Érica Cristina Molina dos Santos[1]
(Orientadora)
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar os alimentos gravídicos e os direitos do nascituro e da gestante, bem como os direitos do suposto genitor. A finalidade do artigo é estudar e analisar a Lei n° 11.804/2008, chamada de lei de alimentos gravídicos, na qual estabelece alimentos destinados à mulher gestante, que não possuí condições financeiras de arcar com os custos da gestação, ou seja, dispõe sobre a possibilidade do pagamento de alimentos para suprir as necessidades de subsistência da pessoa que não possa suportá-las. Para melhor entendimento do teor da lei, os direitos do nascituro e a personalidade civil serão abordados e analisados, bem como a definição do conceito de alimentos. Serão abordados também, os aspectos processuais da lei, a insegurança trazida ao suposto pai, bem como a possibilidade de indenização a este em caso de negativa de paternidade. Trata-se de uma pesquisa bibliográfica realizada por meio de livros, artigos, doutrinas existentes sobre o tema escolhido.
Palavras-Chave: Alimentos gravídicos; Nascituro; Gestação; Mulher; Genitor.
ABSTRACT: The purpose of this article is to analyze pregnancy foods and the rights of the unborn and pregnant women, as well as the rights of the alleged parent. The purpose of the article is to study and analyze Law No. 11.804 / 2008, called the law on pregnant foods, which establishes foods intended for pregnant women, who could not afford the costs of pregnancy, ie, provides for the possibility of paying food to meet the subsistence needs of the person who cannot afford them. To better understand the content of the law, the rights of the unborn child and civil personality will be addressed and analyzed, as well as the definition of the concept of food. It will also address the procedural aspects of the law, the insecurity brought to the alleged father, as well as the possibility of compensation to him in case of refusal of paternity. It is a bibliographical research conducted through books, articles, existing doctrines on the chosen theme.
Keywords: Pregnancy foods; Unborn; Gestation; Woman; Parent.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. DEFINIÇÃO DE NASCITURO NO ORDENAMENTO JURÍDICO; 2.1 Dos direitos do nascituro. 3. DIREITOS DA PERSONALIDADE. 4. CONCEITO DE ALIMENTOS. 5. A LEI DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS. 6. DA POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO AO SUPOSTO PAI. 7. CONCLUSÃO. 8. REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tratará do tema acerca da Lei de alimentos gravídicos, dos direitos do nascituro e da personalidade, bem como sobre o conceito de alimentos e da possibilidade de indenizar o suposto genitor em caso do pagamento de alimentos gravídicos e de um posterior exame de DNA negativo.
Os alimentos gravídicos estão previstos na lei nº 11.804/2008, que visa proteger e assegurar a gestante e ao nascituro uma gestação saudável e segura.
Os alimentos são destinados à mulher grávida para custear as despesas da gestação, desde a concepção até a data do parto, bem como aos custos referentes à assistência médica e psicológica, alimentação especial necessária, exames de praxe, medicamentos, internações e demais cuidados que sejam prescritos, conforme cada caso em específico.
A ação de alimentos gravídicos é proposta pela gestante em desfavor do suposto pai do nascituro, pois a legislação permite que a genitora represente o nascituro para pleitear os alimentos junto ao suposto genitor.
A finalidade da lei é de que ambos os genitores colaborem com as despesas essenciais decorrentes da gravidez, vez que ambos são os genitores da criança e ambos possuem as mesmas responsabilidades.
A lei de alimentos gravídicos não traz o reconhecimento da paternidade como requisito para propositura da ação, tampouco está condicionada a realização do exame de DNA para confirmação da paternidade.
Para ser deferido o pedido de alimentos durante a gravidez, é necessário a existência de fortes indícios da paternidade, não precisando existir entre as partes, casamento, união estável ou relacionamento duradouro.
Após a comprovação da existência de indícios de paternidade, o juiz determinará a fixação dos alimentos gravídicos que, após o nascimento do feto com vida, serão convertidos em pensão alimentícia, permanecendo no mesmo valor estabelecido.
