Resumo: O presente artigo trata sobre a responsabilidade civil do Estado decorrente dos danos causados por notários e registradores a terceiros, quando no exercício de suas atividades delegadas Visa abordar, em especial, as controvérsias que existiam tanto acerca da responsabilidade dos próprios notários e registradores, quanto à responsabilidade estatal e a evolução destas. Por fim, será feita uma análise, tendo em vista as decisões mais recentes, sobretudo do Supremo Tribunal Federal, a qual tende a prevalecer nos Tribunais pátrios, e o impacto desta no âmago da sociedade.
Palavras-chave: “Direito Notarial e Registral”; “Responsabilidade civil”; “Natureza Jurídica”; “Delegação”; “Serviço Público”; “Responsabilidade Estatal”; “Extensão”; “Jurisprudência”.
Abstract: This article deals with the civil liability of the State arising from the damage caused by notaries and registrars to third parties, when in the exercise of their delegated activities. state responsibility and their evolution. Finally, an analysis will be made in view of the most recent decisions, especially of the Supreme Federal Court, which tends to prevail in the national courts, and its impact on the core of society.
Keywords: “Notarial and Registry Law”; “Civil Responsability”; “Legal Nature”; “Delegation”; “Public service”; “State Responsibility”; “Extension”; “Jurisprudence”.
Sumário: 1. Introdução. 2. Responsabilidade civil dos notários e tabeliães. Evolução do entendimento. 3. A Responsabilidade civil do Estado consubstanciada na Teoria do Risco Administrativo. 4. A Responsabilidade civil do Estado pelos danos causados a terceiros por notários e registradores no exercício de suas atividades. 4. Conclusões. Referências.
1.Introdução
A Constituição Federal de 1988, ao tratar no artigo 236 que os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, transferiu em seu §1º ao legislador infraconstitucional a tarefa de disciplinar a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais e de seus prepostos.
O legislador infraconstitucional, no entanto, não foi uníssono na definição dessa responsabilidade. Por algum tempo entendeu que a responsabilidade seria objetiva e, só recentemente, após segunda alteração legislativa, foi definida a natureza jurídica dessa responsabilidade para subjetiva, sob a chancela dos tribunais pátrios.
Tal definição, no entanto, esbarrou no que se entendia, também, quanto à responsabilização do Estado pelos danos causados a terceiros pelos notários e registradores no exercícios de suas atividades delegadas.
Nesse sentido, primeiramente, será abordada nessa obra a responsabilidade civil dos notários e registradores e a evolução, tanto da doutrina, quanto da jurisprudência para se chegar no entendimento atual, consolidado através de alteração legislativa.
Posteriormente, será descrita a responsabilidade do Estado diante da prestação de um serviço público.
E partindo desse trâmite, será abordada algumas características da responsabilidade civil estatal, pautada na Teoria do Risco Administrativo, bem como o comando constitucional que previu o modo como as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado seriam responsabilizadas pelos atos lesivos causados por seus agentes a terceiros, no exercício da atividade.
Por último, portanto, o enfoque central vai tratar da discussão e toda problemática que envolveu a definição da responsabilidade do Estado frente aos atos realizados por tabeliães e registradores quando do exercício da delegação do serviço público, partindo desde a concepção que entendia que estes eram responsabilizados objetivamente, para o entendimento atual chancelado pelo Supremo Tribunal Federal.
Assim, será analisado o julgamento proferido pelo STF e o desdobramento deste na atividade notarial e registral.
O presente trabalho, portanto, visa esclarecer alguns institutos que giram em torno da responsabilidade civil dos tabeliães, registradores e Estado, trazendo entendimentos doutrinários e jurisprudenciais acerca do assunto, que, ao que tudo indica, parece ter sido pacificado no âmbito do STF com a seguinte tese:
“O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa.
O Estado possui responsabilidade civil direta, primária e objetiva pelos danos que notários e oficiais de registro, no exercício de serviço público por delegação, causem a terceiros.”
