Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Universidade Brasil como complementação dos créditos necessários para obtenção do título de Bacharel em Direito. Orientadores: Prof. Dr. André de Paula Viana e Márcia Kazume Pereira Sato
RESUMO: O erro médico trata-se de uma ação ou omissão realizada pelo profissional da saúde que pode ser caracterizado pelas facetas da culpa, seja negligência, imprudência ou imperícia. Tal conduta pode resultar em danos graves e, até mesmo, na morte do paciente. A globalização da mídia contribui para uma expansão do sensacionalismo e tende a atribuir ao conceito de erro médico todos os atos praticados por estes profissionais, não distinguindo dolo de culpa. Levando em consideração que a responsabilização pode ser administrativa, civil ou penal e a crescente judicialização de casos que envolvem erro médico verifica-se uma preocupante situação no país, uma vez que a maioria das pessoas sequer conhece seu significado e, neste sentido, desconhecem até onde um médico pode ser penalmente responsabilizado. Para conhecer esse tema foi feito uma pesquisa por web gráfica, livros e monografias nos meses de agosto a novembro de 2019, usando como descritor o termo Responsabilização Penal por erro médico. Constatou-se, portanto, a importância da prevenção, porém uma vez que há muitos fatores contributivos para tal e que médicos também são humanos e, por consequência, também cometem erros, a informação é essencial para saber até onde os direitos e deverem se estendem.
Palavras-chave: Erro médico; Responsabilização Penal; Negligência; Imprudência; Imperícia;
ABSTRACT: Medical error is an action or omission performed by the health professional that can be characterized by the facets of guilt, whether negligence, imprudence or malpractice. Such conduct may result in serious injury and even death of the patient. The globalization of the media contributes to an expansion of sensationalism and tends to attribute to the concept of medical error all acts performed by these professionals, not distinguishing guilt from guilt. Considering that liability can be administrative, civil or criminal and the increasing judicialization of cases involving medical error is a worrying situation in the country, since most people do not even know its meaning and, in this sense, are not even aware of it. where a doctor may be criminally liable. In order to know this theme, a search was made for web graphics, books and monographs from August to November 2019, using as a descriptor the term Penal Liability for medical error. Therefore, the importance of prevention was noted, but since there are many contributing factors to this and doctors are also human and therefore also make mistakes, information is essential to know to what extent rights and duties extend.
Key words: Medical error; Criminal liability; Negligence; Imprudence; Malpractice;
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. ERRO MÉDICO. 2.1 Medicina legal e erro médico.
2.2 Evolução histórica do erro médico. 2.3 Definição e conceito de erro médico. 3. RESPONSABILIZAÇÃO. 3.1 Responsabilização por erro médico. 3.2 Responsabilização penal por erro médico. 3.3 Classificação do erro médico. 3.4 Apuração da Responsabilidade Legal. 3.5 Responsabilização solidaria. 3.6 Responsabilidade do paciente ou de terceiros . 4. FATORES DE RISCO. 4.1 Fatores de risco e prevenção ao erro médico. 5. Discussão De Resultados. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
Atualmente, qualquer insatisfação de pacientes quanto a tratamentos médicos tende a ser descrita como erro médico, entretanto o erro médico precisa necessariamente ser enquadrado em algumas facetas da culpa, seja ela negligência, imprudência ou imperícia, para que seja classificado com erro médico e que haja responsabilização penal, é essencial que se estabeleça o nexo causal entre o dano e o ato danoso.
O presente artigo visa estudar a natureza do erro médico, estimar seus determinantes essenciais a fim de analisar a partir de que momento pode haver a responsabilização, seja ela administrativa, civil ou, em especial, penal.
A globalização da mídia contribui para um sensacionalismo que tende a atribuir ao conceito de erro médico todos os atos praticados por estes profissionais, não distinguindo dolo de culpa, quando há responsabilização penal no exercício da atividade médica e quando há erro médico. Mesmo diante da relevância do tema, existe ainda certa ignorância que deve ser quebrada.
