Pela Denegação da Ordem. Ordem Denegada. Impetrante: Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais. Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Relator: Min. Napoleão Nunes Maia Filhos, 17 de julho de 2010. Disponível em: < https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ITA&sequencial=981939&num_registro=200901959830&data=20100802&formato=PDF> Acessado em: 10 de novembro de 2019.
[11]Id. Informativo de Jurisprudência n. 551 Terceira Seção. Direito Penal. Parâmetro para Aplicação do Princípio da Insignificância ao Crime de Descaminho. REsp 1.393.317-PR. Relator: Min. Rogerio Schietti Cruz, 12 de novembro de 2014. Disponível em: < https://scon.stj.jus.br/SCON/SearchBRS?b=INFJ&tipo=informativo&livre=@COD=%270551%27> Acessado em: 10 de novembro de 2019.
[12]BRASIL. Superior Tribunal De Justiça. Agravo em Recurso Especial n. 330.323. Paraná. Penal. Descaminho. CP, Art. 334, Caput. Execução de Débitos Fiscais. Limite Mínimo. Portaria MF 75. Legalidade Aplicação. Atipicidade. Agravante: Ministério Publico Federal. Agravado: João Carlos Prestes. Relator: Min. Rogerio Schietti Cruz, 20 de outubro de 2014. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/diarios/documentos/148478343/agravo-em-recurso-especial-n-330323-pr-do-stj> Acessado em 10 de novembro de 2019.
[13]Id. Agravo em Recurso Especial n. 1.637.113. São Paulo. Agravo Regimental no Recurso Especial. Penal. Importação de Sementes de Maconha. Delito Previsto No Art. 33, § 1º, Inciso I, Da Lei N. 11.343/06. Princípio da Insignificância. Inaplicabilidade. Insurgência Desprovida. Agravante: Alexsander Luiz Formigoni de Souza. Agravado: Ministério Publico Federal. Relator: Min. Jorge Mussi, 06 de abril de 2017. Disponível em: < https://www.conjur.com.br/dl/principio-insignificancia-nao-aplica1.pdf> Acessado em 10 de novembro de 2019.
[14]BRASIL. Lei 12.830/2013, Lei de Investigação Criminal conduzida pelo delegado de polícia. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12830.htm> Acessado em: 11 de novembro de 2019.
[15] ZANOTTI, Bruno. Enunciados aprovados no 1º Congresso Jurídico dos Delegados da Polícia Civil do Estado do Rio de Janeiro. Penso Direito, 2014.
[16] KHALED JR., Salah H.; ROSA, Alexandre Morais da. "Delegados relevantes e lesões insignificantes: a legitimidade do reconhecimento da falta de tipicidade material pela autoridade policial". Justificando. Disponível em: <http://justificando.cartacapital.com.br/2014/11/25/delegados-relevantes-e-lesoes-insignificantes-legitimidade-reconhecimento-da-falta-de-tipicidade-material-pela-autoridade-policial/>. Acesso em: 05 outubro 2019.
[17] MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. 9. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
[18] LOPES JR, Aury e GLOECKNER, Ricardo. Investigação preliminar no processo penal. São Paulo: Saraiva, 2014.
Advogada, Pós-Graduada em Direito Processual Penal pela Faculdade Fael e Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Mar del Plata Argentina.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SPAGNOL, Bruna. Aplicação do princípio da insignificância pelo Delegado de Polícia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jan 2020, 04:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54106/aplicao-do-princpio-da-insignificncia-pelo-delegado-de-polcia. Acesso em: 23 dez 2024.
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