STF. Plenário. RE 842846/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 27/2/2019 (repercussão geral)
Diante do exposto, percebe-se que o presente trabalho traçará o caminho que levou o STF a tal entendimento, bem como analisará a referida conclusão dentro do contexto evolutivo atual.
2. Responsabilidade Civil dos Notários e Tabeliães. Evolução do entendimento.
O ingresso na atividade notarial e registral depende da prévia realização de concurso público, nos termos do art. 236, §3º, da CF/88[1], sendo tais serviços regulamentados pela Lei nº 8.935/94, que disciplina em seu artigo 3º[2] ser o notário, ou tabelião, e o oficial de registro, ou registrador, profissionais do direito dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício de atividade notarial e de registro.
Assim, logo a princípio, pode-se depreender que os registros públicos e notariais são funções públicas, a quem a Constituição delegou, no art. 236, a execução a particulares, em que pese a titularidade do serviço pertencer ao Estado.
Ao dispor acerca dessa delegação, o legislador constituinte ainda disciplinou que os tabeliães e profissionais de registro se submeteriam à responsabilidade civil e criminal pelos seus atos, cabendo, contudo, ao legislador infraconstitucional esmiuçar a extensão dessas responsabilidades.
A Lei nº 8.935/94, ao ser editada, previa a responsabilidade civil objetiva dos notários e registradores, que poderiam se utilizar da ação regressiva no caso de dolo ou culpa dos prepostos nos atos por estes praticados. Em que pese ter ocorrido alteração desse dispositivo pela Lei nº 13.137/2015 ampliando as hipóteses de responsabilização, a natureza desta não deixou de ser objetiva.
Apenas com o advento da Lei nº 13.286/2016 houve alteração da redação do art. 22 da Lei nº 8.935/94[3] para esclarecer e por uma pá de cal na jurisprudência e doutrina acerca da responsabilidade civil dos notários e registradores, a qual passou a ser, indubitavelmente, subjetiva.
Os defensores da responsabilidade objetiva o faziam com lastro no art. 37, §6º, da CF/88[4], que atribui a responsabilidade civil objetiva à Administração pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causam a terceiros, assegurado o direito de regresso no caso de dolo ou culpa desses, em atenção à teoria do risco administrativo.
No entanto, o STF entendeu por constitucional a alteração legislativa e, dentre os principais fundamentos pode-se destacar:
- o art. 236, §1º, da CF/88 é norma de eficácia limitada, tendo o constituinte outorgado ao legislador infraconstitucional a tarefa de definir qual seria a responsabilidade dos notários e registradores;
- não caberia ao STF fazer uma interpretação analógica e extensiva a fim de que fosse aplicada a mesma responsabilidade atribuída às pessoas jurídicas de direito privada prestadoras de serviço público;
- e, o fato de os notários e registradores responderem civilmente na qualidade de pessoas naturais delegatárias de serviço público, o que difere da situação preconizada no art. 37, §6º, da CF/88.
Cumpre assinalar, ademais, que a responsabilidade subjetiva já era prevista e sedimentada no âmbito de atuação dos tabeliães de protesto, vez que o art. 38, da Lei nº 9.492/97[5] é expresso nesse sentido. Assim, não fazia o menor sentido atribuir a responsabilidade subjetiva aos tabeliães de protesto e dispor de modo diverso aos notários.
Atualmente, portanto, pode-se afirmar que a responsabilidade civil dos notários e registradores tem natureza subjetiva, por expressa previsão legal e entendimento pacificado em meio a jurisprudência do Supremo.
3. A Responsabilidade civil do Estado consubstanciada na Teoria do Risco Administrativo.
A responsabilidade civil objetiva do Estado surgiu pela primeira vez no ordenamento jurídico brasileiro através da Constituição de 1934 se mantendo até o advento da atual Carta Magna e se consolidando por meio desta, nos termos do art. 37, §6º, da CF/88 acima transcrito.