Assim, este trabalho buscará efetivar a difusão do assunto levando-o a públicos cada vez maiores, com a meta de informá-los e apresentar a matéria sob a luz do Direito, zelando sempre pela valorização e pela obediência plena à lei.
O trabalho será divido em três capítulos. No primeiro capitulo será verificado algumas noções introdutórias a cerca da medicina legal especificamente quanto ao erro médico sua conceituação, natureza jurídica e evolução histórica.
No segundo capítulo será estudado a cerca da responsabilização por erro médico, diferenciando a esfera civil, administrativa e, especificamente, quanto à esfera penal. Também analisaremos as feições da culpa, quanto a negligência, imprudência e imperícia, apuração da responsabilidade legal e sua aplicabilidade aos casos concretos.
No terceiro capítulo serão elencados alguns fatores de risco interligados com a necessidade de prevenção.
A metodologia aplicada neste trabalho de pesquisa será a bibliográfica (textos de doutrina jurídica e da área de medicina legal), também com referências em artigos publicados em meios de comunicação como páginas eletrônicas, usando como descritor o termo Responsabilização Penal por erro médico.
2. ERRO MÉDICO
2.1 Medicina legal e erro médico
A medicina legal é uma ciência que se utiliza de conhecimentos médico-biológicos à aplicação do direito. Abrange desde a concepção até depois da morte. É extremamente necessária para avaliação dos laudos, dentre outras áreas de atuação, no Direito Penal auxilia e colabora no estudo de problemas relacionados a lesões corporais, aborto, homicídio, infanticídio, crimes contra liberdade sexual, dentre outros, neste sentido:
A Medicina Legal não se preocupa apenas com o indivíduo enquanto vivo. Alcança-o ainda quando ovo e pode vasculhá-lo muitos anos depois na escuridão da sepultura. É muito mais uma ciência social do que propriamente um capítulo da Medicina, devido à sua preocupação no estudo das mais diversas formas da convivência humana e do bem comum. (FRANÇA, 2017, p. 23)
Tem extrema relevância e influencia no campo legislativo para elaboração de novas leis, execução das já existentes e interpretação de dispositivos médico-legais. Em suma, conforme palavras do doutrinador França (2017, p. 23) “a Medicina Legal é a contribuição da medicina, e da tecnologia e outras ciências afins, às questões do Direito na elaboração das leis, na administração judiciária e na consolidação da doutrina”.
Dentre tantas áreas em que a medicina legal serve de auxilio para estudo pode ser realizar uma analise do erro médico, por intermédio dos dispositivos legais que responsabilizam os erros cometidos pela classe médica.
2.2 Evolução histórica do erro médico
Com o desenvolvimento social, surge a necessidade da normatização em diversas áreas, dentre elas na área da saúde, neste ponto específico quanto a responsabilização dos profissionais da saúde pelos erros cometidos. Historicamente, o primeiro código normativo que passou a responsabilizar os erros médicos foi o código de Hammurabi da Babilônia no séc. XVIII a.C. Vide: "O médico que mata alguém livre no tratamento ou que cega um cidadão livre terá suas mãos cortadas; se morre o escravo paga seu preço, se ficar cego, a metade do preço".
Este código é um conjunto de leis com 282 artigos que abrangem desde família, propriedade, trabalho, crimes e escravidão. Nele encontra-se a Lei de Talião (Corão), também conhecida como a lei de retaliação que foi criada na mesopotâmia, trouxe a tona uma expressão até hoje conhecida "Olho por olho, dente por dente".
Na medicina grega o conhecido juramento de Hipócrates, demonstrou a responsabilização do médico a exercer com excelência sua atividade profissional: "Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar danos ou mal a alguém".
Com o passar do tempo e globalização, a medicina se tornou uma ciência que passou a exigir condutas cientificas, a reparação passou a ser prevista legalmente uma vez que a medicina se tornou uma atividade de risco, além de inúmeras dificuldades das politicas governamentais da saúde, conflitos com os planos e seguros de saúde, há uma crescente comercialização da indenização.