A lei de alimentos gravídicos é bastante sucinta e omissa em alguns pontos, tais como nos aspectos processuais, portanto, em certas ocasiões, a lei que rege o direito sobre a obrigação alimentar é utilizada para suprir as lacunas que possam surgir durante a tramitação do processo.
2. DEFINIÇÃO DE NASCITURO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
O nascituro é um titular do direito ao nascimento com vida, pois conforme dispõe a Constituição Federal (BRASIL, 1988) todos têm direito à vida, assim como a dignidade da pessoa humana. (DANOSO, 2009 apud NOGUEIRA, 2011).
De acordo com Maria Helena Diniz:
Nascituro é aquele que há de nascer, cujos direitos a lei põe a salvo; aquele que, estando concebido, ainda não nasceu e que, na vida intra-uterina, tem personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos da personalidade, passando a ter personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais, que pertenciam em estado potencial, somente com o nascimento com vida. (DINIZ, 2007, p. 334)
A Teoria Natalista foi adotada no Brasil e estabelece que a personalidade jurídica tem início após o nascimento com vida.
Referida teoria entende que o nascituro não é uma vida a parte de sua genitora, mas que o nascituro é parte do ventre materno. Por isso é necessário o nascimento com vida para o início da personalidade. (SILVA, MIRANDA, 2011)
Carlos Roberto Gonçalves ensina que para se dizer que nasceu com vida, todavia, é necessário que a criança tenha respirado, ou seja, se respirou é porque viveu, independente do tempo. (GONÇALVES, 2014).
É importante destacar que o termo jurídico “nascituro” não pode ser confundido com os termos “embrião” ou “feto”.
O embrião significa ser vivo nas primeiras fases do desenvolvimento: nos vivíparos, desde a fecundação do ovo até o nascimento, e nos ovíparos, até a eclosão; germe fecundado, nos três primeiros meses da vida intrauterina; aquilo que está no começo, que não se desenvolveu, que ainda não tem forma apreciável; princípio, origem. (OLIVEIRA e CARVALHO, 2017)
O feto representa a fase do desenvolvimento intrauterino posterior à fase embrionária até o momento do nascimento, e que acontece após o segundo ou terceiro mês de fecundação.
É um estágio de desenvolvimento intrauterino que tem início após oito semanas de vida embrionária, quando já se podem ser observados braços, pernas, olhos, nariz e boca, e vai até o fim da gestação. (MENDONÇA, 2015)
2.1 Dos direitos do nascituro
A lei estipula expressamente que a personalidade civil tem início a partir do nascimento da pessoa com vida, mas, além disso, a lei também garante os direitos do nascituro, conforme dispõe o artigo 2º do Código Civil (BRASIL, 2002): “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”.
A Constituição Federal (BRASIL, 1988) protege a vida de modo geral e protege também a vida uterina, dessa forma, garante também ao nascituro, direito ao sadio desenvolvimento durante a gestação.
O direito à vida é garantido pela Constituição Federal (BRASIL, 1988), portanto, é dever do Estado assegurá-lo, tomando as providências necessárias para que todos os cidadãos tenham o direito de continuar vivos. Tal garantia não é válida somente aos que já nasceram vivos, mas também àqueles que ainda não nasceram, os nascituros.
A genitora possui o dever de proteger o nascituro. A mesma não poderá atentar contra a vida do feto em hipótese alguma, ou seja, não poderá interromper a vida que se desenvolve, sob pena de ser processada e responsabilizada criminalmente nos termos dos artigos 124 e seguintes do Código Penal (BRASIL, 1940).
Dessa forma, se observa que o direito à integridade física também é amplamente garantido ao nascituro, devendo o feto se desenvolver de forma saudável, não sofrendo nenhum tipo de dano a sua integridade física.
O Estado tem ainda a obrigação de fornecer esse desenvolvimento digno e sadio ao nascituro, por meio do bom atendimento médico que deve ser oferecido e disponibilizado em todos os hospitais públicos existentes no país.
Todos os direitos existentes aos já nascidos serão atribuídos ao nascituro, no momento do nascimento com vida.