A responsabilização pelos danos causados surge com a violação de um dever jurídico, sendo o ato ilícito o seu percursor. Contudo, a obrigação de reparar o dano também pode surgir da ocorrência, excepcional, de um ato lícito, principalmente se este fora realizado fora dos seus parâmetros ou por expressa disposição legal.
A responsabilidade civil do Estado é pautada na teoria do risco administrativo, que tem como corolário a repartição dos encargos sociais. Sobre o fundamento dessas teorias, cumpre transcrever explicação extraída do livro de Rafael Carvalho[6]:
“Em razão dos benefícios gerados à coletividade pelo desenvolvimento das atividades administrativas, os eventuais danos suportados por determinados indivíduos devem ser suportados, igualmente, pela coletividade. O ressarcimento dos prejuízos é efetivado pelo Estado com os recursos públicos, ou seja, oriundos das obrigações tributárias e não tributárias suportadas pelo cidadão. Dessa forma, a coletividade, que se beneficia com a atividade administrativa, tem o ônus de ressarcir aqueles que sofreram danos em razão dessa mesma atividade. Trata-se da adoção do princípio da repartição dos encargos sociais, vinculado ao princípio da igualdade (isonomia)”
Assim, partindo concepção de estar a responsabilidade civil estatal baseada na teoria do risco administrativo, para que o Estado seja responsável é necessária a presença dos seguintes pressupostos: fato administrativo consistente na conduta omissiva ou comissiva do Estado, o dano, e o nexo de causalidade entre a atuação estatual e a lesão sofrida pelo terceiro.
É importante mencionar que, segundo a teoria do risco administrativo, a responsabilidade do Estado pode ser afastado ou até mesmo diminuída, conforme o caso, caso seja demonstrado que houve culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro ou caso fortuito ou força maior. Contudo, esmiuçar tais caracteres não é o objeto do presente artigo, cujo foco é a responsabilidade do Estado face os serviços prestados por notários e registradores, a qual será analisada no tópico seguinte.
4. A Responsabilidade civil do Estado pelos danos causados a terceiros por notários e registradores no exercício de suas atividades.
Até o advento da Lei nº 13.286/2016, que alterou a forma em que os notários e registradores são responsabilizados civilmente, o entendimento que reinava era de que a responsabilidade do Estado seria subsidiária, ou seja, este só seria responsabilizado caso restasse configurada a insolvência do delegatário.
Os argumentos defensores da responsabilidade subsidiária do Estado, o faziam sob o mesmo fundamento em que atribuíam a responsabilidade objetiva aos notários e registradores, ou seja, de que o serviço estatal prestado em nome do Estado por meio de delegação atraía a incidência do art. 37, §6º, da CF/88. Fora o fato de sustentarem que os delegatários desse serviço estatal já eram muito bem recompensados pelo exercício dessa função, e que poderiam, sem demasia onerosidade, assumir também as responsabilidades oriundas da mesma atividade.