2.3 Definição e conceito de erro médico
Em breves palavras podemos conceituar erro médico como um dano causado ao paciente seja pela comissão ou omissão, diverso do esperado ou previsto. Segundo Gomes e França, (1998, p. 244): “Erro médico é o dano provocado no paciente pela ação ou inação do médico, no exercício da profissão, e sem a intenção de cometê-lo”.
Este possui natureza diversa dos delitos praticados intencionalmente para provocar dano físico, com resultados visíveis, na maioria das vezes irreparáveis, ou mesmo psicológicos, quando não, a junção de ambos. Ressalta-se que não há a intenção, a vontade de cometer tal ato, de maneira que fica caracterizado tal erro quando é empregado pelo profissional todos os meios possíveis para se obter um resultado, entretanto é obtido outro adverso ou imprevisível.
A grande questão que gira em torno deste tema “é a dramática inversão de expectativa de quem vai à procura de um bem e alcança o mal” (GOMES E FRANÇA, 1998, p. 244). O mau resultado não necessariamente significa erro médico, pois pode ser decorrente de outros fatores como uma situação incontrolável, um acidente inesperado, falhas estruturais ou mesmo meios e condições de trabalho insuficientes para um resultado satisfatório, neste sentido, vale ressaltar que a relação médico-paciente, em regra, trata-se de uma obrigação de meio e não de resultados. Assim sendo, é valido especificar quais os deveres do profissional da área médica a fim de que se estabeleça um padrão para analise se houve, ou não, eventual erro médico, neste quesito, verifique quatro deveres essenciais de um médico:
I) Deveres de informação: O médico deve prestar todos os esclarecimentos necessários a cerca da realização de um ato médico, desde os procedimentos que serão adotados, riscos a que se sujeita o paciente, até as cautelas recomendáveis, em especial se o ato médico é mais complexo e de maior risco, fundamentando-se nos princípios da transparência e vulnerabilidade do consumidor. Caso houver mudança no procedimento deve ser levado ao paciente. Vale ressaltar que o paciente tem direito a recusa, exceto em situações de urgência em que o médico é legitimado para praticar o ato profissional necessário.
II) Deveres de atualização profissional: É necessário que o profissional esteja sempre se aprimorando , adquirindo novas técnicas, meios de tratamentos, este é o dever que norteia se é admitida ou não a imperícia em um caso concreto. Também é analisado se o profissional estava credenciado a exercer suas atividades ou se poderia ter evitado determinado dano se tivesse conhecimento adquirido pela experiência médica, neste caso fica caracterizada a negligência.
III) Deveres de abstenção de abuso: É necessário que o profissional médico no exercício da atividade haja com cautela com finalidade de evitar danos, pois ao tomar medidas desnecessárias, precipitadas ou mesmo descabidas pode-se configurar em desvio de poder ou abuso. Há exceção, quando assumir determinados risco seja a ultima alternativa, fundamento legal no principio do risco proveito. Também se enquadra neste dever a injustificada quebra de sigilo.
IV) Deveres de vigilância, de cuidados e de assistência: O médico deve agir diligentemente, de maneira que não se omita quando necessário agir, para que não se caracterize em passividade ou descaso. Quanto maior o risco, maior deverá ser o cuidado. Este dever viabiliza a analise da responsabilidade do profissional no âmbito da culpa aplicada ao caso concreto, condições e circunstancias que eventualmente resultaram em fato indesejado.