A lei nº 8.069/1990, chamada de Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), também estabelece alguns direitos personalíssimos ao nascituro, tais como à vida, à saúde e à alimentação.
A genitora tem direito de atendimento pré-natal e perinatal, para que o nascimento do feto seja digno e harmonioso, conforme dispõe os artigos 7º e 8º do
Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990).
Artigo 7º A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.
Artigo 8° É assegurado a todas as mulheres o acesso aos programas e às políticas de saúde da mulher e de planejamento reprodutivo e, às gestantes, nutrição adequada, atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério e atendimento pré-natal, perinatal e pós-natal integral no âmbito do Sistema Único de Saúde.
O nascituro, por ser um ser humano em fase de gestação, também tem direito a dignidade da pessoa humana, e, por isto, deverá ter todas as suas necessidades atendidas, bem como as de sua genitora, pois o mesmo vive no ventre materno.
Conforme apresentado neste capítulo, o Estado tem responsabilidade no sadio desenvolvimento do feto, entretanto, a responsabilidade também é da gestante, que deve colaborar para uma boa gestação, fazendo um acompanhamento médico adequado para o bom e completo desenvolvimento do feto, mas, para isso é necessário que o Estado ofereça de forma eficiente tais recursos.
3. DIREITOS DA PERSONALIDADE
A personalidade pode ser classificada como um conjunto de caracteres próprios da pessoa.
Os direitos da personalidade são subjetivos, ou seja, são oponíveis erga omnes, que se aplicam a todos os homens. São aqueles direitos que a pessoa tem para defender o que é seu, tais como, a vida, a integridade física, a liberdade, a privacidade, a honra, a imagem, dentre outros. (ARAUJO, RODRIGUES, 2017)
Maria Helena Diniz leciona que:
A personalidade consiste no conjunto de caracteres próprios da pessoa. A personalidade não é um direito, de modo que seria errôneo afirmar que o ser humano tem direito à personalidade. A personalidade é que apoia os direitos e deveres que dela irradiam, é o primeiro bem da pessoa, que lhe pertence como primeira utilidade, para que ela possa ser o que é, para sobreviver e se
adaptar às condições do ambiente em que se encontra, servindo-lhe de critério para aferir, adquirir e ordenar outros bens. (DINIZ, 2008, p. 117.)
O artigo 5º da Constituição Federal (BRASIL, 1988) prevê sobre diversos
direitos e garantias individuais. Tais direitos são fundamentais, e devem ser respeitados de forma que possam garantir a existência e a convivência dos seres humanos, pois, são destinados à proteção eficaz da pessoa humana em todos os seus atributos, com a finalidade de proteger e assegurar sua dignidade como valor fundamental.
As três principais características dos direitos da personalidade são: a intransmissibilidade, uma vez que os direitos não podem ser transferidos a alguma outra pessoa; a irrenunciabilidade, pois os direitos não podem ser renunciados, ou seja, ninguém pode dizer que não quer mais fazer uso dos seus direitos; e; a indisponibilidade, pois ninguém pode usá-los como bem entender.
Aduz o Código Civil (BRASIL, 2002) em seu artigo 11: “com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária”.
Os direitos da personalidade são divididos em três categorias: direito à integridade física (artigos 13,14 e 20 do Código Civil); direito à integridade psíquica (artigo 21 do Código Civil); e direitos morais (Artigo 5º da Constituição Federal de 1988).
O doutrinador Carlos Roberto Gonçalves ensina que a personalidade e a capacidade se complementam entre si:
Personalidade e capacidade completam-se: de nada valeria a personalidade sem a capacidade jurídica, que se ajusta assim ao conteúdo da personalidade, na mesma e certa medida em que a utilização do direito integra a ideia de ser alguém titular dele. Com este sentido genérico não há restrições à capacidade, porque todo direito se materializa na efetivação ou está apto a concretizar-se. A privação total de capacidade implicaria a frustração da personalidade: se ao homem, como sujeito de direito, fosse negada a capacidade genérica para adquiri-lo, a consequência seria o seu aniquilamento do mundo jurídico. Só não há capacidade de aquisição de direitos onde falta personalidade, como no caso do nascituro, por exemplo (GONÇALVES, 2007, p. 72).