Contudo, a virada legislativa mudou o cenário jurisprudencial em torno dessa celeuma. Após reconhecer a existência de repercussão geral no recurso extraordinário que versava sobre esta matéria, o STF entendeu, de uma vez, ser a responsabilidade civil do Estado objetiva. Veja-se:
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DANO MATERIAL. ATOS E OMISSÕES DANOSAS DE NOTÁRIOS E REGISTRADORES. TEMA 777. ATIVIDADE DELEGADA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO DELEGATÁRIO E DO ESTADO EM DECORRÊNCIA DE DANOS CAUSADOS A TERCEIROS POR TABELIÃES E OFICIAIS DE REGISTRO NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES. SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS. ART. 236, §1º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO PELOS ATOS DE TABELIÃES E REGISTRADORES OFICIAIS QUE, NO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES, CAUSEM DANOS A TERCEIROS, ASSEGURADO O DIREITO DE REGRESSO CONTRA O RESPONSÁVEL NOS CASOS DE DOLO OU CULPA. POSSIBILIDADE. 1. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. Tabeliães e registradores oficiais são particulares em colaboração com o poder público que exercem suas atividades in nomine do Estado, com lastro em delegação prescrita expressamente no tecido constitucional (art. 236, CRFB/88). 2. Os tabeliães e registradores oficiais exercem função munida de fé pública, que destina-se a conferir autenticidade, publicidade, segurança e eficácia às declarações de vontade. 3. O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público e os atos de seus agentes estão sujeitos à fiscalização do Poder Judiciário, consoante expressa determinação constitucional (art. 236, CRFB/88). Por exercerem um feixe de competências estatais, os titulares de serventias extrajudiciais qualificam-se como agentes públicos. 4. O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa. Precedentes: RE 209.354 AgR, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma, DJe de 16/4/1999; RE 518.894 AgR, Rel. Min. Ayres Britto, Segunda Turma, DJe de 22/9/2011; RE 551.156 AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe de 10/3/2009; AI 846.317 AgR, Relª. Minª. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe de 28/11/13 e RE 788.009 AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 19/08/2014, DJe 13/10/2014. 5. Os serviços notariais e de registro, mercê de exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público (art. 236, CF/88), não se submetem à disciplina que rege as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos. É que esta alternativa interpretativa, além de inobservar a sistemática da aplicabilidade das normas constitucionais, contraria a literalidade do texto da Carta da República, conforme a dicção do art. 37, § 6º, que se refere a “pessoas jurídicas” prestadoras de serviços públicos, ao passo que notários e tabeliães respondem civilmente enquanto pessoas naturais delegatárias de serviço público, consoante disposto no art. 22 da Lei nº 8.935/94. 6. A própria constituição determina que “lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário” (art. 236, CRFB/88), não competindo a esta Corte realizar uma interpretação analógica e extensiva, a fim de equiparar o regime jurídico da responsabilidade civil de notários e registradores oficiais ao das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviços públicos (art. 37, § 6º, CRFB/88). 7. A responsabilização objetiva depende de expressa previsão normativa e não admite interpretação extensiva ou ampliativa, posto regra excepcional, impassível de presunção. 8. A Lei 8.935/94 regulamenta o art. 236 da Constituição Federal e fixa o estatuto dos serviços notariais e de registro, predicando no seu art. 22 que “os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso. (Redação dada pela Lei nº 13.286, de 2016)”, o que configura inequívoca responsabilidade civil subjetiva dos notários e oficiais de registro, legalmente assentada. 9. O art. 28 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/1973) contém comando expresso quanto à responsabilidade subjetiva de oficiais de registro, bem como o art. 38 da Lei 9.492/97, que fixa a responsabilidade subjetiva dos Tabeliães de Protesto de Títulos por seus próprios atos e os de seus prepostos. 10. Deveras, a atividade dos registradores de protesto é análoga à dos notários e demais registradores, inexistindo discrímen que autorize tratamento diferenciado para somente uma determinada atividade da classe notarial. 11. Repercussão geral constitucional que assenta a tese objetiva de que: o Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa. 12. In casu, tratando-se de dano causado por registrador oficial no exercício de sua função, incide a responsabilidade objetiva do Estado de Santa Catarina, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa. 13. Recurso extraordinário CONHECIDO e DESPROVIDO para reconhecer que o Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa. Tese: “O Estado responde, objetivamente, pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros, assentado o dever de regresso contra o responsável, nos casos de dolo ou culpa, sob pena de improbidade administrativa”.
(RE 842846, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 27/02/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 12-08-2019 PUBLIC 13-08-2019)
Diante do exposto, acredita-se que, após muitos embates, chegou-se a um denominador comum no que tange a responsabilidade civil dos tabeliães e registradores, cuja lei de regência agora é expressa no sentido de ser subjetiva, devendo haver a comprovação do dolo ou culpa por parte dos prepostos; bem como em relação a responsabilidade civil do Estado pelos danos causados a terceiros em face de conduta desses delegatários, tendo o STF, em sede de repercussão geral, sedimentado o entendimento de que o Estado responde objetivamente.