3. RESPONSABILIZAÇÃO
3.1 Responsabilização por erro médico
Vislumbra-se que basicamente o erro médico é a má pratica do exercício medicinal e essa malpractice se aplica a todas as atividades profissionais, neste âmbito, especificamente, pode levar à responsabilidade legal do médico. Neste sentido Genival Veloso França posicionou-se:
Ipso facto, por responsabilidade profissional concebe-se todo dano físico ou moral resultante de uma forma atípica ou inadequada de conduta, caracterizada por inobservância de regras técnicas ou por infração aos ditames da ética médica e que possa ser produzido no paciente por imperícia, imprudência ou negligência. (2017, p. 787)
Tal erro pode ser de ordem pessoal ou estrutural. Quando pessoal se pauta estritamente na ação ou omissão do agente, e neste sentido a responsabilidade pode ser arguida de duas formas: a moral e a legal. Sendo que a primeira é avaliada pelos Conselhos Regionais de Medicina, através de processos ético-administrativos, com fundamentação legal na Lei nº 3.268/ 1957, regulamentada pelo Decreto nº 44.045/1958. Enquanto a segunda é de competência tribunais, podendo comportar, entre outras, as ações penais, cíveis e administrativas. Enquanto estrutural o dano resultante de erro médico pode ser auferido por falhas estruturais quanto aos meios ou condições de trabalho quando insuficientes ou ineficazes para um exercício satisfatório da atividade médica.
Para aferição da responsabilidade por erro médico é necessária à distinção do erro médico do mal incontrolável – dano proveniente de uma situação grave de curso inalterável - e do acidente imprevisível – resultado lesivo é causado por caso fortuito ou força maior, incapaz de ser previsto ou mesmo evitado.
Sendo assim responsabilidade pode assumir três aspectos:
· Responsabilização administrativa;
· Responsabilização Civil;
· Responsabilização Penal.
Se aferido pelo Conselho Regional de Medicina, o erro médico assume viés de falta ética e pode levar a instauração de processo ético-disciplinar, na Justiça Cível, por sua vez, possui fim indenizatório e na Justiça Criminal constitui-se na tipificação de um ilícito penal. A cerca da responsabilidade médica vejamos especificamente a responsabilização penal por erro médico.
3.2 Responsabilização penal por erro médico
No ordenamento jurídico brasileiro, em decorrência da culpabilidade, requisito imprescindível para tipificação penal, fez-se necessária a distinção entre crimes dolosos e culposos.
Uma vez dolosa a conduta do agente verifica-se a livre vontade de praticar uma infração ou assumir os ricos de produzi-la, este dolo pode ser direto ou indireto e não traz consigo a fundamentação legal do erro médico. Visto que o erro médico se caracteriza essencialmente pela intenção de produzir um resultado, porém causa um dano diverso, inesperado. Vislumbra-se a justa e necessária aplicação da culpa para averiguar a responsabilidade em sentido amplo - nexo causal do agente e conduta - e estrito do agente mediante as feições da culpa.
O código penal em seu artigo 20 fundamenta a possibilidade da punição de crimes culposos mediante erro, vide: “O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei”.
Verifica-se que o erro extingue o dolo e, em suma, a responsabilidade médica possui como fundamento jurídico o instituto da culpa, de maneira que não se pune o mal resultado em si, mas a atuação descuidada no exercício da profissão. Caso não fique caracterizada a culpa o médico é responsabilizado penalmente como qualquer cidadão.
3.3 Classificação do erro médico
O conceito de culpa é muito complexo, por ser muito abrangente, os legisladores abstiveram-se em defini-lo optando por trazer em nosso ordenamento jurídico brasileiro três situações de sua aplicabilidade. Fazendo-se necessária a aplicação doutrina para tal interpretação, vejamos o que diz Fernando Capez (2018): “Culpa: é o elemento normativo da conduta. A culpa é assim chamada porque sua verificação necessita de um prévio juízo de valor, sem o qual não se sabe se ela está ou não presente”.
É imprescindível a aplicação de um juízo de valor quanto à conduta no caso concreto.
Vejamos que as feições da culpa caracterizam-se pela negligência, imprudência ou imperícia:
Há três possibilidades de suscitar o dano e alcançar o erro: imprudência, imperícia e negligência. Esta, a negligência, consiste em não fazer o que deveria ser feito; a imprudência consiste em fazer o que não deveria ser feito e a imperícia em fazer mal o que deveria ser bem feito. Isto traduzido em linguagem mais simples. (GOMES, FRANÇA, 1998)
Estas não são autônomas entre si e em uma mesma situação podem estar presentes uma, duas, ou mesmo as três, de maneira que uma pode agravar a outra.