Os direitos da personalidade possuem a finalidade de proteger os direitos indispensáveis à dignidade e integridade da pessoa, tal proteção deve ser realizada em várias áreas do ordenamento jurídico.
A proteção jurídica da personalidade é realizada através do dever de reparar o dano moral causado ou a ofensa ao direito da personalidade. A tutela geral dos direitos da personalidade, está prevista no artigo 12 do Código Civil (BRASIL, 2002) que protege os indivíduos de qualquer ameaça ou lesão à sua integridade física ou moral.
A proteção pode ser requerida para evitar que a ameaça seja consumada ou para que diminua os efeitos da ofensa praticada, sem prejuízo da reparação de danos morais e patrimoniais. (GOMES, 2010)
4. CONCEITO DE ALIMENTOS
No ordenamento jurídico brasileiro, a palavra alimentos faz menção expressa às prestações periódicas pertinentes à determinada pessoa, em dinheiro ou espécie, em decorrência de ato ilícito, da manifestação de vontade ou em virtude da legislação de Direito de Família, para prover a sobrevivência. (SILVEIRA, FERNANDES, 2017)
Alimentos são as prestações devidas, feitas para quem as recebe possa subsistir, isto é, manter sua existência, realizar o direito à vida, tanto física (sustento do corpo) como intelectual e moral (cultivo e educação do espírito, do ser racional). (SILVEIRA, FERNANDES, 2017 apud CAHALI, 2002)
De acordo com o que dispõe na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 227, há um conceito para o termo alimentos no ordenamento jurídico conforme se descreve abaixo:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Os alimentos compreendem todos os meios que propiciem ao alimentado uma vida digna e, não apenas a alimentação em si falando.
Os alimentos também abrangem o vestuário, assistência médica, a habitação, ou seja, tudo o que for necessário para atender às necessidades da vida, e, quando se trata de menor, os alimentos compreendem também o que for preciso para educação e instrução. (RODRIGUES, 2007)
Os alimentos são oriundos da relação de parentesco, entre descendente e ascendentes, e das obrigações recíprocas de assistência advindas do casamento ou
da união estável.
De acordo com o que leciona Theodoro Jr. (2007) os alimentos, em sentido jurídico, compreendem tudo o que uma pessoa tem direito a receber de outra para atender às suas necessidades físicas, morais e jurídicas, e para Gonçalves (2005) os alimentos abrangem tudo aquilo que for indispensável ao sustento, vestuário, habitação, assistência médica, instrução e educação.
Dessa forma, é importante frisar que o termo “alimentos” compreende toda e qualquer necessidade para a preservação da vida do ser humano, e, conforme salientado, os alimentos englobam desde a alimentação propriamente dita, mas também a habitação, educação, diversão, vestuário, assistência médica e afins.
Os alimentos podem ser provisórios, definitivos e provisionais.
Os provisórios são fixados em ação própria de alimentos, porém, são concedidos no início do processo desde que haja prova do parentesco entre alimentante e alimentado e que seja requerido pela parte autora na peça processual inicial a concessão em tutela antecipada.
Os alimentos definitivos são aqueles fixados na sentença final do processo de alimentos propriamente dito ou em ação de divórcio/separação. Os alimentos definitivos serão estipulados permanentemente em favor do alimentado pelo juízo competente.
Os alimentos provisionais são fixados em medida cautelar incidental ou preparatória e são regulados pelo artigo 852 e seguintes do Código de Processo Civil (BRASIL, 2015).
Nos alimentos provisionais devem ficar demonstrados os requisitos para interposição de qualquer medida cautelar, que é o periculum in mora (perigo na demora) e o fumus boni iuris (fumaça do bom direito ou aparência do bom direito).