5. Conclusões
A CF/88 disciplina no art. 37, §6º, da CF/88 a maneira como as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público responderão pelos danos que seus agentes causarem a terceiros quando no exercício da atividade, sendo essa responsabilização objetiva.
Com relação à atividade notarial e de registro, a CF/88 dispôs em regramento próprio a maneira como os delegatários desses serviços seriam responsabilizados, atribuindo ao legislador infraconstitucional o papel de definir tal responsabilidade, cumprindo o quanto lhe fora determinado através da norma contida no art. 22 da Lei nº 8.935/94, cuja redação foi alterada pela Lei nº 13.286/2016, que atribui a responsabilidade civil subjetiva aos tabeliães e registradores.
Partindo dessas premissas, chegou no STF a discussão de qual seria, portanto, a responsabilidade civil estatal pelos danos causados a terceiros decorrentes do exercício das atividades notariais e registrais, tendo o Supremo reconhecido a repercussão geral do tema.
Tal entendimento trouxe uma reviravolta no mundo jurídico em torno da responsabilidade do Estado face os tabeliães e registradores, que até então entendia ser subsidiária.
Isto porque, a recente decisão do STF, publicada em agosto de 2019, foi no sentido diametralmente oposto ao que alguns doutrinadores defendiam, e atribuiu ao Estado a responsabilidade objetiva pelos atos dos tabeliães e registradores oficiais que, no exercício de suas funções, causem dano a terceiros.
Desse modo, percebe-se que, se de um lado surgiu o sentimento de ter ocorrido um retrocesso ao atribuir a responsabilidade subjetiva aos delegatários das atividades notarial e de registro, posto que responsabilizá-los por atos lesivos a terceiro, estes devem comprovar a dolo ou culpa daqueles; por outro lado, consolidou-se na jurisprudência a responsabilidade objetiva do Estado face os atos praticados pelos delegatórios, o que trouxe mais segurança aos terceiros lesados, que agora dispõem de uma garantia estatal na busca do ressarcimento.
REFERÊNCIAS.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 30 out. 2019.
______. Lei nº 8.935 (1994). Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro. (Lei dos cartórios). Brasília, DF, 18 nov. 1994. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8935.htm. Acesso em: 30 out. 2019.
_____. Lei nº 9.492 (1997). Define competência, regulamenta os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências. Brasília, DF, 10 set. 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9492.htm. Acesso em: 30 out. 2019.
______. Supremo Tribunal Federal. RE 842846. Relator: Min. Luiz Fux. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=750504507 Acesso em: 31 out. 2019.
OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo – 5. Ed. rev. atual. E ampl – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.
DEBS, Martha El. Legislação Notarial e de Registros Públicos Comentada – 3. Ed. rev. ampl. E atual. – Editora: Juspodivm, 2018.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O Estado responde, objetivamente, pelos danos causados por notários e registradores. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/abebb7c39f4b5e46bbcfab2b565ef32b>. Acesso em: 30/10/2019.
Notas:
[1] Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. (Regulamento)
§ 1º Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário.
§ 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. (Regulamento)
§ 3º O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses.
[2] Art. 3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro.
[3] Art. 22. Os notários e oficiais de registro são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem a terceiros, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso.
[4] Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
[...]
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
[5] Art. 38. Os Tabeliães de Protesto de Títulos são civilmente responsáveis por todos os prejuízos que causarem, por culpa ou dolo, pessoalmente, pelos substitutos que designarem ou Escreventes que autorizarem, assegurado o direito de regresso.
[6] OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo – 5. Ed. rev. atual. E ampl – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.
Graduada pela Universidade Federal da Bahia. Especialização em Direito Tributário pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ASSIS, Claudia Machado de. A responsabilidade civil do Estado pelos danos causados a terceiros por notários e registradores no exercício de suas atividades. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 fev 2020, 04:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54236/a-responsabilidade-civil-do-estado-pelos-danos-causados-a-terceiros-por-notrios-e-registradores-no-exerccio-de-suas-atividades. Acesso em: 23 dez 2024.
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