Vejamos cada uma delas:
I. Imprudência: Tem caráter comissivo e consiste no agir sem cautela do médico, precipitado, é o desprezo dos cuidados necessários. O médico imprudente, apesar de ter conhecimento claro e inequívoco do risco ignora-o. O doutrinador França diz que é estritamente necessário que haja de fato danos objetivos, do contrário não se caracteriza a culpa, não podendo o médico ser responsabilizado por tal ato (FRANÇA, 2017). Esta faceta da culpa por vezes é rotulada como imperícia, porem elas não se confunde:
Muitos casos de comprovada imprudência vêm sendo rotulados como imperícia. Se o médico agiu de maneira açodada, audaciosa e irresponsável, qualquer que seja o seu nível de conhecimento, não há o que confundir: trata-se de imprudência. (FRANÇA, 2017, p. 1432)
Por exemplo, a realização de uma operação sem a equipe cirúrgica mínima necessária ou mesmo um cirurgião que, podendo, deixa de realizar uma cirurgia por um método conhecido e adota outra técnica resultando em dano ao paciente.
II. Negligência: Caracteriza-se na falta de cuidado, precaução. É a omissão daquilo que razoavelmente se faz em determinada circunstância. Segundo FRANÇA (2017, p. 1433-1440) pode ser caracterizada:
a. Abandono ao doente: Este é o tipo mais comum de negligência médica, pois uma vez estabelecida a relação médico-paciente o profissional assume a responsabilidade de continuidade do tratamento, exceto quando não houver perigo, força maior ou for acordado entre ambas as partes.
b. Omissão de tratamento: Neste caso o médico deixa de tratar um paciente ou mesmo atrasa seu encaminhamento a outro médico a partir de então responsável, por exemplo, clinico que deixa de encaminhar ou encaminha tardiamente paciente com apendicite ao médico cirurgião.
c. Negligência de um médico pela omissão de outro: Esta hipótese de negligência já foi chamada pela doutrina de “negligência vicariante”, consiste na responsabilização de determinado médico por irresponsabilidade de outro, vindo ambos a serem responsabilizados pelo código de ética médica. Por exemplo, na troca de plantão o médico deixa o hospital, presumindo pontualidade do profissional que irá substitui-lo, porém este não o faz e um paciente vem a sofrer danos pela falta de um profissional.
d. Prática ilegal por estudantes de Medicina: Consiste na responsabilização do superior hierárquico em caso de negligência, imprudência ou imperícia praticado por estagiário, uma vez que se presume que este esteja sempre sob orientação médica.
e. Prática ilegal por pessoal técnico: Consiste na responsabilização do superior hierárquico em caso da transferência de sua responsabilidade a um auxiliar técnico.
f. Letra do médico: Caso a letra do médico esteja ilegível e de margem para troca de medicamentos e desta troca haja dano ao paciente, tanto o farmacêutico quanto o médico serão responsabilizados, o farmacêutico por imprudência, uma vez que na dúvida não deveria entregar medicamento e o médico por negligência, uma vez que é proibido o fazer de forma ilegível.
g. Negligência hospitalar: Trata-se da responsabilização da pessoa jurídica por negligência quanto a danos causados ao paciente em determinadas situações como rejeição de um paciente em perigo de vida, independente da situação do hospital, lesões sofridas durante a internação e em função desta, por exemplo erro na administração de um medicamento, queimadura, traumatismo por queda, alta prematura.