5. A LEI DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS
A Lei nº 11.804 foi criada em 2008 e disciplina o direito aos alimentos gravídicos e a forma como ele será exercido e dá outras providências. A lei tem o intuito de assegurar os direitos do nascituro, ou seja, daquele que ainda está por nascer.
Art. 1º Esta Lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido.
A lei foi publicada com 12 artigos, porém, seis artigos foram vetados, quais sejam, os artigos 3º, 4º, 5º, 8º, 9º e 10º. Os artigos foram vetados em razão das manifestações realizadas por juristas especializados no assunto de direito de família e aos interesses do nascituro e da gestante.
A ação de alimentos gravídicos deve ser proposta no domicílio da genitora, e não do genitor. O artigo 3 que fora vetado, previa que o domicílio do genitor era o juízo competente para ajuizamento da ação, porém, seria inviável permitir que a gestante tivesse gastos com deslocamentos para possíveis audiências.
A lei garante uma verba suplementar à gestante, paga pelo futuro pai da criança, durante o período de gravidez, ou seja, a lei confere direito a mulher gestante não casada e que também não vive em união estável de receber alimentos referentes à gestação sadia, desde a concepção até o momento do parto.
A Lei de Alimentos Gravídicos tem por objetivo assegurar à grávida o direito a receber alimentos de que necessita para uma gestação segura e tranquila, pondo fim aos casos em que o homem se nega a oferecer assistência à namorada grávida sobre o fundamento de desconfiança da paternidade ou apenas por não estar preparado para ser pai.
Referida lei foi criada para que o futuro pai participe e auxilie a gestante e o feto com suporte econômico desde o momento da concepção. A verba suplementar servirá para despesas com alimentação, assistência médica e psicológica, exames, internações, partos, medicamentos ou qualquer tipo de amparo que a gestante e feto necessitem.
Para Maria Berenice Dias (2009), o termo inicial dos alimentos gravídicos dá-se desde a concepção, na medida em que a Constituição garante o direito à vida.
Os alimentos fixados em sentença ou em momento anterior retroagirão à data
da citação.
De acordo com o artigo 2 da lei:
Art. 2º Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.
Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.
A grávida tem o direito de solicitar os alimentos gravídicos ao judiciário assim que tiver a comprovação da gravidez, ou seja, para a fixação de alimentos gravídicos, cabe à gestante carrear aos autos elementos que comprovem a existência de relacionamento amoroso com o suposto pai, como por exemplo: fotografias, mensagens em redes sociais, cartas de amor, entre outros. É possível ainda a designação de audiência de justificação, para oitiva de testemunhas acerca do relacionamento mantido pelas partes.
A genitora deverá contratar um advogado ou comparecer até a defensoria pública para o ajuizamento do pedido. Após a constatação do juiz, o futuro do pai da criança será convocado e terá cinco dias para responder à Justiça, nos termos do artigo 7°: “o réu será citado para apresentar resposta em 5 (cinco) dias”.
Conforme já abordado, em relação a propositura da ação, a mesma deve ser no domicilio do autor, nesse caso da mãe.
A Súmula 383 do STJ dispõe que: " A competência para processar e julgar ações conexas de interesse de menor é, em princípio, do foro do domicilio do detentor de sua guarda".
Para a fixação da verba alimentícia em favor do nascituro, o juiz deve observar quais são os legitimados para figurarem nos polos ativo e passivo da relação jurídica e também o binômio necessidade versus possibilidade, ou seja, o que é necessário para o alimentando, de acordo com as possibilidades financeiras do alimentante.
A contestação da paternidade é extremamente frágil, exceto se o suposto pai apresentar laudos médicos ou documentos incontroversos que comprovem vasectomia, impotência sexual grave ou esterilidade.
É possível que seja demonstrado nos autos que a gestante no período da concepção manteve relações sexuais com mais de um homem, esta defesa favoreceria o réu, pois geraria dúvidas ao magistrado quanto à questão de quem seria o pai biológico do nascituro, podendo ser julgada improcedente a ação e assim, a paternidade seria comprovada somente após o nascimento do nascituro através de exame de DNA. Outra opção de defesa seria a alegação e comprovação de que a relação sexual ocorreu em período anterior ao da concepção.