h. Esquecimento de corpo estranho em cirurgia: tal situação não se caracteriza imputável por si só, mas sim em situações reiteradas e desde que gere de fato dano. Em geral este tipo de fato ocorre em situações de grande risco e urgência, por vezes frente à iminência da morte ou mediante hemorragias e não diz respeito apenas ao médico, mas também esta relacionado àqueles que participam direta, ou indiretamente, do procedimento operatório. Para que haja a imputabilidade por tal hipótese é necessário analisar as condições médico-hospitalares, pois uma vez precárias, não é justo qualificar tal ato como negligente, pois se trata de fator contribuinte para a ocorrência do acidente, por mais cauteloso que tenha sido o cirurgião. A cerca da responsabilização por crime culposo na modalidade negligencia:
Para se qualificar o esquecimento de um corpo estranho em um ato operatório como crime culposo por negligência, ter-se-ia de invocar os elementos essenciais da culpa: previsibilidade de dano, ato voluntário inicial, ausência de previsão e voluntária omissão ou negligência. Seja a culpa um vício da vontade, seja um vício da inteligência, não é caracterizada nas situações aludidas como responsabilidade médica por negligência (FRANÇA, 2017, p.1437).
Uma vez caracterizada imprevisível tal circunstancia passa a ser acidental e equipara-se a risco cirúrgico.
i. Negligência dos centros complementares de diagnóstico: Trata-se da responsabilização de estabelecimentos responsáveis pela elaboração de exames solicitados subsidiariamente pelos profissionais encarregados pelo diagnóstico e terapêutico dos pacientes, na pessoa dos seus diretores.
j. Negligência em transfusões de sangue: Neste caso a responsabilização deixou de ser, em parte, do médico e passou a ser do Estado por deficiência no serviço publico. Estes danos produzidos são ressarcidos em regra civilmente por meio de indenizações. De maneira que são sujeitos aos riscos não só o receptor, mas também o doador.
k. Cirurgia do lado errado ou da pessoa errada: esta hipótese não se trata de uma fatalidade, mas sim uma culpa declarada. A responsabilização não se restringe ao superior hierárquico, transcendendo do médico para os demais agentes, tanto os que supervisionam quanto os responsáveis por cada procedimento.
III. Imperícia: Se expressa na inaptidão, é a deficiência de conhecimento, seja técnico ou teórico no desempenho da profissão. É valido ressaltar que é punível o erro evitável, levando em consideração que médico também é ser humano e que muito da profissão, assim como em qualquer outra, se adquire pela pratica e experiência profissional.
O Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP) faz alusão a um argumento utilizado pelo procurador geral da Corte de Apelação de Milão, Itália, vide:
Não é imperito quem não sabe, mas aquele que não sabe aquilo que um médico, ordinariamente, deveria saber; não é negligente quem descura alguma norma técnica, mas quem descura aquela norma que todos os outros observam; não é imprudente quem usa experimentos terapêuticos perigosos, mas aquele que os utiliza sem necessidade (...).
A auferição da responsabilidade médica por imperícia é extremamente difícil de ser comprovada uma vez que o diploma médico lhe confere livre exercício da profissão e presume-se idoneidade, sendo assim por mais que, diversas vezes, se confunda, é muito mais provável estarmos diante de um caso de imprudência ou negligência do que de imperícia. Vide a opinião do doutrinador França (2017, p. 1442) acerca do tema: “Portanto, as faltas dos médicos, consideradas sob o princípio da responsabilidade culposa, são, em quaisquer circunstâncias, resultado de imprudência ou de negligência, e jamais de imperícia”.
A cerca da responsabilidade médica e ponderação, é de extrema relevância a verificação da presença das facetas da culpa - negligencia imprudência e imperícia - sob a ótica do caso concreto. Neste sentido o Código de Ética Médica (2010) diz:
III - RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL
É vedado ao médico:
Art. 1º Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.
Parágrafo único. A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida.
Nesta feita é necessário averiguar os aspectos jurídicos que para a apuração da responsabilidade médica.
3.4 Apuração da Responsabilidade Legal
Nereu Cesar de Moraes, ex-Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo fez algumas considerações a cerca dos aspectos jurídicos do erro médico e para apuração deste e suas consequências, neste sentido ele traz a tona quatro aspectos que é necessário levar em consideração:
I. Materialidade e autoria: é a atividade profissional em si, o ato que causou o dano ao paciente, a sua vida, a sua saude; a outra trata-se da efetiva participação do médico no ato causador do dano, respectivamente.
II. Dano: A má prática causa prejuízo comprometendo a vida, saúde ou integridade física do paciente. Nas questões de natureza penal a pericia irá avaliar o dano à evidenciar o corpus criminis (corpo da vítima), o corpus instrumentorum (ação ou meio que produziu o dano) e o corpus probatorum (nexo causal); É realizada uma analise quanto a natureza das lesões e cabe ao juiz qualifica-las, contudo há algumas lesões que por si só já são presumidamente culposas: se o dano incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta (30) dias, debilidade permanente de membro, sentido ou função, incapacidade permanente para o trabalho, enfermidade incurável, perda ou inutilização de membro, sentido ou função ou deformidade permanente.
III. Nexo causal: O ato da má prática deve ter como consequencia o resultado danoso do contrário não há responsabilidade legal, pela inexistência da relação de causalidade. Neste quesito cabe analisar as circunstancias e fatores de risco a que se submeteu o ato médico.
IV. Ilicitude: Deve-se analisar se não há nenhuma causa excludente de ilicitude prevista no art. 23 de Código Penal:
Exclusão de ilicitude
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
Excesso punível
Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
As causas excludentes de ilicitude sejam: estado de necessidade, a legítima defesa, o estrito cumprimento de dever legal ou o exercício regular de direito, tornam o ato legítimo e caso presente alguma destas não há que se cogitar em erro médico uma vez que a conduta torna-se atípica.
3.5 Responsabilização solidaria
Pode caracterizar existência de responsabilidade solidária entre os membros de hospital, clínica, planos de saúde, etc. Neste sentido o Código Civil em seu artigo 932: “São também responsáveis pela reparação civil: (…); III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçal e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele”. Ocorre que penalmente a responsabilização tem caráter pessoal.
3.6 Responsabilidade do paciente ou de terceiros
Para há responsabilização, independente se ética ou legal é necessária à comprovação do dano causado ao paciente, à culpa do profissional e o nexo de causalidade. Levando em consideração que por vezes pode ocorrer que a culpa seja do próprio paciente ou terceiro, vejamos, um exemplo desta hipótese consiste na obtenção de um resultado danoso por conta de descumprimento das recomendações medicas passadas a cerca dos cuidados e procedimentos necessários a serem seguidos, por exemplo, a suspensão ou abandono precoce de um medicamento.
É essencial saber distinguir os deveres de cada individuo na relação médico-paciente e da mesma forma que o médico possui deveres o paciente também possui para que haja a obtenção de um bom resultado. Assim sendo, é essencial que o paciente no cumprimento de seus deveres cumpra a prescrição quanto à dosagem, horário da medicação, cuidados, dietas e seguir as orientações passadas a este, do contrario, uma vez comprovado o nexo de causalidade do dano provocado a culpa pode sim ser atribuída ao médico. Desta forma, para que haja a responsabilização do medico, é necessário analisar, primeiramente, se o paciente cumpriu todas as orientações a ele passadas, uma vez comprovada a responsabilidade do paciente ou de terceiros, fica o médico demandado da culpa. E em caso de falsa imputação pode o médico inclusive pleitear indenização contra o paciente.
4. PREVENÇÃO
4.1 Prevenção ao erro médico
O erro médico pressupõe uma falha humana, para evitar que ocorra faz-se necessário além das questões pessoais, as estruturais para que haja efetiva diminuição dos maus resultados. Sobretudo desmitificar a ideia social de que todo resultado danoso e indesejado no exercício da medicina é de responsabilidade estrita do médico. Nesta feita, faz-se necessário a compreensão de todos os fatores que podem contribuir para a ocorrência de um resultado insatisfatório, França (2017) dividiu doutrinariamente tais fatores em assistenciais e não assistenciais. Dentre os não assistenciais pode-se elencar a precariedade no sistema de saúde, a falta de compromisso de alguns médicos, a não participação da sociedade, a não revisão do aparelho formador, a falta do ensino continuado e a precária fiscalização do exercício profissional. Enquanto, no tocante aos fatores assistenciais, aponta o desgaste da relação médico–paciente, a falta de condições de trabalho, o abuso de poder, a falsa garantia de resultado, a falta do consentimento esclarecido, o preenchimento inadequado de prontuários e também a precária documentação dos procedimentos.