Corrobora a jurisprudência:
DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS C/C ALIMENTOS PROVISÓRIOS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE FIXOU ALIMENTOS GRAVÍDICOS EM 30% (TRINTA POR CENTO) DO SALÁRIO MÍNIMO. INSURGÊNCIA DO ALIMENTANTE. ALEGAÇÃO DE DÚVIDAS QUANTO À PATERNIDADE. INCONSISTÊNCIA. INDÍCIOS APRESENTADOS PELA GENITORA HÁBEIS A INDICAR A PATERNIDADE. EXEGESE DO ART. 6º DA LEI N. 11.804/2008. AVENTADA IRREPETIBILIDADE DOS ALIMENTOS CASO A PATERNIDADE NÃO SEJA COMPROVADA. INSUBSISTÊNCIA. MITIGAÇÃO PROBATÓRIA DIANTE DA PROTEÇÃO DO NASCITURO. INTERLOCUTÓRIO MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO. "A mitigação do elemento probatório em ações dessa natureza justifica-se pela opção feita em prol do nascituro, garantido-lhe, a despeito de maiores digressões, o direito fundamental à vida. Para tanto, pode o julgador embasar sua convicção de paternidade em meros indícios, ressalvando que, em casos de comprovada má-fé da gestante, também o princípio da irrepetibilidade dos alimentos pode sofrer ponderação."
(TJ-SC - AI: 40147105020198240000 Meleiro 4014710-50.2019.8.24.0000, Relator: Marcus Tulio Sartorato, Data de Julgamento: 03/09/2019, Terceira Câmara de Direito Civil)
Após o nascimento da criança, os valores correspondentes aos alimentos gravídicos serão convertidos em pensão alimentícia e pode ser revisado, adequando-os à necessidade do alimentado e as possibilidades do pai da criança, conforme prevê o parágrafo único do artigo 6º, da Lei n.11.804/2008:
Art. 6º Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.
Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.
Os alimentos continuam devidos mesmo após o nascimento, passando a figurar como credor alimentário a criança, e não mais a sua genitora.
Os alimentos gravídicos, após o nascimento com vida, são convertidos em pensão alimentícia em benefício do menor até uma das partes pleitear sua revisão ou exoneração.
A conversão dos alimentos gravídicos em pensão alimentícia ocorre, de maneira automática, sem necessidade de requerimento por qualquer das partes.
A exoneração só ocorrerá se o pai provar mediante prova pericial (DNA) que
o menor não é seu filho.
Quanto à extinção dos alimentos gravídicos, está se dará nos casos de aborto e natimorto.
A lei de alimentos gravídicos possui poucos artigos e por essa razão, necessita de completo de outras normas jurídicas. O artigo 11 disciplina que: “aplicam-se supletivamente nos processos regulados por esta Lei as disposições das Leis nºs 5.478, de 25 de julho de 1968, e 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil”.
Portanto, por ser omissa em alguns detalhes quanto ao procedimento processual, é necessário a aplicação de outras leis.
6. DA POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO AO SUPOSTO PAI
A Lei 11.804/08 favoreceu a gestante e o nascituro ao estabelecer e regulamentar a possibilidade da prestação de alimentos sem a inegável comprovação da paternidade, pois conforme apresentado no capítulo anterior, o juiz fixará os alimentos baseando-se apenas em indícios de paternidade, possibilitando ao magistrado, conceder o subsídio paterno mesmo sem a realização de exame de DNA.
A gestante ao indicar um pretenso pai deve fazer de forma consciente, agindo conforme os bons costumes e a boa-fé, porém, a negativa do exame de paternidade, em que o requerido descobre-se não ser o pai biológico daquele a quem prestava os alimentos, será situação frequente por se valer o juiz apenas de indícios de paternidade.
Em regra, os alimentos não são passíveis de restituição, pois visam à sobrevivência da pessoa, conforme o princípio do irrepetibilidade, pois, em razão dos alimentos servirem para garantir a vida, é impossível a pretensão de que sejam devolvidos.
O princípio da proporcionalidade rege a fixação dos alimentos e tem por pressuposto a capacidade financeira do alimentante e as necessidades do alimentando. O valor dos alimentos deve ser proporcional as necessidades do alimentado, bem como as condições financeiras do alimentante.
De acordo com a Lei 11.804/08, o suposto genitor que prestou alimentos indevidamente está desamparado legalmente, pois o artigo 10º que previa que em caso de posterior resultado negativo do exame de DNA, a genitora/autora da ação de alimentos gravídicos responderia objetivamente pelos danos materiais e morais causados, foi vetado, por ser considerado como norma intimidadora.
Entretanto, apesar do legislador ter excluído a responsabilidade objetiva da
gestante na lei de alimentos gravídicos, é possível atribuir a genitora/autora da ação, a responsabilidade subjetiva por danos morais e/ou materiais sofridos pelo suposto genitor, conforme teor dos artigos 186, 187 e 927, do Código Civil (BRASIL, 2002), restando dessa forma, para aquele que prestou os alimentos e não os devia, outra forma de ser reparado pelos danos sofridos, isto é, através da ação de repetição de indébito e da litigância de má-fé.
Portanto, se após prestar alimentos o suposto pai confirmar negativa de paternidade, poderá, utilizar-se da ação indenizatória por dano material, demonstrando a responsabilidade subjetiva da genitora, a culpa ou dolo com que a mesma tenha agido, bem como, os documentos que comprovem os gastos que lhes foram imputados indevidamente, cumulando assim, uma ação de danos materiais com o pedido de danos morais, cabendo ao genitor, comprovar os abalos psicológicos que tiver sofrido.
Se houver declaração posterior do juiz afirmando que o réu não era de fato pai, este pode requerer devolução dos valores que pagou, mas apenas os de natureza indenizatória e não de natureza alimentar, em razão do princípio da irrepetibilidade.
Dessa forma, fica demonstrada a possibilidade de reembolso de alimentos indenizatórios, mas jamais de alimentos gravídicos vitais.
A própria natureza dos alimentos justifica, por si só a impossibilidade de serem restituídos. Por isso, a alteração, para menor, do valor da pensão não dispõe do efeito retroativo. Passa a vigorar tão somente com referência aos valores vincendos. (DIAS, 2005, p.452)
Na ação de indenização por danos materiais e morais sofridos pelo falso genitor, se levará em conta a conduta culposa da gestante, analisando em cada caso concreto a capacidade dela de ter ou não conhecimento da falsa imputação.
A má-fé da gestante deverá ser comprovada pelo falso genitor no momento da propositura da ação, devendo ele, como autor da ação, provar o alegado através de todas as provas legais ou moralmente admissíveis. A Ação de Indenização por danos materiais e imateriais deverá ser fundada na comprovação da conduta culposa da gestante, o alimentante deixará sua condição de sujeito passivo do processo e assumirá o lugar de “vítima”, requerendo o que lhe é de direito para devolver o equilíbrio da relação antes indicação de falsa paternidade.
Insta salientar que, admite-se a restituição dos alimentos, apenas quando
restar demonstrado que quem os prestou não os devia, e este indicar o terceiro a quem cabia a terceiro a obrigação alimentar. O alimentado não pode ser condenado a restituição, vez que não obteve nenhum enriquecimento ilícito. De forma que, quem forneceu os alimentos acreditando de forma errônea que os devia, poderá exigir do terceiro que realmente devia fornecê-los, a restituição por todo o valor pago indevidamente.