Esta realidade de péssimas condições de trabalho e os meios deficitários no tratamento das pessoas contribui para consolidação de uma medicina defensiva, de custos dobrados e excessiva demanda judicial.
Uma vez ocorrido erro há duas hipóteses, no ponto de vista moral, aceitar da responsabilidade pelo mau resultado com pedido de desculpa e uma possível compensação financeira ao paciente, estabelecendo uma relação de maior confiança, contudo, há uma parte da classe que discorda, sob o argumento que seria fomento a “indústria de indenizações”, estímulo permanente de conflitos, além do temor das punições éticas e legais ao confessarem seus próprios erros.
Conclui-se que o melhor meio é a prevenção, agir em respeito à dignidade e respeito a vida de cada pessoa.
5. Discussão De Resultados
A pesquisa foi realizada com o objetivo de desmistificar e o sensacionalismo midiático, conceituando o erro médico, analisando sua evolução histórica e como se dá a responsabilização.
Verificou-se que a referida responsabilização pode ocorrer em 3 esferas, são elas a administrativa, civil ou penal. De maneira que este trabalho focou especificamente na responsabilização Penal por erro médico e neste sentido delimitou como esta ocorre, uma vez que pressupõe a culpa e deve ser determinada por meio das facetas da culpa: negligência, imprudência ou imperícia.
Os objetivos propostos para a realização desta pesquisa foram realizados, uma vez que, a pesquisa analisou a matéria sob a luz do Direito, baseada em princípios éticos e obediência à lei, explorando ao que a legislação diz acerca da Responsabilização Penal por erro médico e explanando sobre todos os pontos relevantes acerca do tema.
Por fim chegou-se à conclusão que a precaução é essencial, porém uma vez que há muitos fatores contributivos para tal e que médicos também são humanos e, por consequência, também cometem erros, é essencial a informação da sociedade, a fim de que restou esclarecido os direitos e deverem no que diz respeito a responsabilização penal por erro médico.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo discorreu acerca da Responsabilização Penal do erro médico, para melhor compreensão do leitor foi introduzido o assunto a partir da Medicina Legal, especificando o erro médico. Foi abordada à evolução histórica e para maiores conhecimentos a pesquisa abrangeu o posicionamento de outro pais, por meio do direito comparado. Foi analisada a sua natureza jurídica e as disposições legais para embasamento do tema responsabilização por erro médico, diferenciando a esfera civil, administrativa e, especificamente, quanto à esfera penal. Especificou-se quanto a Responsabilização Penal por erro médico e, neste sentido analisou-se as feições da culpa, quanto a negligência, imprudência e imperícia, apuração da responsabilidade legal e sua aplicabilidade e posteriormente apresentada a forma de prevenção a eventual erro médico.
Todos os objetivos propostos para a realização desta pesquisa foram realizados, uma vez que, a pesquisa analisou a matéria sob a luz do Direito, baseada em princípios éticos e obediência à lei, explorando ao que a legislação diz acerca da Responsabilização Penal por erro médico e explanando sobre todos os pontos relevantes acerca do tema.
Constatou-se, portanto, a importância da prevenção, uma vez que há muitos fatores contributivos para a ocorrência do erro médico e levando em consideração que médicos também são humanos e, por consequência, também cometem erros, a informação é essencial para os limites dos direitos e deveres quanto a responsabilidade do profissional e, eventualmente, de pacientes e terceiros.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E WEBGRÁFICAS
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Graduanda no curso de Direito da Universidade Brasil, Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: OLIVEIRA, Ariane Eduarda Carvalho de. Responsabilização penal por erro médico Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 mar 2020, 04:56. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54370/responsabilizao-penal-por-erro-mdico. Acesso em: 23 dez 2024.
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