Dessa forma, aduz a jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO PELO PAGAMENTO DE ALIMENTOS GRAVÍDICOS. Não ficou provado que a ré/apelada, deliberadamente (com dolo) ou desacauteladamente (com culpa) tenha imputado falsamente a paternidade ao apelante. Também não ficou provada a vontade deliberada da ré/apelada de tirar vantagem, cobrando alimentos gravídicos do autor/apelante e não daquele que acabou sendo o pai registral. Nesse passo, não há falar em indenização pelos alimentos pagos, ainda que a criança não tenha sido registrada no nome do alimentante. POR MAIORIA, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO, VENCIDO O RELATOR. (Apelação Cível Nº 70074295155, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Redator: Rui Portanova, Julgado em 30/11/2017). (TJ-RS - AC: 70074295155 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 30/11/2017, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/12/2017)
“ALIMENTOS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INDUÇÃO EM ERRO. Inexistência de filiação declarada em sentença. Enriquecimento sem causa do menor inocorrente. Pretensão que deve ser deduzida contra a mãe ou contra o pai biológico, responsáveis pela manutenção do alimentário. Restituição por este não é devida. Aquele que fornece alimentos pensando erradamente que os devia pode exigir a restituição do seu valor do terceiro que realmente devia fornecê-los.” (SÃO PAULO, TJ, Apelação 138.499-1, Rel.: Des. Jorge Almeida)
Nos casos acima expostos, no primeiro, não houve a comprovação de que a genitora agiu de má-fé e portanto, não houve condenação em danos morais. No segundo, demonstra que, não é devida a restituição do valor pago a título de alimentos gravídicos, mas, que aquele que paga alimentos pensando ser o pai da criança, poderá requerer a restituição do valor pago, àquele que realmente deveria ter pago.
7. CONCLUSÃO
A criação da Lei nº 11.804/2008, que trata dos alimentos gravídicos veio para assegurar e auxiliar as mulheres grávidas uma gestação saudável, e ao feto um desenvolvimento sadio, através do fornecimento de auxílio financeiro do suposto genitor e da genitora de acordo com suas possibilidades, de modo proporcional para ambas as partes.
A lei tem caráter social, vez que busca da melhor forma, amparar e proteger a mulher grávida e seu filho, que necessitam de auxílio, evitando-se assim o desamparo da mulher gestante em condições gestacionais.
A lei de alimentos gravídicos possui poucos artigos e por essa razão, é necessária a utilização da Lei de Alimentos em conjunto.
Referida lei é de extrema importância no ordenamento jurídico, pois garante ao nascituro o direito à vida, mencionado no artigo 5º da Constituição Federal do Brasil de 1988.
Para a fixação dos alimentos gravídicos, é necessário a comprovação dos indícios de paternidade, ou seja, a genitora juntará provas de que manteve algum tipo de relacionamento com o suposto genitor, independentemente do tipo de relacionamento.
Os alimentos gravídicos duram somente o tempo da gestação, porém, quando houver o nascimento com vida, os alimentos gravídicos serão, de forma automática, convertidos em pensão alimentícia.
Os alimentos são irrepetíveis e, caso venha a ser comprovado que foram pagos indevidamente, não há que se falar em restituição por parte da genitora, desde que a mesma tenha agido de boa-fé, uma vez que, os alimentos foram para sustentar a sobrevivência do nascituro. Mas, se após a confirmação da negativa do suposto genitor, através de exame de DNA, o genitor poderá ingressar com ação indenizatória em razão de danos morais e materiais que houver sofrido.
8. REFERÊNCIAS
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[1] graduada em Direito pelo Centro Universitário de Votuporanga-SP (2002), especialização em Direito Civil e Processo Civil pelo Centro Universitário de Rio Preto/SP (2007), especialista em Docência do Ensino Superior pela Faculdade Aldete Maria Alves - FAMA (2011) e especialista em Docência no Ensino à Distância pela Faculdade de Paraíso do Norte-PR (2019). Mestre em Ciências Ambientais pela Universidade Brasil, campus Fernandópolis - SP (2019). Advogada desde 2005. Docente da Universidade Brasil, na cidade de Fernandópolis, no curso de Direito.
Bacharelanda do curso de Direito da Universidade Brasil - Campus Fernandópolis
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, PAULA CRISTINA DE. Alimentos gravídicos: os direitos do nascituro e da gestante Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 mar 2020, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54343/alimentos-gravdicos-os-direitos-do-nascituro-e-da-gestante. Acesso em: 23 dez 2024.
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